NOVOS AMIGOS E UM MISTÉRIO



Kings Cross estava tão apinhada de gente que as pessoas se esbarravam aqui ali com suas malas, carrinhos e bolsas. Era o fim das férias em toda Londres, o que justificava tantos casais de mãos dadas com seus filhos, alguns mais chorosos do que outros.


Um carro parou em frente à famosa estação de trens inglesa e ninguém reparou que de um automóvel pequeno, saíram seis pessoas: Valentina Alves e Cecília Monfort, cada uma com seus respectivos pais e muitas malas.


As duas amigas tinham a aparência física diferente do loiro dominante que era o povo inglês, eram brasileiras e ambas tinham quinze anos. Valentina, de pele clara pelas poucas visitas à praia, tinha os cabelos lisos e negros cortados na altura do pescoço e penteados para dentro, lhe dando um aspecto retrô. Os olhos eram de um azul tão cristalino que o contraste com a escuridão dos cabelos e das sobrancelhas era quase chocante. O rosto era um pouco quadrado, o queixo e o nariz eram finos e a boca lembrava a boca de uma boneca de porcelana, com os lábios parecendo um botão de flor. Sua aparência física materializava o que Valentina era interiormente: uma pessoa observadora e de pouco sorrir – até que alguém quebrasse todo aquele gelo e conquistasse sua amizade.


Já Cecília tinha a pele mais dourada pelo sol que ela fazia questão de tomar quase todo final de semana. Tinha os cabelos castanhos, longos, volumosos, lustrosos e um pouco aloirados pelo efeito do sol; os olhos eram castanhos penetrantes e astuciosos e com uma ponta de esverdeados; o nariz fino e arrebitado, o rosto de traços harmoniosos. A boca bem demarcada portava um sorriso cativante. No geral, sua aparência também condizia com personalidade essencialmente boa, talvez um pouco fútil, mas com o costume de gostar de se divertir às custas da ingenuidade alheia.


As mães de Valentina e Cecília, que trabalhavam no Ministério da Magia no Brasil, haviam sido transferidas para O Ministério na Inglaterra, fazendo com que a família inteira recebesse o impacto: Mudaram-se todos para Londres e as duas foram transferidas do Colégio Brasileiro de Magia – Collegium, para o quinto ano da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts.

Estavam todos conversando muito animados quando terminaram de colocar todas as malas em dois carrinhos e se dirigiram para a plataforma 9.


—Juntas então, Tina?


—No três. Um, dois... três!


As duas correram e empurraram os carinhos contra a parede da plataforma 9 e o muro de tijolinhos vermelhos pareceu recebê-las com boas vindas. Elas sentiram uma poeira e um cheiro de terra lhes invadir as narinas, e quando abriram os olhos, estavam na plataforma 9/2, tão apinhada de gente quanto estava o mundo dos trouxas. As duas deram um pouco de distância da parede atrás delas e logo depois apareceram os pais de Cecília, seguidos pelos pais de Valentina.


A despedida entre as meninas e seus pais foi rápida, pois não haveria mais tempo – o trem partiria às 11h é já eram 10h50min.


—Vou sentir muitas saudades, mãe... – Valentina choramingou no abraço que se demorou mais em Sra. Alves.


—Todos os anos nós sentimos muitas saudades, minha filhinha. – Sra. Alves lhe deu um beijo carinhoso no rosto —Mas vamos pensar que logo o Natal está aí para nos vermos novamente.


Sra. Alves apressou Valentina para que ela levasse suas malas para dentro do trem. Com Cecília não foi diferente. Ela se demorou mais no abraço que dera na mãe e as duas se beijaram.


—Ah, mais uma despedida... – Sra. Monfort disse, tristonha.


—Te amo, mamãe. Vou escrever toda semana!


—Eu também, minha querida!


E então Cecília foi apressada pelo primeiro apito do trem que já começava a soltar muita fumaça repolhuda pelas chaminés. Ela correu para junto de Valentina, entregando suas malas para um dos bruxos que as estava recolhendo e guardando todas elas no porta-malas. Ela empurrou Valentina para dentro de um dos últimos vagões vazios, e ambas apareceram pela janela para acenarem pela última vez para seus pais.


