Quando menos se espera



Vicky procurou por Mary fora do clube até encontrá-la sentada em um banco debaixo do sol fraco de quase primavera, tentando esquentar as mãos esfregando-as uma nas outras.
- Algo errado, Mary?
Ela levantou o rosto e sorriu para a amiga, de um jeito triste que não era comum dela. Vicky, preocupada, se sentou ao seu lado, dizendo:
- E aquela animação toda de antes? A Mary Ann Weed que eu conheço não desiste de provar a inocência de alguém, ainda mais se for a dela mesma!
- Eu não desisti.
- Então o que aconteceu?
- Sabe, Vicky... Eu realmente gostei do Ryan Hainault.
- Eu sei muito bem disso, sou sua testemunha.
- Até recentemente, eu achava que nunca iria pensar tanto em outro garoto como pensava nele... Mas... hoje, quando eu vi Doumajyd e Sarah juntos... Eu sei que eles estavam tentando descobrir a verdade também, mas... De certa forma, eu me senti mal. Não pela Sarah estar ajudando Doumajyd ao invés de me apoiar, mas... Eu não pude evitar de me sentir magoada por ele estar com outra garota, depois de tudo o que ele disse para mim...
Vicky riu e passou a olhar o movimento da rua, enquanto falava:
- Eu acho que pessoas determinadas demoram mais do que as outras para perceber seus próprios sentimentos.
- Sentimentos?... Meus sentimentos?! – Mary entendeu o que a amiga estava falando – De jeito nenhum! Por ele?! Eu nunca iria... Que droga, Vicky, eu só... É que ele... Ah, esquece!
Vicky riu alto enquanto Mary, constrangida, ficava vermelha até as orelhas. Mas no mesmo instante uma coruja de Hogwarts pousou majestosamente na frente delas e deixou cair um pergaminho. Sem perder tempo, e se aproveitando para fugir da situação, Mary o pegou e o desenrolou o mais rápido que seus dedos gelados permitiam.
- É da Sarah! – o rosto dela se iluminava conforme ia lendo – Ela diz que Doumajyd esta disposto a fazer as pazes comigo e esquecer tudo!... Eu preciso voltar para Hogwarts, Vicky! Avisa o Nissenson para mim?
- Mary, espera!
Mas já era tarde. Antes mesmo de a coruja voltar a levantar vôo, Mary já corria desembalada pelas ruas de Hogsmeade.


***


MacGilleain, totalmente contrariado, ajudava a professora Karoline a limpar a estufa, enquanto ela tagarelava alegremente:
- Humanos são seres terríveis, não? Uns traem os outros... Um homem que eu uma vez amei era conhecido como o homem de duas faces. De dia ele era um trabalhador sério e honesto, mas a noite era um abusado. Uma vez esbarrei com ele em um clube. Estava bêbado e fazendo absurdos que eu não tenho coragem nem de mencionar.
- Mas isso é normal hoje em dia. – comentou MacGilleain levantando as cadeiras e as colocando em cima da mesa – Pessoas que fingem ser o que não são.
- Pode ser, mas não é nada bom para quem confia nessas pessoas... Aquele homem me enganou completamente! E eu era uma garota tão ingênua!...
O dragão a encarou franzindo a testa, como se tentasse imaginar como a professora um dia poderia ter sido ingênua. Mas no mesmo instante ela se atrapalhou em guardar alguns potes de doces no armário e vários deles caíram no chão, praticamente fazendo a limpeza voltar ao zero.
- Aaaaah, não! – exclamou a professora desesperada olhando o estrago de doces nas suas vestes.
- Calma. – ele apressou-se em ajudá-la, tirando do seu bolso um lenço.
- Obrigada, Adam. – agradeceu ela, praticamente fungando como se estivesse a ponto de cair no choro se não fosse socorrida – É difícil encontrar um garoto prestativo como você aqui em Hogwarts...
- Não foi nada. – disse ele pensando se realmente era uma coisa boa ajudá-la tanto e se, eventualmente, não seria requisitado pela professora de forma permanente nas estufas.
Mas no mesmo instante algo caiu de dentro do lenço e chamou a sua atenção. Era um pedaço de pergaminho antigo, com uma folha de maçã colada e toda enfeitada com contas desgastadas. Ele o pegou do chão para analisar-lo melhor.
- É o lenço da amiga chorona de Mary... – ele riu, achando aquilo algo muito sem graça de se guardar em um lenço. – Bem coisa dela... – ele virou o pergaminho para ver o que estava escrito atrás e levou um tremendo susto.
Atrás havia um desenho muito mal feito de um menino com uma expressão brava, e em cima dele, escrito em letras tortas e infantis estava um nome: CHRIS.


