Capítulo 17



Capítulo 17

Camelot estava em festa. Bandeiras, faixas e música se espalharam pelo castelo, dominando tudo e todos com uma contagiante felicidade difícil de resistir, mas Ronald conseguiu tal feito com incrível facilidade, tamanha era sua amargura.


Não devia sentir-se daquela maneira, estava agindo de forma egoísta. Os saxões foram vencidos, anos de paz se seguiriam e o reino de Harry seria próspero e seguro. O rei governaria com justiça ao lado de sua rainha. E a vida continuaria. Pedir que aquilo não acontecesse era algo cruel e egoísta.


Por que sua felicidade deveria vir antes das de milhares de pessoas? Ou mesmo de Harry?


Sentado no telhado perto da janela de seu quarto, o mesmo lugar que há não muito tempo atrás conversou com Hermione pela primeira vez em anos, observava a agitação dos súditos fiéis de Camelot. Era a única pessoa em todo aquele enorme castelo que não se reuniu no largo pátio para dar boas-vindas aos heróis do reino.



Quando os enormes portões se abriram e a égua majestosa de Harry apareceu triunfante logo em seguida de seu estandarte com o leão carregado por Sir. Cedric, houve um estrondo de exclamações de alegria e risos que continuaram com a mesma intensidade, mesmo horas depois quando o sol se punha e a festa apenas começava.


Olhava sem realmente ver os soldados se reencontrando com suas famílias, pessoas dançando, tocando e cantando... Por horas só observou a felicidade alheia até que alguém bateu na porta de seu quarto e ele foi obrigado a entrar e atender.


- O rei convida-o para juntar-se às comemorações no salão do trono onde o banquete de vitória está sendo servido – anunciou sobriamente o criado, indo embora logo em seguida.


Não queria ir. Encarar Harry ao lado de Hermione, sorrindo e chamando-o para fazer companhia... Seria a pior coisa que teria de enfrentar em muito tempo. Preferia caçar um dragão a sentar à mesa perto do futuro casal real. Mas seria a última vez que veria Hermione e não podia perder a oportunidade.


As poucas coisas que tinha já estavam colocadas em uma sacola de viagem e no dia seguinte voltaria para a estrada, indo de vilarejo a vilarejo, nunca se acomodando em algum. Talvez visitasse Luna Lovegood e seu pai que o ajudaram e assim poderia retribuir o favor de algum modo.


Soltando um longo suspiro resignado, seguiu pelos corredores vazios do castelo sem pressa. Não esperava encontrar no salão a corte toda reunida com vários lordes e suas famílias. Mas o que mais o surpreendeu foi ver, depois de tanto tempo, seus pais.


Estavam sentados próximos a Gina, no meio da longa mesa. Ao pisar dentro do salão imediatamente aqueles que o viram fizeram silêncio e assim sucessivamente, a curiosidade tomou o lugar das conversas e risadas. Inevitavelmente sentiu-se como o bobo da corte por um instante, não suportava toda aquela atenção e parecia que estava prestes a fazer algo estúpido, como tropeçar ou contar uma piada sem graça na tentativa tola de impressioná-los.


Foi então que sua mãe o viu, levantando rapidamente de seu lugar e correndo até ele. Apesar de ser uma senhora de idade avançada ainda tinha muita força, ou talvez tinha tanta saudade que ganhou força sobrenatural, o bastante para seu ar ao abraçá-lo. Estava chorando.


- Ron! Meu filho!



O salão voltou ao barulho de antes e Molina puxou seu filho até o lugar da mesa onde seu pai e irmã também sentavam. Lorde Arthur imediatamente levantou em sua frente, expressão séria e testa franzida. Estava muito mais velho e de aparência fraca, parecia doente e já há muito tempo. Ron se sentiu mais culpado ainda como se parte da razão do enfraquecimento de seu pai nesses anos todos fosse sua partida


Após alguns segundos desconfortáveis, o pai colocou sua mão no ombro do filho.


- Olá meu rapaz. Estou contente em ver que está bem.


- Eu sinto... Sinto muito, meu pai. Por ter deixado vocês – disse em voz baixa, não havia como consertar seus erros, mas sabia que devia pelo menos aquilo a seus pais.


- Águas passadas, meu querido! Sente-se, vamos! – sua mãe falou rapidamente, indicando que se sentasse ao dela.


