Capítulo 11



"Uma segunda chance?", Severus perguntou, lentamente, enquanto estreitava os olhos e analisava a questão. "Ora, pra que é que eu ia querer uma segunda chance?"

Avery, Mulciber e Crabbe riram.

"Você devia era agradecer, estamos lhe poupando a humilhação de vir pedir pra andar com a gente outra vez", respondeu o segundo, dando um tapa de camaradagem, visivelmente falso, no ombro de Severus, que deu um pequeno sorriso antes de replicar:

"Garanto a vocês que essa é a última coisa que pretendo fazer na vida", e era notável a forma como ele se sentia seguro ao confrontar os antigos companheiros, cena inimaginável até dois meses antes. Mas Severus estava longe de ser o mesmo, aqueles poucos instantes compartilhando a consciência de seu eu-adulto haviam valido por anos de maturidade. E embora houvesse uma mínima parte dele que temesse uma recaída, ele sustentou o olhar dos colegas, decidido como nunca a evitá-la.

"Ora, vamos", Avery insistiu, sorrindo, insinuante. "Você sempre foi excelente, o melhor de nós, vá lá, em azarações e... bem, você sabe o que mais", ele acrescentou, baixando a voz. Embora a aula de Herbologia já houvesse terminado, a Prof. Sprout costumava ficar ali perto das estufas organizando suas coisas. "Não acredito que simplesmente desistiu!"

Severus sacudiu a cabeça, agora, sério e visivelmente tenso.

"Não. Não estou interessado", disse, dando um ou dois passos para o lado, mas os outros foram mais rápidos e o impediram de ir.

"Não seja ridículo", Mulciber disparou. "Não vale a pena jogar tudo fora por causa daquela sangue-ruim", Severus comprimiu os lábios, procurando se mostrar indiferente. "Você pode ter as duas coisas... é só fazer uma Poção e..."

"Não", Severus o interrompeu, agora, num tom mais alto e insistente. "Saiam da frente."

Os três se entreolharam por um instante, então, se aproximaram ainda mais, ombros tocando ombros, formando uma muralha viva em torno de Snape. E apontaram as varinhas para ele.

"Você devia pensar melhor sobre o assunto", Mulciber insistiu. "A gente até concorda em te dar um tempo pra isso."

"Não preciso pensar pra responder, e a resposta é 'não'", Severus replicou, com ar de desprezo, alcançando a própria varinha.

Mas algo mais havia mudado nele: não sabia se era capaz de usá-la novamente para atacar. O trauma havia sido tão grande que temia que a mínima sensação de ódio e rancor desencadeasse sua queda em direção às Artes das Trevas, outra vez, então, procurava se manter frio, e não demonstrar que hesitava em usar a varinha.

"Severus, Severus", Avery começou, com voz macia, "alguém precisa lhe trazer de volta à razão", no que Snape estendeu o braço direito, tentando afastá-los, não conseguindo, ameaçou:

"Vocês sabem do que sou capaz... saiam da frente, agora, ou vou ser obrigado a azará-los."

"Sim, sabemos perfeitamente do que é capaz", Mulciber concordou, em tom de deboche. "De ficar pendurado de cabeça para baixo, mostrando essas cuecas imundas pra todo mundo..."

"Cale-se", Severus ordenou, em tom baixo, ainda tentando se manter calmo. Era estranho mas nem mesmo a lembrança daquela cena o afetava tanto quanto costumava afetar - o problema era a insistência dos colegas. Temia não ser capaz de resistir por muito tempo mais.

"Vamos deixar bem claro", o outro continuou. "Você vai voltar a andar com a gente, passar aqueles feitiços que você inventa..."

"... e cola, nas provas", Crabbe finalmente abriu a boca. Os outros dois deram pequenos sorrisos debochados, mas não o impediram. E Avery seguiu em frente:

"Não é uma opção."

Severus fez um pequeno som de impaciência, e disse:

"Ora, vamos, não acredito que estejam se humilhando dessa forma, tenham mais dignidade!", enquanto tentava passar pelos Sonserinos, que continuaram impassíveis, e Avery ergueu a varinha alguns centímetros, de forma que ela se encontrava agora apontada diretamente para o rosto de Snape.

"Diga que sim, Severus", ele exigiu.