***


Como um exemplar estudante atento da Corvinal, Nissenson reconheceu o anel raro no mesmo instante que o bruxo que o usava entrou no clube acompanhando uma bruxa de meia idade, os dois rindo alegremente. Ao olhar bem para ele, Nissenson rapidamente percebeu a semelhança dele com Ryan, assim como Mary havia lhe descrito. Então, sem aviso algum, o dragão saltou da mesa, em que estava cercado de mulheres que protestaram efusivamente. Andou até o bruxo e o puxou pelas vestes, sem ouvir as palavras indignadas dele.
O dragão praticamente o jogou para fora do clube e, quando o bruxo estava se levantando, Nissenson lhe deu um soco certeiro no rosto, que o fez cambalear e cair novamente.
- Muito bem! – Nissenson o pegou pela gola das vestes e o empurrou contra a parede, demonstrando uma força muito além da sua aparência de um menino bonito e estudioso – Estava vendo essa foto?
- O que significa isso?! – ainda protestava o bruxo como se não entendesse o que estava acontecendo.
- Não há dúvidas de que é você nesta foto! Esse anel é a prova!
O bruxo o encarou surpreso, percebendo que não tinha como fugir e que não adiantaria fazer-se de desentendido.
- Quem lhe mandou fazer isso? – Nissenson continuou a inquisição, o prendendo ainda mais forte contra a parede.
- Eu... eu não sei quem ela é realmente! – declarou o bruxo tentando se livrar do sufocamento – Ela vem aqui no clube algumas vezes e me pagou para embebedar uma garota e tirar fotos com ela!
- Mais alguma coisa? – Nissenson o soltou, mas apontou a varinha ameaçadoramente para o nariz dele.
O bruxo escorregou e caiu sentado no chão, tossindo e nem de perto parecendo o bruxo bonito e elegante de momentos antes.
- Ela usa o nome Cherry quando está aqui, mas com certeza é falso. Uma vez, depois de termos planejado o que fazer, e dela ter bebido muito, ela disse que foi colega de classe do D4 no jardim de infância, e que queria se vingar principalmente de Doumajyd. Além disso, a única coisa que eu sei é que ela é uma princesinha rica e abusada que trata os outros como lixo e só pensa nela mesma!
- Mais nada? – Nissenson tirou a varinha do rosto do bruxo, mas permaneceu em posição de ataque.
- Não, é tudo o que eu sei. Eu só fui pago para fazer isso, nada mais.
Nissenson ainda o encarou ameaçadoramente por um tempo, mas ele realmente não parecia saber mais além do que falara.
- Simon!... Quer dizer, Nissenson. – Vicky voltava apressada para a entrada do clube e avistou os dois – Mary voltou para Hogwarts! Doumajyd quer fazer as pazes com ela!
O garoto a encarou incrédulo. Doumajyd não era um ser fácil de se redimir e pedir desculpas.
- Tem certeza disso?
- Sarah enviou uma coruja para ela. – disse a garota se aproximando sem tirar os olhos do bruxo abatido no chão, ainda tentando se recompor.
- Mas... – o dragão tirou algo do seu bolso e o segurou na mão, diante do rosto.
Era uma esfera de cristal, exatamente como a que Doumajyd tinha. A fumaça em espiral dentro dela no mesmo instante tomou a forma de quem estava tentando entrar em contato com ele: MacGilleain.


