Sangue e Veneno



Cap. 6 – Sangue e Veneno


Do you know that your love is the sweetest sin?
- Boys Like Girls – Hero/Heroine

Não era capaz de entender a pulsação que acelerava quando a via. Provei que o sentimento esteve, durante todo o tempo, cravado em alguma parte de mim, onde eu jamais permiti que se revelasse, mas que de repente aconteceu da forma mais inesperada que fui obrigado a agir de uma forma inesperada. Apesar do orgulho, existia o medo. E o medo era muito silencioso, que, com fervor, devastava o coração discretamente. Eu tinha noção disso, pois o modo como ela me encarava às vezes dava a impressão de que, para ela, eu fosse realmente um escorpião venenoso e mortal.

Mas eu não era, e precisava que ela entendesse isso. Toda a minha frieza e orgulho que demonstrei e tive durante os anos em que éramos colegas, inseriam a ela uma certa desconfiança. Ela se esquivava das minhas ações, e eu sentia um certo temor em seus olhos. Eu queria apagar aquela expressão. Eu queria que ela me olhasse da mesma maneira que olhava para um livro de Aritmancia: fascinada, curiosa e interessada. Eu olhava para ela daquela maneira, porque a guerra entre o sangue e o veneno, para mim, já havia acabado. Eu havia perdido e fracassado em todas as tentativas de vencer aquela batalha.

Estava na hora de descobrir se ela precisava de mim muito mais do que eu precisava dela. Estava na hora de misturar o veneno no sangue, esperar pela morte como se fosse o único jeito de paralisar aquele sentimento errado e ameaçador.

E era tão forte que a fraqueza tornava-se imperceptível. 

Mas aconteceu pouco depois que entramos no sexto ano. Era a semana mais cheia de testes de N.I.E.M’s, e eu só a via na biblioteca. Mas houve um dia em que a encontrei no jardim, sob uma árvore, conversando com Alvo Severo. Ele estava acariciando sua mão, e ela estava sorrindo graciosamente para ele. Olhando-o para ele como se ele fosse o livro de Aritmancia.

Fiquei bastante tempo observando aqueles dois; nada, no entanto, alterara-se entre apenas uma caricia no cabelo, um abraço amigável. Nada que Alvo Severo pudesse fazer para mostrar que estava mais apaixonado do que eu por Rose Weasley.

De repente Potter se levantou, mas Rose continuou sentada examinando, com muita paciência, a lição do primo. Ela encostou a cabeça de uma forma cansada e derrotada no caule da árvore. Potter se irritou, pegou de volta o pergaminho e voltou a escrever rapidamente.

Eu não hesitei ao me aproximar; nunca hesitava. Quando os dois me viram eles ficaram silenciosos. Potter parou de escrever, e Rose desencostou a cabeça da arvore.

– Algum problema, Malfoy? – perguntou Potter, levantando-se.

– Nenhum, por enquanto. Sei que você detestou que entrei para o time da Sonserina, Potter, mas terá que se contentar com tal fato.

– Zabini não era melhor que você, e me contentava perfeitamente com isso. Não se preocupe.

– Ótimo.

No sexto ano Zabini não estava mais no time de Quadribol, pois Potter fora o escolhido como capitão. Potter não ficou satisfeito por me ter no time, mas talvez eu fosse o melhor jogador que ele podia contratar que pudesse representar o lugar de Zabini, que não estava se preocupando com mais nada além de tentar se tornar tão famoso quanto sua avó.

– Vejo você no treino.

– Não se atrase. 

Antes de voltar a andar eu virei a cabeça, de relance, para Rose, que também estava concentrada em mim. Estava entrando novamente ao castelo quando ouvi meu sobrenome sendo proferido pela voz dela. Correndo devagar, ela se aproximou, levemente corada, e parou na minha frente.

– Não fique chateado se Alvo pretender tirá-lo do time – ela disse baixinho olhando para a unha do dedo e depois para mim. – Caso encontrar um jogador melhor do que você, o que parece impossível... porque eu vi como você jogou na ultima vez...

Ela fez um barulho com a boca, frustrada e embaraçada e depois, como se não entendesse porque estava ali, ela jogou as mãos na testa e suspirou.

– Não que eu realmente fique torcendo pela Sonserina, afinal eu pertenço a Grifinória. Mas, sabe... – ela recuperou o fôlego, cada vez mais corada. – O que Alvo diz sobre você... não quer dizer que você realmente é tão ruim...

Continuei vidrado no comportamento dela, e quase sorri da maneira como ela tentava reformular as palavras certas, sem que parecessem ridículas ou coisas assim. Mas parecia que cada vez que tentava, menos acertava.

