Prólogo



“Just what we all need
Apenas o que todos nós precisamos
More lies about a world that
Mais mentiras sobre um mundo que
Never was and never will be”
Nunca foi nem nunca será (Evanescence – Everybody’s Fool)

Prólogo

Era verão, verão de 1976, um verão no qual o destino de muitos Black se cumpriu. “Nós precisamos casá-las logo!” – a mulher loira, que atendia pelo nome de Druella, disse, com sua tradicional expressão de que o mundo acabaria naquele momento por qualquer motivo fútil, levando as mãos ao rosto. Rosto, esse, que aparentava sua idade, mas ainda conservava os traços de uma juventude na qual fora muito bela. “Elas já estão quase passando da idade...” “Faça-me o favor, Druella!” – Walburga Black disse, revirando os olhos. Era, depois de seu marido, a pessoa mais importante na familia. A mulher possuía cabelos brancos que estavam sempre presos em um coque frouxo, e olhos num tom de azul que normalmente seriam considerados bonitos, mas neles morava uma expressão tão fria e ameaçadora que ninguém conseguia ver além disso. Walburga nunca tivera paciência com a cunhada, detestava suas futilidades, sua beleza exuberante, detestava tudo nela. Talvez, inconscientemente, a invejasse. Enquanto mil bruxos se jogavam aos pés da outra, ela sempre fora tratada como uma mulher de pedra, um exemplo de Black: sempre fora temida, mas nunca admirada. “Você acha que eu não sei que precisamos casá-las? Acha que enquanto você se preocupava com seus vestidinhos e festas da sociedade, eu fechava meus olhos para todo o resto? O nome da família está se perdendo, muitos de nossos parentes já o desonraram, os negócios não vão bem como antigamente. Não aja como se fosse tivesse feito uma grande descoberta.” – falou, com sua calma habitual, mas agressiva ao mesmo tempo. “Talvez seja o que você devesse fazer, não é, querida? Se preocupar com as coisas fáceis, ao invés de se meter nos assuntos importantes.” – a loira alfinetou, empinando o nariz, gesto que acentuava ainda mais sua expressão de nojo característica. “Já basta, as duas!” – Orion, que se mantivera em silêncio até o momento, disse, no seu típico tom que não deixava espaços para que fosse contrariado. “Todos aqui sabem que precisamos casá-las, e isso é mais importante do que o motivo pelo qual isso deve ser feito às pressas. Motivo que, aliás, nunca deve ser mencionado fora desta casa.” – concluiu, passando o olhar por todos os presentes. “Já houve manchas demais no nosso sobrenome para toda uma dinastia. Os Black jamais poderiam ter chegado a esse ponto.” Todos os presentes assentiram com a cabeça, acomodados nos sofás de couro de dragão do grande e luxuoso escritório da Mansão Black. “E quanto ao seu filho?” – Cygnus, marido de Druella, perguntou, com um visível ar de desprezo na voz. “Não deveria ser ele, o primogênito homem, a levar adiante o sobrenome, enquanto Regulos ainda não tem idade para tal?” “Não coloque Sirius no meio disso, Cygnus.” – o chefe da família disse, com uma expressão de raiva. Sabia que o filho era um fracasso, e até ele próprio dizia isso, mas não tolerava ironias sobre o assunto. “Depositar essa responsabilidade naquele moleque inútil seria condenar a família à desgraça eterna. Não há mais o que se discutir. Vamos casá-las o mais breve possível.“ – concluiu, dando o assunto por encerrado. “Druella, acredito que você não se incomodaria em fazer com que as famílias tradicionais fiquem sabendo que estamos procurando pretendentes. Espalhar as notícias sempre foi o seu forte.” – Walburga falou, e qualquer um poderia notar o cinismo em sua voz. ”Vou fingir não ter percebido esse insulto mal disfarçado.” – a mulher respondeu, levantando-se e indo em direção a porta do escritório. “E não se preocupe, sei muito bem o que fazer. Preparem-se para um baile dentro de algumas semanas.” Walburga revirou os olhos, ajeitando a saia do longo vestido que usava e levantando-se em seguida. Amaldiçoando o fato de ter que resolver tudo naquela família, foi até a sala de estar. Dizer que era enorme não faria jus ao cômodo. Mas a sala fazia, com certeza, jus ao sobrenome dos donos da mansão. Os sofás de couro de dragão escuros, os tapetes caríssimos, a lareira em mármore preto, os lustres fantasmagóricos, as cortinas azul marinho... Tudo à la Black. Encontrou os cinco adolescentes da família na sala, cada um aparentemente perdido em seus próprios pensamentos. Bellatrix, com todo seu esplendor, sentada de um jeito displicente e elegante ao mesmo tempo, lendo uma revista bruxa qualquer enquanto seus longos cabelos negros teimavam em cair-lhe na face. Narcissa observando suas unhas cor de vinho e olhando-se discretamente no espelho que havia na parede a sua frente. Andromeda, inquieta, batucava delicadamente com o pé no chão e olhava fixamente para o primo mais velho, sentado ao seu lado no sofá. Já Sirius percorria o lugar com o olhar, com sua típica expressão entediada, demorando-se em Bellatrix, que mantinha as pernas cruzadas de um jeito provocante demais para um garoto de 16 anos. Régulos estava sentado à um canto, observando também Bellatrix, com um brilho fascinado no