Pronto pra quê?



(postado em 03.10)

N/A: Bom... parece que as prévias não fizeram sucesso nenhum... então vamos postar o capítulo pra ver se alguém reaparece.

Genteeee.... eu juro que tentei, mas não consegui deixar com menos de 20 páginas... Sinto muito. Espero que gostem mesmo assim... Aguardo seus comentários... COMENTEM !!!!!

Resposta aos coments no final...

E continuem COMENTANDO...

Leiam.
Aproveitem.
Comentem.

Boa leitura.


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Capítulo 2 – Pronto para quê?

Apesar de ser período de férias escolares, a escola de artes marciais tinha aulas diárias e muitos alunos em todas as turmas. A escola funcionava nas férias com um programa de “intensivo” para os interessados, deixando Hikari, Yume e Shaoran bastante ocupados.
Draco estava aproveitando bem essas aulas, treinando o dia todo e todos os dias. Era quase terapêutico para ele se dedicar ao estudo e prática de exercícios, uma vez que queria ocupar a mente com qualquer novidade e seu corpo não reclamava das intensas atividades, e essas vieram no momento mais adequado. Tinha aulas com o mestre Yamamoto todas as manhãs, em turmas variadas. Treinava com Shao a tarde nas turmas dele e com Yume aprendia não apenas Tai Chi, mas também como preparar certos chás e pomadas medicinais, além de, nas horas de descanso, conhecer um pouco mais da cultura japonesa, os costumes, as artes, a tecnologia. Estava até aprendendo a desenhar, representar as imagens dos desenhos favoritos de Shao, tanto das revistinhas em quadrinhos, conhecidas como mangá, como dos desenhos animados, os animes.
Já passava de um mês que estava ali e já aprendera tanta coisa... “Como foi possível eu viver tanto tempo sem ter conhecimento de tamanha riqueza de cultura e diversidade pelo mundo? Tanta coisa a aprender sobre os trouxas...” - pensava quase todos os dias. “Só sinto falta do Quadribol, de verdade... ahhh, como eu gosto de voar...” - também reclamava, sem deixar de completar - “Pelo menos meu corpo não enferruja pela falta de exercícios. Vou voltar melhor do que eu era... Bem melhor em tudo... Se me deixarem voltar...”

- Vamos fazer mais fraco agora... Coloque menos sementes e desligue antes de ferver. – Yume instruiu didaticamente, enquanto Draco colocava água numa panela de ferro e separava uma colher de pau para mexer os ingredientes que ela já havia separado. Era tarde da noite, o habitual horário que Yume ensinava a Draco a preparar alguns chá e remédios com ervas medicinais. – Agora já sabe, não? Se for um ferimento bastante profundo como aquele seu, você deve fazer a pasta bem forte e aplicar ainda quente na pele limpa. E agora que já está quase cicatrizado por fora você não pode esquecer que por dentro ainda não está totalmente curado e, portanto, não pode interromper o tratamento. Estamos diminuindo as doses gradativamente, você percebeu, certo?
- Hu-hum... Você fica irresistível com esse ar de professora, sabia? – perguntou maroto, fazendo a garota enrubescer e perder a linha de raciocínio da explicação. No dia anterior ele também a deixara assim, mas ela conseguiu contornar a situação antes que ele tivesse o controle.
- Certo... E você também fica irresistível quando seus olhos ficam cinza-escuros. Mas agora que você já fez seu papel de me deixar sem-graça... pode voltar a prestar atenção n-...
- Não. – ele interrompeu a garota, colocando o dedo indicador suavemente sobre os lábios dela, impedindo-a de falar e de se mover. - O que acontece quando meus olhos ficam cinza-escuros? – falou com a voz rouca com os rostos a um palmo de distância. Viu-a morder o lábio inferior e sua íris brilhar. – Se sou irresistível, por que fugiu de mim naquele dia? Não vai fugir agora, vai?
Draco venceu a distância dos poucos centímetros que os separavam e capturou os lábios da garota. Ela correspondeu timidamente e quando sentiu os braços do loiro enlaçar sua cintura tocou-lhe no peito impedindo uma aproximação maior, diminuindo a intensidade do beijo.
– Você me hipnotiza... – ele falou baixinho ainda com os olhos fechados. Encarou os olhos negros dela prendendo-a ali com a conexão daquele olhar. – Por que fingiu que nada aconteceu naquele dia? Por que saiu daquele jeito, sem dizer nada? Corresponde e depois me afasta... Está querendo me enlouquecer?
- Também estou confusa Ryu... não é só você que se sente perdido nessa situação. – ela deu um passo para trás para poder pensar melhor.
- Tem horas que você parece tão confiante e outras, tão distante.
- Digo o mesmo de você. – seu sorriso saiu nervoso.
- Você me irrita, sabia? Sinto-me outra pessoa do seu lado. Não dá pra prestar atenção no que você fala enquanto eu vejo sua boca...
- Você é terrível, não? E é mesmo irresistível... – e o sorriso brincalhão surgiu de novo.
- Disso eu já sabia. Agora me fala uma novidade. – disse ele com olhar sedutor, também rindo.
- Você ainda tem muito que aprender... E eu também... – ela falou séria, encarando-o profundamente.
Ele não soube o que falar. Apenas sabia que ela tinha razão. Desviou o olhar, mordeu o lábio para distrair o pensamento e voltou ao fogão para acender o fogo e se ocupar de algo para desfazer o constrangimento. “Até minhas ‘máscaras’ ela está conseguindo tirar... nem sei mais fingir quando estou envergonhado ou temeroso... Certo, voltando à realidade...”, pensava ele antes de criar coragem e voltar a falar:
- Odeio quando você tem razão... Voltando ao aprendizado então... Prometo que vou me concentrar. – ele disse sincero e emburrado.
- Eu ter razão não significa necessariamente que você está errado.
- Não? – perguntou surpreso, olhando para ela.
- Claro que não... – ela não conseguia encará-lo por muito tempo. Temia não resistir ao olhar profundo e hipnotizante. Antes de pensar nisso novamente, voltou sua atenção à atividade anterior. – Então, eu perguntei se você percebeu a diferença na dosagem.
- Sim. Sei que está mais fraco agora, mas ainda me sinto zonzo com o chá e com o cheiro da pomada. Meio embriagado... – respondeu enquanto separava umas ervas e as levava próximo ao nariz para sentir o aroma puro das folhas e depois as colocava na panela.
- Esse é o efeito mesmo. Diminuímos gradativamente para seu corpo não estranhar e reagir negativamente. Você não tem mais dores nem pesadelos mesmo, certo? Você não mentiria pra mim quanto a isso, não é?
- Ainda dói um pouco dependendo do movimento que faço. – ele respondeu sem tirar os olhos da panela, atento ao ponto de fervura da água. – Mas nem se compara com o que era antes. – mexeu mais uma vez e levantou o olhar para a garota antes de falar. - Eu não mentiria pra você em nada.
- Hummm... tenho minhas dúvidas quanto a isso, mas isso não vem ao caso no momento. O bom é que já é visível sua melhora nas aulas. Aliás, você aprendeu bem rápido, não? Seu equilíbrio é perfeito! Você tem resistência, agilidade e força de atleta... Já praticava algum esporte?
- Não regularmente. – respondeu evasivo, omitindo a verdade. Tratou logo de mudar o assunto. – Tenho que usar isso por quanto tempo ainda? – perguntou desligando o fogo e mexendo a pasta, sentindo o delicioso e forte aroma que subia no ar e que sempre lhe entorpecia os sentidos.
- Talvez mais duas semanas... – disse cruzando os braços na frente do peito. – Não mentiria, Draco? – seu olhar inquisidor era perfurante e o atingia de maneira profunda.
- Não mentiria, Yume. Mas também não poderia contar toda a verdade, se é isso que você quer saber. Mas não mentiria.
- Certo. Eu acredito em você. Agora vai, antes que esfrie demais.
- Então boa noite. E obrigado de novo. – saiu rapidamente antes que o desejo de sua pele tomasse forma e lhe escapasse pelos lábios.
- Boa noite Ryu...

Antes de dormir Draco pensou nos acontecimentos dos dias anteriores. Sentimentos e aprendizados...
“- O que é magia pra você Yume? – sussurrou perto da orelha dela enquanto sua mão esquerda alcançava a nuca da garota, trazendo-a para perto de seu rosto.”
Ele estava com os olhos fechados como se pudesse sentir novamente as mesmas sensações daquele dia.
”Sentia as pernas tremerem. O rosto quente. A pele formigando. A mente vazia.”
“O que está acontecendo afinal? O que eu sinto por ela?”, perguntava-se confuso e ao mesmo tempo deliciado com a lembrança do beijo suave, doce. No mesmo instante, um pensamento que já lhe ocorrera invadiu sua mente de novo:
Mas ela é bastante bonita, e inteligente, e esse carinho com que me trata é um tanto quanto sedutor... Ahhh... pare com isso, idiota... tenho coisas mais sérias com que me preocupar no momento, não posso me distrair com garotas... Muito menos essa...”.
- Ela merece alguém especial. – Draco murmurou antes de se deixar levar pela sensação de semi-inconsciência provocada pelo chá e da dormência preguiçosa provocada pela pasta que ele mesmo aplicara no ombro. - Ela merece alguém mais que especial. – corrigiu a própria fala e mergulhou no abraço aconchegante do sono.

No fim de semana seguinte, Hikari disse aos garotos para saírem e andarem pela região. Ele queria ficar sozinho e reverenciar sua família em paz. Na manhã do domingo muito quente, Draco, Yume, sua amiga Rosa, Shao, e seus amigos Fernando, Louis e Eduardo foram a uma praia próxima dali, retornando no fim do dia.
Draco se divertiu como uma criança. Correu com os garotos na areia, apostou corrida de natação com Yume e Rosa, tomou refrigerante e comeu “porcarias”. Ele nunca se divertiu tanto como nas últimas semanas, mesmo sendo dias com tantos aprendizados, novidades e desafios. A situação atual com Yume era estranha, mas estavam bem assim, respeitando o espaço do outro sem tocar no assunto. Sentia-se renovado e pronto para quaisquer mudanças que pudessem ocorrer em sua vida. Sentia que essa era a oportunidade de renascer e ser uma pessoa melhor, exatamente como seu ex-diretor, Dumbledore, havia dito. Seus olhos arderam ao se lembrar do diretor tão abruptamente.
“O que será que está acontecendo por lá?” - perguntou-se silenciosamente, pressionando os olhos para liberar o desconforto. “Como será que está minha mãe?” - os olhos agora se encheram de lágrimas - “Agora já não posso fazer mais nada por ela, devo confiar no Snape”, seus olhos ardiam demais. Piscou várias vezes para limpar os olhos e concentrou-se na estrada e nos garotos que iam à frente pedalando de volta pra casa, depois de saírem da pizzaria onde compraram o ‘jantar’.
Draco ainda não tinha parado pra pensar em como foi parar naquele lugar especificamente, principalmente porque havia visualizado uma paisagem ao sul da França para aparatar. Sabia que só podia ser obra de seu professor, mas a essa altura até o agradecia por tal feito. “O que ele murmurou àquela hora? Deve ter sido algum feitiço para confundir ou para trocar destinos, sei lá, ou então para alongar distâncias, não sei, mas isso não importa mais... depois resolvo isso quando eu puder encontrá-lo... SE eu voltar a encontrá-lo.”, pensava Draco enquanto voltavam para o sítio do sr. Hikari depois de um cansativo e divertido dia nas praias rochosas e desertas da região.