—Eu vou escrever todo dia!!! – Valentina gritou pela janela quando o trem começou a se movimentar.


—Nós te amamos! – os pais das duas falaram em coro não ensaiado.


—Comportem-se!


—E fiquem de olho nas notas!


O trem ganhou mais velocidade e quando apareceu a primeira curva, elas já não podiam mais ver seus pais acenando da plataforma.


Sentaram-se então nos bancos confortáveis do trem, uma de frente para a outra e se entreolharam. Todas as conversas sobre estarem indo para a Inglaterra, sobre estarem deixando o Brasil, sobre estarem mudando de escola; todos os detalhes, todas as impressões, os receios, a empolgação; absolutamente tudo já havia sido discutido previamente, em longas conversas por telefone ou nas usuais visitas de fim de semana ou ainda nos intervalos entre as aulas do Collegium.


As duas encontravam-se, então, numa total falta de assunto. Tudo o que podiam fazer era esperar por novos fatos, esperar por novos acontecimentos.


Tinham passado pouco tempo nas novas casas, com as novas vizinhanças. A chegada na Inglaterra havia sido corrida e mal houve tempo para que elas pudessem fazer as compras necessárias no Beco Diagonal.


—Hogwarts, aí vamos nós. – disse Valentina, sem emoção alguma na voz.


Cecília olhou-a com um  sorrisinho nos lábios.


—Vai ser bom, Tina. Hogwarts parece um lugar interessante. Veja... – disse, levantando um livro pesado e estendendo-o a Valentina.


—Hogwarts, Uma História. – disse ela, tomando o livro para si e passando os olhos pelo Índice. – Isso é útil?


—Oh, sim. Dá pra se ter uma idéia sobre o que se pode fazer lá e o que não se pode fazer. Algumas coisas são bem parecidas com o Collegium, outras... nem tanto.


—Exemplo?


—Casas.


—Que casas? Que é isso?


—Bem, de acordo com o que eu acho que deve ser um teste meio psicodélico de personalidade...


Valentina riu.


—É sério! Os alunos que ingressam em Hogwarts passam por uma espécie de teste que os selecionam para uma das quatro casas existentes. São Grifinória, Sonserina, Corvinal e Lufa-Lufa. E as cores dos uniformes se modificam para indicar a qual casa você pertence.


—Você achou essa informação realmente relevante? – perguntou Tina, com um olhar incrédulo para Cecília.


—Achei interessante. Sem contar que eu fico péssima de amarelo, então Lufa-Lufa nem pensar.


—E você pode decidir isso, Lia? – murmurou Valentina, com um tom divertido de incredulidade.


—Espero que sim. – disse a garota, com desdém. – Ou vou começar mal a minha adaptação em Hogwarts...


—E esse teste? É baseado em quê? Separa os melhores dos piores?


—Não... Acho que não existe uma casa que seja a melhor. É mais baseado em afinidades.


—Existe competição entre as casas? – perguntou Valentina, não parecendo se convencer.


—Existe, mas...


—Qual a que ganha com mais freqüência?


—Hogwarts, Uma História não faz comentários a respeito...


—Então acho bom nós descobrirmos assim que chegarmos lá. Essa história de que o importante é competir não é tão legal quando você está perdendo...


—Espero ir pra Casa onde as pessoas tenham o senso estético mais apurado. Pode ser até que a gente perca, mas pelo menos vamos fazer isso com algum estilo. – disse Cecília, rindo da própria piada.


Valentina sorriu.


—Nunca se perde com estilo, Lia. – continuou ela, folheando o livro com um desinteresse parcialmente teatral.


—Nisso você tem razão. – disse uma voz desconhecida.


Um garoto, aparentemente da mesma idade que elas, estava parado na porta do vagão, observando-as com uma expressão que misturava curiosidade e antipatia.


—O que vocês estão fazendo neste vagão? – perguntou ele, de modo arrogante.


Lia o observou, da cabeça aos pés e Tina manteve-se concentrada no livro.


—Respirando, conversando e esperando a nossa chegada a Hogwarts. – disse ela com um sotaque carregado, virando uma página e levantando o olhar, para encontrar dois olhos azuis frívolos encarando-a.


—Você me parece bem velha para estar no primeiro ano, então da onde vocês estão sendo transferidas?


