Prólogo



Londres, Maio de 1440

— Não, não vou matar a jovem, se é isso que você está me pedindo. Não sei se lhe disseram, mas eu não costumo violentar mulheres.

— Claro que não — garantiu imediatamente Sir Draco Malfoy, no intuito de tranqüilizar seu convidado — Você enten­deu tudo errado. Eu amo Hermione, e ela nutre o mesmo amor por mim. Jamais gostaria que qualquer coisa de ruim lhe acon­tecesse. Quero apenas mantê-la a salvo até que a família con­corde com o nosso casamento. Ninguém falou em morte.

Sir Draco olhou para os inúmeros vilões depravados da taverna, torcendo para conseguir resolver logo aquele assunto. Não lhe agradava nem um pouco ficar naquele lugar sombrio. O Black Raven não era o tipo de estabelecimento que costumava freqüentar. Entretanto, era o antro favorito de ladrões, prosti­tutas e assassinos, que se reuniam para beber e jogar, enquanto esperavam por alguma oportunidade para fazer serviços sujos. Em troca de dinheiro, claro.

Tirando um elegante lenço de seda do bolso de sua túnica, ele limpou o suor da testa antes de se voltar para o homem sentado à sua frente. Diferentemente de Sir Draco, o sujeito mostrava-se bastante confortável em meio àquele tipo de gente.

— Contra a vontade dela, você está insinuando — deduziu o bandido, colocando a caneca em cima da mesa com movimentos lentos e comedidos — Uma mulher apaixonada seria capaz de se esconder até da própria família para conseguir se casar com o homem dos seus sonhos. Eu o admiro por ser tão amado por uma mulher, mas existe mesmo a necessidade de trancafiá-la?

Sir Draco estudou aquele homem com cuidado. Harry Potter era famoso pela grandeza de seu caráter quando se tra­tava de negócios, uma pessoa a quem se podia confiar tarefas das mais sigilosas em troca de uma boa gratificação em dinhei­ro. Por outro lado, também era conhecido pelo tipo de trabalho que aceitava. Furtava, roubava e lutava contra quem fosse pre­ciso, mas se recusava terminantemente a prejudicar o sexo oposto. O que era de se admirar, pois Potter era um homem muito bonito, e as mulheres, jovens e velhas, casadas e soltei­ras, puras e impuras, não hesitavam em se jogar nos braços dele. Tal adoração era recompensada com igual estima, em es­pecial no que dizia respeito à parte física.

Diziam os rumores que, em seus vinte e nove anos de idade, Harry Potter tinha se deitado com mais mulheres do que a maioria dos homens podia esperar simplesmente conhecer durante toda uma vida. Não, ele jamais prejudicaria uma mu­lher, nem mesmo em troca de uma fortuna em ouro. Sir Draco sabia que precisava encontrar a maneira certa de convencer aquele homem da veracidade de suas intenções.

— A família da jovem nos separa — falou ele, inclinando o corpo para a frente — E é o que a impede de se entregar a mim. Não é nada fácil entrar para uma família tão tradicional quanto a dos Granger. Além disso, ela não tem coragem de abandonar os parentes por acreditar que eles não sobreviverão sem seus cuidados. E também teme morrer caso os abandone.

— Morrer? — perguntou Harry Potter, cheio de suspei­tas — Como assim? Está insinuando que eles teriam coragem de matá-la se ela se casasse com você em segredo?

Sir Draco suspirou e balançou à cabeça em sinal de concor­dância.

— E o que Hermione acha, por mais que eu me esforce para lhe provar o contrário. Os Granger já lhe escolheram um pre­tendente e não permitem que nós nos encontremos ou conver­semos. Mas nosso amor é tão grande que ela se opôs à resolução da família de casá-la com um estranho.

— Não me parece uma boa decisão vocês manterem um ro­mance em segredo — comentou Harry Potter, tomando mais um gole de sua bebida — Principalmente por a família ter recusado seus galanteios.

