O tempo não pára

O tempo não pára



- Mais um ataque. E, dessa vez, chegou muito perto. - Moody sentenciou, deixando o relatório cair sobre a mesa - Parece-me que agora é oficial. Voldemort está atrás de vocês.

Frank foi o único a demonstrar alguma emoção. O rapaz cruzou os braços, suspirando, enquanto Sirius, Lily e James permaneciam em silêncio.

- Você é a mais visada do grupo, Evans. Você mora sozinha e... e... - o velho auror parecia ter dificuldades em continuar.

- E sou uma mulher. - Lily arqueou a sobrancelha. - Um ser frágil e indefeso que deveria tomar algum juízo, arranjar um marido e dedicar a vida aos seus afazeres domésticos. Obrigada por me lembrar disso. - ela se levantou, dando as costas a Moody.

- Evans, o quê...

- Eu não preciso de proteção, Olho-tonto. Agora, com licença. Estou cansada. Afinal, não é todo dia que se encara face a face o maior bruxo das trevas da atualidade.

Sem esperar por resposta, ela deixou o escritório, pegando o elevador para chegar à área de aparatação. Minutos depois, estava em casa. Deitou-se sem sequer tirar os sapatos.

Fechando os olhos por alguns instantes, ela pode encarar novamente as orbes vermelhas de Voldemort. Podia ver o bruxo erguer a varinha em sua direção. Podia sentir novamente a dor excruciante da maldição imperdoável que ele lançara nela.

Rolou na cama, inquieta. Precisava esquecer... precisava apagar aquele dia da sua cabeça. Mas uma pergunta a impedia de pôr esses pensamentos de lado. Por que ele não a matara?

Levantou-se de um salto e tirou as roupas, que ainda tinham sangue coagulado. Após um demorado banho quente, ela se trocou e aparatou novamente. Para o Caldeirão Furado.




James observou a janela aberta do apartamento de Lily. A cortina branca esvoaçava lentamente. Perdeu-se nessa contemplação até que uma mão delicada puxou a cortina novamente para dentro, fechando a janela em seguida.

Ele imediatamente se levantou, abandonando o café que se tornara seu posto de observação. Pensou em subir para o apartamento dela, mas desistiu. Lily não estaria em casa.

Sentiu um aperto no peito ao se lembrar do corpo inerte da ruiva no chão, diante de Voldemort. Moody tinha razão. O bruxo tinha chegado perto demais. E ele não pudera fazer nada para protegê-la.

Meneou a cabeça, tentando esquecer esse pensamento. Ele não deveria se importar tanto. Ela mesma deixara isso muito claro. Não havia nada entre eles além de luxúria. Mas porque isso não o satisfazia completamente?

Não podia estar novamente apaixonado por ela, não é? Não podia amá-la. Aquilo só traria sofrimento. A ambos.

Suspirando, ele procurou um lugar para aparatar. Sabia exatamente onde Lily estaria aquela noite.




Novembro - 1976

"Eu queria ser capaz de compreender o que eu sinto por você. Se ao menos eu tivesse certeza... As coisas seriam mais fáceis, pois eu saberia o que fazer.

Mas estou perdida - completamente perdida em minhas divagações. Me transformei em uma outra pessoa: não consigo me concentrar, não consigo estudar, não consigo comer, não consigo nem viver! E, quando fecho os olhos (essa é a pior parte), tudo o que vejo é você me beijando...

Como eu reagiria? Nos meus delírios, costumo corresponder fervorosamente aos seus beijos. Na vida real, eu certamente fugiria. Sou uma covarde completamente assumida. E estou enlouquecendo aos poucos por causa disso...

Preciso descobrir o que realmente sinto; se estou apaixonada por você ou se amo uma idéia, uma imagem que projetei em minha mente e a qual emprestei sua aparência.

E, para descobrir isso, receio que eu tenha que me arriscar. E não sei se quero correr esse risco. Não sei se quero me arriscar a descobrir que você não é tudo que eu fantasiei e te magoar ou descobrir que gosto de você exatamente como você é e deixá-lo brincar comigo.

Receio porque sei que, se eu me enganar com você, não serei capaz de me arriscar de novo. Eu posso passar a imagem de uma pessoa toda certinha e decidida, mas você sabe como eu realmente sou. Sabe que minhas emoções estão sempre no limite - o quão intensas elas sempre são. Por isso, se eu ficasse com você, seria por inteiro: corpo, alma e mente. E eu tenho medo disso. Tenho medo de perder o controle. E tenho medo de perder você.

Com todos os diabos... Eu acho que não estou apenas apaixonada. Mas isso não é possível. Somos novos demais, imaturos demais... Eu não posso amar você..."


Lily se levantou, começando a andar de um lado para o outro no dormitório, uma fúria contida martelando-lhe a boca do estômago. Aquilo não era justo. Não podia ser real, não podia...

Com os olhos embaçados, ela puxou para si o pergaminho abandonado sobre a cama e começou a rasgá-lo em mil pedacinhos. Quando já não havia o que despedaçar ou destruir, ela encostou a testa à parede, deixando livres as lágrimas de raiva.