Tina estudou a presença do garoto. Tinha os cabelos loiros platinados, muitos lisos e compridos até a altura dos ombros, presos num rabo-de-cavalo baixo, lhe dando o ar de um jovem lorde. O queixo era fino, e os olhos daquele azul frívolo particularmente desconfortável. Era alto e magro, mas com uma certa quantidade de benevolência poder-se-ia supor que era praticante de algum esporte. O tom pálido de sua pele, no entanto, fazia Tina duvidar veementemente que fosse alguma coisa realizada ao ar livre.


—É que nós não somos muito inteligentes. – respondeu Lia, antes que Tina finalmente saísse de sua análise minuciosa. – Então demoramos um pouco até atender aos padrões necessários para cursar o primeiro ano. Mas quem espera, sempre alcança... – disse ela, sorrindo cinicamente.


—Nós somos do Brasil, e estamos nos transferindo do Collegium para Hogwarts. – respondeu Tina, por sua vez, de forma seca. – Você é monitor?


—Sim. – respondeu o garoto.


—Merda. – murmurou Lia, de modo quase inaudível.


—E o seu nome é?


—Draco Malfoy. – disse ele, olhando com uma expressão triunfante para Lia. – E seria bom que vocês fossem mais educadas ao responder os questionamentos que lhes são feitos. Nós somos muito formais aqui e a hierarquia é levada muito a sério no nosso país.


—Meu erro.– disse Lia, com um sorriso estrategicamente selecionado. – Me desculpe. É que no nosso país nós somos muito arrogantes.


Draco fitou-a com um certo interesse. Agindo como uma pessoa acostumada a sobreviver em meio a comentários afiados, ele sorriu.


—E o nome de vocês?


—Eu sou Valentina Alves. E esta é Cecília Monfort.


—Prazer em conhecê-las. Eu estava procurando outras pessoas aqui, pessoas que tem uma preferência especial por este vagão. Estava ansioso para me encontrar com elas, vocês sabem, férias longas...


—Ah, eu também estava com saudades, Malfoy!


Os três se viraram para a porta do vagão. Um garoto dos cabelos muito vermelhos estava parado lá, e ao encarar Malfoy de frente, acrescentou:


—Ahn, não. Me precipitei, não estava... Põe aí mais uns cinquenta anos.


Ele sorria, descontraído. Era muito alto, e também era magro – o que lhe dava um ar desajeitado. Os olhos eram de um azul bem mais vivo que os de Malfoy e tinha o rosto cheio de sardas. Sua aparência passava muito mais simpatia do que a de Malfoy; e logo se juntaram a ele mais duas pessoas, uma menina e um outro garoto.


A menina tinha os cabelos volumosos e compridos de um tom castanho claro. Os olhos também castanhos miravam Lia e Tina de forma explicita e o nariz arrebitado lhe dava um ar de arrogância e altivez, ainda que ela não tivesse dito uma palavra sequer. Era magra, de constituição delicada – típica de pessoas não muito adeptas aos esportes, e um pouco mais baixa que o outro rapaz.


—Cinquenta anos? – disse o outro, por de trás do ombro do menino ruivo. – A eternidade, pra mim!


—Potter. – sibilou Malfoy, secamente. Sua mão direita aproximou-se instintivamente do bolso das vestes. O movimento foi repetido pelos outros três, e que Lia e Tina sentiram que a situação, de súbito, havia se tornando mais do que tensa.


—Mas o que há de tão especial com este vagão? Veja, Tina, nós nos acomodamos no ponto mais badalado do Expresso de Hogwarts. Isso aqui é sempre animado, assim?


 —É um verdadeiro point. – disse o ruivo, passando por Malfoy e se largando no banco defronte às duas garotas. – Vamos, Harry, Mione! Sentem-se logo, antes que alguém resolva...


Antes que ele pudesse terminar a frase, Malfoy fez menção de se sentar. Mas o ruivo foi mais rápido e colocou as duas pernas sobre o banco.


—Nem pensar. Os seus amigos, aquelas duas antas de gravata verde, estão no terceiro vagão, Malfoy. Agora que nós já nos cumprimentamos, você pode ir dizer oi para eles também.


—Nós chegamos primeiro. – disse Tina, olhando para os quatro.