Assim que o fez percebeu que estava apenas a alguns lugares longe de Harry e, inevitavelmente de Hermione, mas era tarde demais para sentar-se mais afastado, principalmente com sua mãe o observando atentamente como se para checar que ele realmente estava lá.


Tentou parecer interessado nas conversas da mesa ao seu redor e mais precisamente tentou não olhar na direção do futuro casal real. Foi inútil. A cada minuto virava a cabeça sem perceber na direção deles. Harry conversava em voz baixa com Cedric e Hermione ria educadamente de algo que uma dama da corte lhe dizia. Ela parecia distraída, assim como ele, mas em nenhuma vez seus olhares se cruzaram.


Era como se tivesse voltado anos atrás, quando soube que Harry escolhera Hermione como sua noiva. Só queria sair dali, fugir para bem longe e esquecer. Mas a presença de seus pais ao seu lado e a voz de Gina conversando animada com Sir. Oliver o trouxe de volta a realidade: devia mais à sua família. Uma vez na vida tinha que fazer a coisa certa e ficar ao lado deles. Mesmo que fosse só por uma noite.


Esforçou-se mais ainda para se concentrar em tudo menos em Hermione, e por um tempo conseguiu, ouvindo a conversa de Arthur com Remus Lupin sobre o que aconteceu na guerra contra os saxões, como Servolo foi finalmente derrotado. Havia outras distrações também como as histórias hilárias de Sirius, que já tinha tomado mais do que da conta... Mas a mais incrível foi saber que sua própria irmã, debaixo dos narizes de todo o reino, havia se infiltrado no exército e lutado contra os saxões. E sendo descoberta havia sido surpreendentemente aceita por Harry, que não a mandou de volta para a segurança do castelo como deveria ter feito.



E por mais que tenha achado a atitude de Harry errada, o que mais lhe incomodava era o quanto estava distante da vida da irmã. Hermione disse que ela voltara para as terras do pai, levando a notícia da morte de Percival e tinha se contentado com isso. Quando tinham virado estranhos? Por um longo tempo observou Gina pelo canto do olho, notando pela primeira vez desde que voltara para Camelot o quanto ela tinha crescido e amadurecido. Havia algo diferente nela, e não estava apenas no cabelo curto. Estava mais confiante do que jamais fora e... Principalmente mais alegre.


Gina tinha mudado para melhor, mas o mesmo não podia ser dito sobre ele. Estava de volta exatamente onde começara. Observando Hermione de longe, na esperança que seus olhos fitassem os dele.


A noite avançou lentamente e se misturou em um grande conjunto de momentos parecidos, nada se destacando a não ser Hermione. Quanto mais tempo ficava sentando àquela mesa, com aquelas pessoas, tudo ficava amargo além do que já estava. Antes que percebesse, já tinha tomado mais de dois cálices de vinho. Nunca foi de beber, porém em uma situação onde só existem duas coisas para se fazer e uma delas era olhar Hermione, ficava com a segunda.


Seu silêncio à mesa começava a chamar atenção e curiosidade daqueles que estavam perto. Lupin tentou uma vez ou outra trocar palavras com ele, sem sucesso. Sua mãe também fez suas tentativas, recebendo apenas um “sim”, “não”, “hmm-mm”. No momento, era a vez de seu pai, mesmo que tossindo a cada frase completa, tentar.


- Harry contou que você ficou aqui durante a campanha toda, se recuperando – começou em voz baixa e rouca.


- Sim.


- Está pensando em ficar em Camelot?


Quando respondeu tinha os olhos fixos em Hermione, que conversava com sua mãe mas de repente virou-se para ele apenas com o olhar como se tivesse ouvido a pergunta de seu pai.


Seu pai apenas continuou a conversa depois de uma crise de tosse forte que levou a sua mãe lhe dar um copo de vinho, dizendo fazer-lhe bem.



- Eu... Eu gostaria que você fosse para a casa, Ron – pediu, mostrando sinais de que era vital que voltasse para as terras dele. – Precisamos de você lá.


O pedido era sério. Muito mais sério do que esperava. Não era apenas um pai com saudades do filho, mas sim um pai vendo sua morte próxima e tentando ficar perto do filho em seus últimos momentos de vida. E Ron não podia fazer nada quanto aquilo. Queria desaparecer da face da Terra, mas agora... Como poderia?