Ao chegar, Draco viu sr. Hikari meditando ao lado de uma frondosa árvore um pouco distante da casa e percebeu, mesmo de longe, o quanto o mestre parecia triste.
- Yume... – chamou baixinho e quando ela diminuiu o passo e o alcançou ele continuou. – O que houve com seu pai? Agora que eu percebi que ele nos mandou sair para que pudesse ficar sozinho. Não foi isso?
- Exato. 6 de agosto... a data mais triste para a maioria dos japoneses. Meu pai sempre dá um jeito de ficar sozinho pra poder homenagear seus antepassados.
- Por isso que você e Shaoran acordaram mais cedo e foram para a cerejeira?
- O sol ainda nem havia nascido... Achei que estivesse dormindo...
- Ouvi os passos e os olhei pela janela. Desculpe, não ia comentar com você, pois percebi que era um momento família, mas agora, se não se importar, gostaria de saber o porquê desse dia...
- Não me importo, de maneira nenhuma... – disse com um sorriso sincero. Sentou-se na varanda enquanto os garotos foram para a sala devorar a pizza e ver filme. Depois que Draco se sentou ela prosseguiu. – Vamos lá... Uma pequena aula de História junto com a história da minha família: Em 6 de agosto de 1945 a primeira bomba atômica explodiu na cidade de Hiroshima e matou toda família dos pais dele. Aliás, estima-se que cerca de 70 mil pessoas morreram na hora ou poucas horas depois das explosões. Outras 130 mil morreram nos 5 anos subseqüentes, em função de ferimentos e doenças causadas pela exposição à radiação. Meu pai ainda não havia nascido, pois nessa época meus avós tinham acabado de se casar e estavam em lua de mel num templo no alto da montanha, por isso estavam longe de casa. E como meu avô era um humilde fabricante de espadas ele não foi convocado pra guerra para que ele ‘trabalhasse’ em casa. E como tudo indicava que a guerra já estava quase no fim, eles decidiram por não adiar o casamento. Pouco antes de voltarem ouviu-se sobre a bomba e a total destruição de duas cidades japonesas.
- Ele perdeu a família toda? Moravam todos na mesma cidade?
- Sim. Tanto a família do meu avô como da minha avó. Não sobrou mais ninguém além deles na família. Eles nem voltaram mais pra Hiroshima. Da lua de mel foram direto pra Osaka, e depois de uns anos foram pra Kyoto e por fim, em Nagoya, onde meu pai, o terceiro e último filho nasceu.
- Foi o fim da guerra... – Draco comentou triste, se perguntando se toda guerra deve terminar com uma tragédia tão violenta.
- É o que dizem... Mas imagina, Draco... para um criança que cresceu sob o trauma da brutalidade da guerra, aquilo foi só o começo... Desde que eu me entendo por gente, meu pai se isola nesse dia. As cidades podem ser reconstruídas, mas a cicatriz que fica no coração é permanente. Cada um dos sobreviventes tem uma história de dor e terror, e uma tristeza que nunca desaparece. Sei de muitas pessoas que não conseguem sequer ouvir sobre a guerra, e meu pai até consegue falar do assunto numa boa, mas não dá pra disfarçar a voz trêmula ou alguma lágrima. Ele se sensibiliza por todo assunto relacionado a isso, mesmo uma disputa de quintal ele tenta resolver diplomaticamente e acolhe quem precisa de ajuda em qualquer situação.
- Como ele me acolheu... – disse baixinho.
- Sim, apesar de não saber sua real situação, pelo estado que você estava, tanto físico como emocional, ele sabia que não poderia ser só uma briga de rua. Draco... até hoje nós não sabemos que batalha você lutava...
- Sei que você tem razão... – sentindo-se culpado, ele baixou os olhos e continuou. - Não sabem nada ainda, mas entenda por favor, também tenho meus traumas Yume. E eu ainda não consigo falar disso numa boa. Dê-me mais um tempo, ok?
- O tempo que você precisar, Draco. Você sabe disso. – pousou carinhosamente sua mão delicada sobre a mão fria dele. - Sabe que nunca o forçaríamos a falar de algo tão perturbador, mas saiba que quando estiver pronto estaremos ao seu lado para ouvir.
- Eu sei... e isso muito me conforta. O-obrigado. – terminou de falar com o nó da garganta novamente. Olhou para frente para não encarar a provável expressão solidária e carinhosa da amiga, pois não suportaria ver tanta compreensão. – Veja. Seu pai...
Hikari estava com seu habitual sorriso acolhedor e agradável, mas era visível a tristeza em seus olhos quando entrou na sala para desejar boa noite aos garotos para logo em seguida se retirar para seu quarto.
Os garotos ainda fizeram a maior bagunça depois do jantar e ficaram até tarde assistindo um anime de produção americana que Eduardo trouxe de presente para Shao, e insistiram que o jovem inglês os acompanhasse alegando que ele ia gostar. Yume se despediu dos garotos e foi dormir, enquanto Draco concordou em ficar mais um pouco, mas foi pouco mesmo, pois entregou-se ao cansaço e dormiu logo no terceiro episódio de Samurai Jack.

Na terça feira, Shaoran acordou tossindo muito e reclamando de dores no corpo e de garganta. Hikari logo preparou para ele um chá bem forte de gengibre e mandou-o ficar em casa, chamando Yume logo depois e falando com ela em japonês, deixando certo loiro sem entender nada.
Yume acenou a cabeça em concordância com o pai e chamou Draco para irem para a primeira aula da manhã, que era de Tai Chi.
- O que houve Yume? Não entendi nada, só sei que seu pai falava de Shaoran e alguma coisa sobre as aulas das crianças.
- Já está entendendo um pouco do nosso idioma, não é? Que legal... Bem, papai disse que o Shao está gripado, só isso. Mas ele tem bronquite desde criança e qualquer gripezinha o deixa muito mal, então tem que tomar mais cuidado. Meu pai pediu que eu tomasse conta dos treinos do Shao até ele melhorar, o que deve levar uns dois dias. É horrível vê-lo doente. Parece que a casa entra num inverno rirogooooso.
- Posso imaginar porquê. O primeiro sintoma é o silêncio! Não é?
- Com certeza. Um silêncio horrível. Além de outra coisa... que isso quer dizer que vou ter que treinar as crianças e os iniciantes...
- E qual é o problema? Tem crianças na sua aula... e eu sou iniciante! E você se dá bem com todo mundo.
- É diferente... Você vai ver o que eu estou falando... Aguarde...
Seguiram pela pequena trilha até chegarem ao bosque e aguardar os alunos para a primeira aula do dia.

As atividades do dia passaram voando. O dia estava muito quente. Os treinos intensos. Shaoran teve febre e não quis comer nada durante todo o dia.
O dia seguinte seguiu igual. Voando... Quente... Agitado... e Shaoran com febre, mas melhorando. Draco começava a entender o que Yume quis dizer sobre as aulas com as crianças.
No fim da tarde da sexta-feira, Draco tomou um banho rápido e ajudou a arrumar a mesa para o jantar enquanto sr. Hikari preparava um lanche leve para seu filho. Minutos depois, o loiro, que já se sentia parte da família, descia as escadas com uma bandeja intocada nas mãos após sair do quarto de Shao e ao vê-lo dormindo profundamente, voltou para trás sem incomodar o garoto. “Parece que ele nem sente fome e não vai jantar de novo”, pensou olhando para baixo cuidando os degraus. Quando chegou ao patamar ouviu um barulho e olhou para o lado, na direção da sala, onde viu Yume se jogar de bruços no sofá, visivelmente cansada, espalhando as almofadas e derrubando o controle remoto da televisão no chão.
Ele foi até ela levando um copo de água e sorriu ao se lembrar do esforço que ela fez durante esses dias ao tentar controlar os pequenos samurais hiper-ativos e desastrados e entendeu porque a garota disse que não gostava de cuidar das crianças. Principalmente quando começavam os combates e eles corriam e gritavam e falavam sem parar. Ao ver a expressão de total esgotamento que ela tinha no rosto e nos ombros curvados, deixou o copo na mesinha de centro, ajoelhou-se no chão ao lado dela e começou a massagear-lhe os ombros e as costas.
- Eu sempre fico lá no canto. Nunca tinha reparado como eles são terríveis. – falou em tom de confidência e compreensão.
- Eu amo meu irmão... – foi o que ela conseguiu dizer antes de puxar o ombro para cima e soltar uma exclamação de dor.
- Desculpe... – ele falou parando a massagem e levantando as mãos. – Não sou bom nisso, mas achei que você estava precisando.
- Continue... está ótimo. É que está doendo bem aí onde você apertou.
- Então eu prometo que continuo depois... – sorriu sincero.
- Obrigada. – ela sorriu também, como um acordo mudo para selar a tal promessa.
- Venha jantar para repor as energias. Aí você toma um bom banho pra relaxar.
- Hu-hum... – resmungou balançando a cabeça para cima e para baixo, tentando se levantar do sofá.

