Derreter do Gelo



Capítulo 3- Derreter do Gelo

“Nee 'genki da' to denwa wo choudai
Tokui no iyami wo itte
Anata dakara yuruseta no yo
Isshou no omoide”

“Bem, você me ligava pra dizer: ‘Estou bem’ ,
Usando seu sarcasmo típico
Só por ser você eu perdoava
Lembranças de uma vida inteira.”

-Maki Goto-


Um casal passeava pela terra úmida da neve que se derretia. O cenário ainda era cinzento; porém, aqui e ali pontinhos coloridos davam sinal de vida.

A moça saltitava, fazendo a fraca luz do Sol bailar nas argolas de sua orelha. Draco não podia deixar de notar o quão estranho era aquele cenário.

-Ei, você não tá nem um pouco triste?-perguntou, tirando as mãos do bolso e apontando para suas mínimas pegadas irregulares.
-Por que estaria?
-Você vai morrer, Weasley. Não confie tanto no médico que estou procurando. Até o diretor tá morrendo de preocupação; deve ser muito grave.
-Pra que pensar nisso?-Gina se aproximou e pôs as mãos frias em seu rosto.
-Só me parece o mais normal.
-Isso me faz uma anormal?-perguntou, beijando-lhe de leve.
-Sim.
-Então tá explicado o que tô fazendo aqui com um Malfoy!-concluiu dando risinhos.

Draco olhou por uns instantes para os pés de ambos. Encaravam-se como que se querendo subir um no outro. As botas dela alternavam o peso ora numa ora noutra, enquanto cavavam um raso, porém comprido, buraco na terra. Já as suas próprias ficavam ali paradas, inertes. Prontas para qualquer comando.

Inspirou fundo: “É isso aí, temos um contrato e nada além! Não devemos nadinha além mesmo”, e a beijou mais profundamente.

Um fugaz pensamento lhe ocorreu, enquanto sua língua circulava na outra boca e a mão da menina repetia os movimentos pelas suas costas. Estaria sendo usado como alguma droga alucinógena? E se fosse assim, sentir-se-ia ferido?

Mentalmente, sacudiu para longe tais indagações. Já havia largado mão de seu orgulho quando assinara o contrato e era isso: não havia nada além deste.

-Estou com frio...-Gina comentou, encerrando o beijo, -Vamos para o Três Vassouras.
-Tá, mas tenho uma solução melhor até chegarmos lá.

Retirou o braço direito da manga do casaco e fez sinal para Gina pôr o seu no lugar. Abraçou-a por trás e assim foram caminhando desengonçados até o estabelecimento pelo qual o estômago da Weasley tanto ansiava.

-Esse casaco é muito grande... Tá me fazendo tropeçar.
-Pensei que estivesse com frio.
-Já fez isto antes com alguém? É impossível chegarmos assim lá. E eu tô com fome!
-Não te interessa o que já fiz. Mas não seria nada legal se você desmaiasse de novo. Digo, não pra você. Acho que eu não me importaria neste caminho deserto...
-Eu realmente deveria ter incluído uma multa maior para seus atrevimentos, Malfoy.
-E o que aconteceu com os Dracos de há pouco.
-Foram pro mesmo lugar que vou mandar seu quadril se ele continuar a esbarrar na minha bunda!
-Ui! Eu sei que filhos são impossíveis pra você, mas eu ainda os quero! Não desconte nos Draquinhos...
-Ai, fala sério... Que pervertido.
-É a Biologia.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Hermione dava um suspiro entediado, enquanto o namorado continuava a falar e falar e falar. Olhou para Harry, que parecia bem estranho desde que terminara com Gina, tempos antes. No momento, a sensação piorava.

