Impulsos desastrosos




Capítulo 6

Impulsos desastrosos



O metrô foi uma aventura. Snape se esqueceu de pagar a passagem, e Martha discretamente o lembrou. Foi quando ele se viu frente a frente novamente com a temível catraca. Dessa vez, ele estava preparado: colocou o pequeno tíquete no processador, observou ele ser engolido e então atravessou - dessa vez sem ficar preso.


Sucesso.


Martha pareceu ficar intrigada com o sorriso triunfante que ele deu ao passar do outro lado, mas ele indagou:


- Para que lado?


- Para lá. Plataforma 12.


Eles viajaram separados, porque Snape insistiu em dar o assento vago a Martha, e não havia outro disponível. Ela se ergueu perto de sua estação e os dois caminharam juntos para fora do metrô. Já estava noite lá fora.


Martha morava num apartamento de um prédio baixinho e antigo. A área não era tão afastada quanto a casa dos McTaggart, e a zona não tão residencial. Mas ali as ruas pareciam mais limpas, de algum modo. Havia menos árvores e mais gente na rua.


- Eu moro aqui. Você quer subir para um copo de água ou uma xícara de chá?


Snape foi sincero:


- Não ficaria bem - Ela o encarou, surpresa. - Além do mais, eu não avisei meus amigos que estaria fora. Eles podem se preocupar.


- É muita consideração.


- Bem - ele desconversou -, é melhor eu deixar você descansar agora.


- Se tem certeza de que não quer subir...


- Talvez um outro dia.


- Está certo, então. Obrigada, Sev - Ela sorriu. - Até amanhã.


- Tenha uma boa noite.


Ele a observou transpor a porta e entrar no prédio. Virou-se para a rua e suspirou, pois teria que refazer seus passos para chegar em casa. Isso incluiria mais uma vez andar no maldito metrô.


Então ele ouviu.


Um grito de mulher. Apavorado.


E soube instantaneamente que se tratava de Martha.


Imediatamente, invadiu o prédio e então viu-se perdido. Um som alto de algo se quebrando no andar de cima o fez localizar a fonte do ruído. Galgando os degraus de dois em dois na estreita escada, ele chegou à porta que ainda estava aberta, e a cena dentro o fez agir no impulso, contrariando todos os seus instintos de espião.


O homem chamado Eddie tinha jogado Martha no chão. A moça estava encolhida, tentando proteger-se dos golpes, mas ele estava chutando e batendo nela com um pedaço de alguma coisa que Snape sequer parou para ver. Ele voou em cima de Eddie e puxou-o para longe de Martha. O homem pipocou contra uma parede e se virou, bufando. Os olhos dele adquiriram uma expressão assassina ao olhar para Snape. Numa voz baixa e ameaçadora, ele disse apenas:


- Você...!


Snape checou Martha com os olhos rapidamente e franziu o cenho. Mesmo livre, Martha não se mexia. Ela estava deitada no chão, imóvel, aparentemente desacordada.


Eddie rapidamente tinha se refeito do susto e agora avançava de maneira perigosa contra o Mestre de Poções, um sorriso malévolo nos lábios.


- Ela não vale a pena, cara. É uma vagabunda.


Snape usou seu tom mais gélido para ordenar:


- Saia daqui agora ou vai se arrepender.


- Ah, é? - Eddie alcançou o bolso de trás de sua calça e de lá tirou um canivete do tipo retrátil. Snape ficou rígido, olhos fixos na arma. - Vai bancar o herói? Vem, vem bancar o herói com isso.


O homem começou a avançar contra Snape, que disse apenas, acompanhando a faca, que Eddie agora balançava de um lado para o outro, sorrindo perversamente:


- Última chance. Saia agora e eu prometo que não o perseguirei.


A ameaça fez Eddie rir-se alto:


- Ah, é? E acha que isso vai me amedrontar? Você não pode comigo, cara!


E avançou.


Num impulso, Snape pulou para trás, sacando a varinha e gritando:


- Ciconia argentum minimum fiat!


O canivete foi ao chão. Onde antes havia um homem de mais ou menos 1,70m, agora estava uma miniatura de prata na forma de uma cegonha. Snape olhou de novo para Martha - ela ainda estava desacordada.