—Então, prazer em conhecê-las, eu sou Ronald Weasley, aquela é Mione Granger...


—Hermione; - 


—Sim, então, Hermione Granger e aquele ali, vocês devem saber quem é, ele geralmente dispensa apresentações...


Malfoy revirou os olhos e, para a surpresa de Tina e Lia, o outro garoto também.


—Rony, okay. Deixa que eu me apresento.


—Este é o lunático Potter. O garoto que vai parar de sobreviver. – disse Malfoy, um sorrisinho surgindo em seu rosto. – Em algum momento, eu espero.


—Assim você fere os meus sentimentos... – disse Potter, sorrindo debochado, os olhos muito verdes, os cabelos desalinhados e negros, de altura mediana e mais encorpado que os outros dois.


Tina estudou o garoto. Ela já o havia visto em algum lugar.


—Eu sou Harry Potter.


Sim, aquele era Harry Potter. O adolescente que mais tinha espaço nos jornais naqueles tempos. Tina e Lia já haviam enjoado de ler as noticias sobre ele, mas não tinham parado para pensar que o encontrariam em Hogwarts. Mas certamente elas o encontrariam, uma vez que ele ainda estava em idade escolar.


—A celebridade teen! – exclamou Lia, alegremente. – Que pop!


Hermione Granger deu um risinho abafado e recebeu um olhar de reprovação de Potter.


—Minha fama não anda muito positiva ultimamente. – disse ele, secamente.


—Bem. Agora, como estamos em o que parece ser uma coletiva de imprensa, eu vou realmente deixar vocês. Seria demais para mim.


—Malfoy! Você ainda está aqui?! –perguntou Ronald.


—Pro inferno, Weasley.


—Tchau, Malfoy. – despediu-se Harry.


—Nós estávamos conversando com ele. –Tina disse, secamente. Malfoy parou na porta. – E como nós chegamos primeiro, então...


—Vocês não iam querer conversar muito tempo com o nosso amigo Malfoy aqui. – disse Harry, sorrindo com sarcasmo. – Ele é péssima companhia. E tem um papo muito monótono. Tudo o que ele sabe repetir é “quando o Lorde das Trevas retornar vocês vão ver só” ou “eu tenho o sangue mais puro de toda a Europa” ou “eu vou amaldiçoar vocês”...


Tina e Lia o olharam com surpresa. Malfoy encarou todos com uma expressão despreocupada.


—A garota é sangue-ruim e os dois são grandes traidores do sangue. Só pra vocês estarem cientes de tudo o que precisam saber pra tomar uma decisão, caso queiram se juntar aos de boa família, aos bruxos de verdade. Por que esses daí são péssima companhia. – e sem mais palavras, ele bateu a porta do vagão e se foi.


—Verme nojento. – murmurou Ronald, com uma expressão realmente feia no rosto. – Boa família de Comensais de Morte, assassinos, sádicos, psicopatas. Ele tem realmente todos os valores e todos os parafusos invertidos...


Lia ainda olhava de maneira enojada para a porta do vagão.


—Inacreditável. Não quero nem pensar que apertei a mão desse... dessa... coisa.


—Deixa para lá. – disse Hermione, se dirigindo mais a Rony do que às duas garotas. – Mas então, vocês se transferiram de que escola?


—Collegium. – disse Tina. – No...


—Brasil. – completou Hermione, com um leve sorriso.


—Que surpresa vocês conhecerem o nome do Collegium. – Lia disse, erguendo as sobrancelhas.


­—Nós não conhecíamos nada. Mione aqui é que sabe de tudo. – Rony disse.


—Rony! – ela o reprovou, mas algo em seu rosto ficou corado de satisfação. —Eu já li um pouco a respeito do Collegium. Costumam chamá-lo de “Palácio de Cristal”. Deve ser muito bonito!


—E realmente é. – Tina falou, parecendo um pouco mais à vontade. —Suas paredes externas são todas de cristal, é um castelo muito amplo e luminoso. No verão fica totalmente iluminado com o sol!


—O jardim também é lindo. – Lia continuou. —Há uma cachoeira nele, onde todos nós podemos nos banhar aos finais de semana, inclusive à noite.


—Parece ótimo! – Hermione falou, animada.


