Quadribol




O céu amanheceu razoavelmente limpo na manhã seguinte.

Harry acordou com um susto, achando que dormira demais e perdera a hora do jogo. Um pouco tonto, cambaleou até as camas dos colegas que estavam no time, despertando-os com vários chacoalhões.

Os batedores, John Taylor e Cael Hunter, ambos do quarto ano, resmungavam mal humorados dando pouca atenção ao sermão pré-jogo de Harry; Rony e Kim Yalle, artilheiro do quinto ano, estavam roncando sobre seus pratos de mingau; Gina lançava olhares assassinos a Harry, sendo furiosamente apoiada pela colega Michelle Willians. Não era exatamente a atitude que o garoto esperava do time poucas horas antes do primeiro jogo da temporada, mas não havia muito o que ele pudesse fazer com relação a isso.

Eles foram os primeiros a tomar café da manhã, mas Harry não achava que estava exagerando. Precisava revisar umas jogadas com os artilheiros, e tinha umas dicas que esquecera de dar a John sobre a pegada dos balaços. O time, no entanto, não estava cooperando, e era óbvio que ninguém estava prestando atenção no que ele estava dizendo.

Poucos minutos depois, o time da Corvinal, sua adversária naquela manhã, chegou no salão principal. Harry lançou um olhar superior ao outro capitão, e com um sorrisinho voltou-se para seus companheiros:

- Eles não podem nos vencer. Simplesmente não tem cacife para tanto. Se nós dermos o nosso melhor, e vamos dar, a vitória será nossa sem muitos problemas.

Mas ele não estava tão confiante quanto tentava se mostrar.

Estivera observando o último treino da Corvinal, e a escalação do time era bastante boa. Um garoto alto do terceiro ano, do qual Harry não sabia o nome, havia se mostrado particularmente perigoso na artilharia. E o apanhador, um moleque esguio do segundo ano que lembrava muito Harry quando tinha essa idade, parecia consideravelmente talentoso. O garoto achava que ele tinha futuro na posição, mas é claro que, ao menos por enquanto, as possibilidades de ele vencer Harry eram muito remotas.

Com todo esse estresse do jogo pesando sobre suas costas, o humor do rapaz não estava dos melhores, de modo que quando Hermione chegou no salão ele lançou a ela um olhar irritado, que a garota talentosamente ignorou. Harry observou-a sentar ao lado de Rony e dar-lhe um beijo rápido nos lábios, deixando o amigo um pouco frustrado. O moreno revirou os olhos, aborrecido com a cena.

- Ok, time - ele disse com falsa animação - Vamos para o campo fazer o aquecimento.

Aos resmungos, os jogadores da Grifinória se levantaram e começaram a rastejar para fora do salão principal sob os olhares e cochichos excitados do time da Corvinal.

- Vamos, Kim! Mova-se, Gina! Cael, você teve tempo o suficiente para comer essa torrada! Agora trate de cair fora daqui! Rony, cadê o Rony, Ro... - Harry estreitou os olhos. Rony estava murmurando qualquer coisa para Mione com um sorriso decididamente bobo no rosto, e a garota ajeitava cuidadosamente a gola da camisa dele. - Hermione! - Harry chamou com um tom visivelmente raivoso.

- Sim? - indagou a garota, lançando um olhar desafiador a ele.

- Faça o favor de parar de distrair o meu goleiro, ou vou achar que você tem um acordo com eles - e indicou a mesa da Corvinal com um aceno de cabeça.

- Não seja idiota, Harry - Rony defendeu a garota, mas Harry fingiu não escutar.

- Esqueça, Rony - Hermione disse, olhando para Harry com irritante superioridade. - É melhor você ir mesmo. - Ela deu um beijo no garoto, e desejou-lhe boa sorte. - E boa sorte para você também - disse para Harry.

O garoto deu um sorrisinho irônico para ela, e empertigou-se.

- Caso você não tenha reparado ainda, se existe algo de que eu não preciso no quadribol é sorte - Harry piscou sarcasticamente para Hermione, e afastou-se com Rony para o campo de quadribol, deixando a garota para trás.

- Harry, cara, você anda muito estressado - Rony disse em tom de brincadeira, enquanto era arrastado pelo amigo através do jardim. Mas estava falando sério.

- Você acha? - perguntou Harry, sem prestar muita atenção no que o ruivo dizia. Estava extremamente aborrecido, o que já não era novidade.

- Acho - Rony falou, tropeçando ao passar pelo portão do campo de quadribol. - E, bem... A Mione concorda comigo. E a Gina também! E...

