Suposições



Já eram nove e meia da manhã quando Harry olhou em seu relógio. As perguntas sobre o que escutara na cozinha algumas horas mais cedo martelavam em sua cabeça com força. Os dedos enterrados nos cabelos sempre despenteados quase podiam sentir suas veias latejando para tentar encontrar uma explicação plausível à aquele diálogo. Parecia que quanto mais pensava, mais havia sobre o que pensar. Não tinha certeza se deveria contar à Rony ou Hermione aquilo. Essa era apenas uma das questões que tentava resolver quando escutou alguns grunhidos de sono na cama ao lado. Mione tinha acabado de acordar.

- Bom dia! – disse, com a típica voz de quem acaba de acordar, ainda com os olhos fechados.- O que aconteceu? – completou, abrindo os olhos e vendo a cara de preocupação do amigo.

- Nada – ele falou tão rapidamente que ela teve certeza de que ele estava mentindo.

- Se não fosse nada você não teria ficado sentado nessa cama sem emitir um som durante quase uma hora. – Replicou Hermione num tom astucioso.

- Você estava me observando?

- Não exatamente. Acordei mais ou menos na mesma hora em que você. Vi você sair, escutei-o quando começou a descer a escada, e cochilei. Acordei com você entrando no quarto, escutei você se jogar na cama e dormi de novo. Agora, acabei de acordar outra vez e aí está você ainda. Tenho sono leve, sabia? – enquanto falava, se levantou, colocou o robe sobre o pijama rosa e se sentou na cama, defronte a Harry. – Vai me contar ou não?

- Bom, acho que não tenho escolha, certo? – E narrou a conversa que ouvira na cozinha. Quando terminou, Hermione não parecia muito surpresa.

- Isso era a peça que faltava na minha teoria! – ela falou, com brilho nos olhos

- Teoria? Que teoria, Hermione?

- Vai ser um pouco demorado te explicar tudo, mas, você me disse o que eu queria saber, agora eu te digo o que você quer saber. – ela fez uma pausa, para apreciar o efeito da frase - Desde que cheguei aqui, não sei se você tem notado, mas a Sra. Weasley me parece cansada. Com estou absolutamente no ócio por aqui, só como e durmo, para me distrair, comecei a formular teorias sobre o porquê do cansaço da Sra. Weasley. Acho que fiz umas quatorze, deixe-me mostrar.

Ao dizer isso, ela se levantou e foi até a cômoda. Abriu seu malão e o remexeu por alguns segundos, até soltar uma exclamação de triunfo. Era um fichário vermelho escuro, com o nome dela escrito em alto relevo dourado na lombada. Ele o reconheceu como sendo o fichário dos monitores da Grifinória.

- Para quê você está abrindo isso? – ele perguntou.

- Calma, deixe-me achar... Ah, aqui está. Sim, sim, quatorze teorias minhas e três da Gina. Olhe aqui, teoria número oito – ela começou a ler – “A Sra. Weasley poderia estar cansada porque está se encontrando com Percy escondida, indo visitá-lo quando todos estão dormindo”. Ponto falho, ele é quem vem aqui. – Ela já ia recomeçar a ler quando ele a interrompeu.

- Não querendo ser rude, mas dá para você me explicar, por favor, o que está acontecendo? Eu sou parte de um plano, a Sra. Weasley está se encontrando secretamente com Percy, e ele é um espião? Estou até ficando zonzo! – Harry implorou a ela, com desespero na voz.

Ela parou para pensar um pouco. Harry já estava começando a perder a paciência quando ela disse:

- Certo, certo. Esse plano, como você diz, tem você como peça chave, não é? – Ele concordou com a cabeça. – Então podemos concluir que tem alguma coisa a ver com Voldemort. Percy estaria servindo de espião, informando à Ordem cada passo de Fudge no Ministério. Mas não entendo como isso se junta.

- Fudge poderia Ter se aliado a Voldemort. – disse Harry.

- Você realmente acha que depois de Dumbledore Ter provado que estava certo, e que ele não enxergara as coisas acontecendo debaixo do nariz dele ele teria a petulância de se juntar a Voldemort? Ele não pode ser tão obtuso a ponto de não perceber que Dumbledore é muito mais poderoso do que Voldemort. Percy não deve estar espionando Fudge então...

- Mas quem ele poderia estar observando?- Harry perguntou, mais à si mesmo do que a Hermione.

- Não faço a mínima idéia. – ela disse, desviando o olhar para a janela.- Realmente não faço...



O dia passou com extrema rapidez, e Harry passara o restante dele isolado do grupo, pensando no que tinha conversado com Hermione mais cedo, até que Gina veio acordá-lo de seus pensamentos.

- Harry? Você está bem? – perguntou ela ao se aproximar de uma figueira enorme aonde o garoto estava encostado.

- O que você quer? – disse ele, ranzinza por ela tê-lo despertado para a realidade.

- Calma, não precisa perder a calma comigo! A Mione me pediu para te procurar, acho que ela tem alguma coisa para te falar. Acho Bom você ir bem rápido, ela disse que era urgente.