Falou-se bastante a respeito da escola de magia brasileira, e Harry e Rony escutavam a tudo com interesse, mas uma vez esgotado o assunto, eles passaram a falar de Hogwarts.


—Então, vocês já sabem como Hogwarts funciona? – foi a vez de Harry perguntar.


—Lia leu tudo a respeito. – Tina disse, fechando Hogwarts Uma História e devolvendo-o à amiga.


            Hermione abriu um enorme sorriso de aprovação.


            —Finalmente alguém que dá a devida importância a este livro!


            —E vocês já sabem tudo a respeito das quatro Casas? – Harry voltou a perguntar.


            —Tudo. – Lia disse, convicta.


            —Quase tudo. – Tina retrucou, um pouco sem ânimo na voz.


            —Não importa o que vocês ainda não saibam, mas é melhor vocês irem para a Grifinória! – Rony disse, entusiasmado.


            —Eu sabia que havia uma que era a melhor... – Tina murmurou com o olhar fixo em Lia à sua frente.


            Lia não deu importância ao comentário de Valentina e voltou-se para os três novos amigos.


            —O que há de especial na Grifinória?


            —Tudo! – Harry respondeu. —Nosso time é o melhor time de quadribol! Eu sou o apanhador do time. – finalizou, com orgulho.


            —É realmente o melhor time de Hogwarts! – Rony completou. —Sempre ganhamos da Sonserina no final e...


            Quando Cecília abriu a boca no ânimo de comentar algo a respeito, Hermione cortou o assunto que tendia a rumar para o Quadribol.


            —Sério, a Grifinória está mesmo cheia de pessoas muito bacanas e ótimos professores.


            Tina permaneceu calada pelos minutos que se seguiram com explicações mais profundas a respeito do fundador da Casa e o que esta prezava em seus alunos. Sua mente foi um pouco mais além e quando ela voltou para a conversa, aproveitou uma brecha para perguntar:


            —E aquele tal de Malfoy, a qual casa ele pertence? Certamente não deve ser a Grifinória....


            —Uh, não mesmo. – Harry disse.


            —Ele é da Sonserina. E vocês não vão mesmo querer ir pra lá! – Rony disse, enfático.


            —Todos lá são iguais a ele?


            —Uns piores, outros nem tanto... – Rony falou, com uma expressão de desgosto.


            —Não são pessoas geralmente muito agradáveis... – Hermione disse.


            —Voldemort foi da Sonserina. – Harry finalizou.


A menção do nome de Voldemort fez com que um leve arrepio percorresse a espinha de todos.


—Ah. – Tina disse.


Lia deu uma sacudidela.


—Ui. Não quero mesmo ir para a Sonserina.


Hermione pigarreou.


—Mas a Lufa-Lufa e a Corvinal também são muito boas.


—E vocês são da Grifinória, certo? – Lia perguntou.


Os três concordaram com acenos da cabeça.


—Que legal! Quero ir pra lá, gostei de vocês! – ela finalizou, animada.


As horas que se seguiram foram recheadas de conversas de todos os tipos que incluíram professores, aulas, alunos e costumes da escola como assunto. Lia rapidamente se familiarizou com o trio e até mesmo Tina, que era mais reservada, ao final já deixava vislumbrar sorrisos sinceros em seu rosto.


Já havia escurecido quando Tina e Lia trocaram as roupas de trouxa pelos uniformes negros. Elas estavam justamente retornando do banheiro para o vagão quando o trem começou a perder velocidade.


—Estamos chegando! – Rony anunciou.


—Rony, quase me esqueço! Temos que guiar os alunos novos! – Hermione disse, dando um tapa na própria testa.


—Ih, é mesmo!


De um salto, os dois se levantaram e, com uma despedida breve, sumiram pelos alunos que já enchiam o corredor do trem.


O Expresso parou numa guinada e todos os alunos rumaram para os corredores, aguardando ansiosos pela abertura das portas. Os cinco fizeram o mesmo e, quando finalmente puderam respirar o ar fresco da noite, Lia e Tina se despediram de Harry e seguiram o grupo de alunos novos liderados pelo meio-gigante Hagrid.


—Estou me sentindo uma tia velha. – Lia resmungou ao lado de Tina, ambas caminhando ao final do grupo.