Ele pegou a pequena escultura na mão e pôs no bolso rapidamente, curvando-se para examinar a moça. Ela tinha cortado a testa num fragmento qualquer de um bibelô. Snape usou a varinha para cauterizar o ferimento e limpou o sangue. Mas preferiu deixá-la com uma pequena mancha roxa perto do lábio - ele não poderia explicar que ela saísse sem qualquer ferimento depois daquele ato tão brutal.


Com os dedos, ele notou uma pequena elevação no couro cabeludo dela. Martha teria um belo galo de manhã. Com cuidado, ele ajoelhou-se no chão e tentou apoiar a cabeça dela em seu colo. No meio da operação, os olhos dela se abriram lentamente, mas assim que ela o viu, encolheu-se:


- Ahhh!


- Calma, calma, sou eu - Ela o encarou, trêmula. - Está tudo bem agora. Pode se sentar?


Ela engoliu em seco e assentiu:


- Eu acho que sim. - Snape notou que a voz dela tremia tanto quanto seu corpo. - Eddie estava me esperando escondido no corredor. Ele veio por trás, eu não vi... - Ela tentou se sentar no chão, com a ajuda dele. - Foi horrível... Ele... fugiu?


Rapidamente, Snape inventou a história:


- Sim. Eu consegui afastá-lo, ele ainda me ameaçou com uma faca, mas resolveu sair correndo - Ele apontou - Até largou a faca no chão.


Ela passou os braços em volta do próprio corpo, como se estivesse com frio.


- Típico...


- Acho que ele não vai voltar.


- Eu também acho que ele não vai voltar hoje. Obrigada de novo, Sev. Parece que você vive me salvando... - Ela sorriu, mas lágrimas escorriam pelo seu rosto. - Se você não tivesse vindo, eu não... eu... - Ela afundou o rosto entre as mãos, chorando alto.


Snape arregalou os olhos. Ele sabia instintivamente que deveria consolá-la, mas não sabia direito como fazer isso. Desajeitadamente, puxou-a para perto de seu corpo, e quase se assustou quando Martha se agarrou a ele, e escondeu o rosto no peito dele, chorando convulsivamente. Sem perceber, ele a envolveu em seus braços e alisou o cabelo dela. Pareceu a coisa mais natural a se fazer.


A proximidade dos dois corpos fez Snape experimentar algumas sensações bastante novas. Demorou alguns minutos até Martha se acalmar, e embora Snape estivesse consternado com a situação dela, não pôde evitar notar o calor de seu corpo, o perfume agora ainda mais suave de lavanda, a maciez de seus cabelos...


Aquilo era altamente impróprio.


Martha se afastou um pouco e ergueu a cabeça para olhar para ele, murmurando:


- Desculpe...


Seja lá qual foi a resposta que ele pensou em dar para ela, morreu na garganta, que se fechou diante da visão à sua frente. Martha estava olhando para ele, o rosto banhado em lágrimas. Os olhos dela, que pela primeira vez ele via serem esverdeados, também estavam vermelhos e inchados de tanto chorar, e a manchinha roxa tinha se expandido e ficado quase azul. Suas faces estavam um pouco avermelhadas também, o cabelo bastante despenteado.


Ela jamais parecera tão linda.


Sem jamais perceber o que acontecia, Snape fixou seus olhos nos lábios dela, tão rosados, carnudos. Em mais um impulso, ele suavemente a puxou de volta contra si e fez seus lábios encostarem gentilmente nos dela.


O toque pode ter sido suave, mas a reação foi explosiva. Logo ele se viu mergulhado num mar de maciez e calor que jamais havia vivido antes. De repente, ele sentiu a boca sob a sua se abrir e pôde experimentar ainda mais calor quando impetuosamente colocou sua língua sobre a dela.


As sensações triplicaram. Agora havia também umidade quente, sensual e aconchegante. Tudo aquilo o deixava totalmente inebriado, e ele mal notou estar apertando ainda mais o corpo dela, sentindo-lhe as curvas e a maciez, ficando mais próximo, como se quisesse entrar dentro dele, quase fora de si, a boca se abrindo ainda mais, devorando um fogo que o consumia por dentro...


- N-não!


Ele se separou de repente, erguendo-se quase que de um salto. Martha pareceu se assustar com a reação dele.


- M-me desculpe - Um Snape balbuciando como um adolescente: era impensável! - Foi extremamente impróprio de minha parte. Por favor, tente me perdoar.


Martha se ergueu rapidamente, tentando dizer:


- Sev, por favor...


