Girar, ou não girar: eis a que

Girar, ou não girar: eis a que



A ampulheta parecia uma bomba em suas mãos. Girar, ou não girar:eis a questão.


Um silêncio caiu sobre o sótão, eu não conseguia sair do lugar, o Rio de Janeiro que eu conhecia passava na minha frente, meus amigos, tudo que tinha abandonado. Minha sensação era de estar morta, não conhecia ninguém em Londres – passei os dedos pelos meus cabelos, olhei aquelas pontas loiras que não me pertenciam de verdade, eram parte da minha transformação, do meu recomeço – não tinha mais ninguém no mundo, o que eu tenho a perder? A logomarca da London School of Economics pairou na minha mente...


De repente um som corta o ambiente, ele vem de longe, mas é o único barulho que escuto. Pouso o vira-tempo sob uma das velhas caixas, desço as escadas correndo querendo saber quem poderia estar tocando a campainha, um vizinho convidando para um chá?


Abro a porta, não há ninguém me esperando do lado de fora, baixo os olhos desapontada – esperava que ao menos um vizinho fosse falar comigo, me tirar da solidão – quando vejo uma cesta coberta por um pano branco. Me abaixo para ver o que existe ali dentro. Meu coração acelera, minha pele naturalmente branca fica praticamente transparente: uma cesta cheia de maçãs, uma delas já mordida. Olho ao redor buscando encontrar o olhar daquele que colocara a cesta, não há ninguém nas redondezas. Uma ameaça clara: sabemos quem você é, e onde você mora, você será a próxima manchete de jornal.


 


Disparo em direção ao sótão, tremendo pego a ampulheta em minhas mãos, e sem nem pensar giro sete vezes.  Tudo na minha frente parece girar, as memórias vão se perdendo, as paredes sujas do sótão somem da minha frente.

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