- Querida... pode deixar a cozinha comigo hoje, tenshi. – sr. Hikari falou em japonês, após o jantar, tirando os pratos das mãos da filha e a abraçando em seguida – Me desculpe... Eu sei que as crianças sugam toda sua energia, mas o Shao não está nada bem...
- Eu sei, meu pai. – ela interrompeu o pai, abrançando-o de volta. – Não reclamo por ter que cuidar das aulas dele. E o farei até que ele se recupere totalmente. Não se preocupe. Mas o senhor sabe como é. Sempre me canso com a molecada mesmo.
- Certo... Tente dormir mais cedo então. O Draco me ajuda a tirar a mesa. Vá tomar um banho bem relaxante, meu anjo. Quer que eu prepare um chá calmante pra você dormir bem?
- Seria bom... aquele que o senhor faz com camomila e hortelã... – ela falou com a voz sonhadora, como se já estivesse saboreando o tal chá.
- Então eu farei. Draco leva pra você depois... agora vá. – Beijou-a no rosto e a acompanhou até o começo da escada.
Draco já tirava as louças da mesa. Apesar de não ter entendido muita coisa do que Hikari falara, subentendeu que deveria ajudá-lo na cozinha enquanto Yume deveria descansar.
- Posso confiar em você, não posso filho? - ouviu Hikari falar em inglês para que o rapaz o entendesse.
- C-claro, sen-nhor... No que for preciso. Mas não entendi o ponto da pergunta...
- Ahhhh... os adolescentes... – ele suspirou e deixou a dúvida no ar. – Eu sinto que posso confiar sim. – falou despreocupadamente balançando a mão como se pedisse para deixar o assunto de lado. Nem deu tempo para o rapaz entender o que o mestre estava pensando e ele já começou a falar de novo. – Sabe, a Yume se esgota muito com as crianças...
- Eu percebi... – Draco respondeu ainda desconfiado, se perguntando se o pai da garota imaginava que eles já haviam se beijado ou algo do tipo. Sentiu-se um pouco culpado por abusar da hospitalidade do senhor que o abrigou em sua casa e em sua família. Resolveu seguir a sugestão do mestre e deixar o assunto de lado e respondeu alguns segundos depois. - Ela está muito cansada mesmo.
- Nunca entendi ao certo porque isso acontece, mas desde criança ela é assim... Sempre que fica com uma criança que seja, ela volta cansada. E por outro lado, a criança volta ainda mais alegre e agitada que antes. – enquanto ele falava, depositava a louça suja na pia, pegava uns frascos na prateleira e acendia o fogo para preparar o chá relaxante para sua filha. - É como se Yume doasse sua energia para a criança...
- Mas será que ela sabe que faz isso? Eu digo, será que ela percebe o quanto se doa?
- Provavelmente não. É natural dela. Na verdade, isso não acontece só com crianças. Acontece com qualquer pessoa que ela sinta que precisa de algo. Mas com as crianças é automático. Mas acontece com adultos também. Na verdade Draco, – Hikari terminou de lavar a louça e olhou para Draco, que guardava os copos na estante. Draco percebeu o silêncio e encarou o mestre, aguardando o restante da fala. – Isso aconteceu quando você chegou também. – separou umas ervas frescas e depois de macerar algumas, colocou-as na água quente da panela, tampou e desligou o fogo. - Enquanto você dormia, logo que chegou, e na primeira noite, ela não dormiu quase nada. O engraçado é que dessa vez ela não ficou cansada, e sim ligada, como se... não houvesse sido uma... doação de energia, como acontece normalmente, mas sim uma troca. Achei curioso, mas pensei que fosse uma forma de evolução da sensibilidade dela, mas vejo que foi só com você.
- Eu não entendo, senhor. Por que seria diferente comigo?
- Eu não sei, meu filho... eu não sei. Talvez você também tenha algo que fazer por ela. Foi uma troca. É a única resposta que vejo.
Dizendo isso Hikari serviu o chá num bule pequeno e o colocou numa bandeja com duas xícaras e saiu sem falar mais nada. O loiro não soube o que falar. Apenas acenou, terminou de enxugar os pratos e subiu com a bandeja para o quarto de Yume.
“Uma troca?”, ele pensava. “Estranho... mas talvez faça algum sentido...”

Entrou no quarto dela e a encontrou já deitada na cama, dormindo, e o som ligado tocando uma linda canção em inglês. Deixou a bandeja ao lado da cama e tocou seu ombro de leve, vendo-a abrir os olhos lentamente.
- Seu chá... o cheiro está uma delícia... beba um pouco.
- Tentei não dormir para esperar o chá, mas acabei cochilando. – ela falou se sentando na cama. Enquanto pegava a xícara que Draco lhe oferecia, ele se sentava na beirada da cama e a observava atentamente e boquiaberto.
Ela vestia uma camisola marfim de alças e um roupão longo de cetim por cima cuja gola ricamente bordada cobria apenas um dos ombros, pois escorregou para um lado quando ela se sentou. Os cabelos negros contrastavam lindamente com a cor clara da roupa e da pele macia dos ombros e colo. Ela segurava a xícara com as duas mãos e mantinha os olhos fechados, entregues ao cansaço e ao delicioso sabor do chá. Mas não estava tão entregue a ponto de não perceber as diferentes ondas de energia que vinham do rapaz a sua frente. Levantou um pouco a cabeça, apenas o suficiente para ver que os olhos dele a encaravam profundamente. Os mesmos olhos cinza-escuros e turvos que vira outro dia. Os mesmos olhos recheados de desejo.
“Ela está linda...”, ele pensava sem conseguir desviar o olhar do ombro nu e do pescoço alvo, emoldurado pelos fios negros que desciam pelo peito e pelas costas. “Não seja um idiota, ela precisa descansar...”, repreendeu-se mentalmente tentando desanuviar os pensamentos que começavam a esquentar. Balançou a cabeça levemente e conseguiu olhar para outro canto do quarto, sem reparar na boca da oriental onde se via um sorriso tímido se formar e logo sumir. O cômodo era bem aconchegante e amplo. Todo em cores claras e bem organizado, com flores naturais ao lado da janela. Decidido a não se deixar levar pelo desejo novamente e correr o mesmo risco das outras vezes, quando ela saiu sem dizer nada deixando-o com cara de bobo e emburrado por três dias ou quando ela o empurrou muito delicadamente, voltou à sua expressão ‘Eu não devo me preocupar com isso’ e quebrou o silêncio:
- Quer mais? – perguntou oferecendo o bule para ela já a servindo quando viu que a xícara já estava vazia e serviu um pouco para si também. Provou o chá, instantaneamente aprovando seu sabor refrescante e relaxante. “Vou precisar de uns três litros disso aqui.”
- Obrigada. – ela disse sorrindo suavemente fazendo-o se lembrar em um salto do que prometera.
- Acabei de me lembrar... te prometi algo antes do jantar... – ele disse de sopetão, sem-graça, temendo o perigo da aproximação.
- É verdade... – ela sorriu. Como já estava bastante sonolenta e ainda mais relaxada depois de duas xícaras do especial chá de camomila de seu pai, ela não percebeu o embaraço do rapaz. Estava realmente muito cansada e uma massagem no ombro ajudaria a liberar os nós que se formavam em seus músculos. Deixou a xícara no criado mudo e se deitou novamente de bruços na cama, afastando o cabelo para o lado e abaixando o roupão até a altura da cintura.
“Certo... e agora?... Como assim, e agora? Até parece que não sei como agir! Malditos hormônios... ela aí toda inocente, cansada depois de um dia terrível, seu irmão doente e seu pai achando que pode confiar em mim... Ahhh... Droga!!! Será que pode mesmo? Eu não confiaria... mas... se ela confia... Hummm... então talvez... talvez eu devesse confiar nela também.” Levou uns segundos travando uma batalha interna de consciência, moral e gratidão. “Ela precisa de mim agora, então eu estarei aqui.” Pensou decidido e se concentrou em estar presente para fazê-la se sentir bem e relaxar, deixando de lado quaisquer sentimentos que surgissem. Aproximou-se dela na cama, ficando ao seu lado, esfregou as mãos para esquentá-las e tocou-lhe nos ombros, agora livres do roupão. Sentiu a pele dela quente e retirou as mãos imediatamente como se tivesse levado um choque e esfregou-as de novo a fim de esquentar os dedos.
Um pouco inseguro e temeroso, tocou-a novamente, massageando seus ombros de leve. Pressionava os músculos, sentindo pequenos nós de tensão na superfície da pele quente dela. Apertava seus dedos no pescoço dela, descendo aos ombros, escápulas e deslizando pela coluna. Ao ver que ela pareceu relaxar um pouco mais, e percebendo que também se sentia mais à vontade, repetia os movimentos, intensificando a massagem. Ela reclamou vez ou outra de um ponto que doía mais, fazendo-o demorar mais um tempo ali. Reclamou também com uma exclamação ou outra ou um breve gemido de dor, fazendo-o parar por medo de machucá-la, mas ela apenas mexia a mão ao lado do corpo, que estava quase encostada na perna direita dele, e ele entendia que devia continuar. Depois de uns minutos ela mexeu a mão novamente, tocando a perna dele propositalmente. Ela estava muito sonolenta, mas não se sentia tão cansada como antes. Sentia-se revigorada. Percebeu que o loiro suavizou o movimento, até chegar ao ponto que o toque mais parecia um carinho, mas que ele pareceu não se dar conta disso. Percebeu também que quando os dedos dele tocaram seu pescoço novamente, mas agora de maneira suave, deixou escapar de sua garganta outro gemido, porém não mais de dor.
A visão que ele tinha agora era mesmo muito tentadora. Não era mais uma linda garota cansada e entregue ao sono, como alguns minutos atrás. Agora, via à sua frente uma linda garota, deitada e entregue às suas mãos e suas carícias. Aliás, nem percebeu quando a massagem passou a ser carícia. Deslizava as mãos nas costas dela pressionando a pele de leve. Quando chegou ao pescoço da oriental e ouviu seu gemido suave, foi tomado pela surpresa e por um formigamento no peito, impedindo-o de controlar o ímpeto de descer o tronco e beijar o ponto que causara tal exclamação, próximo à nuca de pele tão delicada. Depositou um beijo, e depois outro, enquanto ela se movia vagamente, mergulhando nas novas sensações daquele contato. Os fios loiros do cabelo do rapaz batiam de leve no rosto da japonesa provocando o riso nos lábios dela. O som baixo e alegre do riso o fez acordar.
- Yume... – ele sussurrou perto da orelha dela. Com a mão direita acariciava os cabelos sedosos e a outra pousava delicadamente sobre o ombro esquerdo da moça. Em cada letra do nome que ela ouviu identificou uma nota diferente, entre medo, dúvida, carinho e o inconfundível desejo.
- Eu sei... – ela respondeu diretamente. Virou um pouco o corpo para ficar de frente para ele, no que ele escorregou para o lado, sentando-se no chão e mantendo seus rostos bem próximos e as mãos entrelaçadas sobre a cama. Mesmo muito sonolenta ela disse: – Não sei explicar, Draco... Não pergunte.
- Eu odeio me sentir confuso... Eu não sei o que eu sinto...
- Não tente explicar em palavras... Nunca será possível. – já quase com os olhos fechados, ela fez um carinho no rosto dele, admirando cada linha para gravar na memória. – Eu também não sei o que sinto. – “Nem por você, nem pelo Enrique”, ela pensou antes que tivesse controle sobre as palavras que surgiam em sua mente.
Draco olhou-a diferente. “Enrique? Não tentei Legilimência agora... Como funcionou?”
- É melhor eu ir... – Draco disse hesitante. – Durma bem, ok?
- Espere! – agarrou a mão dele antes que ele as separassem. - O que foi? Sua voz mudou. Parece assustado de repente.
- Você me deixa confuso... e talvez um pouco assustado também. – mentiu ele.
Ela riu. Um riso calmo e cúmplice.
- Eu? Tá legal... Você é o misterioso por aqui.
- Está melhor? – perguntou sem rodeios para mudar de assunto.
- Estou.
- Então é melhor eu ir...
- Certo. – respondeu já fechando os olhos e dormindo quase imediatamente.
Draco saiu do quarto ainda sentindo o formigamento no peito e o calor da pele de Yume nas mãos. A mente ainda mais confusa se perguntando: “Como pude saber o que ela estava pensando se eu nem tentei? Nem sei como reagir ao lado dela... Quem é Enrique afinal? Quase a beijei de novo, me aproximei sem perceber...”