-Sinceramente, o que há com vocês dois!?-a moça esbaforiu, -Rony não pára de enumerar qualquer erro que Malfoy tenha cometido na vida e aqueles que ainda vai cometer. Aliás, acho que a vida dele não será longa o bastante pra tudo isso. Harry está totalmente calado, olhando a janela na esperança de ver Gina passar totalmente brava com o namorado – ou o ex, como vocês bem gostariam que passasse a ser.
-E qual o problema?-O ruivo a olhava inocentemente.
-Que, sabe... Existe a chance de eles darem certo! E, neste caso, vocês ficarão muito mal na opinião da Gi.
-Nem quero pensar nesse pesadelo!
-Aquele lá tá armando, Mione, -Harry explicou, -Todos sabemos disso e eu não costumo me enganar.
-Mas costuma ter provas. Falsas ou não... Nem isso vocês têm!-A menina tomou mais um gole de cerveja amanteigada. –Dêem um voto de confiança nela... Pelo menos você, Harry Potter. A pobrezinha já recebe desaprovação o bastante do resto de Hogwarts, não precisa de mais uma daquele que, não faz muito tempo, concordou em ser amigo. Não foi por isso que terminaram? Pra salvar a amizade? Vá em frente; vai ser um belo passo.
-Aquele Malfoy me paga! Ah, só um escorregão e ele tá frito, - Ron declarou antes que Potter pudesse pensar numa resposta.
-Sinceramente!-Hermione repetiu-se, com um novo suspiro. Estava indignada com tanta imaturidade de ambas as partes.
-Ah!-Harry mexeu-se desconfortavelmente.

A bruxa virou-se para encarar uma cena que tinha de admitir ser bizarra. Sua amiga estava completamente engolida pelo sujeito mais nojento e convencido que já conhecera e seu casado grosso e, com toda certeza, caro o bastante para acabar com a fome de um país de terceiro mundo.

-Estão sorrindo...-ela observou, enquanto os dois escolhiam uma mesa nada discreta, -Nunca vi Malfoy tão descontraído.
-É isso o que me deixa com raiva!-Potter comentou, afastando sua caneca, -Perdi a fome; vou tomar um ar. –Saiu, deixando o dinheiro de suas despesas.
-Quer sair também?-Hermione olhou o namorado.
-De jeito nenhum!-respondeu, bastante vermelho e com olhos atentos.

Para si, notou que até que formavam um casal bonito. Infelizmente, tinham tudo para dar errado e um ar bastante sombrio que os rodeava. Era como se seus sorrisos e carinhos fossem para expulsá-lo...

“Merlin, que vento frio é este que me veio à barriga?” perguntou-se, tomando em gole único o que restava na sua caneca.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Gina correu apressada pelos corredores. As aulas tinham, enfim, terminado. Não conseguia se conter de ansiedade. Tudo o que tinha de aturar naquele momento era mais um treino de Sonserina, o que não era tão chato quanto um jogo.

Não podia assistir nenhum com o namorado a não ser sentada entre os Corvinais. A menos que quem estivesse jogando fossem os próprios. Neste caso, ficava entre seus amigos, mas calada. Os Grifinórios sempre torciam contra e não cabia à própria namorada fazê-lo.

No domingo passado, foi bastante divertido quando Draco quase caiu da vassoura. No entanto, teve que rir calada, sentadinha em seu banco... Quando a Casa Sonserina ganhou, o problema foi o mesmo. Sentiu muita vontade de pular e gritar orgulhosa para o namorado, que circulava pelo campo segurando o Pomo. Mesmo assim, teve que ficar lá sentada, ouvindo os relatos das trapaças que seus amigos achavam ter visto.

No próximo, prometia ainda mais frustração, porque seriam Corvinais contra Grifinórios. Teria de se sentar entre os Sonserinos... Draco nunca concordaria em ir para perto de seu ex-namorado – nem ela queria tal tragédia.

“Talvez seja melhor eu nem ir ao jogo... Ai, não devia ter largado o time!”

No primeiro jogo de sua casa com a Corvinal, eles decidiram não ir. Ficaram passeando perto do local do evento de mãos dadas. Era bom ter aquele momento meio fora do mundo... Gina só ficava pensando em como aquilo era estranho e se esquecia de que morreria em muito pouco tempo.

E neste? Draco realmente queria assistir? Tudo bem que era importante para o time dele, mas...

“Ai, eu tenho que convencê-lo!” sorriu resoluta e apertou o passo. Tinha que ter certeza de beijá-lo antes do início do treino só para ver a performance de Parkinson piorar por todo o tempo. Fazê-lo só depois não tinha tanta graça assim... “Espero que Draco esteja satisfeito comigo! Ha ha! Bem, com ela é que ele não tava pra chegar a ponto de assinar este contrato doido.”