- Não é justo... - ela murmurou, socando a parede com o punho - Não é justo. NÃO - É - JUSTO!

E caindo em um choro compulsivo, ela deixou o corpo escorregar até o chão e abraçou-se pelos joelhos.




Benjamin Fenwick estava no caldeirão Furado com alguns amigos quando ela apareceu à porta. Em silêncio, ele acompanhou a ruiva com o olhar quando ela rumou para uma mesa afastada da balbúrdia do bar e começou a bebericar o whisky de fogo que Tom logo trouxera para ela.

Ele pensou em se juntar a Lily, mas logo afastou essa possibilidade. Ela devia estar esperando alguém. James Potter por certo. Benjamin já os vira juntos no Ministério. E, embora eles estivessem aparentemente distantes, não era difícil perceber os olhares que trocavam.

James era um cara de sorte... Com esse pensamento, ele voltou a se concentrar na conversa com os amigos. Uma hora e meia depois, quando já se aprontavam para ir embora, ele voltou a relancear o olhar sobre o canto que Lily escolhera para se esconder.

Ela ainda estava lá, sozinha. Havia várias garrafas sobre a mesa agora e, pelo brilho sombrio dos olhos verdes, Benjamin teve certeza de que Lily não estava bem. Lembrou-se da notícia que vazara durante a madrugada sobre um ataque perto do Ministério. Houvera uma nota desmentindo a notícia, assinada pela própria ministra.

Talvez aquilo que ele achava que fosse um boato não fosse tão inverídico assim - pensou ao se aproximar da mesa, depois de despedir os amigos, e notar os cortes no rosto e nos braços da ruiva. Os olhos dela o encararam febrilmente quando ele se sentou e ela sorriu.

- Olá, Benji. - Lily cumprimentou com a fala enrolada.

- Lily, o que aconteceu?

A ruivinha virou mais um copo e o encarou.

- Nada. Nada aconteceu. Tudo aconteceu, mas Moody e o Ministério acham mais seguro pretender que nada aconteceu. Então, nada aconteceu. - ela sorriu - Isso não é divertido?

A voz dela soou extremamente amarga e irônica, como ele jamais ouvira antes.

- Lily... Você está bem, pelo menos?

Ela abaixou a cabeça.

- Ele estava lá em pessoa, sabia? Em pessoa. Só pra me conhecer. Eu, uma "sangue-ruim", a escória do mundo bruxo.

- Voldemort estava lá? - ele perguntou com urgência na voz, embora mantivesse o tom controlado - Ele realmente...

- Ele queria me conhecer. - ela repetiu com um sorriso cínico - Não é adorável? E ele quis brincar um pouco de gato e rato também. Uns "Crucio", só para aquecer. Fui amaldiçoada pelo menos umas cinco vezes. E estou viva para contar a história. Não é fantástico?

- Lily...

- Aparentemente, para o chefe dos aurores, isso não é fantástico. - ela continuou - Sou frágil demais para o cargo. Fraca e inepta para a missão para a qual fui designada.

Benjamin apenas suspirou, levantando-se de sua cadeira e passando os braços ao redor dela, em um abraço apertado.

- É óbvio que Moody não pensa assim, Lily. Ninguém pensa assim. Desde que você chegou ao Ministério, você foi considerada um dos mais eficientes e necessários membros da equipe, você...

Ela apenas sorriu, retribuindo o abraço.

- Obrigada, Benji.

Foi nesse exato instante que James aproximou-se da mesa deles.

- Ora, ora... Olá, "Benji". - ele cumprimentou com a voz raivosa.

- Potter, não é o quê... - Benjamin se levantou, encarando o outro auror.

Lily também se levantou, não deixando que Benjamin se explicasse, puxando-o para um beijo quase desesperado.

James observou em choque a ruiva se separar do rapaz, respirando fundo para recuperar o fôlego.

- Minha vida não lhe diz respeito, Potter. Eu disse a você para não se importar. Avisei que não acreditasse que tínhamos um compromisso ou algo do tipo. O que tivemos acabou, pertence ao passado. Você não tem o direito de cobrar absolutamente nada de mim.

James lançou a ela um olhar profundamente magoado e ela se lembrou de quando acordara aquela manhã e, a primeira coisa que vira fora os olhos fundos e preocupados do maroto a sua frente.

Naquele momento finalmente realizara que, não importava quantas vezes dissesse para si mesma que não estava apaixonada a cada noite que deixava o apartamento dele nos últimos dois meses, não podia fugir da trama de sentimentos que a simples presença de James enredava ao seu redor.

Lembrara-se imediatamente de quando fizera aquela descoberta pela primeira vez no sétimo ano. De como fora tola em se arriscar e de como se tornara um brinquedo nas mãos dele. Ela prometera a si mesma que não cairia novamente. E ela cumpriria a promessa, custasse o que custasse.

- Muito bem, Evans. - ele respondeu, respirando fundo, caminhando para trás, sem desviar os olhos da figura dela - Como você desejar.

E, sem esperar resposta, ele se foi.

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