Yume acordou ao sentir seu colchão afundar com o peso de alguém, mas não conseguiu abrir os olhos ainda. Sentiu o colchão afundar repetidas vezes, como se alguém estivesse quase pulando ao seu lado. Vencida pela curiosidade mais do que pelo despertar, abriu os olhos e com muita alegria viu Shaoran sorrindo ao seu lado, enquanto pulava na cama para acordar a irmã.
- Dorminhoca! Está na hora de levantar... – ele falou rindo.
- Que bom que está melhor. – ela disse com a voz pastosa de sono, mas com um enorme sorriso no rosto.
- Estou sim. Obrigado por cuidar da minha turma. Eles não maltrataram muito você não, né? – ele sabia o quanto sua irmã era sensível às energias agitadas das crianças e como ela se esgotava, e tocado pelo cansaço que ela apresentava mesmo àquela hora da manhã, tratou de agradecer antes que ela dissesse qualquer coisa.
- Não tanto quanto você me maltrata. – ela brincou puxando o irmão para um abraço. – Ainda é muito cedo, não é? Vem aqui. - ele se deitou ao lado dela e se deixou ser abraçado com todo carinho que ela tinha por ele. Ouviram uns barulhos no quarto ao lado, mas não deram muita importância e continuaram ali quase pegando no sono de novo.
- Yume? – a porta do quarto da garota abriu-se de repente e Draco surgiu com a preocupação estampada no rosto pálido. – Você v... Ah, não acredito! – ele suspirou aliviado ao ver a cena fraterna e tocante. A garota colocou o dedo nos próprios lábios pedindo silêncio. – Está tudo bem? – ele perguntou.
- Está... ele veio aqui me acordar, mas acabou dormindo de novo.
- Seu pai pediu pra eu levar o remédio pro Shao e alguma coisa pra ele comer e quando cheguei ao quarto e não o vi, fiquei preocupado...
- Está tudo bem. Pode deixar o remédio aqui, eu dou a ele depois. – ela sorria feliz ao ver a real preocupação nos olhos do loiro.
- Chega desse remédio ruim. – Shao resmungou baixinho fazendo uma careta e tossiu fortemente sendo possível ouvir seu peito chiar.
- Ainda não, mocinho. Você já está bem melhor, mas ainda não está 100 %. Vai continuar tomando o remédio sim. Obrigada Draco. – agradeceu ao ver o rapaz deixar uma bandeja com uma xícara, algumas torradas e duas frutas para o garoto.
- Lamento ter entrado assim no seu quarto... Vou avisar seu pai que Shaoran já está melhor. – e saiu do quarto sem esperar resposta.

O dia foi bem menos cansativo para Yume, pois Shaoran já estava acompanhando as aulas e mesmo que estivesse apenas olhando enquanto Yume seguia o treinamento, ela se sentia bem melhor. Dividia com ele a energia excessiva das crianças e não se sobrecarregava. Draco não fez a aula de Yume nesse dia, ficou o dia todo treinando pesado com o mestre Yamamoto e mais outros três alunos. O mestre estava tão orgulhoso de ver o progresso que seu visitante fizera desde que chegara ali. Se antes ele mal sabia girar a espada na horizontal, hoje ele enfrenta os alunos intermediários, isso com apenas pouco mais de um mês de aprendizado. Era realmente impressionante.
Depois do jantar, Hikari logo se retirou e foi dormir cedo e Yume estava no quarto com Shaoran tentando convencê-lo a tomar mais uma dose do chá amargo que fizera para ajudá-lo a respirar melhor.
Draco foi para a varanda e ficou a admirar a noite sem lua e o céu claro de tantas estrelas. Seu olhar demorou-se um pouco mais quando passou perto da amoreira a menos de três metros da varanda. Pensou ter visto ali uma criatura pequena parecida com uma fada mordente, porém levemente brilhante e com asas coloridas e parecidas com pétalas de for, e essa não era a primeira nem segunda vez que as viam, mas era sempre a noite, no escuro, e nunca conseguiu reparar melhor. Pensou estar imaginando criaturas mágicas pelo tempo que estava distante de tudo referente à mágica que conhecia. Um barulho vindo do segundo piso da casa o fez desviar o olhar para cima, distraindo-o e fazendo-o se lembrar que tinha que aplicar a pomada no ombro.
Ficou ali avaliando seus dias, tudo que aprendera e que mudara em si. Conceitos, idéias, ideais. De olhos fechados pensava no treino da tarde onde lutou com dois alunos ao mesmo tempo, usou duas espadas e muitos golpes, e não foi atingido em nenhum momento. Pensava também na noite anterior, quando chegou a pensar em beijar Yume de novo, sem avaliar os estragos de tal impulso. Sentiu a lembrança do cheiro da pele dela entrar em suas narinas, transportando-o ao desconhecido. O perfume se movia e abriu os olhos para constatar que o aroma não era só uma lembrança.
- Está sem sono? – perguntou quando a viu se sentar numa cadeira ao seu lado.
- Mais ou menos... não te vi hoje... Como foi seu dia?
- Intenso. Treinei com seu pai o dia todo e obtive bons resultados.
- Não tenho dúvidas disso.
- Yume... eu... devia...
- Shhhh... não comece, Draco. Não deve pedir desculpas ou qualquer coisa do gênero.
- Nunca vou me acostumar com isso. Odeio quando você sabe o que eu vou fazer antes que eu tenha certeza se devo fazer ou não.
- Não é culpa minha se você é transparente!
- O quê? Transparente!!! Isso é uma ofensa pra mim, sabia? Por muitos anos eu trabalhei minhas ‘máscaras’, como você disse outro dia, e me aperfeiçoei a ponto de nem minha mãe saber o que eu estava sentindo. Agora você fala com tanta naturalidade que eu sou transparente? – apesar de falar num tom entre o indignado e o revoltado, ele sorriu no final da pergunta.
- Para mim você é transparente. Eu enxergo suas máscaras e consigo desvendar todas elas. E sei que você não gosta dessas máscaras, apenas as usa para se proteger.
- P-prot-teger? – gaguejou e ergueu uma sombracelha em descrença.
- Das pessoas, das dúvidas, e principalmente, dos sentimentos. Os seus e de todos que o rodeiam.
Ele permaneceu em silêncio por alguns minutos. Não ousaria quebrar aquela onda de verdade que invadia o ar e atingia seu peito como repetidos raios de uma tempestade. “Máscaras... Proteger... Sentimentos”, as palavras reverberavam em sua mente. “Faz sentido mesmo...”, começou a entender o que ela quis dizer quando lhe falou que ele tinha muito que aprender ali e esperava que não fossem apenas chás e meditação. “Estou aprendendo sobre mim mesmo”.
Alguns silenciosos minutos se passaram. Ambos encarando o céu salpicado de estrelas, aspirando o perfume da brisa fresca da noite.
- Por que eu me escondo dos sentimentos? – o loiro ouviu-se perguntando.
- Você não faz nem idéia? – ela perguntou com um sorriso. Virou-se na cadeira e ficou de frente pra ele. – De que sentimentos você se esconde, Draco? Eu arriscaria dizer que você se esconde de todos eles. De tudo o que você desconhece.
- Está querendo dizer que eu desconheço sentimentos?
- Estou??? – sorriu enigmática.
- E se for necessário eu esconder os sentimentos? E se eu estiver tentando esconder meus sentimentos para proteger alguém? – arriscou uma pergunta sem sentido.
- Você poderia fazer isso a partir de agora, mas é novo pra você. Não fuja da verdade Draco. A sua verdade. Não preciso conhecer seus segredos pra conhecer seu coração. A sua verdade é o que importa.
- E se for uma verdade que eu quero esconder? – sua voz escapou sem passar pelo filtro da razão.
- Por que quer esconder? – ela perguntou se perdendo na profundeza do olhar penetrante do loiro.
Embalado pela pureza dos olhos negros que ele encarava, concluiu por fim, dizendo o que seu coração gritava:
- Porque eu tenho medo... Tenho medo de saber que o que eu sinto não é suficiente. Medo de me decepcionar quando descobrir que minha família nunca foi uma família de verdade. Medo de admitir que nunca tive amigos de verdade. Que nunca amei ou fui amado de nenhuma forma. Medo de tentar... De sentir qualquer coisa.
- Você ainda tem esse medo? – ela perguntou algum tempo depois.
- Não aqui. Mas ainda não sei o que eu sinto. – ele a olhava diretamente nos olhos. Levou sua mão ao rosto da oriental fazendo um carinho suave com a ponta dos dedos frios.
- Eu também não sei Draco... Mas sei que ainda temos muito que aprender um com o outro... E superar... Agora começo a entender algumas coisas com maior nitidez... - ela abaixou a cabeça eliminando o contato com a mão dele, permitindo o pensamento claro vir à tona, sem interferência das sensações eletrizantes que mesmo um breve toque causava.
- Como o quê? Como o que está acontecendo com a gente?
- Por aí... Não confunda as coisas, Ryu. Suas escamas são mais fortes do que eu havia pensado, seu coração está se preparando para abrigar as mudanças que virão e seu poder ainda deve ser polido. Concentre-se nisso.
- Mudanças? Poder? Coração? Do que está falando?
- Não precipite o aprendizado. Os sentimentos são mesmo confusos. Com qualquer pessoa... Entre nós também... Eles me confundem o tempo todo.
- Odeio me sentir confuso Yume... Sei que existe algo... – ele se levantou e ficou a andar de um lado para outro e logo parou diante dela, sentando-se no chão e encarando-a diretamente e sem medo de se expor. – Senti isso ontem, senti no dia que cheguei e você segurava minha mão enquanto eu sofria com meus pesadelos, senti quando eu acordei no segundo dia, senti quando te beijei sem nem perceber o que fazia e sinto agora. Apenas sinto, não posso explicar.
- Abra sua mente, Draco. – ela falou baixinho enquanto pensava: “Você ainda não está pronto para isso!”
- O quê? - “Pronto? Pronto para quê? ... Como?... De novo?... Estou sem varinha... Como posso ler os pensamentos dela? Que conexão é essa? – O que... quer dizer... com ‘Abrir minha mente’? - ele pensava atordoado, sem entender mais nada, com a expressão de dúvida explícita no rosto. A resposta veio ainda mais confusa.
- Não confunda a magia de nossas mentes com a magia de nossos corpos. – a oriental disse em tom misterioso, seus olhos negros fixos nos cinzas dele. Não se incomodava com a proximidade perigosa, apesar de quase fechar os olhos ao sentir o hálito de menta tão próximo de seu rosto.
- Não sou muito amigo das esfinges... pode dizer com clareza, por favor? – ele bufou contrariado tentando a todo custo ignorar o aroma agradável e entorpecente que ela emitia.
- Abra sua mente, Draco. Desfaça-se de seus pré-conceitos, de seus antigos ensinamentos. Aceite o novo, se prepare para receber o novo. Que conexão é essa que sentimos? – viu-o com o olhar de puro espanto, e sorriu. – É o que está pensando, não é? Eu não posso ‘ler’ pensamentos... mas essa pergunta estava estampada em seus olhos... como se as palavras saltassem de sua mente e se formassem no ar... Mas e você? Como viu o que eu pensei? Por que essa conexão existe?
- Como sabe o que eu vi?
- Eu apenas sei... as palavras ‘se formam’ no ar...
- O que é isso afinal? Existe algo aqui... – ergueu os braços abrangendo a ambos. - Existe, e é forte e eu não conheço e eu tenho medo sim de descobrir. Não pode ser só atração simplesmente. Sei que não é só isso.
- Sinto-me conectada a você de alguma forma... atraída também... e sei que é recíproco. Mas não é essa a questão. Somos mais do que isso.
- Então me explique, por favor.
- Lamento Draco, mas eu também não sei explicar. – ela tinha um sorriso sem-graça nos lábios, um sorriso sincero como se pedisse desculpas pela falta de informação. - Nem tudo é possível aprender em livros ou ser explicado racionalmente. Acredite na magia de nossas mentes. – agora o sorriso aumentou e iluminou toda a noite. - Apenas acredite na magia Draco! É disso que somos feitos.
Sem poder dizer o que a magia realmente significava para ele, Draco apenas abaixou a cabeça e se jogou pra trás, deitando no piso de madeira da varanda com os pés em cima de uma cadeira e os braços atrás da cabeça.
- Eu acredito! – falou baixinho, sem ter certeza se queria que ela realmente ouvisse, mas desconfiou que ela tivesse ouvido, pois logo em seguida ela se levantou da cadeira e se abaixou ao seu lado, beijou-lhe a testa e entrou em casa depois de lhe desejar “Boa noite”.
Draco ainda ficou um tempo na varanda tentado absorver toda a conversa. Era muita informação, muitos sentimentos, muitas verdades. Precisava de tempo para aceitar e entender a complexidade de tudo aquilo. Quase uma hora depois ele também entrou e foi ao seu quarto para tentar dormir.