Era estranho, mas seus pensamentos andavam sendo monopolizados por “Draco”. Contanto que seu assunto com as amigas também não estivesse, não faria mal. Com sua morte iminente, não havia risco de um coração partido. Talvez não fosse ruim se deixar apaixonar um tantinho por aquele loiro.

“Okay, acho que essa doença tá me deixando louca... Só pode ser essa a explicação.”

Chegou até o seu destino e avistou o namorado terminando de ajeitar o uniforme. Parkinson estava logo atrás, conversando com uma amiga.

-Queridooo! Olha quem chegou!-Gina gritou no seu tom mais “menininha fofinha apaixonada” que pôde.
-Ah, você...-Draco parecia um pouco acanhado, mas caminhou até a moça, dando-lhe um beijo.
-Snape me segurou um pouco depois da aula. Por pouco não te desejo “bom treino” a tempo.
-Acho que preciso mais de você depois dele do que antes, -falou insinuador.
-E eu também... Tenho uma surpresinha para você assim que estiver limpinho e cheirosinho. Aposto que irá amar!-A ruiva fez questão de levantar o tom apenas o bastante para que a ex ouvisse. –Bom treino, querido.

Beijaram-se até perderem o ar.

Gina sentou-se na arquibancada e começou a sua simulação de “torcedora cegamente apaixonada e extremamente irritante” – era sua preferida.

Com tudo terminado, caminharam de mãos dadas a um lugar meio vazio nos jardins. Ainda estava frio demais para os alunos permanecerem ali depois que anoitecia. As luzes do castelo vinham de longe fornecer claridade apenas o bastante para se verem.

Ambos acenderam suas varinhas e ficaram se beijando por uns momentos.

-Não é estranho isto?-Gina falou de repente.
-Hã?
-Digo, ninguém tá nos vendo e mesmo assim aqui estamos.
-Não somos namorados só pra exibição; por mais divertido que possa ser.
-Não era pra você? Escapar do negócio dos Comensais da Morte...
-E o que isso tem a ver com sermos vistos nos divertindo ou não?
-Ah, sei lá...
-Esta é a oportunidade que tenho de te conhecer melhor. E quem teve a idéia de virmos aqui foi você!
-Ah, é mesmo! Já ia esquecendo...

A ruiva pegou sua varinha e materializou um bolo confeitado com o nome dos dois escritos em cima.

-Que isso!?-Draco gritou com o susto.
-Feliz duas semanas de namoro?
-Ahahahaha! Nossa... Duas semanas? Parecia mais...
-Ai, Draco! Como vocês homens nunca guardam essas coisas?
-Como vocês mulheres querem sempre que comemoremos tudo?
-Bem, eu espero que você o faça porque está num certo contrato que assinei contigo há duas semanas. Lembra-se? Flores, chocolate...
-Mas pra duas semanas!? Que importância há em duas semanas? Digo, um mês, seis, um ano... Mas duas semanas!?

Draco a encarou por uns instantes até que algo lhe passou pelos olhos. Suspirou derrotado e lhe pediu desculpas, beijando suas mãos.

-Ei, que deu em você, Malfoy?
-Me chama de Draco.
-Então, pára com isso. Eu só sou uma garota romântica, gostando ou não do meu namorado.
-Mas você bem que gosta, né?-Ele a beijou profundamente.
-Não exatamente da pessoa!-Gina virou-se e começou a percorrer suas roupas noutro beijo. Nem o deixou perceber que um pergaminho caiu do bolso.

Ela achou-o e apanhou-o, devolvendo-o ao namorado com “curiosidade” estampada na face.

-É da minha mãe, -Draco disse, guardando-o de novo.
-E? Você comentou que ela me tinha aprovado...
-Disse que quer te conhecer, mas eu já respondi que não.
-Ué? Por quê? Eu acho muito romântico conhecer os pais! Digo, no seu caso, só a sua mãe, por favor.
-He he! Não sei se eu gostaria disso.
-Tem algo a esconder?
-Hã?-O moço olhou para o lado por uns segundos. –Vamos comer logo esse bolo, eu tô com fome depois do treino de hoje.
-Draco... Como espera que eu confie em você com ações tão evasivas?
-Não espero. Escuta, não gosto de pensar em você na mesma sala com a minha mãe. Sabe, eu até considerei o convite, mas é muito cedo e, provavelmente, desnecessário; assim como o é explicar o porquê.
-Ai, vamos logo, então. Você fica aí falando... Que metido! Tem vergonha de eu ser uma Weasley; fala logo!

