O Começo - by Jus

O Começo - by Jus



Mais um dia ridículo, sem graça, monótono e muito melancólico para se viver. Era assim como podia ser definida a vida do jovem Justin. Ou ao menos era assim como ele próprio via sua vida. É verdade que o cotidiano do rapaz nunca foi o mesmo desde a morte de seu irmão, Ethan, um pouco mais de um ano atrás. Ele sentia como se não vivesse mais, ao contrário, como se apenas ficasse parado na janela olhando sua vida passar. De fato, para aquele mirrado garoto de olhos azuis ele era um completo inútil e por mais que tentasse nunca, nunca, nunca seria nem metade do que foi o irmão. 

Jus cariño, acorde! Jus... Justin... Você vai se atrasar, está en la hora, mi chico! -  Ele abriu lentamente os olhos e viu a figura de Rosário próximo a sua cama. Ela sorriu maternalmente quando seus olhares se encontraram. Deu-lhe um beijo de bom dia na testa e saiu do quarto informando que o café já estava o esperando e que o uniforme estava encima da cômoda. Ele demorou alguns instantes para assimilar a notícia. "Uniforme? Para que raios eu quero uniforme? Será que ela enlouque..." Seus pensamentos foram interrompidos. Deu um tapa na própria testa arregalando os olhos. Isso! Como pôde ter esquecido. Era o começo do ano letivo. Estivera tão ansioso com esse dia, mas os acontecimentos na noite anterior haviam varrido de sua mente toda a ansiedade e preocupações fazendo-o esquecer de tudo. Jogou para um lado os cobertores que o cobriam e sentou na cama olhando para o quarto. Estava uma bagunça. Vários livros abertos e fechados se encontravam espalhados pelo chão, sem contar cadernos, folhas amassadas em um canto e até mesmo um pequeno e discreto diário azul. Levantou e se espreguiçando foi até caminhando lentamente até a porta ao lado esquerdo de sua cama. 

No banheiro encontravam-se algumas roupas espalhadas aqui e ali. Ele piscou para a bagunça generalizada e seguiu até o espelho. Arregalou os olhos ao constatar que estava com olheira e os olhos inchados, muito vermelhos, provavelmente da quantidade de lágrimas que havia derramado na noite anterior. Deu um leve bocejo tirando as roupas e por fim foi se banhar. O banho quente não demorou muito, mas foi suficiente para encher o banheiro com uma fumaça esbranquiçada. Ao voltar enrolado para o quarto encontrou novamente Rosário, recolhendo os variados livros e cadernos do chão e lançando os papéis amassados na lixeira que carregava em uma das mãos. Sentou na cama e ficou a admirar o vácuo. Agora que parava para pensar a conhecida sensação voltava a invadi-lo. Teria de voltar à escola e encarar tudo novamente. Suspirou fundo até sentir algo gelado escorrendo por sua cabeça. Pôs a mão em seus cabelos e constatou que Rosário colocara um creme para pentear e agora moldava seu cabelo com um penteado. Ele ficou parado e após alguns instantes Rosário saiu novamente do quarto afirmando para ele por o uniforme. Ele sorriu, talvez um dos poucos sorrisos que dera em semanas. Rosário ou Rosa, como ele gosta de chamá-la, é uma espécie de governanta, mordomo ou babá. Ou até mesmo uma mistura disso tudo. Era mexicana e a única que dava atenção para o nosso pequeno protagonista e ele a encara mais do que uma simples empregada, era como se fosse sua mãe substituta ou até mais do que isso. Depois da morte de seu irmão, seus pais haviam se enclausurado em seu mundinho perfeito e negligenciaram o Justin, até mesmo (e Rosa não admitia) acusando-o de ser o culpado da morte do irmão. Ele balançou a cabeça como que querendo afastar os pensamentos de sua cabeça, pôs o uniforme e saiu do quarto.

