III



Na manhã seguinte acordei com Morgana berrando que deveríamos estar prontas para o café-da-manhã em minutos porque estávamos atrasadas, o que me fez ficar desesperada. Eu nunca tinha me atrasado para nenhum compromisso e ter ficado acordada até tarde, pensando em algumas coisas, me fez ter uma péssima noite de sono e acordar para um péssimo dia, provavelmente.
Para começar, eu estava atrasada pela primeira vez em minha vida.
Depois, minha cabeça latejava de tanta dor.
E para finalizar, era obrigada a procurar Cecília e sua trupe para impedi-las de cometerem aquele erro tão banal e dar uma chance para a líder perceber o quanto estava cega em estar disposta a pegar um castigo por um garoto que não valia a pena.
No final das contas, eu fazia isso tudo por Cecília, para salvá-la de um tormento.


— Bom dia. — disse ternamente para Morgana e para as outras garotas. — Podem descer, eu vou logo atrás.


E assim que terminei de vestir o uniforme, peguei o meu material e ignorei a flor de Tiago que boiava em um aquário pequeno perto de minha cama. Ela estava com as pétalas inclinadas, dando indícios de que se abriria para mais uma manhã de fotossíntese, mas eu não poderia me preocupar com aquilo, porque precisava encontrar Cecília o mais rápido que conseguisse.
Andei pelos corredores do castelo com certa pressa, esbarrando com alguns alunos e ignorando também o olá que Pedro me deu. Quando percebi que era Pedro quem estava ali, voltei alguns passos e o encarei nos olhos.


— Pedro, você sabe onde os outros garotos estão?
— Você diz Tiago e os outros? — os olhos dele brilharam de admiração e revirei os meus.
— Sim. — sorri um pouco.
— Estávamos tomando café, mas então Lupin e Sirius se levantaram para seguir duas garotas do quarto ano... — bufei de irritação e cruzei os braços.
— E o Tiago deve ter ido também, não é?


— Não. — ele pareceu surpreso. — Ele me disse que iria procurá-la para perguntar algo a respeito de um feitiço...
— Me procurar? — gemi, temendo que a minha teoria estivesse certa.
— Alguma novidade? — senti a ironia da pergunta dele e suspirei.
— Ok, obrigada.


Virei de costas e dei cinco passos até encontrar Cecília andando com uma expressão frustrada, e antes que passasse por mim, segurei-a pelo braço, rangendo os dentes.


— Você! — apontei um dedo bem na direção do nariz dela e soltei fumaça – literalmente. — Você deu aquela poção para o Potter, como as suas amigas fizeram com Lupin e Sirius? — vi que as pupilas dela se tornaram negras de susto e logo ela se encolheu, afastando a minha mão de seu braço.
— Não sei do que você está falando. — ela murmurou.
— Não pense que é só você que sabe fazer poções aqui, Vandergod, — disse com calma. — porque acredite quando eu digo que sei preparar um ótimo Veritaserum. — um sorriso cínico saiu dos lábios dela, mas vi que o medo ainda não desabitara o seu olhar.
— Então a doce menina Lily não é tão doce assim.
— Não sou eu quem precisa fazer uma poção do amor para conquistar as pessoas, não é mesmo? — rugi. — Você por acaso tem ideia do que uma poção mal feita poderia causar?
— Como se você se importasse para os danos! — foi a vez dela rugir. — Você só quer que Tiago tenha olhos para você! Será que você percebeu que eu estava fazendo um favor para ele? — dei uma risada.
— Como? Colocando a vida dele em jogo?
— Não! — o tom de voz dela diminuiu. — Eu estava disposta a dar algo que ele precisa... Se chama amor, conhece? Algo que você não pode dar!


Me calei, sentindo olhares de outros alunos queimando em minhas costas. Uma leve ardência começou a existir em meus olhos e pedi para os céus para que lágrimas não nascessem dali.