A resposta foi um mero sorriso. Porém, este era tão oblíquo que não saiu da cabeça de Gina por toda a noite. Se não era vergonha dela, o que mais poderia ser?

Já havia se despedido dele e caminhava com Hermione e Harry até o dormitório quando sua vista rodou. A rotina já se estabelecia a tal ponto que teve até tempo de parar e se sentar antes que o desmaio se completasse.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

-E o que você fazia com ela àquela hora da noite?-Draco estava muito irritado enquanto apontava um dedo trêmulo que pontuara cada palavra dita.
-Íamos dormir, somos da mesma Casa, tínhamos jantado... Precisamos passar por tudo isso de novo?-o moreno respondia bastante entediado.
-Isso soa muito estranho!
-Já disse isso! E lembro de haver respondido que somente soa, pois não é. Hermione estava conosco, inclusive. Aliás, pra que estamos nos repetindo?
-Ela tá acordando!-a terceira jovem na sala apontou para uma Gina pálida coberta por um grosso edredom.
-Mi...? Desmaiei de novo?-perguntou com a voz frágil, - Já é de manhã!
-Sim, quase na hora das aulas. Achei que teríamos de ir antes de ver se estava mesmo bem. Que há contigo, hein?
-Estou com anemia depois daquela gripe.
-Foi o que a Madame Pomfrey falou...-Harry interrompeu.
-Cadê o Ron?-A paciente olhou por toda a enfermaria sem encontrar outro ruivo senão ela própria.
-Dá pra perguntar por mim também!? Eu fiquei muito preocupado, tá?-A voz imponente de Malfoy assustou um pouco a enferma.
-Não tinha te visto... Que faz aqui?
-Não quisemos contar ao teu irmão, sabe como ele é...-Hermione retornou à conversa, ajeitando leito à sua frente, -Malfoy apareceu aqui do nada quando tava meio escuro ainda.
-Só Merlin sabe como ele descobriu...-Potter completou.
-E só ele mesmo sabe o que você estava fazendo lá e por que não evitou isto!-Draco voltou ao tópico anterior.
-Evitar!? Como eu vou evitar que ela desmaie!? Gina tá anêmica, você ouviu? Madame Pomfrey mesma disse isso e você ouviu muito bem. Quem tinha que evitar alguma coisa era você! Suas comidas frescas de riquinho tão faltando conteúdo.
-Quis dizer evitar que ela viesse pa-
-Chega!-a pequena interrompeu, olhando ameaçadoramente para Draco. Parou um segundo pensando em como desviar do assunto para o qual o namorado caminhava e decidiu-se: -Eu odeio hospitais, mas se eu tô doente, tenho que vir aqui, né? Vamos, querido, eu estou bem, não fique tão aborrecido. E, Harry, nem precisava se preocupar tanto a ponto de passar a noite aqui. – Apontou para as camas desarrumadas nos seus dois lados. –Aprecio sua amizade, mas acho que se excedeu. Digo, já devia imaginar que Draco fosse ficar transtornado quando descobrisse.
-Não era pra ele ter sabido, -seu ex-namorado respondeu, olhando de esguelha para o atual.
-Hermione, - a ruiva continuou, ignorando que quem a interrompeu. Isso causou uns risinhos maldosos da parte do acusado, -Obrigada por não ter dito nada ao Rony. Aliás, é melhor eu me arrumar e agir como se nada tivesse acontecido, né?
-Poderia, se o Cicatriz não tivesse te cagoetado...-o loiro advertiu.
-Como assim?-as duas meninas o encararam atordoadas.
-Não falei nada!-Potter se defendeu.
-Mas vocês não dormem no mesmo quarto? Vai conseguir mentir tanto assim?
-Ele tem razão...-Hermione olhou para os lados, pensando em algum plano.
-Ai, se ele souber...!
-Mas, Gina, não vejo o problema...-Harry a olhava sem entender para que tanta preocupação.
-Errr... Bem, ele...
-Vai me culpar, - O namorado a salvara.

A ruiva sentiu-se tão agradecida que nem conteve o sorriso de alívio para o rapaz, quando a situação exigia maior seriedade.