— Você não entende! Eles só não me entregaram a mão de Hermione porque eu ainda não recebi a minha herança. Todavia, meu tio, o duque d'Burdeux, está muito doente e não lhe resta muito mais tempo. Ele me chamou na Normandia para lhe fazer companhia nesses últimos momentos. E quando eu receber o título e as terras que me são de direito, tenho certeza de que os Granger concordarão com o nosso casamento.

— E por que não tenta dizer tudo isso a eles? — sugeriu Harry — Peça-lhes para esperar um pouco. Não vejo motivos para você raptar a jovem e mantê-la prisioneira. Ela não recu­sou o pedido do outro homem? Não faltam apenas algumas se­manas para você alcançar seus objetivos? Para que a pressa?

— A família de Hermione a obrigará a se casar com esse outro homem — insistiu Sir Draco — Você nem imagina como eles são. A pobrezinha morre de medo do irmão e dos tios, e eu não consigo convencê-la de que posso lhe oferecer segurança. Nin­guém saberá por onde começar a procurá-la quando você a levar daqui.

— Se eu a levar — corrigiu Harry, levantando a mão direita para chamar uma das garçonetes para encher sua caneca mais uma vez. A jovem, como todas as outras mulheres da taverna, não tinha tirado os olhos dele e correu para atendê-lo. Como recompensa, recebeu um sorriso preguiçoso e um afago em seu amplo quadril, o que quase a fez derrubar a pesada jarra que carregava.

Sir Draco sentiu um embrulho no estômago ao testemunhar aquela cena. Harry Potter provavelmente levaria a mulher para um dos quartos do andar de cima tão logo a conversa de negócios terminasse. Como alguém em sã consciência poderia se deitar com uma mulher daquele tipo?

— Você ainda não me explicou por que a sua amada precisa ser capturada contra a própria vontade — insistiu Harry, as­sim que a jovem desapareceu. — Se eu disser à Srta. Granger que recebi a incumbência de levá-la a um lugar seguro, ela concordará na mesma hora, se tudo que você me contou real­mente for verdade.

Sir Draco franziu a testa sem tirar os olhos do homem à sua frente.

— Está me chamando de mentiroso?

— De forma alguma — respondeu ele, sem vacilar, em tom irônico — E você, acha que sou tonto? Só um completo idiota aceitaria essa história sem discutir. Quero saber quais são os verdadeiros motivos para você manter essa mulher em cativeiro.

— Eu já lhe disse que Hermione morre de medo da família — repetiu Sir Draco, lutando para conter a raiva diante de tama­nha insolência. — Mesmo que você lhe diga que a está levando a mando de Sir. Draco Malfoy, ela nunca acreditará que ficará a salvo dos parentes. Todavia, devo admitir que existe outra razão. Hermione está… digamos que esteja em busca de algo.

— Em busca de algo? — repetiu Harry, nem um pouco sur­preso. A história não era tão simples quanto parecia.

— Sim. A família dela, o clã Granger, é galesa e tem como ancestrais uma nobre linhagem celta. É o grande orgulho de todos, mas eles são fiéis a muitas crenças antigas, por mais estranhas e profanas que possam parecer. O chefe da família, Albus Dumbledore Granger , tio de Hermione, alega possuir certos poderes. — Sir Draco aproximou-se do outro homem e baixou um pouco a voz. — Poderes místicos, se é que você me entende.

Harry Potter não se impressionou com o comentário.

— E ele possui mesmo esses poderes?

— Claro que não! — respondeu Sir Draco, de certa forma frustrado. — Dizem que o homem é meio louco. Na verdade, todos são um pouco esquisitos, os tios e tias de Hermione. Ela é a única pessoa normal daquela família, apesar de insistir em recuperar a Pedra Greth. Daria, inclusive, a vida em troca da Pedra.

— Pedra Greth? — repetiu Harry. — Greth é uma palavra antiga para "graça", não é?

— Sim, e é exatamente o que significa. Pedra da Graça. Tra­ta-se de um anel que pertence aos Granger há muitas gerações. É uma linda jóia com uma grande safira azul-escura no centro. Eu mesmo já vi anéis bem mais bonitos e valiosos, mas eles insistem em dizer que a Pedra da Graça possui poderes espe­ciais. É tanta tolice junta…

Sir Draco limpou mais uma vez o suor da testa.