"Não", o outro replicou, e antes que dissesse qualquer outra coisa foi arremessado de costas contra a parede da estufa, e deixou escapar um lamento de dor.

"Você vai pensar, e vai mudar de idéia", Mulciber exigiu, Severus sorriu, um sorriso terrível, disse 'não', outra vez, e apontou-lhe a varinha, embora, ainda hesitasse em usá-la. E a hesitação custou caro: com as próprias mãos, Crabbe atirou Snape para dentro das estufas, enquanto Avery, de longe e tapando um dos ouvidos com as mãos, arrancou dos vasos todas as mandrágoras quase adultas, que começaram a gritar de forma ensurdecedora no mesmo instante. Então, fecharam a porta com força, e correram, se acabando de rir, na direção do castelo.


*


"Não. Você vai ficar exatamente aí onde está", ela dise, apoiando as mãos com delicadeza sobre o peito dele, para que continuasse deitado.

"Mas não tem necessidade alguma", Severus resmungou. "Estou ótimo. Vou voltar para o meu quarto", anunciou, apoiando-se sobre os cotovelos.

"Não, acho que não, Sr. Snape", anunciou Madame Pomfrey, saindo de sua sala com mais um cálice nas mãos, o quinto, desde que Severus fora encontrado nas estufas, desmaiado, depois de ter derrubado vasos e entrado em contato com pelo menos três tipos de plantas venenosas, atordoado pelo grito das mandrágoras. "Já deixei claro: irá permanecer sob observação até depois de amanhã, pelo menos. Bubotúberas, tentátulos venenosos, mandrágoras, cacos pontiagudos de vasos quebrados... tem sorte de ainda possuir todas as partes de seu corpo!"

Severus bufou, olhando para os braços cobertos por ataduras.

"Beba", a mulher disse, deixando o cálice sob a mesinha ao lado da cama, e retornando para sua sala.

"Vou ficar aqui, Sev. Remus vai quebrar um galho por mim e fazer a ronda dos monitores por nós dois essa noite. Agora, seja bonzinho e bebe isso", Lily disse, alcançando a Poção e estendendo-a para ele.

Contrariado, Severus suspirou, mas não foi capaz de resistir, não quando ela pedia daquela forma carinhosa e aguardava com um pequeno sorriso de incentivo. Levou o cálice à boca, virou-o todo de uma vez e tornou a colocá-lo sobre a mesinha, de má vontade.

"Os três pegaram detenção de uma semana. A cargo de Filch. Tomara que ele pense em alguma coisa bem horrorosa", Lily comentou, aborrecida.

Severus concordou com um aceno de cabeça, mas acrescentou;

"Claro que, depois, eles só vão ficar ainda mais furiosos comigo."

Lily suspirou alto, e seu aborrecimento também cresceu.

"Vê? Eu sempre te falei, eles não são boa coisa. Que tipo de gente teria coragem de atacar um... amigo", ela disse, sem poder conter uma pequena ironia na voz, "só porque ele se recusou a... colaborar?"

Severus comprimiu os lábios, e acabou concordando. E ainda acrescentou:

"Mas eu mudei", e a forma ansiosa como ele olhava para ela, esperando ver em seu rosto qualquer coisa que denunciasse que ela acreditava nele, desarmou-a por completo. Lily sorriu e deu um pequeno aceno com a cabeça, e apertou a mão dele. Ele relaxou e, então, bocejou, cansado, tanto pelo efeito das plantas quanto das poções e contra-venenos que tivera de tomar naquele dia. Lily aconselhou-a a dormir e Severus, ainda que reclamando mais um pouco, acabou fechando os olhos minutos depois e mergulhando em um sono profundo. E nem mesmo adormecido daquela forma ele soltou a mão dela.