Durante toda a semana, Draco estava impaciente por não conseguir entender como foi possível ‘ler’ os pensamentos de Yume. Ele tinha certeza que tinha entrado na mente da garota, mas não foi intencional, o que tornava as coisas muito mais estranhas. Não conseguindo mais conter sua curiosidade, Draco resolveu perguntar a Yume o que há alguns dias queria saber. No fim da aula, esperou os alunos partirem e foi até ela.
- Yume... eu preciso te perguntar uma coisa. – ele foi direto ao ponto.
- Pode dizer...
- Quem é Enrique?
- ... – ela abriu a boca pela surpresa, mas não conseguiu falar nada.
- Não quer falar sobre ele?
- E-eu... n-n... c-como s-soube dele?
- Eu apenas sei... as palavras ‘se formam’ no ar... não foi o que você me disse sexta passada? Estou começando a acreditar...
- Eu não sei o que falar...
- Fale-me sobre ele então. Você pensa nele o tempo todo. Você não sabe o que sente por mim por causa do que sente por ele? – perguntou, totalmente satisfeito pela expressão de puro espanto no rosto da garota, deixando escapar um sorriso travesso no canto dos lábios por ter chegado exatamente no ponto que queria.
- Certo... Você é melhor nisso do que eu... Ok... Eu o conheço há algum tempo, e... e nem sei se ele sabe que eu existo... Ele era o melhor amigo do Iuki e o melhor aluno da academia, depois de Iuki, claro. Mas... eu... não quero falar disso Draco.
- Você pensa nele o tempo todo...
Ela lhe lançou um olhar raivoso. Então ele prosseguiu:
- Tudo bem, já que não quer falar dele, vamos falar do Iuki então. Você me disse que outro dia falaríamos dele... Por que não quer se lembrar do irmão que você tanto gosta?
- Que eu tanto amo. E que partiu, sem se despedir, sem me dizer se pretendia voltar algum dia. – respondeu seca, com os olhos brilhando de mágoa.
- Eu sinto muito...
- Por que isso agora? – ela perguntou brava.
- Não consegui ficar de boca fechada... Sinto muito, mas como você mesma me disse, enquanto eu não souber de alguma coisa, não saberei qual assunto é proibido.
- Isso não te dá o direito de interferir... E FERIR... E aliás, ainda não sabemos nada sobre SEU assunto PROIBIDO, não é? – não esperou a resposta e saiu dali a passos rápidos sem olhar para trás.
“Droga, é verdade... eu peguei pesado e fui rápido demais”, pensava Draco ao ver a garota sumindo na trilha do bosque.

No jantar de quinta-feira, onde Shaoran já fazia suas brincadeiras habituais e ouvia-se sua risada explosiva e contagiante, Draco a todo momento buscava o olhar de Yume para pedir-lhe desculpas pelo seu comportamento do dia anterior. Mais tarde ficaram na varanda jogando Sudoku ou Xadrez, para a alegria de Shao, que ganhava quase todas as partidas.
- Viu? Não falei que ninguém ganha de mim? – o menino disse sorrindo radiante. – Agora não adianta mais vir com a desculpinha de que você não está em sua melhor forma... hahaha... você perdeu pra mim, de novo.
- Pula essa parte, campeão. – o loiro falou emburrado.
Algum tempo depois Shao subiu para dormir e Yume logo o seguiu, mas Draco a segurou pelo braço antes que ela subisse também.
- Espere! – ele pediu suplicante. Segurou-a com as duas mãos pelos ombros delicadamente, mergulhando em seus olhos tão intensamente negros. – Eu só quero pedir desculpas. Toquei num assunto que te magoa. Eu sinto muito. Já me sinto um pouco mais preparado pra tocar nos meus assuntos proibidos... mas vamos pegar leve, ok? Eu realmente sinto muito por ter te magoado, Yume.
- Não sente tanto quanto eu. Ainda me dói falar do meu irmão. E não quero falar do Enrique porque acho que não tenho o que falar... É bobeira minha mesmo... É amorzinho de criança, coisa boba, que hoje em dia não deveria ter significado nenhum. Eu gosto dele desde criança, mas ele nunca me deu muita bola... acho que nem sabe meu nome verdadeiro, só meu apelido na academia. E eu fiquei furiosa comigo mesma quando você me beijou e eu me lembrei dele. Não queria ter lembrado dele e ao mesmo tempo ter gostado tanto de você. O que, aliás, - complementou quando viu um esboço de sorriso surgir nos lábios do loiro e levantou o indicador impedindo-o de falar – eu também não quero comentar sobre isso agora. – terminou sorrindo também, ciente da ‘confissão’ que fizera. – Eu estou confusa Draco. Só sei que o seu destino não é aqui. Você pertence à Inglaterra, é lá que seu coração vai encontrar paz.
Ele apenas sorriu. Segurou as duas mãos de Yume entre as suas e beijou-as ternamente. Ela retribuiu o sorriso e se virou para a escada, indo para mais uma noite de sono.

