Louca?



  Estava frio. Sem sol. Sem claridade. Com chuva. Triste, soturno, sombrio. Este era o dia.
  Estava frio. Sem amor. Sem respostas. Com perguntas. Triste, soturno, sombrio. Esta era eu.
  Basicamente podiam-se resumir tudo deste modo. Eu não conseguira reunir ânimos suficientes para fazer coisas felizes ou até mesmo normais. Hoje eu estava, novamente repetindo, triste, soturna e sombria. Eu nunca cheguei a este ponto. Eu nunca sai de casa de manhã para ir a um cemitério simplesmente para acolher forças. Forças? Que forças são essas eu desconhecia, mas que eu vou recolher elas e levar para dentro de mim, isso é verdade. Só basta saber de onde vou tirar isso, das pessoas que lá estão?


  Eu adentrei no cemitério. A chuva caia sobre meus cabelos, deslizava sobre minha face, penetrava em minhas roupas, mas não era forte o bastante para conseguir lavar minha alma, e era exatamente isso que eu precisava.
  Caminhei durante muito tempo nos corredores estreitos formados pelos inúmeros túmulos. Não era possível encontrar nenhum sinal de alegria em nada. O pouco das pessoas que estavam espalhadas no enorme cemitério tinha a aparência deprimida, em suas faces a dor se continha. As lágrimas destas pessoas saiam de seus olhos inchados e corria vagarosamente em seus rostos e terminava em cima dos túmulos. A vista era totalmente pálida, a cor estava somente nos brotos de flores que eram deixados carinhosamente pelos amigos e familiares.
  Continuei andando... andando... andando... As lembranças me fizeram lembrar. Os dois túmulos um do lado do outro, pertenciam a meus pais. Eu me aproximei e encarei as fotos velhas coladas no mármore. Eu chorei... coloquei tudo de ruim que estava guardado em meu interior para fora. Ajoelhei-me e fechei as mãos rezando. Pedia para Deus guardar meus pais para sempre. Guardar em um lugar bom, junto a ele. Permaneci ajoelhada por mais um bom tempo até beijar cada túmulo. Uma senhora que aparentava ter uns oitenta anos se aproximou de mim e me entregou uma rosa vermelha, pouco depois havia sumido da imensidão de cruzes, flores, pessoas e túmulos.


  Deixei a rosa vermelha no meio dos dois túmulos. A chuva engrossou e trovões começaram a sair do céu cinzento. Eu me despedi de meus pais e prossegui a caminhar com passos atrasados em direção a saída.
  Avistei um túmulo branco. O mais bonito de todos, bem cuidado, coberto de flores. O túmulo bem conservado me chamou atenção e me puxou para perto dele, como um imã. Dei mais uns dez passos e parei em frente a ele observando tudo antes de correr os olhos para o nome. Arthur McStuart.
  Soltei um breve sorriso pequeno no rosto. Eu estava mesmo ficando louca. Virei-me em direção contrária e me preparei para andar novamente em direção a saída. Não! Agora eu estava até vendo coisas, estou mesmo alucinada. Só por curiosidade virei meu rosto e li novamente a placa de metal grudada no túmulo. ARTHUR MCSTUART. Fechei os olhos novamente tentando me organizar e me belisquei na expectativa de acordar em casa, saindo de um sonho, acho que podemos chamar de pesadelo. Abri os olhos e gemi por razão do belisco doído. Penetrei os olhos na placa novamente e li pausadamente como uma criança que está aprendendo a ler e precisa ficar juntando sílabas. Ar-thur Mc-Stu-art. Eu não conseguia mais enxergar nada na minha frente, tudo ficou embaçado e eu senti meus olhos se fecharem e meu corpo, sem forças, cair para trás.


  _ Jennifer? Jennifer acorde. – eu abri meus olhos ainda entreabertos e senti uma respiração aquecida e ofegante bem perto de mim, uma voz conhecida chamava por meu nome – Que bom que acordou, já estava ficando realmente preocupado.
  _ Quem é você? – eu não tinha noção de quem estava falando comigo, só sabia que era uma voz conhecida e também não tinha noção de onde estava, havia morrido afinal?
  _ Arthur. – eu abri os olhos bruscamente e me coloquei de pé encarando-o.
  Medo, raiva, angústia, delírios, nervosismo, amizade, morte, amor, segredo, desconfiança, paixão, Arthur, ódio, cemitério, receio...
  Eu ainda estava me lembrando dos fatos e colocando-os em ordem. Não era possível descrever o que estava sentindo.
  _ Você descobriu. – disse ele. Alguns minutos de silêncio se passaram até que eu pudesse me tocar do que estava acontecendo.


  _ Saia de perto de mim. – gritei.
  _ Se acalme Jennifer! – Arthur segurou meus braços e lançou um olhar matador em mim – Eu posso explicar tudo.
  _ Explicar o quê? Não preciso de explicações vá embora. – a hipótese de que eu estava louca não fora totalmente descartada.
  Arthur está morto? Arthur é um espírito? Isso não está acontecendo, não pode estar.
  “Até porque não existe amor entre anjos, demônios e humanos mortais.” Os desaparecimentos misteriosos de Arthur e Alex. O segredo. A rivalidade. Tudo se encaixa perfeitamente. Medo, medo, medo.
  _ É isso mesmo que está pensando... – Arthur estava chorando – sou um anjo... – ele pausou e meu sangue começou a ferver – seu anjo da guarda, responsável pela sua proteção. Eu já morri há muitos anos atrás. E estou apaixonado por você, e isso não é certo.
  Minha cabeça começou a martelar a ponto de explodir.


  _ E Alex... – ele respirou e continuou – é o meu inimigo, ele é um demônio e necessita de sua alma para que possa se libertar. Ele já morreu também. Ele não está apaixonado por você, é só um joguinho para te conquistar e te levar junto com ele.
  Eu permaneci calada. Em estado de choque. Não conseguia pensar em nada. Não conseguia imaginar o que estava acontecendo. Não conseguia dizer nada.
  _ É melhor você dormir e esfriar a cabeça. Amanhã é um novo dia. – Arthur passou a mãos em meus cabelos molhados e isso é a última coisa que eu lembro.

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