Argumento convince



Capítulo 7. Argumento convincente

::Marlene::

A cama de Lílian estava toda tomada por enormes mapas coloridos. Ela os observava, falando consigo mesma sem parar, traçando caminhos com um lápis.

- No inverno os ventos do norte podem nos atrapalhar, então é melhor seguirmos pelo centro... - ela resmungava.

Eu e Andy estávamos espalhadas no tapete, cada uma de um lado do tabuleiro. Ela estava me dando uma surra homérica, mas eu pouco me importava. Aine dormia a sono solto na cama, aparentemente ainda sob efeito da poção calmante.

Andy finalmente se cansou do jogo e olhou para toda a atividade de Lílian intrigada.

- O que está fazendo? - indagou.

- Procurando rotas boas para uma rápida viagem a Edimburgo - respondeu ela sem tirar os olhos dos mapas.

Andy ergueu a sobrancelha e engatinhou até a cama de Lílian, olhando com curiosidade os mapas climáticos e de orientação de vôo. Havia até um manual "Como fazer longas viagens de vassoura pela Grã Bretanha sem problemas com os ventos".

- E então? - foi a minha vez de perguntar. - Já achou alguma?

- Não se trata de achar - Lílian fez um movimento de impaciência com as mãos. - Tenho que medir os prós e os contras de cada rota e compará-las até encontrar a melhor.

- Exatamente, prós e contras - falei rindo para Andy.

- Se começarem a me gozar eu paro agora mesmo - ela ameaçou zangada.

- Não estamos te gozando, Lily - interveio Andy. - Estou feliz por você ter concordado.

Ela levantou os olhos dos mapas e olhou para nós emburrada.

- Eu não concordei. Estou fazendo isso como um exercício intelectual - disse ela. - Mas depois que eu terminar é bom que você esteja pronta para me contar o tal plano com todos os detalhes.

Sorri e me levantei do tapete dizendo que ia ao salão principal para buscar algo que Aine pudesse comer quando acordasse antes que os elfos retirassem as mesas. Andy me seguiu com um ar suspeito e, assim que nos vimos num corredor bem distante da torre, ela me fez parar e cochichou:

- Espero que você tenha mesmo um plano.

- Claro que tenho - garanti acenando com a cabeça. - E um plano muito bom. Assim que Lily terminar vamos todas conversar para acertar os detalhes. Depois do jantar tudo vai estar pronto.

- Isto é - ponderou Andy -, se a Lílian concordar...

Mas uma coisa aconteceria naquela noite que faria com que Lílian concordasse comigo, ainda que eu dissesse que iríamos num tapete mágico ilegal.

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::Lily::

- Certo, Potter, eu estou realmente exausta hoje e tenho uma lista enorme de coisas para fazer - falei, dispensando Tiago de sua terceira detenção da semana.

Estava começando a desconfiar de que aqueles castigos cansavam mais a mim que a ele, porque Tiago sempre saia todo cândido e sorridente, fazendo graça comigo, enquanto eu sempre acabava exausta e totalmente furiosa.

Apesar da dispensa, ele largou o pano cheirando a polidor de troféus numa mesa e fixou os olhos em mim, não parecendo nem um pouco inclinado a me dar um pouco de paz.

- Se você não tem mais nada de importante para me dizer, por favor, vá embora - suspirei, começando a juntar livros e pergaminhos para enfiar na mochila. Eu tinha conjurado uma ampla mesa e uma cadeira para ficar estudando enquanto ele polia troféus.

Tiago sorriu de um jeito idiota - como sempre - e continuou parado no meio da sala. Olhava para as paredes como se as esperasse e, ao perceber que eu o observava (não exatamente observava, apenas me distraí divagando sobre o motivo de ele ainda não ter corrido para fazer suas traquinagens noturnas e providenciar uma detenção para o dia seguinte), me lançou um sorriso que me deixou meio desconcertada.

