De como eles correram contra o



Capítulo 4 – De como eles correram contra o tempo

Ao chegarem ao hospital, Ronald desceu do carro e ficou observando ela sair, atravessando a porta sem precisar abri-la. Entraram e se dirigiram para a área onde se localizavam os quartos dos pacientes. Ao entrar no longo e muito claro corredor, os olhos castanhos da morena brilharam de reconhecimento:

- Eu já estive nesse lugar! Sim, eu já estive aqui! Venha, Ronald, venha!

Ela começou a correr e ele permaneceu em seus calcanhares, prestando atenção em tudo o que ela dizia:

- Eu trabalhava aqui, Ronald! Sim, eu trabalhava, tenho certeza! Aqui é a sala de Angelina, ela era minha coordenadora, como estará? E ali, na recepção, temos a sorridente Minerva, oh, como ela consegue continuar sempre com o mesmo rosto? Está tão velhinha já, trabalhou a vida inteira neste hospital e tem tantas histórias para contar! E, olhe só, Ronald, bem ali, naquela sala de aspecto importante, é o lugar onde trabalha o diretor da área de traumatologia, Alvo Dumbledore, um homem muito inteligente, mas também exigente, você não tem idéia e...

Eles tinham parado diante da recepção e Ronald sorria enquanto ouvia ela descrever o lugar. A recepcionista, Minerva, parecia um tanto confusa enquanto observava o rapaz ruivo, que olhava para o lado oposto ao dela. Atentando para esse fato, Ronald pigarreou antes de dizer:

- Hã... bem... eu vim visitar uma paciente.

- Sim, senhor...

- Ronald Weasley.

- Ok, senhor Weasley. Pode me informar o número do quarto e o nome da paciente?

- Claro. Quarto número 713, Hermione Granger.

Ao pronunciar o nome dela, o rosto de Hermione se iluminou, abrindo-se num sorriso de contentamento muito bonito:

- Eu me lembro, Ronald! Eu me lembro! – disse ela, enquanto dava pulinhos e continuava observando tudo ao redor.

No entanto, a animação de Hermione não conseguiu contagiar Ronald, porque era completamente oposta à expressão registrada no rosto de Minerva, que tinha adquirido uma feição dura e amarga.

- Só um momento, senhor. Vou chamar a coordenadora do centro de traumatologia, senhorita Angelina Johnson.

- Hermione... Hermione! – ele tentava chamá-la, enquanto tudo o que ela conseguia fazer era pular e dizer “eu me lembro, eu me lembro”, até que se deu conta de que ele queria dizer algo e fixou os olhos nele. – Acho que tem alguma coisa errada aqui.

- Não! Não tem nada errado, eu me lembro e... – então Hermione passou a pensar racionalmente. Se ela se lembrava de trabalhar ali, por que se encontrava fora de seu corpo então? Onde estaria? O que teria acontecido a ela?

E foi como se um clarão repentino tivesse iluminado sua mente e a fizesse enxergar. Angelina chegou no momento em que Hermione ia começar a falar, dirigindo-se a Ronald com o olhar entristecido:

- Você é alguma coisa da paciente? Parente ou algo assim?

- Er... eu sou... bem... namorado dela – Ronald não conseguiu pensar em mais nada para dizer, e sentiu suas orelhas ficarem bastante quentes enquanto registrava a expressão de descrença da mulher diante de si.

- Namorado? Hermione não nos contou que estava namorando – disse, enquanto o conduzia pelo ombro para o fundo do corredor, ambos sendo seguidos de perto pela morena. – Na verdade, ela não era o tipo de pessoa muito sociável. Era uma menina adorável, claro, sempre muito esforçada, estudiosa e extremamente inteligente. Mas nós dizíamos que ela deveria sair mais, largar um pouco os livros, entende? Fico feliz em saber que ela conseguiu aproveitar a vida antes de lhe acontecer essa tragédia.

- Mas o que foi que aconteceu exatamente a ela? – perguntou Ronald, tentando parecer natural no papel de um namorado que não sabia que a parceira tinha sofrido um acidente.