Sentada em uma cadeira, Lily curvou-se para a frente, estudando-o, com uma pequena ruga entre as sobrancelhas. Bem, é. Ele repetia sem parar, de forma decidida, que havia mudado. E realmente parecia menos... revoltado e vingativo. Mas ela jamais havia acreditado tanto quanto o fazia naquele momento, quando pensava em tudo o que poderia significar o fato de Severus ter sido covardemente atacado por sua antiga turma. Não havia nada de novo naqueles Sonserinos, continuavam a se divertir azarando qualquer um que fosse menor ou mais fraco. Severus, por sua vez, nunca mais fora visto na companhia deles, e ela se sentia tentada a acreditar completamente no que ele havia dito, que fora procurado para voltar a andar com eles, passar-lhe os feitiços que criava, como sempre havia feito. E se recusado. E mais ainda: denunciado-os (ainda que depois de alguma pressão da parte dela). Sua expressão se tornou séria por um instante, quando ela se recordou de todas as vezes em que ele havia mentido. Ainda tinha algum receio em confiar no amigo de olhos fechados. Mas um sorriso brotou em seus lábios, porque, agora, haviam pequenos indícios de que ele realmente falava a verdade.


*


"E isso é tudo", Lily concluiu, fechando o livro de História da Magia.

Três dias mais tarde, Severus ainda continuava na Ala Hospitalar. O pús das bubotúberas havia penetrado nos cortes em seus braços e se misturado a seu sangue, exigindo mais cuidados do que Madame Pomfrey havia calculado, a princípio. E a contrariedade dele também foi se modificando com o passar dos dias, afinal, a Ala Hospitalar, naquela semana em especial, o possuía como seu único ocupante, sendo um lugar tranquilo e silencioso. E, mais importante ainda, Lily havia se habituado a passar ali todos os dias depois das aulas, jantando com ele e permanecendo até a hora de dormir, a fim de lhe passar as matérias do dia. Deixando seus outros amigos de lado, para ficar ali com ele. É, realmente, não podia achar a situação de todo ruim, Severus pensou, espreguiçando-se. Ajeitou-se sobre os travesseiros fofos, fixando os olhos nela. Lily o fitava com intensidade, com uma expressão quase voraz de curiosidade, e um pequeno sorriso misterioso curvava para cima os cantos de seus lábios. Ela se curvou para a frente, apoiando os cotovelos sobre as cobertas da cama dele, e apoiando o rosto nas mãos, de forma a não perdê-lo de vista nem por um segundo. Tudo parecia estar tão bem, tão calmo entre eles, ela não parecia nem de longe inclinada a deixá-lo, que era seu maior medo desde aquela tarde com o homem. Sequer voltara a brigar com ele, era como se tudo fosse retornando aos primeiros anos de amizade. Sentiu-se relaxar, ao mesmo tempo em que seu coração batia mais rápido e respirava de forma mais acelerada. O paradoxo Lily Evans, fazendo-o se esticar de um extremo a outro, como sempre: relaxado e cheio de energia. Ele mal tomava consciência do largo e oblíquo raio de sol outonal sobre as cobertas, aquecendo suas pernas, ou das ataduras em seus braços, fazendo a pele coçar. Pareciam haver se hipnotizado um ao outro, e só despertaram quando madame Pomfrey surgiu com o que deveria ser o vigésimo cálice de contraveneno dos últimos dias.

Lily se adiantou e, estendendo o braço, apanhou-o.

"Isso não pode ser tão ruim", ela comentou, e depois de dias vendo-o beber o líquido espesso com uma careta, resolveu: "Vamos conferir", e deu um golinho no conteúdo grosso e borbulhante do cálice.

E então, afastou-o de si imediatamente, fazendo uma careta - e fazendo-o sorrir, pela primeira vez em muito tempo. Sorrir e sentir alguma coisa, preocupação, uma parte do medo, talvez, partindo-se dentro de si. E porque sentia-se subitamente muito à vontade com ela, já que não precisava mais, aparentemente, provar que havia mudado, ele disse:

"Não é pra você", e pegou o cálice e o levou aos lábios, e bebeu tudo de uma só vez. "Amargo demais."

Ela riu.

"Tudo bem, Sr. Amargura", disse, revirando os olhos, e então, sorriu carinhosa e significativa para ele. "Mas acho que seria bom um pouco mais de... outros sabores, na sua vida, você não concorda?"

