Chapter 4



Chapter 4


—Isso não pode acontecer — insistiu Hermione. — Você não pertence a este lugar. Isso é impossível.


Harry sentou-se e a encarou. Ele adorava o modo como todo o corpo dela reagia com sentimento a qual­quer emoção que sentisse. Era como se a comunicação que deveria transparecer pelos olhos se manifestasse em cada célula de seu corpo. Ela era uma sinfonia do co­ração, um bale da alma. Ele podia ficar ali para sempre observando-a.


Ou pelo menos até as coisas ficarem um pouco mais intensas. Observando a linguagem corporal dela se agi­tar em resposta a ele. Comunicação física. Ele nunca estivera tão preparado para experimentar isso, pelo menos teoricamente. Porque ele sabia muito bem que não acon­teceria. Ela era intocável.


Harry geralmente não se sintonizava com as sutilezas da vida, principalmente quando isso se referia a mulhe­res. Ele trabalhava em um ramo em que as mulheres bo­nitas eram maioria, e muitas delas estavam prontamente disponíveis para um homem na posição dele. Havia uma tentação em usar as mulheres como brinquedos descartá­veis naquele ambiente. Ele já se sentira culpado por isso algumas vezes.


Mas sabia de antemão que Hermione não se encaixava em algo tão banal. E não por ser cega. Havia mais, uma ino­cência e pureza de espírito que ele não tinha o direito de macular. E pela primeira vez na vida ele honraria isso Pena não encontrar uma maneira sincera de lhe dizer que não precisava se preocupar.


— Você nem está dando uma chance para a minha idéia — argumentou ele. — Nós podemos fazer com que dê certo. — Ele deu de ombros, percebendo que não estava sendo muito persuasivo, mas sabia que não con­seguiria fazer melhor. — Pense um pouco no assunto. Examine todas as possibilidades. Não deixe que sua pri­meira reação dite as regras. Dê um tempo e...


— Eu não preciso de tempo para saber que tê-lo aqui não daria certo. — disse ela com firmeza. — Você... você...


Ao vê-la tentar concluir, ele veio em sua ajuda.


— Eu o quê? Incomodo de alguma forma?


Ela imediatamente ficou vermelha, era óbvio que pen­sava dessa forma.


— Eu prometo tentar não incomodar. De jeito ne­nhum. Eu ficarei lá fora, na casinha, quieto como um camundongo. Você nem perceberá que estamos lá.


Ele sabia que estava blefando, e ela também estava. Ela nem se deu ao trabalho de argumentar, voltando-se para ele com uma nova tática.


— Você está fazendo isso só porque pensa que o dono do hotel está com raiva por causa do incidente do bolo? Tenho certeza de que o dinheiro que você deu serviu muito bem para compensar o prejuízo. Se você voltar e...


— Não é por causa disso — disse ele com sincerida­de — Isso é apenas parte. Tem muito mais. — Harry hesitou. Provavelmente era chegada a hora de confessar. Talvez o passado. — Eu... bem, eu na verdade não lhe contei tudo...


Sobre o fato de você ter sido requisitado para se tornar o próximo rei de Niroli? — interveio ela rapida­mente, imaginando que ele nunca chegaria ao centro do problema se ela ficasse esperando por uma explica­ção pensada. E ela precisava esclarecer tudo agora. Ele não poderia ficar ali. — E então? Se você não gosta do hotel, por que não se hospeda no palácio? Imagino que seria o lugar onde gostaria de estar.


— Não mesmo — disse ele, analisando-a, surpreso. Como ela sabia que ele estava na linha de sucessão à Coroa? A notícia deve ter sido mais divulgada do que supunha. E isso não era bom.


— Como você sabe? — perguntou ele com curiosi­dade.


— Gino me disse.


— Ah, o onipresente Gino. — Ele estava começando a criar antipatia por esse homem. — Ele está sempre por perto, não está?


— Gino é um dos meus melhores amigos — insistiu ela, em tom cortante. — Ele sabe mais das coisas que acontecem aqui do que qualquer pessoa.


— Bom para ele — replicou Harry secamente. — En­tão eu gostaria que você não lhe contasse que neste mo­mento estamos negociando. Não quero ficar lá porque preciso de distanciamento para fazê-los pensar que real­mente estou interessado.