—Segura a onda que nós nem somos as mais velhas da escola.


—Mas olha só o tamanho deles! Olha o nosso tamanho!


Tina não teve tempo de responder, pois Hagrid dava agora instruções para que eles escolhessem seus botes e atravessassem em duplas o lago negro. Nem Tina e nem Lia gostaram muito da idéia, afinal o clima que parecia ser fresco para os ingleses, para elas já era suficientemente frio para não as fazer desejar nenhum mergulho involuntário. Porém, seguindo a tradição, elas escolheram um bote e muito cuidadosamente sentaram-se lado a lado.


Tina tinha os olhos grudados no castelo imponente à sua frente, com suas várias janelinhas e torres iluminadas pela luz das velas.


—É verdadeiramente lindo. Você não acha, Lia?


—Completamente. – a menina disse, com um sorriso.


Enquanto todos os alunos novos atravessavam o lago, os alunos mais velhos se acomodavam nas mesas de suas respectivas casas em meio à conversas e risos.


—Façam suas apostas. – Harry escutou a voz conhecida de Malfoy atrás dele. Ele o olhou por cima dos ombros.


—Apostas de que, seu idiota?


—Quanto às novatas. Tenho certeza de que pelo menos uma delas vai para a melhor Casa. E se não for o caso, vou torcer para que o quinto ano da Grifinória não ganhe mais nenhuma nova cabeça.


E rindo sem preocupação com a resposta, ele se afastou para a mesa da Sonserina com Crabbe e Goyle em seus calcanhares.


—Idiota. – Rony resmungou. – Nenhuma delas tem jeito de que vai para a Sonserina. O que você acha, Harry?


O menino balançou a cabeça.


—Não faço idéia. – disse com fingida displicência, se lembrando do seu primeiro dia em Hogwarts e do que o Chapéu alegara para quase o mandar para a Sonserina.


—Particularmente, eu gostaria que elas viessem para a Grifinória. – Hermione disse, e Harry compreendeu que a amiga deveria se sentir sozinha algumas vezes tendo apenas meninos ao seu lado para conversar.


Todos se sentaram quando vislumbraram Profa. McGonagall adentrar o salão guiando o grande grupo de bruxinhos. Valentina e Cecília ao fundo despertaram os olhares da grande maioria dos alunos e um burburinho nítido seguido de risadinhas percorreu todas as mesas.


—Odeio comentários. – Tina resmungou.


—Sssh! – fez Lia.


Profa. McGonagall se colocou à frente de todos e ao lado de um banquinho com o velho e surrado Chapéu Seletor pousado sobre ele.


—Atenção, por favor.


O burburinho rapidamente se desfez e a professora anunciou:


—Neste ano, temos duas alunas novas que foram transferidas do Colégio Brasileiro de Magia - Collegium, para Hogwarts. – seu olhar recaiu sobre Lia e Tina bem mais altas ao fundo. —Queiram ter a gentileza de recepcioná-las com a mesma educação e estima que todos os anos vocês oferecem aos alunos mais novos.


E depois de uma pausa, a professora desenrolou o longo pergaminho com os nomes de todos os alunos novos e, por ordem alfabética do último sobrenome, Valentina foi a primeira a ser chamada.


Pedindo licença, ela passou pelo grupo à sua frente e se sentou no banquinho. Profa. McGonagall colocou o chapéu sobre seus cabelos e este pareceu ganhar vida com o calor de Valentina.


Segundos que pareceram horas se passaram com o chapéu imerso em total silêncio como se estivesse ponderando muito cuidadosamente a sua decisão. Ao final, ele anunciou em alto e bom som:


Sonserina!


Tina ainda permaneceu sentada no banquinho quando Profa. McGonagall retirou o chapéu de sua cabeça. Seus olhos foram rapidamente da mesa da Grifinória para Cecília, que a olhava com uma expressão que mesclava surpresa com um pouco de pesar.


—Você já pode ir para a sua mesa, Srta. Alves.


Concordando com um aceno nervoso da cabeça, Valentina levantou e rumou para a mesa da Sonserina, onde foi recebida com tapinhas no ombro e apertos de mão. Os sonserinos sorriram de modo pomposo para ela, como que orgulhosos por terem mais uma integrante na Casa. Em meio a tantos rostos, ela avistou Draco Malfoy se aproximar para falar com ela.