- Sim, querido! Ouça seu pai, finalmente o encontramos e você partirá tão cedo? Por que não volta para casa? Deve conhecer todo o reino já, está na hora de parar em um lugar só e se estabelecer. Casar! Ter filhos! – sua mãe acrescentou tentando parecer mais otimista.


Por alguma razão aquela conversa não só tinha chamado atenção de sua mãe, como a de Hermione, Narcissa Malfoy e Harry. Ron se sentiu mais uma vez o bobo da corte, seu futuro sendo discutido em sua frente sem que ele fosse capaz de compreendê-lo ou opinar sobre como ele seria.


- Não acho que Ronald está pronto para acabar com as aventuras – sorriu Harry aumentando um pouco sua voz para que os Weasley o ouvissem melhor. – Ficar em Camelot será muito mais divertido... Como nos velhos tempos, não acha Ron?


- Não somos mais crianças, Harry – falou Hermione, em uma voz um pouco mais baixa.


- Também não somos velhos – retrucou ele rindo.


- Acho que meu irmão está ocupado demais sendo o herói de Hermione para voltar para casa, papai – riu Gina quase forçando Ron a bater em seu calcanhar para calar-se. – Ouvi dizer que você a salvou, não foi?


- Não foi nada de importante, Gina. Só o meu dever – murmurou entre dentes, tentando ver se ela pegava a dica.



- Suponho que ainda não agradeci você por isso, não é? – riu Harry, de repente se levantando e pegando Hermione pela mão, para que também o fizesse.


Tentou manter-se incógnita o máximo que pôde, e enquanto olhava para a mesa orelhas quentes e vermelha nervoso, perdeu a mesma reação de Hermione que tinha as bochechas rubras e tentava convencer Harry a desistir do que pretendia fazer.


- Ouçam todos, por favor! – anunciou Harry para o banquete inteiro. – Enquanto lutávamos bravamente contra os saxões, eles tentaram nos enfraquecer aqui mesmo em Camelot. Destruir justamente o que nós amamos, nossa casa... E justamente o que eu amo. Minha noiva, Hermione, não estaria aqui para iluminar nossa festa se não fosse pelo meu amigo, meu mais leal amigo, Ronald Weasley...


O salão todo explodiu em palmas e elogios. Harry indicou Ron com a mão e pediu que se levanta-se, o que ele prontamente negou, balançando a cabeça fervorosamente.


- Vamos, querido! – insistiu sua mãe. – Vá lá!


Sem opção e preso às obrigações da corte, obedeceu ficando em pé e sentindo-se a criatura mais traidora do reino. Ele era amigo de Harry? Como? Se desejava tirar Hermione dele e fugir para bem longe?


- Eu espero... Não, desejo que ele fique conosco em Camelot, protegendo não só Hermione mas o reino todo ao meu lado – para completar a cerimônia desembainhou Excalibur. – Aproxime-se meu amigo.



Ron fechou os olhos por um segundo, de vergonha por tantos momentos de traição cometidos, antes de ir até a ponta da mesa e posicionar-se perto da espada. Sabia o que estava prestes a acontecer. Não era certo, ele não merecia... E nem desejava. Só queria sumir dali o quanto antes.


- Harry, eu não... – tentou apelar, murmurando apenas para que o rei ouvisse. – Isso não é necessário, por favor.


Harry, no entanto, continuou sorrindo e não lhe deu ouvidos. Ao seu lado Hermione estava com a expressão mais neutra que já vira, desesperadamente tentando esconder o que sentia.


- Ajoelhe-se, Ronald Weasley.


Era inútil, tinha que obedecer. Não podia simplesmente ignorar o rei e lhe dar as costas, saindo correndo daquele lugar o mais rápido que suas pernas longas o podiam levar. Sentiu o aço gelado em seu ombro esquerdo.


- Sua lealdade a Camelot e amizade à mim e Hermione são mais que provas suficientes de sua força e virtude. Não consigo imaginar melhor pessoa para lutar ao meu lado. – a espada tocou de leve sua cabeça e depois seu ombro direito. – Levante-se... Sir Ronald Weasley.


Mais uma vez todos bateram palmas e Ron, que tinha seus olhos fechados durante toda a cerimônia, se ergueu, fitando Harry com angustia, da qual o rei parecia totalmente ignorante, feliz demais com a vitória.


- Bem vindo de volta meu amigo.


E antes mesmo que Ron pudesse reagir, ele o abraçou fortemente. Estavam próximos o bastante para que Ron pudesse falar o que realmente sentia e não causar problemas com o resto da corte.