— A jóia foi roubada da família alguns meses atrás por um sujeito chamado Caswallan e levada de volta para Gales. Hermione está determinada a encontrar esse homem e recuperar o anel, mas ninguém nunca mais soube dele. Ninguém sabe onde se escondeu, ou o que fez com o anel. E uma busca sem sentido, além de perigosa, porém nada tira a idéia da cabeça dela. E eu me sinto na obrigação de manter a minha amada a salvo. Con­tudo, confesso que Hermione não aprovará a minha maneira de conduzir essa história.

Depois de esvaziar a caneca pela terceira vez desde que che­gara ao Black Raven, Harry Potter colocou-a de lado. Então limpou a boca com a manga da camisa.

— Pois bem. Você quer que eu capture a Srta. Granger e a leve para…

— Para uma pequena fortaleza que mantenho em York. Está desabitada há anos, mas é sólida o suficiente para que minha Hermione fique bem e segura. Além do mais, a família dela jamais a encontrará ali.

— E eu devo manter a jovem nessa fortaleza contra a própria vontade, apesar do sofrimento que a família enfrentará? Até quando?

— Até que eu possa ir buscá-la — respondeu Sir Draco — Serão somente alguns meses, talvez semanas, pois o estado de saúde do meu tio não é nada animador. Ele está nas últimas. Você terá ouro suficiente para se manter durante um ano in­teiro, se for o caso, oferecendo o máximo de conforto a Hermione.

Olhando ao redor da taverna para ver se alguém acompa­nhava seus movimentos, Sir Draco enfiou a mão no bolso da túnica e pegou uma pequena sacola de couro.

— Como você pode perceber, eu já vim preparado para o primeiro pagamento. Cinqüenta moedas de ouro agora, cin­qüenta no dia em que você capturar Hermione, e mais cem quando eu for buscá-la.

Sir Draco esperava que Harry Potter no mínimo arregalasse os olhos diante da chance de receber tanto dinheiro, mas ele continuou imóvel.

— Um ano é tempo demais para manter uma mulher presa, independentemente da quantia de dinheiro envolvida. Na ver­dade, acho que uma atitude dessas é um pouco exagerada. Essa família deve ser estranha mesmo para não querer esperar al­gumas semanas até você se tornar um pretendente à altura da Srta. Granger, após a morte de seu tio.

— Como eu lhe disse antes, eles são meio loucos — falou Sir. Draco, começando a demonstrar sinais de desespero. Se aquele homem não aceitasse seqüestrar Hermione, ele teria de encontrar alguém bem menos decente. E a idéia de ter outra experiência naquele lugar não o agradava nem um pouco — Até Sir Daman, o irmão dela, é um lunático. Ele tentou me matar duas vezes, simplesmente por ter me encontrado es­condido com Hermione.

As últimas palavras despertaram a atenção de Harry.

— Sir Daman Granger? Ele é irmão de sua amada?

— Sim. Você o conhece?

— De certa forma. — O sorriso nos lábios de Harry Potter aos poucos foi se tornando felino. — Então é a irmã dele que devo seqüestrar? De repente ficou bem claro por que você não quer essa responsabilidade. Daman matará o homem que en­costar um só dedo na irmã. Ou que ouse fazê-lo.

Ele deu uma sonora risada, deixando Sir Draco arrepiado.

— Por que não mencionou o nome dele antes? Nosso negócio se resolveria bem mais depressa.

Inclinando-se para a frente, Harry tirou a bolsa de couro das mãos trêmulas do outro homem.

— Decidi aceitar o serviço. Mas será rápido, ainda esta se­mana. Meu criado, Ronald Weasley, lhe informará o dia. Deixe a segunda parcela preparada, conforme o combinado, e dê-lhe in­dicações sobre a localidade de sua fortaleza em York. Se tudo sair de acordo com os meus planos, a Srta. Granger estará confinada em menos de quinze dias.


Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.