Tudo o que eu sei



- Ron! Mione! Eu preciso falar com vocês! – Harry corria pelos corredores que levavam ao jardim, onde Rony e Hermione, já refeitos de mais uma briga, aterrorizavam alguns estudantes do primeiro ano.

Rony já não estava mais com Lilá Brow, e agora Hermione finalmente voltara a falar decentemente com ele. O ruivo também já tinha se recuperado do envenenamento com o hidromel. Nesse meio tempo, Harry teve que agüentar os futricos e cenas de ciúmes de Hermione em relação a Lilá úon-úon, como ela e Gina costumavam chamar o affair de Rony. Harry não podia negar que, apesar de ter ficado irritado pela briga de seus dois melhores amigos, ouviu frases memoráveis da boca de Hermione nesse meio tempo:

- Rony, só porque você tem a profundidade emocional de uma colher de chá, não quer dizer que todos sejamos iguais. – dissera Hermione certa vez.

- Rony, você é o legume mais insensível que eu tive o desprazer de conhecer. – outra de suas frases que deixara Rony vermelho como seus cabelos.

Mas Harry ficou bastante preocupado quando Hermione chegou ao absurdo de transfigurar vários passarinhos para atacar Rony e Lilá. Era claro para Harry há muito tempo, pelo menos desde a crise de choro de Hermione no Baile de Inverno durante o Torneio Tribruxo, que a amiga era apaixonada por Rony. Mas Harry não conversava muito dessas coisas com o amigo, e não conseguia saber o que ele sentia em relação a isso. No entanto, Rony andava numa boa fase como goleiro do time de quadribol da Grifinória, e isso havia deixado o rapaz mais bem humorado e disposto a relevar os acessos de Hermione. A menina ficara feliz pelo fim do romancezinho barato com Lilá e agora os dois voltavam a se entender.

E Harry, afinal, também estava feliz. Depois de algumas detenções com Snape que impossibilitaram o garoto de jogar, e depois de tentar superar o fato do Ranhoso ter conseguido a vaga de professor de DCAT, as coisas iam caminhando bem. A Grifinória havia ganhado a Taça das Casas e as aulas com Dumbledore davam a Harry a certeza de que ele poderia conhecer melhor o inimigo que teria que enfrentar. Harry se lembrava bem da profecia “nenhum pode viver enquanto o outro sobreviver”. Mas o que Harry também se lembrava, e não havia contado a ninguém, era sobre a conversa que tivera com Trewlaney no Beco Diagonal. Havia outra profecia que apenas ele conhecia. E que talvez fosse ainda pior do que a profecia principal, pois envolvia a morte de outras pessoas. Mas afinal, tinha algo que importava mais ainda. Algo que Harry não acreditava que pudesse acontecer tão depressa. Ele dera voz para o monstro que estava em seu interior desde o dia em que Gina saiu acompanhada de seus amigos no Expresso de Hogwarts. Enfim a ruiva estava em seus braços e ele não tinha do que reclamar. Não poderia haver maior felicidade no mundo. Harry sabia enfim que encontrara a mulher de sua vida. Aquela com quem ele desejava casar, ter filhos, ser feliz para sempre como num belo conto de fadas. Mas será que um homem marcado como ele poderia ser feliz para sempre? Será que a cicatriz não representaria um fardo eterno em sua vida? Será que ele teria o direito de colocar em perigo a mulher que amava?

As perguntas se multiplicavam na cabeça do bruxo, embora ele não estivesse dando muita atenção para isso nos últimos dias. Até aquela tarde em que corria pelo pátio para falar com Rony e Hermione. A última aula com Dumbledore lhe dera uma perspectiva diferente dos acontecimentos. Enfim eles partiriam do plano das idéias para o plano da ação. Agora Harry teria a possibilidade de mostrar seu valor e precisaria convencer a si mesmo que era capaz de enfrentar seu objeto de estudo daquele ano. Ou pelo menos uma parte dele.

- Rony! Hermione! Dumbledore vai me levar com ele para procurar uma horcrux!

A cara de espanto dos amigos foi impagável. Hermione chegou a sufocar um grito. Rony permaneceu com a cara de assustado que lhe era característica. Eles já sabiam de tudo o que Harry andara aprendendo com Dumbledore, das aulas secretas, das supostas horcruxes de Voldemort. Mas até aí, não imaginavam que o diretor fosse empreender uma viagem em busca de algo que ele nem sabia ao certo onde estava e quais poderes encerrava dentro de si. Dumbledore já havia destruído o anel de Gaunt e se ferira gravemente na mão. Era seguro levar Harry para um dos covis de Voldemort e colocá-lo em contato com um pedaço da alma daquele que queria destruí-lo?