Depois de uma semana puxada, os garotos conseguiram uma folga para passar o fim de semana em Lisboa para que Draco conhecesse um pouco mais da região. Desta vez foram apenas Yume, Shaoran e Draco. Saíram do sítio no sábado bem cedo e foram de ônibus para a capital. Visitaram os monumentos, pontos turísticos, e museus mais importantes.
Draco ficou encantado com a vista do alto do Castelo de São Jorge, de onde se viam os telhados das casas e suas paredes brancas, e ao fundo a ponte 25 de Abril; o emocionante passeio de bonde, “sempre emocionante e aterrorizante”, como Yume dissera; a Torre de Belém, lugar preferido de Shao; o labirinto das ruas do Bairro de Alfama, onde se encontram os típicos restaurantes com músicos tocando fado ao vivo; e o delicioso salame de chocolate e vinho do Porto que compraram num mercado e levaram para o quarto que alugaram para passar a noite.
O mais estranho para Draco foi quando entre todos aqueles bares no Bairro de Alfama, ele percebeu que havia ali um bar exclusivo para bruxos, que ele fez questão de passar do outro lado da rua por não ter se sentido bem naquela região, como se algo ruim existisse ali. Não deu muita atenção e voltou a pensar no fim de semana que havia sido tão divertido.
No domingo a tarde voltaram pra casa na certeza de que aquelas lembranças não seriam nunca esquecidas. Chegaram exaustos e foram cedo para a cama, mas não sem antes Yume bater à porta do quarto de Draco e entrar sem esperar resposta.
- Yume? – perguntou ele assustado e surpreso, segurando uma toalha que usava para secar os cabelos. Era possível ver as gotas d’água escorrer por sua pele clara, descendo de seus ombros largos, onde ainda se via marcas do corte, passar pelo peitoral e o abdômen definido e morrer no cós do short azul e curto que usava.
- Draco... D-desculpe... – respirou fundo e foi impossível não viajar no delicioso aroma que vinha da pele dele e invadia suas narinas, embaralhando seus sentidos por um instante. – Eu... quero te perguntar uma coisa...
- Sim... – ele falou sorrindo de lado, satisfeito com o efeito que causara, mas pensando que o modo que ela entrara ali foi bastante estranho. “Ela está estranha.”
- Draco... – suspirou audivelmente e falou baixinho. – Ahhh... assim fica difícil ser direta...
- Algum problema? – perguntou confiante e sedutor, andando devagar na direção da garota, na clara intenção de deixá-la constrangida. Colocou a toalha nos ombros, em volta do pescoço e parou de frente para ela. “Ela está estranha. Isso não me parece bom.” Pensou antes de cruzar os braços no peito e repetir a pergunta, agora num tom de voz preocupado e sério. - Algum problema, Yume?
- Vou ser bastante direta, antes que eu me distraia com... qualquer coisa... – deu um passo a frente e fechou a porta atrás de si. Distanciou-se de Draco em dois passos como se fosse uma distância segura para ignorar o perfume delicioso que dançava no ar, e só então falou com a voz firme e muito séria. - Você sentiu algo diferente naquela rua onde jantamos ontem. Sentiu, não foi? Havia algo ali, algo que eu não sei explicar.
- O que quer dizer? Diferente como, Yume? – “Como é possível ela saber?” Incomodado, apertou mais os braços contra o peito como se assim fosse possível se fechar da vulnerabilidade que sentia ao lado dela.
- Você sabe o que quero dizer. Senti uma energia diferente, uma vibração diferente. Sei que também percebeu, você reagiu... ficou perturbado, foi para o outro lado da rua, olhava ao redor como se procurasse algo... algo perigoso. Sei que sentiu... O que foi aquilo? Que lugar é aquele? Que tipo de pessoas o freqüentam, quem estava lá?
- Yume... eu não sei... do que está... falando... – sua voz estava tensa.
- Sabe sim, Draco. Você também sabe que sei quando você está em casa antes mesmo de se aproximar da varanda... Que eu sei dizer quando você está mentindo... Que sinto sua vibração e reconheço sua energia. Reconheço também que é diferente de todo tipo de energia da qual estou acostumada. Draco? - sua voz era suave e tranqüila. Ela pareceu hesitar ao falar, não sabia como chegar àquele ponto. – Draco... eu senti seu mesmo tipo de energia naquele lugar...
- Essa energia que você sentiu... era boa ou ruim? – sabia que não era possível esconder nada dela, nem queria. Sentia-se totalmente desarmado, totalmente nu.
- Não existe energia boa ou ruim. O que existe é a forma como você vibra. Como você decide. A escolha é sua... Tem momentos bons e momentos ruins... Espere... – levantou uma mão quando ele abriu a boca para falar e interrompê-la. – Você chegou aqui de um jeito e hoje está tão diferente... eu posso sentir... – esticou o braço em direção ao rosto do garoto, mantendo-o a alguns centímetros de distância – Quase posso tocar... – aproximou mais um pouco e desceu a mão, pousando-a no peito dele – E é bom... sei, ou melhor, sinto que é bom. Por que se afastou deles? Era a mesma energia, mas a vibração era outra... era ruim. Por isso você se afastou, Draco? Do que você tem medo? Que eles o reconheçam, como você os reconheceu? Você também percebeu, não foi?
O loiro pegou a mão de Yume que estava em seu peito e delicadamente puxou-a até se sentarem nas almofadas perto da janela e falou:
- É impossível esconder qualquer coisa de você, não é? Eu aprendi muita coisa com você Yume... Eu... me afastei porque... sei lá, não me senti bem ali... não sei se senti a vibração ruim que você disse ou simplesmente porque eu não quero voltar ao meu passado... ou-
- Ou reencontrar seu passado? – interrompeu-o.
- Talvez. – ele se levantou e virou-se para a janela que estava aberta. Aspirou ao frescor leve da brisa noturna e voltou a encarar a garota. – Como é possível sentir isso? Sentir a energia de alguém ou de um lugar? Como você reconhece essa energia?
- Minha mãe me ensinou ainda muito nova. É bem tradicional na família dela e foi passando de uma geração a outra, e também aos amigos que apresentavam alguma facilidade. Já tenho algum tempo de prática. – sorriu tímida e foi até ele. – Se você quiser e praticar, pode aprender também... algo me diz que você vai aprender bem mais rápido do que eu... Olha... não dava pra esperar muito tempo com essa dúvida na minha cabeça. Não te assustei ao entrar aqui daquela forma, assustei?
- Não. De forma nenhuma. Mas você me pegou de surpresa... – o sorriso malicioso que surgiu em seus lábios fez a garota corar. – Esquece isso... E eu quero aprender sim. Quero saber como fazer isso... Pode me ensinar isso também? – perguntou esperançoso e com grande expectativa.
- Isso leva tempo, Ryu. Mas eu acho que o básico você já aprendeu. Preste mais atenção e você vai perceber que já reconhece algumas coisas. Pratique! E eu acho que você não tem tanto tempo assim. Você não pretende ficar todo esse tempo por aqui, não é? Sempre que falamos de tempo ou permanência ou casa, você se altera. Sua respiração, seus batimentos, seu ki. Torno a perguntar, do que você tem medo?
- Talvez... do próprio medo... – respondeu enigmático e soturno.
Ela o tocou no rosto de novo e ficando na ponta dos pés beijou-lhe a face com carinho, deu um sorriso calmo e disse:
- Então encare-o de frente. Encare-o com garras e cílios e veias e ouvidos e pele e dor e sonhos. Encare-o com a alma e com a palavra.
- Não é fácil Yume...
- Talvez não seja tão difícil assim...
- É sim... Você não sabe o quanto... São muitas coisas para enfrentar, esclarecer, perdoar... É insuportável... É muito difícil. – ele respondeu angustiado, com o sofrimento explícito em seus olhos e em sua voz baixa.
- Não... não diga que é difícil! – segurou suas mãos, apertando-a de leve entre seus dedos. - Entre o desconhecido sabor amargo ou ácido que lhe toca a pele... - soltou a mão direita e pousou na testa dele e desceu sobre os olhos, fazendo-o fechar as pálpebras. - ... feche os olhos da consciência... – deslizou os dedos a partir do queixo até chegar ao peito - ... e apure os ouvidos do coração, aspire ao aroma colorido da coragem e sinta a delicada superfície da verdade que acaricia as pálpebras cerradas. – ergueu-se na ponta dos pés novamente e depositou outro beijo delicado na bochecha do loiro.
Ele sorriu de leve, absorvendo os toques e as palavras.
As palavras ecoando em sua mente.
“Encare-o de frente. Encare-o com garras e cílios e veias e ouvidos e pele e dor e sonhos. Encare-o com a alma e com a palavra. *
Quando ela o viu sorrir tão sutilmente sorriu também. Começou a se distanciar devagar para que ele não percebesse seu afastamento, mas ele a segurou pela mão esquerda e também pela cintura. Ainda com os olhos fechados abaixou a cabeça e beijou-a nos lábios. Um beijo calmo. Carinhoso. Compreensivo. Ela correspondeu da mesma forma, como se conversassem por entre os lábios. O último beijo. Ela se afastou de novo e viu que ele ainda não havia aberto os olhos e perguntou-se divertida como sua mão direita foi parar na nuca dele e a toalha que ele segurava agora estava no chão. Enrolava os cabelos dele entre seus dedos e se deliciava com o sorriso bobo que ele mantinha nos lábios levemente avermelhados. Logo que ele abriu os olhos, ainda entorpecido pelas sensações, uma pergunta escapou da boca da oriental, entre o riso e o sussurro:
- Você ainda tem medo?
Ele a abraçou fortemente e com carinho, envolvendo-a pela cintura até tirá-la do chão, e ela o agarrava pelo pescoço, respirando o perfume da pele dele como se esse fosse seu único ar. Draco colocou-a no chão e murmurou em seu ouvido, fazendo-a arrepiar.
- Não mais... nunca mais...
E selou a verdade que pousava em seu coração com mais um beijo. Um beijo rápido e alegre.
- Boa noite Draco... – Yume falou sorridente empurrando-o pelo peito delicadamente, e saiu do quarto, deixando o loiro imerso no perfume leve como a brisa noturna que se desprendia dos cabelos negros dela, na voz doce com palavras puras como a chuva a bater nos troncos de bambu e no carinho que se espalhava pelo ar como o vapor aromatizado do ofurô.
Ele se jogou na cama sem conseguir pensar em mais nada. Algo novo surgia... Esqueceu-se da estranha sensação do bar de Lisboa, esqueceu-se do medicamento que ainda devia passar no ombro, esqueceu-se das dúvidas e dos medos. Esqueceu-se até da maciez do beijo terno que não deveria ter acontecido... De novo. Apenas repetia mentalmente as palavras e absorvia seus significados.
” Não diga que é difícil! Entre o desconhecido sabor amargo ou ácido que lhe toca a pele, feche os olhos da consciência e apure os ouvidos do coração, aspire ao aroma colorido da coragem e sinta a delicada superfície da verdade que acaricia as pálpebras cerradas.“
E adormeceu imediatamente.