- Ah, é mesmo, é? - Harry falou com pouco caso, e fez menção de entrar no vestiário, mas Rony o impediu.

Harry virou-se para o amigo, sobrancelha erguida em indagação.

- Nós somos amigos - Rony disse, muito estranhamente sério. - Eu já percebi o que está havendo. Aliás, muita gente já percebeu.

Harry sentiu o sangue congelar nas veias, e o ar deixar os seus pulmões.

- S-sabe? - gaguejou, pálido. Rony fez que sim com a cabeça, e suspirou. - Rony, eu realmente... Eu não... Não sei o que andaram te dizendo, mas eu posso afirmar que não é exatamente assim! Eu nunca... Nunca faria...

Mas, para a surpresa de Harry, o amigo sorriu e deu uns tapinhas amigáveis em seu ombro.

- Tudo bem, Harry - ele disse. - Não precisa ficar com vergonha. Ok, já passou algum tempo, mas você ainda não conseguiu superar a Gina. Eu entendo.

- Eh... O quê? - Harry indagou, atônito.

- É o velho charme Weasley - brincou Rony. - Quem pode resistir?

- Gina - Harry repetiu, sentindo o sangue voltar lentamente a circular pelo seu corpo. - Gina, é claro.

E Harry começou a rir, sentindo-se incrivelmente aliviado. Rony o encarou, aparentemente pouco certo se deveria rir também.

- É, acho que já está na hora de eu dar um basta nessa minha coisa com a Gina - Harry disse, tentando parecer sério. - Mas obrigado pelo apoio, de todo modo.

E entrou no vestiário antes que o garoto pudesse dizer algo mais. Rony o seguiu pouco depois, ainda parecendo confuso. O resto do time já estava lá, acabando de vestir os uniformes.

Enquanto se trocava habilmente, Harry lançou um olhar de esguelha a Gina, imaginando se ela teria colocado essas idéias absurdas na cabeça do amigo. Conhecendo a garota como conhecia, ele sabia que aquilo era bastante típico dela.

Não havia se passado muito tempo e as arquibancadas já estavam tingidas de vermelho e azul. Lufa-lufas e alguns sonserinos também estavam lá para assistir a partida, e Harry sabia que, dessa vez, a Corvinal era a favorita para a vitória no jogo. Mas ele tinha a pretensão de inverter esse quadro durante a partida e mostrar que não estava para brincadeira.

E foi sob um rugido furioso misturando vaia e torcida que os times da Grifinória e da Corvinal entraram em campo naquela manhã. Harry apertou a mão do capitão adversário rapidamente, e com um apito de Madame Hooch a partida começou.

Foi um jogo muito, muito rápido e disputado. Harry quase ficou sem voz de tanto berrar com os companheiros de time e, para o seu desespero, logo nos primeiros dois minutos de jogo a Corvinal marcou seu primeiro gol.

- RONY, VIGIE ESSAS BALIZAS! - Harry urrou, insano, abaixando a cabeça para não tê-la rachada por um balaço.

A partida seguiu, e com um passe estratégico de Kim Gina equilibrou os pontos. Harry percebeu que se ficasse prestando atenção no resto do jogo acabaria perdendo o pomo, e precisou de muito sangue frio para ignorar o que se passava abaixo dele. O molequinho apanhador da Corvinal estava na sua cola o tempo inteiro, e Harry tinha certeza de que ele recebera ordens explícitas para fazer isso.

Não demorou a avistar o pomo próximo às balizas da Corvinal, e disparou num mergulho em linha reta para ele. Foi então que aconteceram várias coisas num espaço de tempo muito curto, e Harry sequer teve tempo de compreender o que se passava: uma luz muito forte ofuscou a visão do rapaz, e ele freou a vassoura de supetão, protegendo os olhos que ardiam com um braço. Com um urro ensurdecedor da torcida da Corvinal, o outro apanhador passou veloz por Harry. O garoto desviou-se do raio de luz e, inclinando-se o máximo que podia na vassoura, emparelhou violentamente com o adversário.

Os outros jogadores simplesmente pararam para ver o que ia acontecer, de modo que quando John e Cael perceberam o balaço que o batedor da Corvinal lançou contra Harry, já era tarde demais. Quando os dedos do garoto se fecharam, vitoriosos, em torno da pequena esfera dourada, ele sentiu a violência do impacto do balaço contra seu rosto.

Atordoado, o sangue jorrando de seu nariz e escorrendo para a sua boca, Harry perdeu o equilíbrio.

Tudo escureceu.

***

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