— Você quer dizer manipulação, não é? — ela deu um passo para trás.


Ele deu uma risada.


— Aceito a palavra. Mas você entende por que não quero ficar no lugar onde os burocratas do palácio po­dem me controlar 24 horas por dia?


— Então tente outro hotel.


— Eu não quero um hotel. A imprensa já está rondan­do. Não quero ser fotografada por paparazzi. Tenho que ficar em um lugar onde ninguém saiba o meu nome.


Ela o interrompeu, quase implorando:


— Harry, esta é uma ilha pequena. Você não pode se esconder como se estivesse em uma cidade grande.


— Posso ser discreto por enquanto. Adiar o inevitá­vel. Eu pagarei bem pela acomodação.


— Oh! — Ela recuou mais um pouco. Não o queria ali. Não poderia tê-lo ali. Ela não o queria ali desde o início, e agora ele queria ficar!


Não. Isso era impossível. Ele era muito grande, muito alto, muito espaçoso. Já havia sido ruim tê-lo por perto a tarde toda. Ela estava tensa, não conseguia relaxar. Não poderia ficar desse jeito dias a fio. Aquele lugar era o seu espaço. Ela não o queria ali.


Alguém bateu na porta da frente e Harry se virou as­sustado. Um homem alto e forte entrava pela casa. Bo­nito e como que ciente disso, parecia firme e um pouco arrogante.


— Olá — disse ele para Helena — Só dei uma pas­sada para lhe dizer que Draco e Gina podem vir esta noite.


— Ah ótimo — respondeu ela distraída, depois fez as apresentações. — Gino, este é Harry Potter.


Harry levantou-se da banqueta do piano pronto para um aperto de mãos, mas o amigo de Hermione não parecia muito disposto a isso.


— Oh — Gino olhou para Adam, mas não parecia muito satisfeito. — O que ele está fazendo aqui?


Hermione agitou as mãos:


— Eu não sei. Por que não pergunta para ele?


Harry não teve problemas com a resposta.


— Eu estava tentando convencer Hermione me alugar sua pequena casa de hóspedes.


Gino franziu o cenho ameaçadoramente.


— Bem, ela não fará isso.


Harry levantou uma das sobrancelhas em contra­partida.


— Ah, não? — repetiu ele calmamente.


— Não. Claro que não. Ela não pode tê-lo por aqui.


Hermione se virou, ouvindo atentamente, os lábios con­traídos.


— Ela não fará isso — continuou Gino confiante. — Ela não precisa de você. Sabemos quem você é.


— Sabem?


— Você é Harry Potter. Tem ligações com a família real.


— Você me pegou. Não que isso seja algo para me vangloriar.


— O quê? A nossa família real não é boa o suficiente para você?


O homem estava claramente decidido a tomar tudo o que ele dissesse como afronta. Harry sorriu.


— É uma situação complicada — respondeu ele cal­mamente.


— Bem, Hermione não precisa desse tipo de complicação em sua vida.


Gino estava tão irritado que tudo indicava que costu­mava intimidar as pessoas, mas Harry manteve o olhar fixo e respondeu friamente:


— Eu não tenho a intenção de complicar a vida de Hermione.


— Mas você não lhe contou quem era logo de início contou? Você estava tentando manter segredo. Isso não é comportamento de um homem honesto.


Nesse momento Hermione ergueu a cabeça e se colocou entre eles.


— Gino, já basta. Essa decisão é minha, não sua.


A raiva de Gino o deixara impulsivo.


— Hermione, pelo menos algumas vezes você deve admi­tir que precisa de ajuda.


— Gino! Ele segurou as mãos dela e olhou-a seriamente.


— Olha, eu sei que você acabou de perder metade dos seus rendimentos e está preocupada com isso. Principal­mente por estar tentando encontrar um jeito de pagar a matrícula do programa de música em Nova York.


— Está certo — disse ela com sarcasmo. — Então você deveria entender.


— Mas, querida, esse não é o melhor modo de con­seguir — disse ele, argumentando mas ao mesmo tempo deixando claro que esperava que ela fizesse exatamente o que sugeria. — Encontraremos um jeito melhor. Eu venderei as minhas pinturas, me dê um tempo.