—Eu já desconfiava. Bem vinda, Alves. E parabéns. – ele disse, enquanto apertava sua mão.


—Obrigada. – ela falou, um pouco hesitante.


Tina sentou-se no primeiro lugar vago que viu, bem perto da ponta da mesa e seu olhar recaiu sobre a mesa dos professores, especialmente sobre o professor que estava sentado diretamente na direção da mesa da Casa. Ele a encarava de modo duro e inexpressivo: um par de olhos negros e frios, emoldurados pelo cabelo negro e oleoso que, parecidos com os dela, desciam até a altura do pescoço.


Sua atenção, em seguida, se desviou para a mesa as Grifinória, de onde Hermione a olhou com certa decepção. As duas deram de ombros uma para a outra, lamentando sinceramente não estarem sentadas lado a lado.


E de repente já era a vez de Cecília ser sorteada.


— Monfort, Cecília!


Ao contrário do ocorrido com Tina, o Chapéu mal tocou os cabelos de Lia para decidir em alto e bom som pela Grifinória. Antes mesmo que a menina se levantasse para se dirigir a sua mesa, as cores do forro de seu uniforme e da gravata se modificaram para combinar com o vermelho e dourado da Casa, e o emblema do imponente leão magicamente se bordou em suas vestes.


Cecília se encaminhou para a sua mesa, recebendo os parabéns calorosos dos estudantes da Grifinória e um abraço afetuoso de Hermione, que sorria abertamente. Rony e Harry lhe apertaram a mão, dando os parabéns. A menina sentiu que lhe davam tapinhas de boas vindas nas costas, mas eram tantas mãos que ela não soube dizer quem poderia ser. Assim que escolheu seu lugar, de frente para a mesa da Sonserina, Cecília se esticou e procurou os olhos da amiga Valentina. Encontrando-os, acenou para ela e sorriu, recebendo em retorno um sorriso e um aceno positivo da cabeça, como sua amiga sempre fazia quando aprovava alguma coisa.


O jantar teve início e Tina pouco falou com seus novos colegas enquanto se servia da mais variada sorte de comidas que já havia visto. Na mesa da Grifinória, as coisas já eram um pouco mais diferentes: Lia estava muito feliz entre seus novos amigos, e também já conversava com uma menina de cabelos tão ruivos quanto os de Rony, Gina Weasley. Os comentários de Rony para com Harry, porém, eram um pouco mais ácidos.


—Que surpresa hein, cara. – Rony disse, de boca cheia.


Harry deu de ombros.


—Ao menos a ida da Tina para a Sonserina nos mostrou que há chances de haverem mais pessoas legais lá.


—Ah, eu não sei não. Pensando bem, eu achei ela muito calada. Me lembrou até um pouco do Snape.


—Rony! – Hermione, que escutara os cochichos, exclamou em reprovação. —Que coisa horrível de se fazer: falar mal de uma pessoa que não nos fez nada de ruim apenas porque ela foi para a Sonserina!


—Bem, nós a conhecemos há bem pouco tempo, não?


—Você chama o Malfoy de idiota, mas às vezes é tão idiota quanto ele.


Rony fez menção de revidar quando escutaram a voz de Lia, vindo do lado de Hermione:


—O que vocês estão falando da Sonserina aí?


—Estamos falando de como Malfoy deve estar ainda mais intragável do que nunca com uma aluna transferida logo na Sonserina. – Rony disfarçou as implicâncias, ficando um pouco corado e sem jeito. —Espero que ele não tenha feito a cabeça dela contra a gente. – emendou.


—Valentina Alves não parece ser do tipo que se deixa levar pela lábia de um bruxo arrogante e preconceituoso como ele. – Hermione foi enfática.


—Concordo com você – Lia disse —Tina tem as idéias no lugar e uma personalidade muito forte. Eu a conheço muito bem. Nunca foi uma pessoa má e isso não vai mudar agora só porque está na Sonserina.


Dando-se por convencidos, eles resolveram mudar de assunto entre uma colherada e outra.