-Assim como eu?-o moreno perguntou, rindo sarcasticamente, -Que bom. Por mais engraçada que a explicação seja...
-Olha, Potter, eu realmente amo a Gi. Quero, como todo bom rapaz, conhecer a família dela e ser pelo menos um pouco aprovado. Isso vai ser quase que impossível considerando meu sobrenome. Qualquer membro que eu conquiste por amigo, já conta, mesmo que seja Rony Weasley.
-Sem sentimentalismos... E eu não confio em você!-disse, apontando o dedo bem abaixo da garganta do outro.
-Harry!-Gina gritou enquanto observava o amigo sair do lugar.
-Olha, prefiro que Ron saiba. Mas se ele não perguntar, não direi nada...-declarou antes de fechar a porta.

Hermione ficou observando a cena. Lentamente, soltou o fôlego prendido e olhou surpresa para Malfoy: -Pensei que você ia dar um soco na cara dele...

-Não sou tão irritadinho quanto o Cicatriz.
-Ho ho! Tô sabendo...-A Weasley se mexeu na cama, rindo sarcasticamente.
-Argh! Venho todo preocupado contigo e me trata assim na frente da sua amiga?
-Ah, fala sério, Draco! Só não esculhambou com a dele pra manter tua pose.
-Não! É porque respeito este local e também minha pobre namorada... Apesar desse último não ser muito correspondido.
-Vai estudar, vai! Porque como ator dramático você morre de fome.
-Tô indo mesmo, que você morra sozinha!- Saiu enfurecido.

As outras duas ficaram rindo por mais um momento enquanto a batida da porta ainda ecoava.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

A cela escura de Lúcio Malfoy estava a cada dia menos fria com o fim do inverno. A chegada da primavera marcava o fim de todos os seus aborrecimentos com o frio. É claro que até o verão, a umidade daria conta de fazê-lo sentir falta daquela sensação.

Seus olhos rodavam observando cada detalhe novo que o cair da noite trazia. Seria aquela profunda escuridão mais um dos castigos inúmeros aos moradores de Azkaban ou apenas um vestígio do abandono do local?

Não havia muito a se fazer no meio do Mar do Norte que não fosse olhar os aurores passarem para lá e para cá. Grande feito o do Ministério! Manter tantos prisioneiros perigosos com um monte de jovenzinhos bem-intencionados, mas que nunca passariam daquela ilha.

As palavras que se trocavam ali eram tão diminutas quanto as amizades; quase inexistentes. Nem Lúcio se importava com aquilo. Não pretendia escapar ou ser agradado por soldados. Pelo menos não naquela condição. Sairia dali vitorioso!

Com Voldemort fora de caminho, o mal havia perdido sua cabeça e vários bruxozinhos de quinta, que nem puro-sangue eram, tentavam assumir o posto. Ridículo e inaceitável!

A família Malfoy era a mais digna de todas, muito mais que qualquer Riddle pudesse ser. Assim sempre pensou, mesmo havendo apoiado o outro, sabia que quando o Império se consolidasse, o poder iria para as mãos de quem mais merecesse.

“Ainda irá...” pensou, sentindo um frio polar invadir a câmara onde sua cela se encontrava, “Oh! Um dementador... Que raro”.

Os poucos que ficaram em Azkaban, por qualquer que fosse o motivo, eram usados apenas em câmaras com prisioneiros incômodos. Aquilo tornava o trabalho auror muito mais fácil: os chatos ficavam naquele estado de morte, enquanto os que pretendiam perturbar tremiam até a alma com a simples presença daquela criatura.

Lúcio, obviamente, ficava em uma câmara privilegiada. Poucos dos Comensais que trabalharam mais recentemente com ele se encontravam ali, como forma de evitar motins. Apenas estranhos, com uma ficha limpa se comparada à que Malfoy realmente merecia.

Olhou de volta para seu amuleto. Era a única coisa que aquelas pessoas o haviam dado de interessante. Sempre tentava imaginar o que algo tão poderoso fazia jazendo entre os pertences de um anônimo, morto quando Lúcio ainda era um recém-chegado.

Nunca nem entendeu como Azkaban era leniente com certos objetos. Não havia armas nem nada, porém permitiam quadros, retratos, algumas jóias, – contanto que fossem de família... Porém, nunca nem se davam ao trabalho de confirmar o que o prisioneiro trazia consigo.