- O que é que você está olhando agora, Potter? - perguntei tentando disfarçar o súbito descontrole, me mantendo concentrada na arrumação da mochila, que se recusava a fechar o zíper por causa do excesso de livros dentro.

- Estou te admirando. E você está olhando o quê? - ele retrucou, inocente.

- Eu não estou olhando nada - falei irritada, tirando vários volumes para reorganizar o interior da mochila.

- Estava sim.

- Ah, por favor! - finalmente a droga do zíper fechou direito e eu joguei a mochila nas costas, sentindo que a má distribuição do peso me fazia ficar levemente inclinada para a esquerda. - Eu não estava olhando para você e tenho mais o que fazer do que ficar aqui discutindo. Potter, você quer ir embora antes que me faça perder a paciência?

- Admita, você não vive sem mim... - Tiago gracejou, me seguindo quando saí da sala dos troféus quase correndo.

- Potter, se você está pensando que esse seu ego imenso aumenta de alguma forma a chance de eu aceitar sair com você, está muito enganado.

- Ah, vamos, Lily - ele insistiu -, o que mais você poderia esperar de um cara, além de tudo o que eu sou?

Eu bufei sem querer nem pensar no que viria a seguir. Estava simplesmente louca pela minha cama macia e quentinha.

- Você quer apostar? – ele perguntou de repente.

- Apostar o quê? - perguntei, só levemente interessada.

- Que nós podemos dar certo se você aceitasse tentar.

- Eu não preciso de tentativa nenhuma para saber quem você é, Tiago Potter.

- Como se você tivesse alguma idéia de quem eu sou - fez ele, falando de um jeito tão ameno que eu quase achei que ele estava lamentando. - Para você eu sou só um estudante mal comportado que te dá trabalho com detenções.

- Não se esqueça do fato de que você também não tem muita consideração por ninguém - acrescentei.

- Eu tenho sim. Tenho muita consideração por muita gente! - exclamou Tiago. Embora eu nunca o tivesse visto realmente bravo, pude adivinhar que a expressão dele naquele momento era de raiva. - E pode ter certeza de que, se você me deixasse tentar, eu teria muita consideração por você. Mas você nunca arrisca, não é mesmo? Você não quer descobrir que está enganada em relação a mim, sempre esteve.

- Não há nada para ser descoberto - protestei.

- Se não há nada, então qual é o problema de arriscar? Se você sabe que está certa, por que não prova isso?

Eu parei de andar e olhei para Potter. Uma sensação meio estranha me atingiu naquele momento, uma espécie de formigamento na altura do estômago e meus joelhos ficaram levemente trêmulos.

- Saia comigo e, se não ficar convencida de que eu sou diferente do que você imagina, nunca mais insisto que faça isso de novo.

- Está bem, se você quer tanto assim sair comigo, vai ter o que quer! – falei, cansada e irritada com tanta insistência, querendo por tudo me livrar dele.

Nesse momento eu devo ter perdido o cérebro. Sabe quando os miolos parecem sair do lugar e você faz uma coisa que nunca pensou em fazer? Foi o que me aconteceu. Quando saí daquele corredor, tudo o que eu queria era enfiar a cabeça num buraco e ficar desaparecida até o Natal.

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::Andy::

- Então você disse que ia sair com ele na véspera de Natal?

Lily apenas confirmou com a cabeça e se deixou cair sobre o travesseiro.

- Você não devia ficar assim, Lily! - protestei. - Que garota não gostaria que Tiago as chamasse para sair tão insistentemente quanto chama você?

- É - Marlene, que nos observava pelo espelho da penteadeira enquanto penteava os longos cabelos negros, concordou comigo. - Você deveria simplesmente aceitar e se livrar disso. Além do mais, não seria nenhum sacrifício, já que, apesar de tudo, ele está realmente bonito esse ano.

- É, eu sei - resmungou Lílian com uma voz abafada. - E isso é o mais irritante. Eu poderia muito bem aceitar e me livrar disso tudo, mas...