Harry esperou calmamente a discussão acabar. Ele percebeu a expressão de Hermione enquanto Gino pompo­samente dava suas ordens e se permitiu um discreto sor­riso. Ela não gostava que lhe dissessem o que fazer, e detestou mais ainda ouvir que precisava de alguém para cuidar dela. Ainda havia uma chance. Tudo o que Harry precisava fazer era esperar Gino sair e dar as cartas da forma correta. Ele era um negociador que sabia recuar, saberia como fazer isso.


— Hermione , ouça a voz da razão. Você consegue. — Gino parecia prestes a sair.


Mas Hermione se mantinha firme, com o queixo erguido e um pouco revoltada.


— Eu farei o que achar melhor.


Gino suspirou irritado e encaminhou-se para a porta.


— Eu não tenho mais tempo para bate-boca — dis­se, parecendo mais irritado. — Estão me aguardando no SPA. Eu prometi a Luna que a ajudaria com a decora­ção. — Ele olhou de volta para Harry, um olhar inten­cionalmente ameaçador. — Verei isso mais tarde, inclu­sive com você — ameaçou.


E saiu.


Harry se virou e sorriu para Hermione, sabendo que ela não poderia ver, mas certamente perceberia em sua voz.


— Quando ele disse que veria isso mais tarde, a que exatamente estava se referindo? — perguntou, com iro­nia.


— Ah, não lhe dê importância — respondeu ela, demonstrando irritação. — Gino tem talento para o drama.


— O fator desconhecido é sempre o fatal. Então como sempre, acho melhor ficar atento.


Ele realmente estava perturbado com a ameaça implí­cita de Gino. Harry já enfrentara homens maiores do que o amigo de Hermione. Mesmo assim, não perderia a opor­tunidade de estimular o ressentimento dela por ter sido tratada como alguém que precisava ser controlada.


E ele com certeza não se enganara ao ouvir que ela estava precisando de dinheiro desesperadamente. Ele sabia como era, mesmo que sua necessidade financeira envolvesse uma ligação diferente. Mas ele ainda possuía uma reserva em dinheiro para as pequenas necessidades da vida.


Estava quase prometendo fazer tudo o que pudesse por ela quando fosse rei, mas recuou em tempo. Era pre­ciso ser esperto. Quanto mais analisava as coisas, mais percebia que ela odiaria uma proposta dessas. Teria que ir devagar. Se ele jogasse de forma correta, no final ela cederia.


— Quanto é?


Ela parou de andar e inclinou a cabeça.


— Quanto é o quê?


— Quanto você quer para alugar o quarto lá fora? Pos­so pagar o dobro do que estou pagando no Ritz — disse ele, e ela quase engasgou.


— Pela minha humilde casinha? — retrucou ela. Ele deu de ombros.


— Bem, você terá que me deixar circular pela sua casa. Afinal, não há banheiro lá fora. E acima de tudo... — ele tentou acrescentar uma nota de trágico pesar —... e acima de tudo, não tem cozinha.


Ela sacudiu a cabeça e agitou as mãos, com um meio sorriso nos cantos da boca.


— Você precisa de uma cozinha só para você? — murmurou ela.


Ele sorriu e concordou balançando a cabeça.


É útil para os lanches no meio da noite.


Ela pensou mais uma vez na quantia. Se ele ficasse tempo suficiente, ela poderia pagar a passagem para Nova York. Seus ombros relaxaram, e ela deu um sus­piro profundo. Houve um tempo em que se considerava uma realista de coração duro. Agora, em vez disso, esta­va se tornando uma pequena sonhadora insaciável. Será que se odiaria na manhã seguinte?


—Você é como uma serpente no jardim, não é?


Ele abaixou a cabeça; não gostou muito da compa­ração.


— Do que você está falando?


— Tentação. Você está me oferecendo uma suculenta maçã vermelha.


Ele achou que Hermione estava certa. De qualquer forma, era uma maneira estranha de colocar as coisas... para ela.


Qual a importância da cor? — perguntou ele deli­cadamente.


— Ah, há uma diferença. Acredite. Eu posso sentir. — Ela assentiu com a cabeça. — É grande, é deliciosa e é vermelha. Deverei ceder e dar uma mordida? Eis a questão.