olhar. “Sirius, vá para seu quarto, agora.” – sentenciou, indicando a escada com o olhar. O garoto bufou. Se ficava trancado no quarto, mandavam o elfo ir buscá-lo – como se fizessem muita questão de sua presença nos momentos familiares –, se descia e ficava junto com os outros, lhe mandavam subir. Sem paciência para discutir, simplesmente subiu, fazendo um gesto displicente com a mão. Bellatrix levantou os olhos da revista por um momento para observá-lo, era estranho que o primo não tivesse dado mais um show de rebeldia. “Você também, Régulos, vá fazer alguma outra coisa, preciso conversar a sós com as garotas.” – Walburga disse, num tom mais amigável, mas ainda assim seco. Contrariado, mas sem reclamar, o garoto saiu da sala pela mesma porta onde Sirius passara a poucos momentos. “Bellatrix, Narcissa, juntem-se a Andromeda no sofá. Tenho um assunto importante para conversar com as três.” As irmãs ficaram então sentadas lado a lado, encarando a tia que sentou-se na poltrona antes ocupada por Bellatrix. “Não vejo porque me demorar em longas explicações, vou ir direto ao assunto. Vocês sabem como as coisas funcionam” – falou, com sua voz fria e sem emoção. “Mulheres Black se casam com bruxos sangue-puro, escolhidos por sua família.” Bellatrix parecia entediada de ter que ouvir aquele discurso pela milésima vez. Andromeda fitava o chão, desconfortável. A única que parecia curiosa com a idéia era Narcissa. “Isso jamais mudará.” – acrescentou, ao ver que Andromeda pretendia falar alguma coisa. “Dentro de algumas semanas, realizaremos um baile aqui na mansão, para que vocês possam, digamos, confraternizar com as outras famílias bruxas e para que os homens as vejam. Esperemos que hajam bons pretendentes, quanto mais cedo todas se casarem, melhor. Não queremos que nenhuma de vocês fique mal falada na sociedade.” Andromeda abafou um riso debochado. Ah, os Black, sempre preocupados com a reputação. Se eles achavam que ela ia aceitar ser exposta como um pedaço de carne para que alguém escolhesse lhe levar para casa, estavam todos muito enganados. Imaginava o que Sirius diria quando lhe contasse. Ele, definitivamente, não ficaria muito animado com a idéia de um baile com todas as mais nobres famílias do mundo bruxo. Narcissa abriu um sorriso que não combinava muito com sua expressão de nojo constante, mas que não lhe privava de sua beleza. Qualquer momento de exibição, para ela, era o paraíso. Nem se preocupou muito com o assunto principal, os casamentos arranjados. Afinal, era algo para qual as mulheres Black se preparavam a vida toda, era o destino delas, sua serventia na família. “Precisamos de vestidos novos!” – ela disse, controlando-se para não parecer animada demais. “Compramos vestidos novos semana passada, Cissy!” – Andromeda disse, incrédula com o quão fútil a irmã mais nova podia ser. “Se quiser que algum homem olhe para você, vai ter que comprar um vestido melhor que o que comprou semana passada, Andie.” – Bellatrix alfinetou, com seu sorriso cínico. Andromeda segurou-se para não retrucar dizendo que ela não queria mesmo que nenhum daqueles homens sujos olhasse para ela, mas achou melhor não fazê-lo na frente da tia. Desprezava os costumes e os valores dos Black, mas, ainda assim, não tinha coragem para enfrentar a família. Invejava Sirius nesse aspecto – e talvez não só nesse. “Vocês podem comprar vestidos novos se precisarem.” – Walburga disse, impedindo que a discussão continuasse. “Pedirei que os garotos as acompanhem ao Beco Diagonal, os adultos estão muito ocupados para isso nesses últimos dias. Mas talvez a mãe de vocês possa ir, ela nunca foi realmente muito ocupada.” – terminou, com um cinismo palpável. Bellatrix encarou a tia. Tão admirada por todos, e vacilava dessa maneira, deixando transparecer o rancor que guardava da cunhada. Ela jamais se permitiria ser assim – nascera para ser a Black perfeita, mais do que qualquer outra, e o seria. Nada ficaria em seu caminho. Sorriu internamente, enquanto se perdia em pensamentos sobre seu futuro glorioso. A alguns metros dali, um Sirius debochado se encontrava apoiado na parede, com os braços cruzados. “Espiar atrás da porta é feio.” Régulos se sobressaltou com o susto. Encarou o irmão mais velho, que mantinha uma expressão quase divertida. – “Não vai contar à mamãe, vai?” – uma ruga de preocupação se formou em sua testa. “Shh, não faça barulho!” – Sirius o repreendeu, levando o indicador à boca num sinal de silêncio. Também não pretendia ser pego ali. “Não, se você me contar sobre o que elas estavam falando.” Um sorriso malicioso se formou em seu rosto. Era tão fácil persuadir o irmão, sempre preocupado em parecer bem diante da família. ”Casamentos arranjados, pelo jeito vão fazer um baile. Pelo menos foi isso que eu consegui entender.” – sussurrou, olhando para os lados para se certificar que ninguém se aproximava. Não faria mal contar a Sirius... Era o preço de seu silêncio, não era? Sirius bufou quando terminou de absorver a nova informação. Um baile, na mansão Black? Isso não ia correr bem, definitivamente.

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