“Tolos! Agora deixaram comigo a chave da minha conquista,” riu-se, observando cada detalhe do estranho objeto. Achara-o jogado ao lado do corpo, enquanto os outros prisioneiros tentavam ver se ele possua arma ou coisa similar. Pelo menos aquilo não costumava escapar aos olhos dos aurores.

As inscrições em língua morta disseram ao bruxo tudo o que precisava para entender como usá-lo. Ele era uma forma de aumentar o contato com o mundo externo, ultrapassava muitas barreiras mágicas e ajudava na telepatia.

“O que aquele velho diria se soubesse que Lucius Malfoy possui uma arma tão perigosa!? Ou também não veria o problema que algo tão inocente poderia causar?” Concentrou-se o mais forte que pôde e tentou mais uma vez penetrar na mente do aluno de Hogwarts. O gosto extra de invadir tão protegida escola tomava conta de sua boca cada vez que sentia a resposta do rapaz. “Hora de nosso recreio...” falou para ele e conseguia ver o tanto que tremia.

Até alguns meses antes não era tão fácil, mas naquele momento podia ter certeza de que a ligação entre ambos estava quase perfeita! Não demoraria muito para que aquele jovem tão insuspeito lhe concedesse o trono de todo o mundo, tanto o bruxo, quanto o trouxa.

Naquele dia, seu roteiro pedia que falassem mais sobre a vida. Por que era tão mais fácil? Antes tinha que usar alguém de mente bastante fraca para alcançá-lo. Intermediários gastavam tempo e energia... Contudo, tudo se simplificara quase que da noite para o dia. Seu novo amiguinho estaria enfrentando problemas emocionais? Precisaria de um ombro onde chorar?

Então Lúcio Malfoy estava pronto para dar-lhe ainda mais um motivo! Pouco a pouco, abriria sua mente e não demoraria muito até que se tornasse uma perfeita marionete. Ele mesmo o coroaria numa esplêndida cerimônia merecedora de sua pessoa.

“Ah, Narcisa! Espere e verá tudo o que seu maridinho está fazendo... Ficará surpresa ao perceber que está enganada: não fui seu único erro, minha querida”. Aquela era mais uma que voltaria engatinhando, após tantas barbaridades que escrevera em cartas. Sabia que era apenas disfarce, mas não era nada bom recebê-las naquela cela escura.

O auror que as entregava todo satisfeito também pagaria. Nunca mais pensaria em ler cartas alheias. E tantos mais... A lista aumentava a cada segundo.

“Meu querido bruxinho, por que está tão aborrecido hoje?” perguntou ao sentir o mau humor do rapaz. E suas palavras acompanhadas com o mais puro veneno cada vez mais abriam aquela pobre mente.

Nem em sua noite de núpcias sentira tanto prazer quanto possuía ao imaginar o que logo viria. Muito mais rápido que imaginara quando começara a pôr seu plano em ação.

Um trovão ressonou iluminando toda a cela e uma voz ainda mais imponente fez com que Lucius deixasse o amuleto cair no chão. O tinido do ouro contra a pedra foi a única melodia que acompanhou a voz de Alvo Dumbledore:

-Lúcio Malfoy! Não sei quem você está usando, mas se eu senti-lo de novo, tenha certeza de que na nossa próxima conversa estarei acompanhado de um agravamento de sua pena, junto com o afastamento do aluno.

Os olhos cinzentos ficaram olhando o teto, de onde a voz parecia vir e, recuperado do susto, Malfoy começou a rir.

-Eu só quero ver, seu velho!-gritou, gargalhando mais forte em seguida.

Continuará...

Anita, 27/05/2006


Notas da Autora:

As cartas estão sendo viradas, mas parece que o Dumbledore vai tentar dar conta dessa doninha sênior! Será que vai conseguir?
Não deixem de ler o próximo capítulo com muuuuitas revelações! E muito obrigada a todos os que me mandaram e-mails, comentários e reviews!
Se vocês também quiserem, sintam-se livres para tal!!! Meu e-mail é [email protected] à disposição de qualquer um queira me incentivar e visitem meu site http://olhoazul.here.ws!!
Um agradecimento especial ao Felipe, à Miaka_ELA e à Vane por toda a ajuda que me forneceram ao longo deste capítulo tão enrolado ^^U

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