– Em fim... esqueça tudo o que eu disse. Tchau – e deu as costas para mim. 

Fui segurar o braço dela, mas ela se virou voluntariamente, quase com brutalidade, finalmente decidida a terminar o que queria dizer, antes que eu chegasse a encostar um dedo sequer nela. Ao fazer isso ela parou há uns dois centímetros de distância de mim, sendo forçado a me encarar quase tão perto que eu podia contar quantas sardas havia na maçã corada de seu rosto.

– Desculpe – ela murmurou, respirando fundo. – Eu só...

– Só?

– Queria agradecer por ter... defendido o meu irmão contra o Beaumont...

Fiz uma expressão de indiferença, mas ela não notou.

– Ah... aquilo.

Eu não lembrava que Luke Beaumont tentara acertar um balaço na cabeça do irmão dela no primeiro jogo que ocorreu contra a Grifinória depois que entrei para o time. Pelo relato da diretora Minerva, entrei na frente num ato ridiculamente heróico, e recebido o balaço na cabeça para que o garoto não se ferrasse.

– Faz algum tempo que isso ocorreu – eu comentei. 

– Você ficou quase um mês na enfermaria, eu não tive tempo de agradecer – ela parecia estar se desculpando.

– Mas eu estou bem agora – sorri para ela tentando parecer convincente. 

Achei que ela fosse dar um passo para trás ou encontrar alguma desculpa para sair dali, no entanto tudo o que ela fez foi continuar parada, analisando talvez o meu sorriso.

– Eu não iria suportar se acontecesse alguma coisa com... – ela ficou um mero segundo calada.

– Com o seu irmão – eu completei para ela. – Seria terrível, eu sei.

– Mas foi terrível do mesmo jeito – ela falou tão baixinho que a voz mal saíra. – Eu nunca imaginei que você fosse capaz de...

– Ajudar o seu irmão?

Ela assentiu.

– Há coisas que nem mesmo eu imagino capaz de fazer pelos outros – disse a ela.

– Se eu puder compensar o que fez por ele... se eu pudesse ajudá-lo a estudar para recuperar a matéria que perdeu durante o tempo que você ficou de repouso. Eu faria qualquer coisa.

– Você não tem coisas mais importantes para fazer do que esperar que eu possa me decidir?

– Dessa vez não – Rose disse com sinceridade.

Coloquei meu olhar em Alvo Severo, que conversava com uma garota há dois metros de nós.

– Mas não está ajudando seu namorado agora. 

– Meu...?

– Dizem que Potter é o seu namorado.

Ela riu fracamente, balançando a cabeça frustrada. Pareceu desistir de explicar alguma coisa e perguntou, nervosa:

– No que isso influenciaria você a aceitar a minha ajuda?

Estava tão abismada que provocá-la mais um pouco iria desfazer minha curiosidade de saber como funcionavam as coisas para ela. Inclinei-me a poucos milímetros do ouvido dela e falei:

– Se não sabe, não sou eu que vou lhe dizer.

Tenho certeza de que a irritei, assim como ela havia me irritado quando dissera a mesma coisa. Olhei para ela outra vez e sua sobrancelha estava levantada, como se não acreditasse no que escutara.


– Para a sua informação – ela retrucou, mas eu fiz uma expressão para que ela se calasse. Contudo, Rose não deu atenção e continuou. – Eu só ofereci ajuda, mas se não está...

– Encontro você na biblioteca – eu disse, interrompendo-a. Ela falava muito.

– Horário? 

– Quando quiser, estarei te esperando.

Ela cruzou os braços, duvidosa.

– Prove.

– Acho que deve confiar em mim. 

Sendo assim, voltei para a masmorra da Sonserina sem olhar para trás. Eu só fui para a biblioteca às nove horas da noite, quando o tilintar da chuva nas janelas dos corredores passou a ficar audível.

Não esperava que ela logo pudesse aparecer. Rose Weasley era popular, e eu não chegava aos pés dela na sociedade de Hogwarts – assim como era chamado o lugar dos alunos que tinham parentescos com os Potter e os Weasley. Entrementes, poucas pessoas não se davam bem com eles, como aqueles invejosos e ciumentos. Rose Weasley – e metade de seus primos – era muito cobiçada pelos professores, e nenhum deles, por mais que eu esteja no mesmo nível de inteligência dela, pareciam criar alguma expectativa em mim.

Eu, no entanto, estava acostumado com a falta de admiração. Agora, a Weasley não gostaria de perder a reputação que tinha por estar andando comigo. Ela não queria ser vista com alguém como eu, o filho de Draco Malfoy.