- Eu não vou ficar, Harry.


Quando o abraço terminou a expressão alegre do amigo tornou-se séria. Havia decepção em seu olhar, porém não houve tempo para que ele contestasse em voz alta a decisão de Ron, Hermione pediu que se sentasse.


De volta ao seu lugar à mesa, Ronald parecia finalmente ter perdido interesse na festa e desistido de qualquer tentativa de fingir o contrário. Sua mente girava em torno de desculpas para que pudesse fugir e cortar qualquer ligação com Camelot definitivamente. Tentou se convencer de que o pai não estava doente a ponto de falecer e se recuperaria em breve, e mesmo se não fosse o caso, Gina poderia tomar conta das suas terras ou seu futuro marido o faria. Ronald não era necessário. Poderia sumir pelo litoral e atravessar o mar até outras terras, quem sabe conhecer Roma, a suposta maior cidade da Terra. Isso, claro, se ainda existia uma Roma. Depois que os romanos abandonaram a Bretanha ninguém mais teve notícias do resto do mundo, ou desejava ter.


Continuou seus planos absurdos e tentativas de se sentir menos culpado por um longo tempo. A sobremesa começava a ser servida quando finalmente foi forçado, de forma cruel, a sair de seus pensamentos amargos. Foi a gota d’água.


Novamente Harry estava de pé para fazer um discurso, e aquele seria o pior de todos os discursos, pelo menos para Ronald. Antes que o rei começasse a falar, procurou Hermione com o olhar, mas quem respondeu sua busca foi Narcissa Malfoy, que o fitava com um sorriso nos lábios e até, para sua enorme confusão e surpresa, levantou o próprio cálice como se brindasse algo que apenas os dois comemoravam. Impossível saber o quê exatamente, já que não passava por sua cabeça nada que tivesse a comemorar com aquela mulher. O marido não tinha morrido como traidor na guerra? Por que estava tão contente?


- Hoje é um dia que ficará para a história... É o inicio de um longo e próspero período de nossas vidas. Não mais teremos que chorar ao invés de sorrir... Ainda há muito que reconstruir e proteger, mas o maior mal foi vencido – fez uma pausa, sorrindo em direção de Hermione, Ron gelou imaginando o que viria a seguir. – Eu fiz uma promessa para você, Hermione não muito tempo atrás, disse que no dia em que a paz reinasse em Camelot, nos casaríamos. E esse dia chegou. Amanhã, Camelot terá uma nova rainha!


Ela tinha os olhos arregalados, e como ele, estava estática, praticamente dominada pelo terror. Mas nenhuma de suas reações foi notada, pois tamanha eram as comemorações que o salão inteiro estava de pé brindando à saúde dos noivos. A única coisa que Ron sentia era desolação. Em meio às congratulações, risadas e desejos de felicidade, saiu discretamente de lá, até um corredor vazio... Onde pôde finalmente liberar a frustração que sentia. Subitamente se viu batendo o punho contra a parede de pedra, sem se importar com a dor.



Gina observou enquanto seu irmão saía do salão, sabendo bem o motivo. Ninguém mais parecia ter visto que agora o protetor da futura rainha não estava mais sentando à mesa; seus pais perguntaram à ela onde o irmão teria ido, mas não se perguntaram por que tinha ido.



Era tão estranho o quão distantes estavam um do outro. A família dividida e despedaçada. Tinham sido tão unidos no passado.


Soltou um suspiro e instintivamente procurou por Draco na mesa, querendo conforto na presença dele. Acabou o encontrando sentado ao lado da mãe, expressão tediosa no rosto. Pela noite toda tentou chamar sua atenção silenciosamente, mas ele parecia perdido em pensamentos. No entanto, sua mãe Narcissa, era uma história completamente diferente. Não estava de luto pelo marido, e quando Harry anunciou a traição de Lucius, apenas afirmou que era um tolo e que ela jamais trairia seu rei e Camelot. Diferentemente de Draco, não demonstrou raiva ou tristeza, provavelmente guardando seus sentimentos para expressar em privacidade. Porém, mesmo assim Gina ficou um pouco surpresa do quanto ela a acolheu no minuto em que se viram pela primeira vez, e parecia saber – não esperar– há muito tempo, que ela e Draco estavam apaixonados.