Havia algo de muito sensual no modo como ela disse isso. Ele estava satisfeito, e não era a primeira vez, por ela não poder ver as imagens que evocava nele.


— Claro. O dinheiro é tentador. - Ele deu de ombros — Com certeza. O dinheiro faz o mundo girar. - A afirmação a fez recuar rapidamente.


— Bem, mas o dinheiro não me faz girar. Pelo menos não sempre.


— Motivações diferentes para pessoas diferentes. E a compaixão? E a amizade?


— Você não é meu amigo. Eu mal o conheço.


— Para me conhecer é preciso me amar, portanto, não se preocupe com isso.


Ela franziu o cenho, e ele se arrependeu da atitude insolente. Ela merecia coisa melhor.


— Você dita as regras, Hermione — falou ele rapidamen­te. — Será do jeito que você determinar. Eu prometo.


Ela concordou lentamente com a cabeça.


— Estou considerando — admitiu. — Mas tenho uma condição — acrescentou.


Ele ficou imóvel, aguardando.


— Qual é?


Ela respirou fundo, depois disse tranqüilamente, com a voz firme.


— Eu preciso vê-lo primeiro.


Ele ficou completamente imóvel. Alguma coisa fez sua nuca se arrepiar.


— Do que está falando?


— Eu tenho que "vê-lo". Enquanto não o vir real­mente, não o conhecerei o suficiente para saber se pos­so ou não deixá-lo ficar. — Aproximando-se dele, ela apontou para uma cadeira de espaldar reto no canto. — Sente-se.


— Para quê? — resistiu ele, estranhamente apreen­sivo.


— Sente-se, eu lhe mostrarei.


Ele na verdade não queria fazer aquilo.


— Você vai fazer aquela coisa de tocar o meu rosto?Porque eu não acho que isso lhe revelará muita coisa. Quero dizer...


— Sente-se.


Ele olhou para o relógio e depois para o sofá onde o filho dormia profundamente.


— Escute, eu tenho que estar no palácio em uma hora para uma audiência e...


— Não vai demorar muito. Sente-se.


Ele hesitou, olhando para ela. Aquilo não revelaria nada a respeito dele. Harry sentou-se.


Ela veio decidida na sua direção e ele de repente sen­tiu a boca seca. Não ficava tão assustado desde... desde a noite em que Melissa deu à luz Jeremy. Mas não queria pensar nisso.


Ele olhou fixo para a frente enquanto ela se posta­va ao seu lado. Ele tinha a impressão de que ela estava captando os sentimentos dele, e talvez o cheiro, mas era apenas uma sensação. Não tinha nenhum motivo para estar ansioso, e se sentiu um idiota com o coração dispa­rado. Desse jeito, em breve estaria suando quando ela o tocasse. Ela iria tocá-lo.


Ele tinha certeza. A espera o estava levando ao limi­te. Vamos, ele queria gritar. Toque-me. Acabe logo com isso. E ela se mantinha de pé calmamente...


Então, os dedos dela começaram a tocar delicada­mente os cabelos dele, delineando o contorno de sua cabeça, tão delicadamente que poderiam ser asas de borboletas. Parecia que ela estava sondando sua aura em vez de ter uma experiência tátil sólida. Ele fechou os olhos, e sua pulsação diminuiu. Não era tão ruim assim podia suportar. Na verdade, era até agradável. Mesmo quando os dedos dela ficaram mais firmes e começaram a revolver a maciez de seus cabelos. Ele já havia sido massageado, e se parecia muito com isso. Até agora estava bom.


De repente, ela mudou de posição, como se quisesse encontrar um ângulo melhor para se aproximar. Ele sen­tiu os movimentos dela, abriu os olhos e viu-a se posi­cionando entre os seus joelhos para segurar-lhe a cabeça com ambas as mãos.


Imediatamente ele submergiu em sensações. As mãos dela se moviam lentamente pelo seu rosto, tocando as sobrancelhas, deslizando pelo contorno dos olhos, alisando as bochechas. E, ao mesmo tempo, seus seios fir­mes, mal cobertos por uma fina mini blusa, estavam a alguns centímetros de seu rosto, enquanto os músculos externos de suas coxas faziam pressão contra a parte in­terna das pernas dele. O desejo tomou conta de Harry como uma flecha, deixando-o rígido como uma rocha em questão de segundos. Ele ficou apavorado que ela pudesse perceber sua situação.