- Harry... isso é... absolutamente... aterrorizante! – Rony balbuciou, enfim. Hermione nada dissera, mas seu rosto e a mão que congelara na boca exprimiam toda a sua preocupação com o amigo.

- Dumbledore acha que, se formos em dois, será mais fácil encontrar e destruir a horcrux. Eu concordo com ele. Eu estarei seguro, Dumbledore é o maior bruxo de todos os tempos! E ele já vem pesquisando as horcruxes, portanto não estamos indo atrás apenas de hipóteses, mas de memórias cuidadosamente guardadas. Eu só quero pedir uma coisa para vocês...

Nesse momento, os olhares de ambos ficaram muito intensos, colados nos olhos verdes de Harry, que vacilava a cabeça de um para outro. Ele sabia que ali tinha amigos que dariam a vida por ele. Que estavam dispostos a morrer combatendo o mal. Mas acima de tudo, que prezavam e se preocupavam com as decisões de Harry. Por isso o menino gostava tanto de Hogwarts, aquele lugar era sua verdadeira casa, e aqueles dois amigos eram seus verdadeiros irmãos. Podia até não ser de sangue, mas o sangue bruxo era o mesmo, o que fazia deles irmãos de magia.

- Eu preciso que vocês fiquem de olho no Malfoy... – completou, abaixando a cabeça.

- Harry, definitivamente essa idéia possuiu você! – foi a vez de Hermione quebrar o silêncio que havia mantido – Desde aquele dia em que encontramos Malfoy na Burguin & Burkes você ficou aficcionado por isso. Já seguimos Malfoy, já vimos que ele usa a sala precisa e que os retardados do Crabble e do Goyle estavam se disfarçando para vigiar o local. Mas acredito que não há mais nada para ver. Malfoy está fazendo algo ilegal, mas que não diz respeito a você. Senão já teria acontecido alguma coisa!

- Hermione... o que você acha que foi aquele hidromel envenenado que o Rony bebeu? E aquele cólar de ópalas que caiu nas mãos erradas? É tudo muito estranho. E Draco Malfoy me inspira tanta confiança quanto o elfo doméstico do Largo Grimmauld. – Harry contestou – Portanto, fiquem de olho nele.

Querendo encerrar a discussão, Rony interveio:

- Tudo bem, Harry, nós ficaremos.

- E quero dizer outra coisa antes de eu ir. – Harry começou a falar novamente – Eu vou deixar isso com vocês, para o caso de precisarem.

E entregou o potinho de Felix Felicis que conquistou pelo excelente desempenho nas aulas de Poções de Slughorn. Afinal, não se sentia a vontade para usar a poção da sorte, pois só tinha obtido bons resultados por causa do livro do Príncipe Mestiço. Era justo entregá-la nas mãos de Hermione, que era a melhor aluna de poções, assim como de todas as outras matérias.

- Harry! Você precisa mais disso do que nós. – disse Rony, olhando de Harry para o potinho nas mãos de Hermione.

- Não, eu não preciso, Rony. Eu tenho Dumbledore.




Harry pediu para encontrar Gina na sala comunal da Grifinória naquela noite. Ele precisava conversar com ela antes de partir, na manhã seguinte, para a viagem com Dumbledore. Estava com medo de deixá-la sozinha, mas precisava orientá-la quanto ao Malfoy e a Felix Felicis, assim como fizera com Rony e Hermione. Mas não queria conversar com ela na frente de todos. As pessoas já apontavam demais para os dois normalmente, imagine se eles estivessem demonstrando que queriam conversar a sós. Por isso Harry achou melhor esperar que a escuridão favorecesse a ambos para contar tudo a ruiva. Agora que a hora combinada se aproximava, o desespero em seu coração era crescente. A consciência de fazer algo que, para a grande maioria, era assustador, deixava Harry mais receoso ainda para falar com Gina. Ela sempre o deixara seguro quanto ao amor que sentia por ele agora. Harry não duvidava dos sentimentos da menina, e por isso sabia que ela sofreria ao saber que ele estaria em perigo.

- Oi Harry... o que o meu bonitão está fazendo com essa cara preocupada?

Os cabelos ruivos despontaram no topo da escada que levava ao dormitório das meninas. Por um instante, Harry pensou em Rony e no quanto tivera medo que o amigo ficasse bravo pela irmã. Mas Rony compreendeu os sentimentos de ambos, e ele sabia que Gina sempre fora mesmo louca por Harry. Ainda bem, porque o menino não suportaria a idéia de desapontar seu mais fiel companheiro de aventuras.