Não disse aquilo em palavras, mas o modo como a tratou bem, sendo que em toda sua vida em Camelot jamais tinha sequer dirigido a palavra à Gina, bastou para que estranhasse. Talvez Draco tivesse comentado algo com a mãe.


Talvez... Indicado que pretendia pedir Gina em casamento? Só a idéia de que existia a possibilidade de se casarem abria um grande sorriso em seu rosto, e por mais tola que a fazia parecer, ficava ansiosa para que o dia chegasse logo. Sabia que talvez fosse cedo demais, mal se conheciam, mas era o mais apropriado a se fazer, não? Se tinha intenções românticas sérias, deveria pedir sua mão ao pai dela em breve ou então não teriam futuro.


Infelizmente tudo indicava que no momento Draco estava bem longe de casamentos e romantismo. Na verdade, olhava de Hermione para o lugar vazio deixado por Ron como se enxergasse perfeitamente a ligação entre ambos. Ou então estava curioso para saber se existia uma.


E enquanto Gina observava Draco, Harry a fitava. Foi estranho quando anunciou que Hermione e ele se casariam, pois durante quase todo o discurso olhava para ela, como se esperasse algum tipo de reação. Ou então quisesse lhe dizer algo. Será que interpretara a preocupação de irmão mais velho que demonstrara no acampamento erradamente? Não era possível, era? Talvez...



- Seu pai e eu vamos nos deitar, Gina... Ele está muito cansado.


- Tem razão, já é bem tarde.


E era... Muitos já haviam deixando a mesa, com certeza à caminho de uma boa noite de sono. Resolveu acompanhar os pais e também ir dormir, pela primeira vez em um bom tempo o faria em uma cama apropriada. Pensar no conforto que lhe esperava a fez bocejar levemente.


- Aliás... Vou também.


- Isso mesmo, filha. Faça isso. Deve estar muito cansada da viagem.


Enquanto se levantava para seguir seus pais, deu uma última olhadela na direção de Draco e daquela vez ele retribuiu. Ao ver que partia, também ficou de pé e indicou para que ela fosse primeiro. Intrigada, continuou seu caminho para fora do salão, mas antes que pudesse continuar até seu quarto, Draco apareceu em um dos corredores, tão silencioso que quase levou um susto.


- Precisamos conversar. Está cansada demais para um passeio?


- Passeio? A essa hora?


- Você já enfrentou saxões bárbaros, está com medo do quê? – sorriu provocativamente.



- Está bem... Mostre o caminho.


Pegou sua mão e a beijou antes de segurá-la, enquanto levava Gina por corredores vazios até a cozinha vazia e silenciosa, mas quando achou que o passeio terminaria, ele a guiou até os estábulos da corte que ficavam atrás do castelo e encostados na muralha que defendia Camelot. A lua cheia estava bem acima deles e a noite um pouco fria com cheiro de grama molhada, mas agradável. Porém, Draco não podia seriamente querer andar a cavalo!


- Acabamos de passar dias andando em cima de um cavalo, não prefere sentar em algo macio para variar? – ela pediu.


- Quem disse que vamos andar a cavalo?


- O estábulo foi a pista.


- Confie em mim, nada de cavalos.


Quando entraram, ele a pegou pela mão mais uma vez e a levou até uma das baias vazias, se aproximou da parede de madeira e retirou o feno que a cobria, revelando uma pequena porta da altura de uma criança. Para passar por ela tiveram que se abaixar.



- Aonde estamos indo?


- Você vai ver...


Era uma passagem antiga, com paredes de pedra, pequena mas ao mesmo tempo com espaço o bastante para dois adultos pois o teto, após alguns passos, ficou mais alto. Apesar da escuridão e umidade, Gina via tudo aquilo como algo muito romântico... Ela confiava em Draco para ser seu guia e sentia-se em total segurança perto dele. Surpreendentemente logo encontraram a saída, exatamente do outro lado da muralha do castelo. Estavam fora de Camelot!


- Uma passagem secreta que atravessa a muralha! Como nunca fiquei sabendo disso?


- Um criado do estábulo me contou sobre ela, usada para escapar de incêndios, mas é muito pequena para servir para outra coisa, tirando o fato de ser útil para passeios no meio da noite, claro – sorriu.


Continuaram se afastando do castelo e indo a direção a floresta próxima. Caminharam alguns minutos parecendo sem rumo, até que Draco parou em uma pequena clareira, onde a luz da lua os iluminava e podiam ver as estrelas claramente se olhassem para o céu.