Mais uma aula de Tai Chi Chuan havia terminado e Draco e Yume continuaram no pomar. Depois de conversar e descansar um pouco, seguiram para o treino com espadas. Alguns minutos depois...
- Corrija sua postura, Draco. Está errado.
- Ok...
Alguns golpes depois...
- Errado de novo, Ruy! Mantenha seu pé de apoio firme no chão, senão você cai. - ela falou depois de executar um giro no ar e desestabilizar a base do loiro.
- Ok. – ele respondeu ofegante. – Estou aprendendo aos poucos.
Alguns hematomas depois...
- Ei... não tão rápido! – reclamou o loiro enxugando o suor da testa com as costas da mão após uma seqüência de golpes rápidos onde ela o atingiu três vezes seguidas.
- Você já melhorou bastante, mas ainda é bastante lento. – brincou ela, rindo da cara dele ao vê-lo massagear a coxa direita, onde tinha levado um forte chute, e o braço direito, o qual tentou usar para proteger do mesmo chute na coxa. – Você vai sobreviver. Vamos. Só estamos aqui há vinte minutos.
- Eu sou tão ruim assim? Eu não apanho tanto do Shao. – falou emburrado.
- Você não é nada ruim. – ela sorriu. – Shaoran que é bonzinho demais. Você aprende bastante rápido e não é mais um mero principiante. Agora vamos intensificar seu treinamento e pegar mais pesado. Não há palavras para descrever seu progresso Ryu. Está de parabéns. Mas vamos lá. Essa é só sua terceira aula comigo. Chega de moleza.
- Moleza? Ah é? Tá legal... – disse em desafio a si mesmo. - Duas espadas então. Tenho mais equilíbrio com as duas...
- Você é quem manda... – disse a garota com um sorriso quase perverso nos lábios, pegando mais uma espada e jogando-a nas mãos dele.
Alguns minutos depois o loiro, ofegante, suado e sujo, reclamava novamente.
- Tá legal... talvez eu não tenha tanto equilíbrio assim. – ele falou com a voz trêmula assim que tombou, com as costas cravadas no chão, desarmado, e com uma das espadas da garota apontada para seu peito e a outra fincada no chão entre suas pernas e o pé dela encostado em sua garganta.
- Tsc... Tsc... Tsc... – ela balançou a cabeça como se o repreendesse pela falha, jogou as espadas no chão e estendeu a mão para ajudá-lo a levantar. – Errado de novo...
- Só espero que meus erros me façam mais forte... e menos sujo da próxima vez. – falou irritado, tirando a camiseta que estava suja de terra e usou-a para secar o suor que escorria do rosto ao pescoço e costas. - Eu tenho o direito de estar errado, não tenho?
- Eu sabia que essa música combinava com você... – ela disse sorrindo, ignorando a expressão séria e preocupada no rosto do rapaz e deixando-o muito curioso.
- Que música? – perguntou apoiando numa árvore e sentando-se no chão para recuperar o fôlego.
- Aquela que eu estava ouvindo quando você foi ao meu quarto naquele dia do chá... naquela hora eu percebi como a letra se parece com você...
- Como uma letra de música vai se parecer comigo, Yume? – perguntou com ironia.
- Pára de ser chato... a letra fala de você... – e começou a cantar - *
I've got a right to be wrong
(Eu conquistei o direito de estar errado)
My mistakes will make me strong
(Os meus erros me tornarão forte)
I'm stepping out into the great unknown
(Estou avançando no grande desconhecido)
I'm feeling wings though I've never flown
(Eu sinto que tenho asas apesar de nunca ter voado)
I've got a mind of my own
(Eu tenho me importado mais comigo mesmo)
I'm flesh and blood to the bone
(Eu sou de carne, sangue e osso)
I'm not made of stone
(Não sou feito de pedra!)
Got a right to be wrong
(Eu conquistei o direito de estar errado)
So just leave me alone...
(Então me deixe em paz!)*
- Linda voz em uma linda canção... – o loiro falou com a voz distante e suave.
- Obrigada... Adoro essa música... E me lembra você... Agora chega de descanso. Mais treino... só mais vinte minutos...
- Não pode ser dez? Hoje você pegou pesado vai... Minha coxa ainda está doendo...
- Lento, instável e fraco! Era só o qu-
- YUMEEEEEEE... DRACOOO... – foram interrompidos pela voz de Shaoran. O garoto apareceu gritando, ofegante pela corrida e muito sorridente. – Yume... papai já confirmou com todos os alunos... próximo fim de semana. Hahaha... Precisamos treinar. E é você que vai fazer a abertura... Que legal!!! Eu adoro os torneios. Tenho que avisar as crianças... Estarei no bosque! – tão rápido quanto chegou, ele partiu, deixando para trás a irmã surpresa e feliz e o loiro perdido e sem entender nada.
- Hummm... O que o furacão que acabou de passar por aqui quis dizer? – Draco perguntou.
- O último sábado de agosto é o dia mais esperado do ano por aqui... Todo semestre tem a cerimônia da troca de faixa e os testes em geral, mas no meio do ano é o que tem mais gente e algumas apresentações culturais.
- Eu aprendi a gostar de suas manifestações culturais.
- Eu sei. – ela se sentou ao lado dele, desistindo do treino e se entregando ao cansaço dos músculos. – E aprendeu muitas outras coisas também, não é?
- Com certeza... – ele respondeu vagamente.
- O que está pensando agora? – perguntou curiosa vendo-o com um brilho no olhar.
- Nas mudanças... não tenho mais máscaras... nem medos... – olhou significativamente para ela, lembrando-se do último beijo entre eles. – Mas continuo tendo muito mais perguntas do que respostas...
- Mas isso é ótimo! É o que move o mundo. Sempre tenha mais perguntas.
- Mas não gosto dessas perguntas. São dúvidas. Eu... não sei como agir... ao seu lado. Você tem uma espécie de raio-X que passa por mim e desvenda tudo o que eu sinto.
- Porque você é transparente. – falou em tom de brincadeira, mencionando uma conversa anterior.
- Exatamente... Não consigo entender como você me vê assim. Transparente. O sr. Hikari confia em mim sem me conhecer. Shaoran me trata como um irmão.
- E isso não é bom? Ryu, saiba que isso tudo vem de você. Nós apenas reagimos ao que sentimos, ao que você transmite. Ou ao que você precisa.
- E como vocês sabem do que eu preciso? – sua voz saiu nervosa.
- Não sabemos até que você nos diga. Quando você chegou era claro que precisava de ajuda. De muitos tipos de ajuda... Nós esperamos você pedir. E o pedido mudo é o mais poderoso...
- Aí está Yume... eu nunca tive nada disso, então é tudo novo pra mim. Você simplesmente sabe... Parece que você representa a família que eu nunca tive... – sua voz se perdia em pensamentos, saindo baixa e distante. – O carinho que nunca recebi de ninguém.
- Agora você entende nossa conexão? Eu tinha algo para te ensinar e algo para aprender.
- Aprender? – perguntou incrédulo que pudesse ter ensinado algo àquela garota tão especial.
- Aprendi a olhar para frente e para mim mesma, para o futuro, aceitando os riscos não calculados para aproveitar os prazeres esperados. E eu te ensinei a olhar para dentro, para si mesmo, para enfrentar seus medos e traumas e se preparar para o que vier, principalmente, o que vier de bom, que era o mais desconhecido pra você.
- Está aí o raio-X... Fascinante! Mas... eu... ainda não entendo Yume... nunca me senti assim. Sinto que com você posso falar o mais francamente possível, então, eu vou falar, ok? – vendo-a concordar e sorrir, ele prosseguiu sem demora. - Quando nos beijamos... foi... foi tão bom... foi intenso... – ele sorria e voltar a ficar sério de novo - Nunca me senti assim com nenhuma garota. Se bem que nunca me importei muito com o que sentia... Mas sinto que é mais do que isso, ou sei lá, não é mais do que isso... não sei... Viu? Odeio me sentir confuso... me sinto horrível por expressar esse sentimento... mas... eu... não sei explicar... Eu nunca me senti assim. Aquele dia, sabe, parece que foi o último beijo... Foi diferente. Sei que tudo isso despertou muita coisa em mim, mas não tanta coisa assim, entende? – ele mexia as mãos nervosamente, estava impaciente e inseguro, tanto por não saber como explicar o que sentia como por medo de falar algo errado e ela o entender mal.
- Draco... – ele não parou de se mexer - Draco... relaxa... – chamou de novo pegando em sua mão fria. - Não estou esperando você falar que está apaixonado por mim. – riu da cara assustada que ele fez. – Qual é? Não tem nada a ver... Não era pra acontecer. Eu sempre soube disso. Você sempre soube disso!!! Agora você entende nossa conexão e não há porque se sentir culpado. Também senti que foi diferente. – ela mantinha as mãos entrelaçadas com as dele fazendo um carinho leve nos dedos, obrigando-o a fechar os olhos e sentir-se bem mais tranqüilo. – Foi mágico! As três vezes que nos beijamos... Nunca fui beijada daquela forma. – ele abriu os olhos, curioso, e sorriu, retribuindo o carinho em sua mão. Ele encostou sua testa na dela apenas sentindo a troca de carinho que parecia passar pelo ar. Ela sentia a troca de energia como ondas de calor. De olhos fechados, ela sentiu os lábios dele em sua testa, depois em seu nariz, na bochecha, e então voltou a beijar a testa ternamente. – Agora sim você está pronto Ryu. – afastou-se um pouco, apenas o suficiente para encará-lo nos olhos. Sua mão pousava sobre o peito dele, no coração. – Agora seu coração está pronto.
- Pronto para quê? – perguntou curioso e suplicante, sentindo o coração apertado de ansiedade.
- Pronto para amar. – respondeu simplesmente e com um sorriso singelo.
Ainda ficaram um tempo ali curtindo o silêncio agradável e a companhia um do outro. Depois de alguns minutos Yume cutucou o ombro de Draco com o olhar inocente e uma desmedida força, bem onde estivera o corte mais profundo, e ele simplesmente a encarou como se perguntasse “Sim?”. Ela sorriu de novo.
- Você está pronto pra outras coisas também... – falou misteriosa. – Vem, vamos voltar a treinar... O torneio é semana que vem e algo me diz que você vai arrasar!!! – falou puxando-o pelo braço levando-o até onde Shaoran estava a treinar também.
Os três passaram o resto da tarde alternando entre treino sério e pesado com brincadeiras e risadas, alcançando um excelente resultado no fim do dia.