Ele não se sentia tão fora de controle desde a ado­lescência, e ela não podia saber disso. Tentou manter a respiração estável, pensando em canções de ninar, can­tando antigas melodias mentalmente. Nada funcionava. Ele temia que ela percebesse e se aborrecesse com ele. Não queria passar a impressão de um homem voraz e indomado. Ela era tão honesta, tão verdadeira. Merecia ser tratada com respeito.


— Está quase terminando — sussurrou ela. — Só mais um minuto.


As pequenas mãos circulavam por suas orelhas, de­pois deslizaram para a mandíbula. Ele emitiu um som estranho, mas ela não demonstrou ter percebido. Ela se curvou para tocar a parte de trás de sua cabeça. Um pequeno m0vimento e ele teria o mamilo direito de Elena em sua boca. O tecido que mal encobria agora parecia mais transparente ainda. Ele podia ver o bico do seio en­rijecido. Tudo o que precisava fazer era alcançá-lo com a língua...


Oh Deus, ele estava prestes a explodir. Ele era tão fir­me, mas precisou de toda a sua força de vontade para não ceder.


Os dedos dela tocavam os seus lábios, contornando-os delicadamente, e ele pensou, Deixe-me morrer agora. E finalmente tudo acabou.


— Pronto — disse ela, recuando naturalmente. — Acabou. Foi tão ruim assim?


Ele pigarreou para disfarçar o fato de não conseguir falar.


— Hum, não... nem tanto — finalmente ele conseguiu resmungar. Olhando para ela, Harry sacudiu a cabeça. Como era possível uma mulher esbelta e cega provocar tamanho impacto? Ele achava que jamais seria o mesmo de novo.


Ela se sentou na banqueta do piano e olhou na dire­ção dele. Harry permanecia imóvel. Nem se atrevia a se mexer.


— Você é um homem muito bonito, não é? — perguntou ela tranqüilamente.


Ele engoliu em seco e tentou se concentrar.


— Por que essa pergunta?


—A harmonia de suas feições — sorriu ela. — E o seu jeito arrogante. Mas isso não importa, porque não posso vê-lo do modo como as outras pessoas vêem. O mais im­portante é a beleza do seu caráter. Fale sobre isso, Harry. Como é o seu caráter? Que tipo de pessoa você é?


As palavras dela serviram como o jato de água fria de que tanto precisava. Transformando o prazer em algo penoso. Contemplar o próprio caráter era uma coisa que ele raramente fazia. Provavelmente porque não tinha certeza se iria gostar do que poderia encontrar.


— O meu caráter tem os seus altos e baixos — res­pondeu evasivamente. — Mas posso lhe prometer urna coisa: não farei nada que possa magoá-la enquanto esti­ver aqui. Eu juro.


Ela estava sentada calmamente, meditando sobre o que fora dito. Hermione sabia onde estava se metendo, mas forçou-se a pensar no assunto. Aquele homem estava pretendendo se tornar rei. Isso o deixaria fora de circu­lação. Harryera o homem mais cínico que conhecera. Isso o colocaria mais distante ainda. E, finalmente, ela se sentia perigosamente atraída por ele... uma atração que não tinha futuro. Todos os elementos que indicavam um desastre. Então isso significava que ela o rejeitaria? Deixaria que ele se fosse e nunca mais o veria outra vez. Salvaria a sua própria pele e a sua vida amorosa "à prova de balas". Isso seria o lógico.


Mas havia uma nova Hermione com quem estava lidando, uma mulher que saíra do sonambulismo e que queria se engajar no mundo. Ele precisava de um lugar para ficar.


Ela certamente poderia usar o dinheiro. Era tudo lógico.


Ele finalmente a confrontou com a velha pergunta:


— E aí? Fui aprovado, mestra? Vai me alugar o quarto?


Lentamente, ela balançou a cabeça concordando:


—Sim — respondeu quase pesarosamente. — Sim, Harry. Vou alugar o quarto para você. Pelo menos por enquanto.