- Ah! Você não soube? Pobrezinho, meu rapaz. Foi um acidente de carro. Um caminhão bateu de frente com o automóvel dela quando saía daqui. Tinha feito um plantão de 48 horas e acabado de receber uma promoção. Achamos que estava um pouco agitada demais e desatenta no momento do acidente. Está em coma desde esse dia, já faz mais de três meses.

Ronald pôde notar que os olhos de Hermione estavam marejados pelas lágrimas e que ela engolia em seco com mais ênfase do que seria necessário. Angelina mostrou o quarto e disse que os deixaria sozinhos por uns instantes, para que pudessem se despedir. Ronald registrou a palavra e a questionou:

- Como assim, nos despedir? Talvez ela saia do coma, não é mesmo?

- Na verdade não. Os pais dela autorizaram que desliguemos os aparelhos que a mantêm viva. O médico responsável pelo caso, o doutor Draco Malfoy, acha que ela não tem mais chances de voltar. O procedimento será realizado amanhã de manhã.

Ronald assentiu enquanto se esforçava para manter o controle. As lágrimas nos olhos de Hermione se transformarem em fúria reprimida. Quando Angelina abandonou o quarto, como se fosse necessário esperar que ela saísse, a morena explodiu toda a sua revolta, falando e caminhando pelo cubículo sem parar:

- Draco Malfoy! Claro, só podia ser aquele loiro metido a besta! Ele queria minha posição, eu fui promovida a assessora de Angelina no lugar dele. Ora, isso é golpe baixo, Ronald! Ele convenceu meus pais porque quer me ver fora do caminho!

Ronald estava ligeiramente incomodado com a perspectiva de conversar com o espírito daquela mulher enquanto seu corpo jazia na cama, respirando com a ajuda de aparelhos, tão frágil e desprotegido. Não combinava com a figura determinada que caminhava diante dele e distribuía impropérios ao doutor Malfoy. Ronald se aproximou em silêncio de um lado da cama, enquanto ela observava a si mesma do outro. Sem conseguir se conter, ele tocou a pálida pele do rosto dela. Hermione se sobressaltou e parou de falar no mesmo instante, a expressão tomada de susto:

- Eu pude sentir você me tocar! – ela levou a mão ao próprio rosto, no lugar onde ele havia tocado. Sem perceber, sua voz assumiu um tom de necessidade quando ela pediu - Faz de novo?

E ele correu a mão delicadamente pelo rosto dela, enquanto Hermione fechava os olhos e deixava um tímido sorriso brincar em seus lábios. O coração de Ronald estava aos pedaços. Ela não estava morta ainda, mas se eles não fizessem alguma coisa bem rápido, não seria possível reverter o fato de que eles fariam parte de dois mundos completamente diferentes, que não poderiam nunca se tocar de verdade. Era uma corrida contra o tempo, que Ronald se sentia absolutamente disposto a enfrentar. Mas não sabia ainda qual era o ponto de partida.

Foi quando um barulho na porta fez com que ele se sobressaltasse. Angelina entrou, sorrindo bondosamente:

- Com sua licença, senhor Weasley, os pais de Hermione estão aqui e gostariam de conhecê-lo.

Pela segunda vez naquela tarde, as orelhas de Ronald ficaram muito quentes e vermelhas. Ele sorriu, sem graça, enquanto o senhor e a senhora Granger adentravam o quarto de hospital. A mãe de Hermione era uma versão mais velha da filha, os mesmos cabelos fofos e castanhos emoldurando seu rosto de traço fino e delicado, já tomado em alguns pontos pelas marcas produzidas pela passagem do tempo. O senhor Granger era um homem alto e magro, com cabelos loiro-escuros que já começavam a rarear. Ambos tinham a mesma expressão de tristeza e conformidade nos rostos quando cumprimentaram Ronald.

- Olá, meu jovem rapaz... – disse o senhor Granger. – Fico feliz de saber que nossa menina estava, enfim, procurando fazer outras coisas que não só estudar e trabalhar.