Ao final do banquete, todos os alunos novos seguiram os monitores de suas respectivas Casas para aprenderem o caminho para os Salões Comunais. Assim sendo, Rony e Hermione rapidamente se levantaram, ainda não muito bem acostumados com o novo ritmo de vida de monitores, e sumiram por entre os alunos.


—Vem com a gente, Lia. Vamos mostrar o caminho da torre da Grifinória para você. – Rony convidou.


—Foi uma longa jornada. – Lia disse, bocejando —Acho que já vou mesmo.


—Eu também vou. – Harry disse.


Eles se levantaram e seguiram juntos, liderando o grupo de alunos baixinhos do primeiro ano.


—Olha só pra eles. – Rony murmurou incrédulo para Hermione ao lado dele. —Eu não era dessa altura no primeiro ano. Nenhum de nós era! A cada ano parece que eles estão ficando menores!


—Shh! – Hermione fez, mas não pôde conter o leve ar de riso estampado no rosto.


Ao chegarem no salão comunal, que era redondo e quentinho, os alunos que estavam já muito cansados, se dispersaram para seus dormitórios. Um burburinho de “boa noite” era entreouvido aqui e ali e rapidamente o salão foi se esvaziando.


—Boa noite então, Lia. – Harry disse, agora muito mais simpático do que a primeira vez que se viram. —A gente se vê amanhã.


—Boa noite.


Lia subiu para o dormitório feminino, seguida de Hermione. Antes de se deitarem e puxarem as cortinas ao redor de suas camas, Hermione ainda falou, muito feliz em ter uma nova amiga:


—Ainda há muitas pessoas legais pra você conhecer. Amanhã vamos apresentar a você à Tina, os gêmeos irmãos do Rony.


—Ele tem mais irmãos?


—Oh sim. Os gêmeos Fred e Jorge que ainda estão em idade escolar; Carlinhos e Gui que já estão trabalhando. Você deverá gostar muito dos gêmeos, eles fazem qualquer um morrer de rir.


Um longo bocejo de Hermione denunciou que o sono estava difícil de ser disfarçado.


—Bem, boa noite, Lia.


—Boa noite, Mione.


Com Tina não foi diferente: Obediente, ela se levantou após seu jantar e foi uma das primeiras a se unir a Draco Malfoy e Pansy Parkinson (que não pareceu ter ido muito com a cara dela) para aprender o caminho do Salão Comunal da Sonserina. Uma vez nele, ela deu boa noite a todos, mais especialmente a Malfoy, que foi a pessoa com quem ela teve seu primeiro contato uma vez no Expresso, e se dirigiu para o dormitório feminino. Decidiu-se por, apesar da friagem, tomar um banho antes de dormir, como era o seu costume.


Ela identificou suas malas em cima de uma das bonitas camas com cortinas verde-esmeralda. Abriu a maior delas e tirou sua toalha e suas roupas de dormir. Encontrando a porta do banheiro, ela entrou e fechou-a cuidadosamente atrás dela.


O silêncio era quase mortificante e ela pensou que deveria de haver algum feitiço ali para isolar o banheiro do resto do salão comunal. Não se incomodando muito, ela se preparou para abrir a água quente.


Foi quando algo realmente estranho aconteceu.


Murmúrios que pareciam vir de dentro das paredes, encheram o banheiro como se ali estivessem criaturas invisíveis. Valentina olhou ao redor, girando em 360º, mas não conseguiu ver nada além das paredes verdes e dos bonitos espelhos com adornos prateados de serpentes.


Ela encostou o ouvido na parede onde estavam as pias, e pôde escutar os murmúrios com ainda mais intensidade, mas jamais poderia entender o que era dito. Eles enchiam o banheiro de tal forma que ela tinha a impressão de que alguma criatura poderia aparecer através das paredes a qualquer momento.


Porém, como num passe de mágica eles cessaram, deixando Tina com a orelha grudada na parede sem ouvir nada mais além da sua própria respiração.


Achando tudo aquilo muito estranho, ela abriu a água quente e apreciou o vapor que logo aqueceu o banheiro. Tomou seu banho antes de se deitar, como era de costume e, pensando que no dia seguinte já teria o que comentar com seus novos amigos e com Lia, ela se deitou, fechou as cortinas em volta da cama, e adormeceu.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.