Harry se levantou com preguiça e foi andando vagarosamente em direção á porta da cozinha, protegendo os olhos do sol. Passou pela cozinha, onde vislumbrou a Sra. Weasley preparando o almoço, e subiu as escadas, arrastando os pés a cada passo. Quando finalmente entrou no quarto, Gina na frente, Hermione tinha um sorriso de profunda satisfação no rosto, o mesmo que ostentava quando recebia o resultado de um exame em Hogwarts.

- Harry! Que bom que você veio rápido. Enquanto você se isolava no jardim, eu pensei em muitas coisas, e... – Ela interrompeu o que dizia e olhou para Gina.

- O quê? – Indagou a ruiva.

- Gina, eu acho melhor que você não fique sabendo disso por enquanto... É para o seu bem. – Alertou Mione.

- Bom... Se isso é o que você pensa, então eu saio. Mas eu acho que você quer mesmo é ficar sozi... – nesse ponto Hermione lhe deu um olhar tão contundente que a garota se calou. – Ok, ok, eu vou. – E se retirou do quarto, batendo de leve a porta.

Houve um segundo de silêncio constrangido logo após a saída de Gina, que foi quebrado por Harry.

- Vai me contar ou não o que você descobriu? – Perguntou ele, impaciente.

- Na verdade eu não descobri nada, apenas consegui encontrar uma pessoa a quem Percy pode estar seguindo.

- Quem? – Ele agora estava completamente absorto na conversa.

- Harry, pense um pouco. Quem é próximo o suficiente de Fudge para influenciá-lo, tem passe livre dentro do Ministério e nunca despertou suspeitas de quem não tivesse ligação com a Ordem? – Hermione parecia desesperada para Harry entender.

- Hum... Próximo de Fudge... Passe livre... Não desperta suspeitas... Elfreida Cragg??? – Harry tentava se divertir com a impaciência de amiga.

- Isso não é hora para brincadeiras, Sr. Potter! – A voz dela praticamente era a de Minerva McGonagall. – O único a quem Percy pode estar espionando é Malfoy!

Ele parara de brincar e ficara sério. Seu cérebro trabalhava furiosamente. De repente, ele se levantou e disse:

- Mione, eu não posso fazer isso. Não vou investigar nada, não posso me dar a esse luxo. A culpa pela morte de Sirius foi minha, e não vou me arriscar a perder a vida de mais alguém que amo só para satisfazer meus heroísmos. – Ele estava muito sério, e sua voz assumiu um tom embargado ao falar de Sirius.

Ela não se atreveu a dizer nada. Sabia que embora a culpa não fosse de Harry, como ele clamava, a vida de alguém sempre ficava em perigo quando eles se jogavam nessas aventuras. Somente fez um sinal assertivo com a cabeça, e Harry se retirou.

Ele desceu as escadas sem pensar, indo aonde seus pés o levavam. Não queria ficar dentro daquela casa, não queria ver ninguém. A única coisa que queria era sumir, desaparecer. A lembrança de Sirius o atormentara durante todo o verão, e ele sentia que assim iria ser até o fim de sua vida. Ao chegar ao jardim, ele se sentiu preso. Queria gritar muito alto, um grito que, quem sabe, pudesse tirar um pouco da angústia que carregava. Queria correr, queria não ser ele mesmo, queria qualquer coisa, desde que pudesse ser livre. Não agüentava mais o estigma de ser “O Menino Que Sobreviveu”, não queria aquilo. Naquele instante, um ódio sem limites se apoderou da alma dele. Ele odiou cada pessoa responsável pelo seu sofrimento, odiou Voldemort, odiou Rabicho, odiou Sirius, Lílian, Tiago, Petúnia, Válter, Hermione... Mas acima de tudo, odiou Belatriz. Ela, acabando com a vida de Sirius, acabara com a vida de Harry também.

Seis andares acima, Hermione, que se encontrava jogada na cama pensando, ouviu um grito. Era um grito de agonia, de ódio. Um aperto tomou conta de seu coração, e ela correu à janela. Lá embaixo, conseguiu ver o vulto de um homem ajoelhado na grama, com as mãos no rosto. Ela correu para lá, e ainda chegou a tempo de ver o corpo dele desabando no chão, sem forças. Ela se abaixou ao seu lado, e pôs a mão em suas costas. Ele se apoiou nos braços e já ia se levantando, quando ela se sentou com as pernas cruzadas e o deitou em seu colo.

Ele não tinha forças para repeli-la, ou para xingá-la, por isso aceitou o gesto. Uma vez deitado, chorou. Chorou como nunca havia chorado, chorou de ódio, de tristeza, de amargura. O verde de seus olhos estava claro como nunca. Hermione, vendo o sofrimento daquele homem com quem crescera e a quem tão bem conhecia, sentiu em seu corpo algo que nunca havia ocorrido agora. Seu coração estava apertado, e ela descobriu que também queria chorar. Jogou seu corpo para trás, caindo na grama, e as lágrimas vieram.

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