Estavam frente a frente e Gina esperava que ele dissesse algo, afinal a trouxera ali para conversar mas Draco a observava quieto, talvez relutante. O luar o deixava mais pálido que de costume, cabelo loiro prateado quase totalmente branco, ele parecia uma fantasma. Mas o que o assombrava?


- Aconteceu alguma coisa? – tentou, começando a ficar um pouco preocupada.


Ele não respondeu. Ao invés disso, a beijou profundamente, quase que como uma tentativa desesperada de provar algo, mas para ele e não para ela. Foi um beijo suplicante e inseguro e resposta o bastante para sua pergunta... Havia algo de errado. Mas, o que quer que fosse, depois que se separaram Draco parecia ter esquecido, sua voz e expressão estavam de volta à confiança de sempre.



- Amanhã pedirei sua mão a seu pai. Quero que se case comigo.


Gina se jogou em cima dele, colocando os braços em volta de seu pescoço em um abraço entusiasmado, retribuído com uma certa relutância e que mal percebeu.



Não sabia como nem quando conseguira voltar para o quarto e cair na cama, dormindo um sono desconfortável, acordando várias vezes durante a noite, mas enfim as longas e dolorosas horas passaram e a luz do sol entrou pela janela iniciando mais um dia... E seu último em Camelot.


A manhã mal começara e já havia agitação pelo castelo na preparação do casamento real, o qual Ron não pretendia presenciar, se tudo ocorresse como o planejado estaria bem longe de lá quando Hermione subisse ao altar para receber o título de rainha. Levantou da cama sem qualquer animação e vestiu-se lentamente De alguma forma, ainda guardou esperanças para os dois antes da festa de vitória e agora via a história enfim terminar.


Não era exatamente o desfecho que gostaria.


Tudo havia dado errado, pelo menos para ele. Se tivesse dito antes para Hermione como se sentia, ela não teria noivado Harry. Se não tivesse fugido de Camelot, teria pelo menos passado mais tempo com sua família... A única coisa que fizera certo foi voltar para o castelo e avisar Harry da invasão e mesmo aquilo lhe custou mais sofrimento, pois descobriu que se ao menos tivesse tido mais coragem quando mais jovem para se confessar para Hermione, nada daquilo estaria acontecendo.


Estava cometendo outro erro? Decepcionando sua família outra vez?



Como se para responder suas dúvidas alguém bateu na porta. Tentou ignorar, não queria falar com ninguém no momento, só partir o mais rápido possível, mas as batidas continuaram e a voz de seu pai o chamou.


- Filho... Abra a porta, preciso conversar com você.


Relutantemente o deixou entrar, sabendo de imediato que nada do que o pai falaria o deixaria contente e parecia que não era o único com aquela opinião, porque o lorde preferiu observar o quarto por alguns segundos antes de se aventurar a começar a falar, nisso notou que o filho estava preparado para viajar, seus pertences seguramente colocados em uma sacola de viagem.


- Então... Você vai mesmo embora. Mesmo com Harry querendo que fique.


Não era pergunta e Ron achou melhor não comentar.


- Ele me veio pedir ontem à noite para que insistisse que você ficasse, pelo menos por algum tempo, para ajudá-lo a reconstruir o reino. Será que vim perder meu tempo?


Era incrível que mesmo doente e debilitado seu pai continuava com o porte firme e nobre que sempre teve. Sua voz era decidida e possuía uma sabedoria que Ron sabia que jamais teria.


- Não posso ficar – respondeu debilmente, sentindo-se um garotinho perdido.


- E por que não? O que você está escondendo? Anda curvado, desviando o olhar... Algo não está certo.



Instintivamente fez exatamente o que seu pai havia descrito e desviou o olhar, não sabendo nem por onde começar a explicar o que sentia e razão de sua partida. Em resposta, seu pai suspirou, cansado.


- O que for que está te perturbando, deixe de lado. Existem coisas mais importantes que precisam de sua atenção – fez uma pausa, como se fosse difícil admitir. – Eu não vou durar para sempre, filho. E a sua casa precisa ser protegida por você... Sim, Harry derrotou os saxões, nos salvando de uma invasão gigantesca, mas sempre haverá problemas, bárbaros a espreita de um sinal de fraqueza... A Cornualha está enfraquecida.


- Não fale assim... Você ainda...