- Nossa pequena Mione sempre foi muito inteligente. Mas achamos que ela deixou algumas coisas para trás ao se concentrar somente nos estudos durante toda a sua vida. Nunca teve um único namoradinho... a não ser você, é claro.

Ronald não sabia onde, mas definitivamente gostaria de poder se esconder. Com a mão nos bolsos, balançava ligeiramente as pernas enquanto escutava a conversa dos Granger e olhava para Hermione, a preocupação crescendo em seu peito frente às lágrimas que ela derramava. Ver a morena chorar deu um novo ímpeto a Ronald, a necessidade e a força de fazer alguma coisa ficando ainda mais latente. Era tudo ou nada, e ele estava decidido a não perder:

- Vocês não podem desligar os aparelhos. Ela está ao meu lado, foi por isso que eu vim até aqui.

Hermione reprimiu um soluço e olhou para Ronald estupefata:

- O que é que você está fazendo?

- Deixa comigo, Hermione – ele disse, fazendo com que os pais dela assumissem uma expressão ligeiramente assustada. Ele se dirigiu para ambos novamente – A filha de vocês está do meu lado e ela diz que vocês precisam dar uma nova chance a ela. Vocês não podem deixar que o doutor Malfoy desligue os aparelhos.

Primeiro Hermione ficou chocada. Depois, começou a achar que talvez a idéia pudesse surtir algum efeito. Os pais dela olhavam boquiabertos da cama onde estava o corpo da filha para os olhos determinados de Ronald. Porém, ele vacilou no momento em que a porta se abriu e a coordenadora Angelina entrou, acompanhada de ninguém menos que o doutor Draco Malfoy. Revoltada e esquecida de sua condição semi-morta, Hermione rumou para ele e deu-lhe um soco no rosto, que obviamente não produziu o efeito esperado. Ela se desequilibrou e atravessou o corpo do médico. Sem conseguir se deter, atravessou a parede e sumiu, enquanto Ronald registrou um pequeno estremecimento no corpo do doutor. Mas ele rapidamente se recompôs e disse:

- Agora é necessário que vocês deixem o quarto. Preciso prepará-la para amanhã.

- Você não pode fazer isso! – Ronald disse, o tom de voz pouco educado. O médico virou a cabeça em sua direção, fazendo um gesto com as mãos como se tentasse espantar uma mosca que o estava atrapalhando. Quando encarou Ronald, observou seu suéter de família, as jeans e o blusão velhos e os cabelos completamente despenteados. Então, o doutor Malfoy assumiu um ar de desdém ao questionar:

- Quem é você?

- Eu sou o namorado dela – disse Ronald, dessa vez com firmeza na voz, sem se importar com o fato de que era esquadrinhado pelo olhar de censura do médico.

- Namorado não é considerado da família – disse o doutor Malfoy com um ligeiro ar de vitória, enquanto posicionava um aparelho no braço de Hermione para medir a pressão. – E, além disso, os pais dela já autorizaram que desliguemos tudo. Agora, preciso fazer o meu trabalho. Se puderem sair, eu agradeço.

E, sem que desse tempo a Ronald para protestar, o médico lhes abriu a porta do quarto. Ronald saiu, absolutamente irritado. Virou-se para o senhor e a senhora Granger, que pareciam julgá-lo um maluco, mas estavam bastante receosos. O senhor Granger começou:

- Filho, nós sabemos o quanto deve ser difícil para você, mas o doutor Malfoy já disse que não há solução! Precisamos acabar com esse sofrimento.

- Se vocês acreditam nesse metido, tudo bem. Mas saibam que não vou ficar parado – e avistou Hermione, passando cabisbaixa pelo corredor – Vamos, Hermione, a gente vai dar um jeito nisso.

A morena o seguiu, e ambos deixaram para trás o senhor e a senhora Granger, bastante perturbados com as colocações de Ronald, mas sem coragem para voltar atrás na decisão que tomaram.

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