 O café da manhã estava já posto a mesa. Ele se dirigiu até ela e começou a comer. Segundos depois Rosa apareceu com uma jarra de suco nas mãos. - Onde estão meus pais Rosa? - perguntou ele um pouco mais esperançoso do que gostaria de admitir ao mesmo tempo em que comia uma fatia de bacon com ovos. - A senhora Windsor saiu bem cedo para ver um projeto e seu pai teve uma reunião remarcada para hoje então... - ela olhou para ele que acabara de interrompê-la - ... teve de sair correndo! É eu sei! - completou as palavras dela com um tom de voz baixo e triste. Está certo que ele já esperava isso, mas então porque sempre ficava triste? Porque alimentava as esperanças que quem sabe um dia tudo pudesse mudar? Ashley e William, desde a morte de Ethan, nunca conversaram com Jus, não lanchavam com ele, não comiam com ele. De fato a única vez que Jus conseguia ver os pais era na hora em que algum deles passava apressado até a porta. Rosa notou o tom triste do menino e abraçando-o rapidamente disse - Eles tiveram de sair... trabalho sabe... mas aposto que iriam querer estar aqui contigo nesse momento importante! - Ele sabia que ela estava tentando apenas consolá-lo e que era mentira o que falava porque se eles realmente quisessem estar ali dariam um jeito como inúmeras vezes estiveram com ele e o Ethan todos os primeiros dias de aula. Jus não encontrou forças para rebater o que Rosa dizia então apenas acenou a cabeça deixando-se consolar. Terminado o café, ele pegou sua mochila preparada por Rosa e rumou com ela até a porta um pouco cabisbaixo.

- Estas seguro que queres ir solo? O motorista pode lhe levar rapida...
- Não se preocupe Rosa... já conheço o caminho. Já fiz muitas vezes com o Ethan...

Era verdade que já tinha caminhado com o Ethan varias vezes até a escola. Sua mãe sempre insistia em que eles fossem com o motorista, mas Ethan nunca aceitava. Ele dizia que gostava de se exercitar, mas para mim ele afirmava que assim podiam conversar melhor e de fato o fazíamos. Ethan era um bom irmão, talvez um dos melhores. Sempre esteve com ele quando ele precisou. Nunca o desapontou. Nunca o deixou na mão e sempre acreditou nele, por mais insana que fosse a loucura. Depois de sua morte, o mundo nunca mais foi o mesmo. Seus pais o "abandonaram", é claro que nunca faltou nada para ele, seus pais eram ricos. Mas carinho, afeto, amor e atenção deixaram de existir. Ele por sua vez fechou-se também em seu mundo diante de tudo. Diante da culpa de si mesmo, da culpa que os pais impunham sobre ele. A fim de aliviar um pouco Jus passou a escrever loucamente. Encontrou na poesia, na escrita seu refúgio, sua válvula de escape. Em casa seus dias eram por vezes solitários, quando não tinha Rosa. Ficava horas e horas trancado dentro do quarto escrevendo. Tinha alguns poucos amigos na escola. Era um aluno exemplar, um típico nerd, mas isso apenas piorava pois já varias vezes ele apanhava dos meninos "mais velhos". E sem ter ninguém para contar, sofria sozinho. Mas ao menos era um pouco de aventura a mais na vidinha dele. 

Seus passos eram lentos e ele estava tão distraído que nem percebeu que já havia a avenida. Olhou ao redor e viu vários alunos parados no ponto de ônibus. Ficou parado. Não sabia se queria exatamente entrar naquela confusão. Foi então que um menino grande e forte passou por ele e batendo nas suas coisas, fez tudo cair no chão. O menino forte riu e continuou andando até o ponto. Jus olhou para ele, abaixou a cabeça e pôs a apanhar suas coisas. Quando terminou de pegar tudo viu que o ônibus já havia chegado. Desesperado correu em direção ao ônibus. Não queria perder o ônibus e chegar atrasado. Vários alunos já subiam para o ônibus. A fila diminuía cada vez mais. Iria perder. Foi então que uma menina ficou parada na porta do ônibus. Ele corria mais, agora já estava suando. E depois de alguns segundos chegou até o ônibus. Ajeitou seus óculos, olhou a menina, era oriental, pelos olhos puxados. Achou-a bonita. Agradeceu um pouco tímido e subiu para o ônibus esperando que ela fizesse o mesmo, no entanto ela não subiu e o ônibus partiu. Justin grudou na janela e ficou a olhar a menina misteriosa ficando para trás, perguntando-se quem era ela.

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