- Mas? - indagou Aine.

- Não sei...

- Por que você se importa com tudo isso? - perguntou Marlene, jogando mechas de cabelo no rosto como se experimentasse novos penteados. - Ele vai sair com você uma vez e fim, nem ficar com ele você precisa. A não ser que você não queira isso.

Lily ergueu as costas e mirou McKinnon com estranheza.

- Não queira o quê? - perguntou.

- Que ele saia com você uma vez e fim - respondeu Marlene. - Porque, se for isso, eu vou ter que realmente concordar com o que Remo disse.

- O que Remo disse?

Eu e Aine trocamos olhares confusos, sem saber do que ela falava também.

- Que você gosta do Tiago e por isso está tentando dar um jeito nele antes de ficarem juntos.

Lílian fechou os olhos e escondeu a cabeça nos joelhos, murmurando para nós:

- Vou terminar nosso plano de vôo. Eu definitivamente não quero estar no castelo na véspera de Natal.

Marlene queria iniciar os preparativos para a viagem ainda naquela noite, mas Lílian foi categórica quando disse que ganharíamos mais se dormíssemos.

E, apesar de concordar com ela, eu tinha que admitir que era difícil tentar dormir com tanta excitação no ar. Havia coisas que precisávamos levar na viagem. Eu queria ir direto a Hogsmead escondida para retirar dinheiro da minha conta do Gringotes e comprar mantimentos, mas esqueci do pequeno detalhe de que nenhuma de nós poderia sair da área da escola sem autorização. Não que alguém precisasse saber que tínhamos saído, mas Lily afinal ainda era monitora e ia conter todas as nossas tentativas de violar as regras enquanto pudesse.

- Compraremos o que for necessário antes de irmos, Andy - insistiu ela. - Não estamos com pressa, não é mesmo?

Lílian e Aine pareciam não acreditar que íamos mesmo fugir. Elas tratavam a mim e Marlene, que não parávamos de falar da fuga, com a condescendência com que falariam com loucos varridos.

Na manhã seguinte foram afixadas no mural da sala comunal nossas notas no simulado para os N.I.E.M.'s. Lílian foi a primeira a se aproximar. Estranhamente, ela não fez nenhum comentário sobre a nota que tirara. Em geral, ela nos fazia um discurso sobre tudo o que tinha estudado e a validade do que tinha caído no simulado, quer quiséssemos ou não.

Eu sabia que ela tinha essa atitude por causa do que acontecera na noite anterior - aquilo ainda parecia pesar como chumbo em seus ombros. Lílian não queria de jeito nenhum sair com Tiago na véspera de natal - mas tampouco queria admitir que a solução era fugir com a gente. Por algum motivo, ela não conseguia simplesmente se convencer a cancelar o tal encontro e resolver o problema de vez. Talvez a questão fosse simplesmente o fato de que ela sabia que o que a fizera aceitar aquela aposta sem sentido não havia sido a surpresa ou mesmo perspectiva de fazer um pequeno sacrifício para se livrar de um grande incômodo.

Já Marlene parecia se convencer mais e mais da urgência de partirmos o mais rápido possível. Ela via os olhares assustados de Lily para Tiago quando ele acenava para nós na sala comunal e a forma como fugia da mesa assim que os Marotos se sentavam. Lançava para mim olhares significativos como se dissesse "A melhor coisa que podemos fazer é tirá-la daqui".

Aine nos seguia como um cachorrinho ansioso, arregalando os olhos de pavor sempre que mencionávamos o tal plano. Eu fui incumbida de passar quase toda a manhã com ela no dormitório jogando bexigas, mas Aine nunca se concentrava no jogo, olhando a todo momento para a porta na expectativa de ver Lílian e Marlene, que haviam ido preparar nossos mantimentos. Não era difícil perceber que ela queria muito que algo desse errado e nós não partíssemos nunca.

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