- Não. Estou morrendo e sua mãe não pode ficar sozinha distante de todos... Quando eu morrer ela virá para Camelot, com Gina.


- Gina! Ela pode muito bem...


- Sua irmã vai se casar, as responsabilidades dela serão outras.


- Casar? Com... Com quem? E o marido pode cuidar das terras da Cornualha...


Seu pai balançou a cabeça, claramente não estava contente com a escolha de marido de Gina.


- Ele tem as próprias para se preocupar, principalmente agora que o pai morreu. Sua irmã vai casar com Draco Malfoy. Ele pediu a mão dela há algumas horas.



- E você... Você deixou! Draco Malfoy! Pai! Ele é como aquele traidor Lucius! Não...


- Ela está apaixonada por ele. E por isso estou disposto a dar o benefício da dúvida ao garoto. Ele jurou que cuidará dela e a amará até o fim de seus dias, vi sinceridade em sua promessa.


Ron estava estupefato. Como, em nome de tudo que era sagrado, Gina poderia escolher Draco Malfoy como marido? Não permitiria, não importando o que o pai achava.


- Vou falar com ela... Parar com essa loucura!


- Não – a voz de seu pai era decidida. – Não fará nada disso. Perdeu a liberdade de opinar na vida da sua irmã há muito tempo. Ela está feliz e isso deve bastar para você.


Era dolorido ouvir aquilo mas infelizmente sabia que era verdade, estava tão distante da vida deles... Como podia ser diferente?


- Estou lhe pedindo mais uma vez: fique um ou dois meses aqui em Camelot, ajude Harry a se fortalecer. A felicidade de muita gente depende disso... E depois volte conosco para casa e fique lá. Está na hora de crescer, Ronald, e cumprir com suas responsabilidades. Sua família e amigos precisam de você.


- Não em Camelot, não peça para ficar aqui – suplicou.


- Então abandone seu rei, jogue fora a lealdade e amizade que tiveram por tanto tempo. É sua decisão.



Sem esperar resposta seu pai saiu do quarto.



Harry sabia que em algumas horas se casaria. Estava ciente daquilo. Afinal fora ele quem decidiria que seria em algumas horas... Ele decidia tudo. As vidas de milhares de pessoas estavam em suas mãos, dependendo dele. Exceto a vida de uma.


Gina.


Quando se tratava dela, o que ele pensava, o que queria, o que precisava, não fazia diferença alguma. Ela tomava suas próprias decisões, fazia o que bem entendia e Harry era incapaz de fazer algo sobre aquilo. O máximo que conseguia era admirá-la por tudo. Não se curvava para ele, não o tratava como um principezinho sem experiência. Ela era livre e amava-a por isso.


Não sabia quando exatamente começara sentir aquilo. Por muito tempo sonhou com a ruiva sem rosto definido que vira no meio de uma das tantas batalhas que lutaram juntos sem saber. E quando finalmente descobriu sua identidade, o que antes era quase irreal como uma fantasia, se tornou verdadeiro e próximo. Ele podia tocá-la. Podia sentir seu cabelo, tocar seus lábios...


Por que não sentia o mesmo por Hermione? Era seu dever casar-se com ela e estar apaixonado, mas não estava.


Era um tolo... Pela viagem inteira para Camelot só conseguiu pensar em Gina nos braços de Malfoy, rindo com ele. Estava furioso, com ciúmes e frustrado por estar de mãos atadas, afinal a escolha foi dela e não havia nada que podia fazer.



Em uma tentativa estúpida de se libertar do feitiço que ela lhe lançou marcou o casamento, mas mesmo assim a encarou todo o jantar, procurando achar alguma faísca de esperança de que a notícia a deixou perturbada... Ao invés, descobriu naquela manhã que Lorde Arthur havia dado sua mão para Malfoy.


Como desejava não ser rei. Daquela forma poderia duelar contra Malfoy e cortar sua cabeça sem se preocupar com responsabilidades, alianças e repercussões.


Soltou um longo suspirou, sabendo que aqueles pensamentos era inúteis, as escolhas haviam sido feitas e era tarde demais para voltar atrás. Sua obrigação agora era fazer Hermione feliz e restaurar o reino.



Fitava seu vestido branco intensamente, mal acreditando que realmente o estava usando. Era surreal depois de tanto tempo e mudanças. Estava realmente acontecendo? Esperava que não.