Não tinha idéia de como cheguei e me sentei à beira do lago do castelo. Observar as águas negras e os seus meros poucos movimentos me acalmavam o suficiente para conseguir esquecer um pouco o que me desagradava. "Agora que você não pode dar!". Vandergod ou era muito tola ou enxergava através de limites para ver o que eu não conseguia. Eu não queria que Tiago "tivesse olhos para mim". Eu nunca cheguei e falei para ele que queria que ele me convidasse para sair. Não me lembro de ter dado a parecer que queria sair com ele, então qual era a minha culpa em tudo aquilo?
Se Tiago era um arrogante metido a conquistador, eu não tinha culpa! Não fora eu quem tinha o colocado no mundo, então a culpa não era minha! Se ele tivesse aceitado o primeiro não, ninguém sairia ferido... E agora eu mal entendia o porquê de estar tão murcha.


— Hey, Evans! — escutei a voz do dono dos meus pensamentos vinda logo detrás. — Eu lhe dei uma flor e ensinei um feitiço, então me encontro no direito de levá-la para sair, não é mesmo?


Respirei fundo, pedindo paciência para Deus e Merlin para agüentar aquela chateação diária, ficando de pé e atirando uma pedra no lago, observando-a afundar na imensidão negra.


— Você não deveria estar na aula, Potter? — ele riu.
— Você não deveria estar na aula, Evans? — eu suspirei.
— Porque você é tão irritante?
— Porque você não diz sim de uma vez?


Peguei os meus livros no chão, dando a parecer que sairia dali, mas ele se colocou em minha frente, negando com a cabeça e retirando os livros das minhas mãos, devolvendo-os ao lugar que estavam antes e sorrindo contente, pelo que pude ver.


— Para tudo tem uma primeira vez, Lily. — abaixou-se para pegar alguns pedregulhos e imitar o meu ato de atirá-las no lago. — Você hoje se atrasou para o café, se meteu em briga e matou aula... Porque não diz umsim para mim, então, sendo que eu sou o motivo dos outros três?


Rangi os dentes e cruzei os braços, sem acreditar na petulância daquele garoto, e me sentei outra vez na grama, soltando o ar com força pelas minhas narinas, acreditando que dali sairia fogo de novo.


— Porque você é tão convencido? O mundo não gira em torno do seu umbigo, Potter. Seria ótimo se você também fizesse algo pela primeira vez, como, por exemplo, parar e olhar ao redor para ver que existem outras milhares de pessoas que respiram e vivem como você!
— Porque quando olho ao redor enxergo apenas você?
— Porque estamos sozinhos, pois estamos matando aula! — revirei os olhos e ele fez o mesmo, se ajoelhando na grama e bagunçando os cabelos.
— Eu não disse no sentido literal da palavra, Lily. Eu disse no sentido romântico.
— Há! — dei uma risada alta. — Até parece que Tiago Potter sabe ser romântico!
— Há! — ele imitou a minha risada. — Até parece que um dia alguém acreditaria que Lílian Evans não conseguiu realizar um simples feitiço!


Corei abruptamente, enterrando meu rosto em minhas mãos e o olhando com ódio, em seguida. Peguei um livro e bati com força em sua cabeça, vendo que ele caia deitado na grama e começava a gargalhar.
E a cada risada, meu estômago parecia se revoltar mais e mais.


— Diga sim, Lily. — ele não desistiu da idéia. — É a única coisa que eu quero escutar!
— Se contente com o meu não, Potter, porque é tudo o que você ira escutar.
— Adoro quando você fica irritada. — ele sentou ao meu lado, tão próximo de mim que pude sentir perfeitamente o cheiro da primavera soprando pelo ar. — O que geralmente é sempre.
— Pena que não posso dizer que adoro quando você é irritante. — sorri ligeiramente, sentindo os dedos dele tocando de leve a ponta dos meus cabelos.


Um simples gesto me fez arquear.


— Eu sei, Lily. — ele murmurou, em uma distância exageradamente reduzida do meu ouvido. — Pedro me contou que você brigou com Cecília por minha causa. Não sou burro, sei juntar os fatos...