Só continuei o caminho porque eu não tinha nada para fazer. Lógico que não iria dizer que eu estava desejando sentir aquele monstro esmagador que viveu e despertou com a presença dela desde o quinto ano dentro de mim.

Eu não sabia o que aquilo significava. Ou, ao menos, não queria saber.

Andava calmamente pelo corredor quando de repente ouvi, atrás de um pilar, alguém reclamar.

Conhecia perfeitamente a voz para saber quem era. Minha pulsação se acelerou, mas era excelente em ignorá-la.

– Não seja difícil! – uma voz masculina se estendeu na mesma direção, e apurei mais os ouvidos.

– Me solte! – ela suplicava, com repugnância na voz.

– Vamos, Weasleyzinha, você está caidinha por mim... 

– Eu tenho nojo de você, Beaumont.

Comecei a andar depressa quando ouvi a risada de Beaumont. Logo que virei para um outro corredor, avistei Rose tentando se esquivar de Beaumont, sem sucesso. Demorou a entender o que ele queria até o ponto em que ele pegou a mão dela com força e a segurou pela cintura. Ela, no mesmo segundo o empurrou contra a parede, gerando mais risada do rapaz.

Por instinto – ou o que seja –, atravessei o corredor e gritei quase correndo:

– EI!

Rose girou a cabeça para mim, começou a dizer alguma coisa, mas eu não tinha gostado do que Beaumont estava pretendendo fazer com ela; passei por ela e, com toda a raiva que tive – desde o dia em que ele humilhara Rose na floresta proibida – o enforquei na parede.

– Malfoy, não... – aconselhara Rose, mas não dei atenção. Eu estava relembrando o que ele falou de mim no Natal passado.

– Filhinho de papai, eh? – perguntei a ele, quase cuspindo.

– Olha, Malfoy, caso não tenha reparado eu estou tentando pegar uma garota aqui...

Ele fez um careta quando aumentei a força da minha mão em seu pescoço.

– Pegar. Uma. Garota? – sibilei, fungando.

– Solte ele, Malfoy – mandou Rose enquanto Beaumont engasgava. – Não vale a pena.

Beaumont ergueu as mãos, rendendo-se. Ele aproveitou o momento em que afrouxei a mão, tirou a varinha do bolso e a apontou em minha direção, de modo que fiz o mesmo movimento.

– Por favor! – exclamou Rose, zangada, postando-se entre nós dois.

– Ele estava tentando abusar de você! – eu gritei inconformado com aquilo. – E você vai deixar isso barato, Weasley?

De repente ela se voltou contra mim.

– Eu tinha a situação sob controle até você chegar!

Beaumont riu de mim.

– Bem! – ele exclamou, parecendo feliz. – Isso vocês que decidam!

Quando ele deu um passo para trás eu avancei nele, mas Rose me segurou com força, berrando para que eu parasse. Beaumont correu e desapareceu de vista. Eu estava vermelho, podia sentir isso.

Assim que percebi que os braços delas estavam em torno de mim, a empurrei para o outro lado. Ela me encarou, com os olhos ardendo em chamas.

– O que pensa que iria fazer? – ela perguntou cada vez mais furiosa. Eu não estava entendendo. – Não adianta brigar, achando que com um soco vai fazê-lo parar... 

– Então essa não foi a primeira vez que ele tentou...

– Você não é o meu pai, Malfoy! – ela gritou desesperada. – Você não tem motivos para me proteger!

– Motivos? – eu ri alto.

Ela demorou um tempinho para replicar, baixinho:

– Sei cuidar de mim mesma... Eu não preciso de você para enfrentar as pessoas que me atacam! Eu sei me cuidar, Malfoy!

– Eu não desejei nada disso, mas aconteceu – abaixei o tom de voz de maneira que só ela escutasse. – Entenda que é inútil tentar impedir, eu nunca vou hesitar em dar um soco na cara dele.

– Simplesmente por orgulho ou você só quer se mostrar?

Cerrei os dentes:

– É simplesmente por você. Tudo o que eu fiz, que nunca desejei e imaginei fazer, foi por você.

A expressão dela ficou vazia de uma hora para outra. Piscou os olhos várias vezes e quando os deixou aberto eu vi o quanto brilhavam. 

– Eu odeio tudo o que você faz comigo – continuei. – Porque você não tem nem idéia. – Cada sílaba era proferida lentamente, eu não consegui suportar o modo como ela me olhava. Minha voz, depois, saiu um pouco desafinada: – A culpa é toda sua se eu quero que as pessoas a tratem com respeito que merece. Eu tentei ajudar você, e se não quer enxergar isso é problema seu.