Ele parecia transtornado:


- Como pude fazer isso? Eu não sei o que dizer...


Num movimento rápido, Martha juntou as mãos de Snape entre as suas e garantiu, agora numa voz tranqüila e controlada:


- Não aconteceu nada que eu não quisesse que acontecesse, Sev.


Ele estava agitado, parecia que o ar tinha diminuído na sala:


- Mas... você não entende...! Eu... não sou quem você pensa que eu sou! Eu não quero lhe dar falsa impressão... falsas esperanças...!


Martha tinha uma voz muito calma, e agora parecia que os papéis tinham se invertido - ela é quem o consolava:


- Sev, tudo bem. Se você quiser, podemos esquecer o que aconteceu. - A voz dela parecia um pouco magoada, mas não desesperada. - Fingir que nunca aconteceu.


Snape sentiu gratidão instantânea pela moça:


- Sim, sim... Por favor... Eu ficaria imensamente agradecido. - Ele retirou suas mãos das dela e suspirou. - Er, você quer que eu fique e prepare algum chá de ervas?


- Não será necessário. Eu já estou melhor.


Era o que ele esperava ouvir.


- Nesse caso, eu... acho melhor deixar você descansar.


- Está bem. Mais uma vez, Sev, obrigada.


- Não se esqueça de trancar bem a porta depois que eu sair.


- Eu farei isso. Boa noite, Sev.


- Boa noite.


Snape desceu as escadas, ainda tentando recuperar o fôlego. Em todos os anos de espião, ele jamais se lembrava de ter perdido o controle daquela maneira. Primeiro, ele usara mágica. Mesmo num caso de autodefesa, poderia atrair uma investigação do Ministério da Magia. E a última coisa que ele queria fazer no momento era atrair a atenção de qualquer um, fosse bruxo ou trouxa, para sua presença.


Mas isso não era nada em relação ao que ele fizera em seguida. O que o tinha possuído para ele se aproveitar da moça daquele jeito? Como ele não tinha sido capaz de resistir à tentação. Ele arriscara demais. Martha poderia acusá-lo de ter segundas intenções, e ele não poderia honestamente dizer que não as tinha...


Além do mais, se Martha realmente fosse capaz de sentir coisas, ela poderia desmascará-lo. Não, o melhor a fazer é esquecer o que tinha acontecido. Fingir que estava tudo normal, entre dois colegas de trabalho.


Se isso era o que sua cabeça prontamente tinha decidido, seu coração estava totalmente fora de sintonia. Ele não conseguia tirar da cabeça o aroma da lavanda que emanava dela, sensual e incitante, como se prometesse mais delícias do corpo quente, macio e cheio de curvas que ele teve em seus braços. Parecia que aqueles breves minutos estavam marcados a ferro e fogo em Snape, ele mal conseguia ver o que se passava diante de si.


Na verdade, ele só foi se dar conta de onde estava dentro do metrô, quando já estava perto da estação onde deveria saltar. Ele fizera toda a complicada passagem pelas catracas totalmente aéreo, pensando em Martha e no que aconteceria dali para frente, alheio ao mundo de trouxas e seus problemas.


Com uma pontada de relutância, ele finalmente admitiu que poderia estar atraído pela bela balconista. Não, não era bela, mas havia alguma coisa que ele achava adorável. Como um bichinho de estimação. Sim, deveria ser uma atração como se Martha fosse uma pequena serpente, se aventurando pelo mundo, sozinha, usando a língua bifurcada para testar o mundo diante de si. Os ofídios sempre o fascinaram de maneira quase hipnotizante. Aliás, ele era bem-quisto por Voldemort por sempre ter tratado Nagini com distinção e respeito que a serpente merecia.


Sim, com certeza não poderia ser paixão ou essas coisas de amor. Um Snape jamais sentia isso. Era uma coisa tão... tão grifinória, apaixonar-se. Os tolos lufa-lufa também sentiam isso volta e meia. Na certa, ele tinha se intoxicado com alguma erva trouxa e agora seus pensamentos estavam um pouco confusos.


Mas de uma verdade ele não conseguia fugir: ele realmente não era mais o mesmo Severo Snape, mestre de Poções de Hogwarts. Em dois dias de mundo trouxa, ele estava quase irreconhecível.


Será que ele poderia colocar a culpa no Moo Goo Gai Pan?



Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.