— Você juntou os fatos que Vandergod deu uma poção do amor para você? — disse com a maior paciência, esperando alguma reação de choque vinda dele. — O seu suco de abóbora matinal deveria conter uma ótima dose de Amortentia, só para avisar.
— Não fique com ciúmes, Lils. — soltou uma risada baixa em meu ouvido e tentei me afastar, mas suas mãos seguravam o meu ombro. — Não tomei suco de abóbora hoje, pois me atrasei para o café, como você...
— Não quero que você se justifique! — exclamei rapidamente. — E eu também não estou com ciúmes de um acéfalo como você! — antes que ele perguntasse o que era um acéfalo, continuei: — Sou monitora-chefe, Potter, e se discuti com a Vandergod foi por ela ter infringido leis do colégio, preparando poções fora do horário de aula e também por ter roubado ingredientes de posse do colégio! — e virei o rosto, afastando o seu nariz da minha pele. — Pelo visto você nunca deixara de ser um egocentrista narcisista!
— Porque eu não entendo metade das palavras que você fala? — ele pareceu se divertir com tudo aquilo. — E porque você não confessa que está morrendo de ciúmes, Lily?
— Porque eu não estou! — gritei. — Potter, Deus, como você consegue ser tão... Idiota?


Consegui ficar de pé, afastando as mãos dele de mim e limpando a grama de minha saia. Não conseguiria aturar mais um minuto perto dele, pois se não meu coração saltaria pela boca, denunciando a raiva ao qual eu me encontrava.
Tiago Potter era o maior idiota da face da terra, ainda mais por usar aquela maldita fragrância deliciosa, deixar aqueles malditos botões da camisa abertos e bagunçar o seu maldito cabelo negro de dois em dois segundos.
Tiago Potter era um idiota.


— Só para você saber Lily, eu não dormi muito bem de noite pensando em você. Por isso acordei atrasado... — ele levantou também, me dando um sorriso singelo e o que me pareceu, sem graça.


Tiago Potter, além de ser um idiota, nunca ficava sem graça. Nunca. Como eu nunca me atrasava para as aulas ou nunca errava um feitiço. Nunca. Apenas quando o envolvia no meio. E ele estava sem graça, ali, diante dos meus olhos, bagunçando os cabelos e com as bochechas levemente coradas... Por mim. Por mim?


— Eu já disse que não preciso de justificações da sua parte, Potter. — suspirei, mantendo a postura de sempre. — Quem precisa me dar justificações são as garotas do quarto ano que resolveram brincar com magia e sentimentos, duas coisas com quais não se brincam! — quis sublinhar os sentimentos, mas não vi necessidade.
— Então, — ele se aproximou. — porque você brinca com os meus sentimentos, Evans? — prendi a respiração, sentindo como suas mãos quentes e macias tocavam o meu pescoço, montando um caminho até as minhas bochechas que queimavam de raiva. — Porque você não consegue entender que mesmo se eu tivesse tomado uma poção do amor que outra garota tivesse preparado, eu ainda acharia você a garota mais linda quando está irritada do mundo inteiro? — minha garganta estava seca, o que me impedia de tragar a saliva, e minhas pernas estavam travadas, como se alguém tivesse lançado o Petrificus Totalus nelas. — Eu gostode você, Lílian Evans, e posso ser tudo o que você diz que eu sou, mas eu continuo gostando de você.


E então ele me beijou.
Tiago Potter me beijou. Tiago Potter juntou os lábios com os meus, dedilhando a minha face com cuidado, sorrindo entre o contato e comprimindo a boca com certa força sobre a minha. Tiago Potter me beijava de forma carinhosa, nada apressado ou afobado como eu imaginei que ele o faria – se um dia tivesse a oportunidade. Tiago Potter me beijou.
E a fragrância dele estava se misturando com a minha. E os botões abertos da camisa dele roçavam no meu corpo. E o cabelo negro dele batia de leve na minha testa. E a boca dele beijava a minha.
E eu não sei se me sentia culpada por estar gostando.

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Comentários (1)

  • patrícia m prongs

     ''Eu gostode você, Lílian Evans, e posso ser tudo o que você diz que eu sou, mas eu continuo gostando de você.'' Que lindo,muito lindo.E a Lily não vai se sentir culpada por estar beijando ele,quem se sentiria?!

    2011-05-07
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