Ela continuou calada, apenas esperando por mais. No entanto, eu não daria tanta satisfação. Eu queria vê-la implorar para conseguir o que queria; eu queria que ela me ameaçasse para que eu dissesse o que pensava.

Então ela fez o que eu mais temia – ou desejava – que fizesse, e depois segurou meu braço com leveza. 

– Scorpius...

Seus dedos finos soltaram-se do meu braço, enquanto desciam,  calmamente, mas trêmulos, roçando a pele quase inocentemente, até alcançarem a minha mão.

Fiquei calado, paralisado. Rose nunca havia me tocado tão docemente, e a sensação era... boa.

– Não faça mais isso – ela disse baixinho. – Para o nosso bem.

– Você tem medo – disse irritado, mas ao mesmo tempo pensando numa maneira para que ela não tirasse sua mão da minha. Infelizmente, no momento em que pensei nisso, ela se afastou.

– Medo do quê?

– De se envenenar – eu respondi.

– Se fosse esperto, Malfoy – Rose replicou presunçosa –, teria percebido que o veneno já me atingiu. Sendo que não há nada que possa se fazer, sentir medo é inútil agora.

– Eu sou esperto, Rose.

Ela deu as costas para mim e cruzou os braços. 

– Só não confio na minha imaginação.

– Quem dera se fosse só imaginação – ela murmurou.

– A sensação não lhe agrada?

– O que não me agrada – Rose virou seus olhos para mim de novo, e por um momento louco achei que ela começaria a chorar, pois a voz saíra trêmula: – é o fato de gostar demais dessa sensação. E quando eu vi você passando nesse corredor para tentar me ajudar, a coisa só piorou. E cada vez mais eu estou odiando gostar disso.

Aquele momento era perfeito para testá-la do jeito que eu queria. Rose estava frágil e não sairia dali até resolver aquilo. Ela havia acabado de se declarar, de modo que a certeza tornou-se ridícula, embora a angustia de conhecer seus pensamentos remotos fosse atormentadora.

Eu me aproximei e ela ergueu de leve a cabeça para me ver. Tentei não pensar muito na cor dos olhos dela. E no brilho que estava incrustado neles. E na tentativa de encontrar algo menos destrutível, eu olhei para os lábios dela por meros segundos. Só que isso ajudou o monstro rugir mais alto ainda.

Segurei a mão dela, que estava quente e macia. Weasley estremeceu com o contato, mas não protestou. 

Ela foi andando para trás. Embora desejasse fugir, ainda continuava me encarando. Sabia que enquanto minha mão estivesse segurando a dela eu não a deixaria que fosse embora. Levantei nossa mão até a altura de seu ombro, e Rose ofegou quando a coloquei contra a parede.

– Você odeia isso, não odeia? – eu sussurrei.

– Scorpius...

– Não se preocupe. – Eu entrelacei nossos dedos. – Não vou obrigá-la a nada.

Meu rosto se inclinou, sem saber por onde começar e sem imaginar como iria acabar. A respiração dela era oculta, parecia ter esquecido de respirar enquanto eu me aproximava de seu rosto gentil e cauteloso. Eu estava convicto de que era isso o que eu queria. Mas fui incapaz de continuar até que eu tivesse certeza se era isso o que ela queria, apesar de contestar.

Ela estava sem fôlego antes mesmo do contato. Eu fiquei apenas olhando para ela, sem me mexer, ciente de que os lábios delas estavam entreabertos esperando os meus há pouquíssimo milímetro de distancia. Eu sentia a respiração fraca, que no momento em que comecei a acariciar sua mão tornou-se cada vez mais acelerada.

Com a mão desocupada, eu coloquei o cabelo dela atrás da orelha. Encostei minha testa na dela, inalando o cheiro do perfume natural de sua pele. Ela afrouxou a força que tinha sobre a minha mão e fechou os olhos, apenas esperando...

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Comentários (3)

  • Mariana Berlese Rodrigues

    SIMPLISMENTE P-E-R-F-E-I-T-O ESSE CAP. A-M-E-I *.*#MORRI A-M-E-I <3 <3 <3 MUITOOOOOOOOOO LINDAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA *.*CHOREI AQUI :)

    2013-02-05
  • Lana Silva

    Como você para em uma parte dessas ??? O.O Tô louca aquiiiiiiiiiiii *---------------------------------* Awww *-* declaração mais que fofa a deles dois.

    2012-02-15
  • Keriane

    OMG!Aaaah,amei!Que lindo,você escreve muito bem mulher,mel dels^^ Indo para o próximo capítulo,muito curiosa pra saber o que vai acontecer.

    2011-09-06
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