 


Mudar-se para lá não tomou mesmo muito tempo. Depois que o acordo foi fechado, Harry usou o telefone de Hermione para fazer algumas ligações e rapidamente as coisas foram trazidas do hotel. Ele tirou Jeremy do sofá onde estava e o acomodou em uma das camas de soltei­ro do pequeno quarto. E antes que ela o percebesse já havia ido para o palácio. Hermione se sentou para se acalmar e pensar no que acabara de fazer, e principalmente se continuaria sendo a mesma pessoa depois de passar por aquela experiência.


Havia vários motivos pelos quais não deveria ter con­cordado com isso. Quando finalmente se deteve para pensar nos possíveis resultados, seu coração quase pa­rou. Lá estava ela, brincando com fogo outra vez. A últi­ma coisa de que precisava no mundo era de um homem rondando, deixando-a enlouquecida. O que havia de er­rado com ela? Naquela manhã mesmo evitara falar com ele. Agora estava praticamente se preparando para viver com ele! Deveria estar louca.


Ela sabia que Gino ficaria furioso.


Gino era um de seus melhores amigos há muitos anos No passado, ela achava o cuidado dele comovente. Ago­ra, começava a achar que ele estava se tornando protetor e autoritário. Quase com toda certeza, Gino faria planos para dormir no sofá para protegê-la. Ela deveria pensar rapidamente nos argumentos que usaria para convencê-lo de que isso não seria possível. Ela não o queria lá e não queria pensar muito no por que disso.


Ainda que soubesse que ele provavelmente estava certo. Ela precisava de proteção, mas de si mesma.


O pensamento a fez rir, e sabia que não era de fato verdade. Não, ela ainda não estava tão maluca. Mas ti­nha que admitir que estava intrigada com Harry.


Quando contou a ele que nunca havia se apaixonado estava falando a verdade.


Ao crescer, ela tivera os mesmos sonhos e esperanças que todas as garotas da sua idade, mas sempre soube que jamais teria o mesmo tipo de vida de suas amigas. Ela era diferente.


Sua mãe e sua avó, quando vivas, concordavam que ela era diferente, mas enfatizavam o fato de ser especial não estranha. Ela sempre soube que tinha um talento ex­cepcional para a música. Isso aconteceu naturalmente, Tanto a mãe quanto a avó lidaram com música, e ela sabia que a música também seria sua vida.


Isso lhe deu forças para manter-se afastada dos ro­mances todos esses anos. Quando a avó a incentivava a sair com um rapaz que a perseguia, ela ria e sacudia a cabeça.


— Um homem para mim tem que ser especial — cos­tumava dizer. — Eu o reconhecerei ao ouvir sua voz.


Ela estava sonhando ou simplesmente dando descul­pas para se livrar dos conselhos? Hoje, aquela jovem lhe pareceria extremamente ingênua. O que pensava? Que o homem ideal entraria em sua vida e ela saberia pelo som de sua voz? Só mesmo um sonho.


A princípio, ela não gostou do som da voz de Harry. Achou que ele parecia arrogante e agressivo, e odiou o modo como falava com o filho. Agora que o conhecia melhor, mudara seu julgamento. Mas ele ainda estava longe de ser aquele homem maravilhoso por quem es­perava.


Ainda assim, tinha que admitir que ele lhe despertava sentimentos que jamais experimentara. Quando tocou o rosto dele, sentiu uma admiração que lhe era totalmente nova. Gostaria de tocá-lo outra vez.


E queria ser tocada por ele. E era aí que morava o perigo. Só de pensar nisso já ficava sem ar. Ela teria que ser muito cautelosa.


Embora ele particularmente a atraísse, tinha dúvidas sobre o objetivo dele ali. Estava começando a pensar se realmente poderia apoiá-lo na iniciativa de se tornar rei. Hermione amava a sua terra natal e gostaria de ter um bom rei, e de preferência um que também amasse Niroli. Cada vez mais ela percebia que Harry estava longe de ser a pessoa certa.


Suas atitudes eram muito perturbadoras. Primeira­mente, notou que ele, de vez em quando, fazia uma piada com sua terra natal, mas atribuía isso a uma percepção cínica do mundo de um modo geral. Foi quando ele estava prestes a ir para o palácio que ela o pegou falando coisas que realmente a deixaram desconfiada. Será que ele realmente quisera dizer aquilo? E ela deveria ignorar tais atitudes?


 

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