Ao chegarem em casa, logo após o pôr do sol, encontraram Hikari entretido com a lista dos participantes do torneio entre outras coisas da organização e Yume foi a primeira a pegar a lista para dar uma espiada. Tão logo a tocou, paralisou, deixando a folha escorregar da mão e descrever um caminho lento em direção ao solo. Tentou fingir que foi um acidente, mas Shaoran já tinha pego o papel do chão e procurava o motivo da reação de sua irmã.
- Ahá. Enrique! – ele falou baixinho para que seu pai não ouvisse. - Ele nunca deixa de vir... Eu não disse que ele estava pra voltar, maninha. E agora hein?
- E agora o quê? Por que haveria de ser diferente? – e entrou em casa sem esperar uma resposta, mas quatro passos depois ouviu a voz de seu pai chamando-a de volta.
- Querida... já pensou no que vamos ter na abertura?
- Ainda não papai, ainda não pensei em nada... – sua voz saiu mais rude do que queria. Respirou fundo e tentou corrigir o tom. – Quer dizer... mais ou menos. – falou com a voz mais animada. – Já tinha pensado nisso pro final do ano, mas deixei pra usar agora, onde todos os alunos participam dos combates, e têm também algumas apresentações a mais. Pensei em trazer um grupo de Taiko que se apresentou na minha escola no ano passado. Vai ser bem legal.
- Perfeito Tenshi... Perfeito! – Hikari respondeu empolgado.
- Hummm... desculpe, mas o que é Taiko? – Draco perguntou, não conseguindo segurar sua curiosidade.
- É um instrumento japonês. – Yume começou a explicar animadamente. - A palavra significa simplesmente "grande tambor". Mas fora do Japão é frequentemente usada para se referir a alguns dos vários tambores japoneses. O som dele é simplesmente fantástico, não tem como ficar imune à sensação que ele transmite. Tem vários tambores diferentes que compõem o grupo de Taiko. Temos por exemplo, o nagado-daiko que consiste em duas peças de pele de vaca estendida em uma peça única de madeira de corpo longo, tem o tsukeshime-daiko que tem um corpo menor e as peles são estendidas sobre anéis de aço, o okedo-daiko tem o corpo como de um barril, tem também o hira-daiko que é um tambor chato e vários outros, além de uma variedade de outros instrumentos de percussão utilizados nos conjuntos musicais japoneses como o noh, o gagaku e o kabuki. É tocada com a mão ou com o uso do Bachi, uma baqueta de madeira, mas sempre exige do músico a habilidade rítmica e o preparo físico para sustentar batidas homogêneas e obter um som satisfatório.
- Parece ser bem legal... – o loiro falou, encantado com a explicação da garota. Mas outra pergunta lhe veio à mente e sua expressão de interesse pelo Taiko se perdeu no tom preocupado de sua voz, sendo que antes de pensar em controlar a ansiedade na voz, as palavras escaparam de sua boca atropelando-se. – Agora, o que você quer dizer com “todos os alunos participam dos combates”?
- Quero dizer que você também vai lutar, Ryu!


\ * / . \ * / . \ * /

Menos de uma semana de férias... foi o tempo que Harry dera à sua mente para descansar antes de partir em busca às Horcruxes. Já estava tudo combinado com Hermione e Rony que os esperaria no jardim de sua casa e partiriam na madrugada da próxima terça-feira, antes que seus tios acordassem.
Logo que amanheceu, Petúnia viu o bilhete de seu sobrinho na geladeira. Não era bem um bilhete destinado a ela, mas sim aos amigos ‘estranhos’ do garoto. “Não se preocupem comigo. Estarei seguro e atento a tudo. Volto assim que terminar o que prometi ao Diretor e entro em contato caso necessário. Ou estaremos de volta para o casamento... HP + 2.” - era o que dizia o bilhete. Na mesma hora que ela lia o bilhete, o trio já estava longe, seguindo a primeira pista deixada pelo diretor.

Três semanas depois, dois dias antes do aniversário de Harry eles voltaram para a Toca. Com uma horcrux em mãos e sem saber como destruí-la, muito cansados e esgotados física e mentalmente, eles se preparavam para voltarem para o casamento de Gui Weasley e Fleur Delacour, que seria no dia seguinte ao aniversário de Harry.

- E Nagine, Harry... Como a encontraremos longe de Você-sabe-quem? – perguntou Rony enquanto arrumavam a barraca na última noite que estariam ali.
- Bem, como Mione disse esses dias, vamos descansar um pouco e logo depois do casamento nós partiremos novamente. Ainda temos muito que fazer.
- Lembra-se da outra coisa que eu disse Harry? – perguntou a castanha com olhar de censura para o amigo.
- Ahhh... Mione... ainda não concordo com isso!
- Não concorda com o quê, Harry? Mione? – indagou o ruivo olhando para seus amigos para saber quem responderia primeiro.
- Acontece Rony, que seu amigo teimoso e cabeça-dura insiste em dizer que não podemos pedir ajuda da Ordem.
- Qual é Harry? Já falamos disso, não falamos?
- Olha quem fala que eu sou cabeça-dura... – reclamou o garoto.
- Harry, o que faremos com as horcruxes depois de as termos encontrado? Como as destruiremos?
- Não sei Mione. Lembra naquele livro? Precisamos da espada de Griffyndor ou presas de basilisco ou o tal Fogomaldito...
- Ótimo! Aí está o problema, ‘cabeça-dura’! Fogomaldito é perigoso demais e os outros dois estão em Hogwarts! E não podemos ser encontrados por Comensais, que com certeza todos eles estão de plantão nos arredores de Hogwarts esperando você aparecer por lá. Harry... deixa de ser teimoso! Precisamos falar sobre isso com alguém da Ordem. Com certeza eles poderão ajudar.
- Dumbledore não disse a ninguém!
- E daí Harry? – Rony brigou, já irritado com a mesma história de sempre e a teimosia do amigo. - O que ele conseguiu com isso? Só faltam dois... e depois poderemos finalmente aguardar o momento da batalha final... pra só depois podermos finalmente respirar aliviados. Estamos na reta final, cara.
- Você também está contra mim, Rony?
- NÃO ESTOU CONTRA VOCÊ, Harry! Estamos aqui COM você, pra ajudar no for possível, mas, cara, tem mais gente que pode nos ajudar também. Lupin, Tonks, McGonagall, Quim, qualquer dos meus irmãos, meu pai... Precisamos da espada de Griffyndor e alguém vai ter que nos entregá-la!
- Isso mesmo Harry. Já conseguimos dois horcruxes, já sabemos que o diadema está em Hogwarts, e só vai ficar faltando Nagine, mas ainda não temos como destruí-las. – ponderou Hermione, com calma.
- E ainda NÃO DESTRUÍMOS nenhum... – não tão calmo, Rony completou o pensamento da amiga.
- TÁ BOM! Tá bom... AHHH... vamos falar com o Lupin então. – Harry se virou para não ter que encarar os amigos com os olhos carregados de frustação.
- Ótimo! – a castanha se animou um pouco, fingindo não dar importância à irritação do amigo. – Então assim que chegarmos à Toca falamos com ele, certo? Logo de cara, e sem enrolações! – ela disse apontando para Harry que tinha uma expressão muito suspeita no rosto.
- Droga! – o moreno resmungou.
- Te conheço muito bem, garoto. Assim que chegarmos chamamos o Lupin.
- Tá bom, Mione. Poxa... eu também quero acabar logo com isso.
- Nós sabemos, cara. Agora vamos comer alguma coisa que estou morrendo de fome. – Rony disse compreensivo enquanto abria a mochila em busca de algo para comer.

Logo que amanheceu foram para o Toca. Curtiram a família e ajudaram Molly nos últimos preparativos do casamento e no jantar de aniversário que Molly insistiu em fazer para seu ‘filho moreno’. Foram dois dias de festa, o aniversário e depois o casamento. Dois dias em que o trio só pensou em descansar, falar apenas com Lupin sobre a viagem e se preparar para a próxima etapa. Lupin prometera ajudá-los conforme fosse possível e disse que falaria com Minerva e inventaria alguma desculpa para pegar a espada, ou até algumas presas de basilisco se fosse o caso. E disse também que iria com eles se fosse preciso, sendo que esta oferta foi imediatamente recusada pelo trio de amigos.
No dia seguinte ao casamento o trio já se encontrava pronto para partir enquanto Molly se derretia aos prantos ao ver o filho e seus amigos com as mochilas nas costas. Gina estava trancada no quarto, pois não queria ver o momento que Harry desaparatasse. E sem demora, logo após o café da manhã, partiram para a última parte de suas aventuras.

Depois desse dia, mais um mês se passara sem que ninguém tivesse notícia de Harry, Rony e Hermione. Setembro já começou, os ataques dos Comensais ficavam cada vez mais freqüentes, e mesmo sem Dumbledore, Hogwarts ainda era o local mais seguro para os estudantes, mas mesmo assim ninguém sabia dizer se o trio voltaria para o último ano da escola ou se aguardariam a batalha final.


/ * \ . / * \ . / * \
. fim do capítulo .
\ * / . \ * / . \ * /


N/A:
* Trecho da poesia “O Medo Teme Você” – de minha autoria mesmo. Eu a escrevi algum tempo atrás, depois de assistir a uma peça de teatro baseada na obra de Clarice Lispector, de uma grupo da minha cidade. Saí da peça super inspirada... No meio da fic lembrei da poesia do nada, e vi que naquela parte ela encaixava perfeitamente... espero que tenham gostado.
* Música “Right to be Wrong” – Joss Stone


Aí está o segundo capítulo… o penúltimo dessa fase. Eu disse que essa é “só a introdução” pq fala só do Draco por enquanto, mas logo logo.... hehehehehehehe.........

Respondendo os comentários: (tão queridos...)

Anassissan: aí está o segundo capítulo já... e não vi mais seu coment... *sinf*

Brenda Marques: Vc sumiu! *snif* Nem apareceu para ler os capítulos... Volta aquiiiii...

Elros: É essa a idéia mesmo... imaginar o que aconteceu com a cabeça confusa do Draco depois de tudo aquilo... Espero que curta os próximos capítulos também... Obrigada pelo carinho... Bjão

Claudiomir: *que honra*... Que bom que gostou, fico muito feliz... Continue acompanhando que muitas surpresas estão por vir. Espero que goste ainda mais. Bjão.

Jeeh: hehehe... eu não mato não, mas posso morrer se vcs desistirem de mim no meio da fic, então não suma não. *dramática* E vc tem razão, é muita pesquisa mesmo *adoro isso*, muita coisa pra ler e como eu não sei escrever pouco (deu pra percerber?) acaba ficando capítulos um pouco grandes... hehehehe... e como eu já falei, vc pegou a essência dessa parte... o psicológico do Draco DEVE ser trabalhado. Eu acho que não tem como ele de repente, de malvadinho, arrogante e antipático ficar amigável e compreensivo. Ele tem que passar por um processo, e é este processo que ele está vivendo agora, com essa adorável família que o acolheu, e que tem princípios tão fortes que ele sequer conhecia. Que bom que vc gostou. Espero que continue acompanhando... tem muito mais pela frente ainda. Bjins.


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