"Talvez", ele disse, baixando a cabeça e deixando os cabelos caírem sobre o rosto. Olhou de lado para ela, por sob os cabelos. Lily continuava fitando-o daquela forma curiosa, ele não conseguia descobrir o porquê, mas não havia raiva ou decepção nos olhos dela, então, não devia ser algo ruim. Uma pequena onda de excitação tomou conta de seu corpo, mas aquilo, também, havia mudado. Ah, ainda a amava, era fato, e havia até mesmo lhe confessado aquilo. Amaria-a para sempre. Mas não sentia mais a necessidade de ser amado de volta - tudo o que importava era tê-la a seu lado, de qualquer maneira com a qual ela concordasse, como amiga, que fosse. Suspirou. Era pessimista demais para confiar por completo no destino mas, pela primeira vez em sua vida, parecia que alguma coisa estava acontecendo da maneira que ele queria.

Madame Pomfrey interrompeu-os outra vez, anunciando que retiraria as ataduras dos braços dele, a fim de examinar os ferimentos. E como estes se encontravam quase que completamente curados, Severus recebeu alta naquele mesmo instante, bem como um grande suprimento de frascos de Poções.

Lily Evans continuou analisando-o com os olhos, cheia de curiosidade e mistério pelas duas semanas que se seguiram.


*


Também naquelas duas semanas, a pressão dos colegas de casa aumentou terrivelmente sobre Severus. Como ele bem havia previsto, o fato de haver denunciado os três colegas, fazendo-os pegar uma suspensão, transformou-o em uma espécie de proscrito em sua Casa, e tornou-o alvo de perseguições e ameaças. Severus ainda hesitava em atacá-los de volta. Sabia que a ira, o desejo de vingança, e de ser superior estavam intimamente ligados ao envolvimento com as Artes das Trevas, de forma que o máximo que fazia era se defender com feitiços mais simples. Mas, na maior parte do tempo, preferia se isolar, longe da Sonserina e, de preferência, longe do castelo, como acontecia naquela noite.

Não era realmente muito difícil escapulir para fora do castelo se um aluno realmente o quisesse fazer. Ele caminhava a esmo há algumas horas, e nem fazia muita idéia de em que ponto, no terreno gigantesco de Hogwarts, se encontrava. A bem da verdade, as luzes de Hogsmeade pareciam bem mais próximas que as do castelo, mas, Severus deu de ombros, o que poderia lhe acontecer, ali? Estava mais seguro fora do que dentro da escola, mesmo que fossem tempos de guerra. Porque ele tinha sua própria guerra pessoal para travar, e tudo o que não dissesse respeito a ela era completamente secundário, e mal lhe despertava a atenção. Mesmo a possibilidade de ser morto ali, por um servidor de Voldermot, ou quem quer que fosse, não lhe punha medo - se aquilo por acaso acontecesse, Lily estaria completamente a salvo, e era o que importava. Lily. Um sorriso ameaçou surgir em seus lábios apenas por estar pensando nela, e tornou-se real quando ele se pôs a recordar as últimas semanas. Estavam se dando tão bem outra vez, e ela havia lhe prometido não abandoná-lo, e ele estava conseguindo resistir...

Um ruído de passos correndo sobre a grama se fez ouvir, interrompendo seus pensamentos. Severus se voltou naquela direção, estreitando os olhos para tentar enxergar melhor, o que não foi difícil, porque uma enorme Lua Cheia surgia lentamente por trás do horizonte.


*


O dia seguinte mal havia começado, um anormalmente claro e ensolarado dia de outono, e o povoado de Hogsmeade já se encontrava movimentado. Pessoas corriam de um lado para o outro, funcionários do Ministério aparatavam e desaparatavam a todo instante, e uma forma que parecia um corpo humano encontrava-se deitada sobre uma maca e coberta por um lençol, junto à porta de uma das casas da rua principal. A notícia não demorou a chegar a Hogwarts: um lobisomem tinha aparecido no povoado na noite anterior.

E deixado uma vítima fatal.


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sem muito a dizer, blablabla, capítulo não ficou muito longo, além de ser aquela coisa de ligação, mas prometo compensar no próximo ;D e preferi não enrolar muito e postar logo, depois de toda a demora. aproveitando,queria agradecer os comentários, torcendo pela minha volta e sentindo falta da fic. tenho que confessar, não sou daquelas autoras que escrevem pra conseguir reviews, mas cada vez que eu ameaçava enrolar pensava nas pessoas aguardando o cap. novo, e me forçava a escrever mais umas linhas que fossem =)

brigada pelos reviews do último capítulo,

espero que gostem, e até o próximo. ;D

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