Finalmente se encontrava sozinha, deixada pela mãe e pelas damas de companhia que ajudaram-na a se vestir, e voltara exatamente para onde estivera desde que Harry anunciara o casamento: em estado de choque.


Não estava esperando que acontecesse tão rapidamente, pensava que demoraria pelo menos alguns meses, até que juntos tomassem a decisão de se casarem... A última coisa que esperava era que Harry se levantasse daquela forma e sem nem mesmo perguntá-la decidisse a data do casamento... Na verdade, a última coisa que se passava em sua mente há vários dias era casar-se com ele. Só conseguia pensar em Ron. Tentou lutar contra isso, mas era inútil. Uma batalha perdida.


Estava feliz que Harry ganhara e voltara em segurança, que seus pais estavam vivos e próximos dela outra vez, mas ver Ron sair da mesa da festa ao ouvir que ela e Harry se casariam no dia seguinte a marcou muito mais. Como queria ter ido atrás dele e dito que tudo ficaria bem... Mas estava presa a responsabilidades e promessas antigas.



Sabia que naquele momento Ron provavelmente estaria indo embora de Camelot, ou talvez já estivesse bem longe dali... E não poder se despedir, beijá-lo uma última vez a estava destruindo. Provavelmente nunca mais o veria.


Tentou não chorar, não molhar o vestido. A qualquer momento alguém voltaria para ver como ela estava e encontrá-la chorando não seria bem visto, deveria ser o dia mais feliz de sua vida e só conseguia se sentir miserável.


Colocou a mão no rosto e respirou fundo, procurando controle e frieza onde reinava a tristeza.


A porta de seu quarto abriu.


- Está pronta?



Foi um lindo casamento. Havia flores espalhadas pelo castelo inteiro, pessoas alegres e música animada. Todos de Camelot foram convidados e o salão do trono ficou tão lotado que muitos tiveram que esperar no pátio para poderem finalmente ver o casal real.


A cerimônia foi especialmente bonita, todos em seus melhores trajes e a noiva com um lindo vestido, que de nada combinava com seu rostinho sério. Apesar do noivo ter um belo sorriso estampado na face, seus olhos atravessaram várias vezes o salão em busca de algo que com certeza não era sua noiva tristonha. A coroa lhe pesava na cabeça... O que era ótimo, pois não estaria com ele por muito tempo.


Os convidados em sua maioria estavam felizes com a união e tinham esperanças que tudo daria certo a partir daquele momento. Mas não um certo ruivo posicionado sobriamente ao lado dos pais debilitados. Ah sim, Ronald não estava nada feliz e não fez esforço para esconder a amargura. Faltava apenas protestar na frente de todos que a noiva era sua e não de Potter.



Sua mãe mal vestida segurava a mão do marido na tentativa fútil de dar lhe forças... Pobrezinha, não tinha noção que a quantidade de veneno que fluía no corpo do homem estava além da capacidade de qualquer um curar... Mas quem mandava confiar demais em seus criados?


Por último, reparou na ingênua Ginevra, também para ao lado dos pais, esta não estava prestando atenção na cerimônia e tinha olhos apenas para alguém bem diferente do rei e rainha.


Narcissa se virou para o filho, sorrindo abertamente.


- Que casamento lindo, não Draco? – sussurrou em seu ouvido discretamente. – E pensar que seu pai queria matá-la.


Draco não respondeu, ultimamente estava calado demais, então resolveu insistir. Odiava quando não lhe davam atenção.


- A sua noiva está adorável. No entanto poderia ser um pouco mais discreta, não pára de olhar em sua direção. Mas não se preocupe, vou ensiná-la direitinho como se portar de forma apropriada.


Draco abriu um sorriso curto e respondeu em igual voz baixa.


- Você pode tentar, mas duvido que ela vai se deixar ser domada.


- Parece que não conhece a mãe que tem, querido.



Ah sim... Ginevrinha seria a perfeita rainha domada. A única mulher com poder ali seria Narcissa.


N/A: Desculpe a demora, fiquei muito tempo sem inspiração. Próximo capítulo é o último... Preparem-se para o grande Big Bang. Thanks Lucy por betar!


ATENÇÃO eu não me dou muito bem com o Floreios e Borrões, portanto atualizo em primeiro lugar e com muito mais freqüência no Fanfiction.net, se você quiser acompanhar as atualizações entre no meu profile lá: www.fanfiction.net/~scila

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