***


Mary passou pelas portas de entrada de Hogwarts como um raio e seguiu para a direção em que ficava a sala comunal da Sonserina. Sarah a estaria esperando no corredor e iria deixar com que ela entrasse sem problemas para poder falar com Doumajyd. Naquele momento, as preocupações de pouco tempo antes, sobre Sarah e o dragão, sumiram completamente de seus pensamentos.
- Sarah! – exclamou ela assim que avistou a amiga.
- Vem comigo, Mary! – disse a garota feliz – Doumajyd teve que sair por um momento, mas ele já volta. Eu vou levar você até o meu quarto e buscar alguns doces para nós enquanto esperamos por ele, que tal? Assim poderemos conversar melhor.
- Tudo bem.
As duas seguiram furtivamente para o quarto de Sarah, onde a garota deixou Mary esperando a vontade até que voltasse com os doces. A garota sentou na cama, sentindo que agora as coisas voltariam ao normal... Bem, não muito ao normal, mas pelo menos a situação complicada daquelas malditas fotos seria resolvida de uma forma pacífica entre ela e Doumajyd.
Ainda pensando se o obrigaria a pedir perdão de joelhos, Mary começou a reparar o quarto da amiga. Ele era definitivamente o contrário do seu.
Como Hogwarts nunca fora o lugar preferido de Mary, ela não se preocupava em deixar o seu quarto o mais seu possível. Já Sarah não poupara esforços, e nem dinheiro, na decoração. Haviam várias almofadas, enormes ursos de pelúcia rosa, flores, quadros decorativos, a cama e as almofadas estavam forradas com colchas cheia de babados e havia uma estante repleta de livros de romances, não só em inglês mas em francês e várias outras línguas. Foi então que ela reparou que um livro estava aberto em cima da escrivaninha de madeira fina. Parecia um livro de ilustrações e Mary levantou interessada em saber o que a amiga estava vendo nele.
Foi quando se aproximou que Mary percebeu que era um livro de recordações, cheio de fotos de crianças. Ela olhou a primeira página e viu muitos rostinhos felizes. Reconheceu no mesmo instante o uniforme de uma renomada escola bruxa para crianças que ainda não estão em idade para entrar em Hogwarts. Ela olhou para a porta, certificando-se de que Sarah não vinha pelo corredor, e virou a página. Mas dessa vez, sua expressão alegre foi substituída pela de surpresa. Lá estava uma foto de quatro meninos juntos, meninos que ela já tinha visto antes. Eram exatamente os mesmo que ela vira nos porta-retratos de Sharon, antes do natal. Aqueles eram definitivamente o D4. Lá estava Ryan Hainault, rindo sem os dentes da frente. Doumajyd fazendo pose de menino travesso, já demonstrando se achar o dono do mundo. Nissenson com seu ar de o mais inteligente de todos e MacGilleain parecendo se divertir imensamente em fazer poses.
Mary virou mais uma página e levou um tremendo susto. Aquelas eram as páginas centrais do livro, com fotos individuais de todas as crianças anteriores. Mas uma delas estava totalmente destruída, como se alguém a tivesse riscado com a ponta de uma faca. Em baixo dela, ainda eram visíveis as inscrições que indicavam quem era a criança: Christopher Doumajyd.
- Antigas recordações, nem sempre são alegres, não? – disse uma voz carregada atrás dela.
Mary se virou e ficou chocada ao ver Sarah parada na porta, carregando uma bandeja com chá e doces, olhando-a de um jeito sinistro que ela nunca vira antes.


***


Doumajyd estava voltando do seu treino de quadribol quando percebeu que a esfera de cristal em seu bolso começou a esquentar. Imediatamente ele a pegou e a imagem do rosto de Sarah apareceu dentro vidro.
- Obrigado por me acompanhar essa tarde, Doumajyd. Estou imensamente feliz por tudo ter sido esclarecido... Mas eu não imaginava que o grande líder do D4 poderia ser tão facilmente enganado.
Doumajyd a encarou, demonstrando não ter entendido onde ela queria chegar com aquilo:
- Como você conseguiu uma esfera dessas? Elas são exclusivas para o uso da minha família!
- Isso não interessa!... Não percebeu, Chris? – perguntou a garota rindo – As pessoas do clube, do hotel... eles atuaram tão falsamente que eu achei que você já tivesse percebido.
- O que significa isso, maldita?
Diante da ofensa, tanto a expressão de Sarah quanto o seu tom de voz mudaram radicalmente.
- Venha para as antigas salas de aula da masmorra imediatamente! – ordenou ela – Sua querida Weed está esperando por você aqui! Venha sozinho! Sozinho, ouvi bem!
A imagem da se desfez em fumaça e Doumajyd ainda permaneceu um tempo olhando para a esfera. Então, jogando seu bastão longe, ele correu em direção a escola.

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