Ao se aproximar, Harry sentiu o cheiro suave que reconheceria a um milhão de quilômetros. Aquele mesmo perfume que havia sentido na aula de Slughorn quando fora apresentado à Poção do Amor. “Sim, esta poção sempre tem o cheiro da pessoa amada”, Slughorn dissera. Harry lembrava vagamente de grama molhada depois da chuva. Era o cheiro do amor que sentia por Gina. E isso o deixava feliz e fazia esquecer um pouco a tensão daquilo que estava por vir.

A menina se aproximou e sentou perto da lareira. A sala comunal já estava vazia devido ao adiantado da hora. Os olhos castanhos de Gina fitavam o rosto de Harry esperando por uma resposta. Harry não disse nada. Beijou-a suavemente nos lábios, pegou a mão da menina e conduziu-a para fora.

- Você está me raptando, Harry? Posso saber para onde estamos indo, senhor seqüestrador?

Ela nunca perdia o bom humor. Herdeira de Fred e Jorge, Gina era uma verdadeira e inegável Weasley, não apenas nos cabelos vermelhos. O puro sangue emanava dos poros da ruiva, e Harry sabia que ela encerrava dentro de si um grande poder. Ele era capaz de sentir a força da magia dentro de ambos, e as descargas elétricas liberadas pelo contato de duas forças tão poderosas. Harry e Gina compartilhavam a magia de que eram feitos. Por isso tudo entre eles era tão intenso.

Harry sabia que, se fossem vistos andando pelo castelo naquele horário, seriam detidos. Então pegou a capa da invisibilidade e jogou por cima dos ombros dos dois, abraçando Gina. A garota se aconchegou no ombro de Harry e esperava pacientemente. Conhecia Harry a ponto de não falar enquanto ele não decidisse se abrir. Ninguém poderia dizer que ela não era paciente. Afinal, havia esperado anos a fio para ter aquele homem do seu lado, e agora ela não poderia fazer nenhuma besteira para perdê-lo. Apesar disso, o antigo medo de torná-lo mais vulnerável a Voldemort continuava. Gina andava tendo sonhos estranhos, e muitas vezes não se lembrava de alguns momentos do dia. Não sabia o que era, mas achava que deveria ser o cansaço pela quantidade de treinos de quadribol somado aos estudos para os NOM´s. Harry não sabia, mas Gina continuava treinando alguns feitiços praticados na Armada de Dumbledore. Ela queria estar preparada para o momento de se defender e àqueles que amava. Especialmente durante os treinos, Gina tinha lapsos de memória que não conseguia explicar.

Harry abriu a porta e entrou num armário de vassouras. Sentou-se e ficou olhando o rosto indagador de Gina ali, a poucos centímetros do seu.

- Gina, eu vou ter que viajar.

- Para onde?

- Para longe. Não sei ao certo onde é. Vou com Dumbledore. Vamos procurar uma horcrux.

Gina respirou fundo e sentou-se ao lado de Harry, segurando a mão do menino. Era como se ela medisse, pensasse e repensasse cada palavra que viria a seguir. De repente ela começou a falar, resignada:

- O que você quer que eu diga, Harry? Eu poderia chorar, gritar, segurar você e te pedir para não ir. Eu poderia ameaçar me jogar da Torre de Astronomia. Tudo isso ia ser pouco perto do que eu sinto agora. Harry... eu... eu já esperei por você uma vez. Eu vou continuar esperando o tempo que for necessário.

Os olhos da ruiva estavam molhados. Harry não era do tipo que chorava com facilidade. Mas também estava muito emocionado. Não conseguia dizer nenhuma palavra, apenas abraçava Gina o mais apertado que conseguia. Então eles começaram a se beijar apaixonadamente. As línguas entrelaçadas passeavam na boca um do outro. O beijo era salgado, molhado das lágrimas que Gina não queria conter. Ao mesmo tempo, ela prometia para si mesma que nunca mais choraria por Harry. Aquilo era um momento de preocupação extrema, e ela se deixava levar. Mas por pouco tempo. Logo já estava recomposta e sorria, olhando com carinho para o garoto.

- Só quero que você tenha sorte, Harry. O mundo bruxo precisa de você. E eu também.

Foi então que Harry se deu conta do quanto era perigoso amar Gina daquele jeito. Talvez até mais perigoso que qualquer combate com o Lord das Trevas.

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