Um ponto de Luz



Aparatou fora da Mansão, temendo encontrar Lucius lá dentro entrou devagar no hall de entrada, parando no espelho em uma das paredes para checar sua aparência. O rosto estava acabado e o cabelo totalmente bagunçado, com alguns feitiços deu um jeito em tudo para que ficasse apresentável e seguiu até o interior da casa, as luzes estavam apagadas então ela presumiu que ele não havia chegado ainda e atravessou a sala principal em direção à cozinha para fazer um lanche rápido e ir se deitar.


Estava passando ao lado das poltronas em frente à varanda quando repentinamente todas as luzes se acenderam e ela reparou em alguém sentado na poltrona mais próxima de perfil. Ele apoiava os cotovelos nos baços da poltrona e girava a varinha na mão, virou o rosto lentamente para ela e se levantou, o silêncio se impondo entre os dois como uma atmosfera saturada pronta para explodir a qualquer momento.


- Visitando Bellatrix, foi o que elfos me disseram quando cheguei nessa casa. - sua voz era baixa e pausada, sem deixar a natural imponência de lado, seus olhos faiscavam em ódio, um brilho assassino passando por eles.- Narcissa. Responda. -  Ao vê-lo com aquele olhar, como se estivesse disposto a matá-la ali em um segundo, a bruxa permaneceu estática, se esforçando para responder algo sem se entregar.


- S-sim. Visitando Bellatrix, Lucius. Era aonde eu estava.


- E desde quando você e sua irmã são tão próximas ao ponto de você ir passar o fim de tarde com ela? - disse em um tom debochado e um sorriso irônico nos lábios, se aproximou três passos e cruzou os braços, ficando assim apenas a um metro de distância de Narcissa.


- É minha irmã, não há nada de errado em passar um tempo com ela. - tentava se manter firme e calma, sem denunciar o nervosismo que tomava conta de si.


- E deixe-me adivinhar, ela te recebeu de braços abertos e um sorriso no rosto, como uma bela anfitriã. - falava lentamente, o sarcasmo escorrendo pelo sorriso de escárnio em seus lábios a cada palavra que dizia. Até que ficou sério e se aproximou mais enquanto continuava - Não seja ridícula, Narcissa, todos sabemos que Bellatrix não ficaria exatamente radiante em receber a irmãzinha caçula dela. -  parou em frente a mulher com os rostos muito próximos, aquele tom de superioridade que ele usou a fez ferver em raiva, o asco subindo pela garganta.


-Como disse, ela é minha irmã. Agora não posso nem mais visitar a  minha própria irmã, é isso? - levantou o tom de voz. Era comum ele tratá-la daquela forma, usar aquele tom de voz era rotineiro. Mas tendo experimentado da “liberdade” há pouco, ter Lucius tentando controlando-a daquela forma a afetou como nunca, sentia que não pertencia mais totalmente a ele como antes.


Ao ouvir que ela disse o ódio nos olhos de Lucius transbordou e sua mão desceu em um tapa sonoro no rosto de Narcissa, fazendo-a tropeçar um passo para o lado e quase cair.


- Não ouse falar comigo nesse tom de novo. - segurou-a pelo braço e disse cada palavra pausadamente.


- E você vai fazer o que? - em um primeiro instante se sentiu revoltada com o tapa, dizendo as palavras sem pensar nas consequências, mas quando percebeu a espressão no rosto do homem e se lembrou que não tinha chances de se defender contra ele ali sozinha o medo se espalhou por seu corpo em um calafrio.


- Você sabe muito bem o que eu posso e vou fazer se continuar insolente desse jeito, Narcissa. - ele crispou os lábios e apertou com mais força seu braço, fazendo-a sentir como se fosse quebrar.


- Lucius… - falou como um gemido e os olhos se enchendo de lágrimas, segurou seu braço com a outra mão tentando se soltar.


- Você é minha esposa, Narcissa. E isso não vai se repetir. - soltou a loira, que deu alguns passos para trás. Ele respirou fundo e olhou para ela por alguns segundos - Ótimo então. Se estava com Bellatrix, posso muito bem ir à casa dela amanhã cedo que ela confirmará a história, não é?


- Claro. - não tinha certeza do que aconteceria se ele fosse mesmo confirmar a história, mas certamente não havia outra resposta a dar naquele momento. Talvez até sua irmã mentisse para ajudá-la, Bella também nunca gostara de Lucius. - Vamos amanhã então.


- Não, querida. - deu novamente aquele sorriso irônico e falso, se aproximou novamente e segurou seu queixo com delicadeza. - Você fica e eu vou sozinho.


- Lucius, eu quero ir.


- Não. - apertou com força sua mandíbula e arqueou as sobrancelhas. - Você fica. Sem mais nenhuma discussão por hoje. - afrouxou os dedos a puxou para um beijo antes que pudesse responder.


Foi necessário muito esforço para não empurrá-lo para longe de si, cerrou os punhos e apenas retribuiu ao beijo na intensidade que a repulsa que a dominava permitia.


- Está decidido então, levantarei cedo para visitar sua querida irmã. - disse ao romper o beijo, em seguida se afastou e foi em direção à escada subindo até o quarto dos dois.


Narcissa permaneceu petrificada enquanto ele se retirava, não disse nenhuma palavra até porque tentar ir contra uma decisão dele não era algo muito inteligente a se fazer. Assim que ficou sozinha ela andou até o sofá mais adiante e sentou ali, lágrimas silenciosas percorreram seu rosto e ela se forçou a lembrar dos momentos que passara na Mansão Lestrange com Rodolphus. Sorriu de canto, imaginando como seria formar mais lembranças como aquela, como ela seria feliz se todas as possibilidades que cruzavam sua mente se tornassem realidade. Seria praticamente impossível de cultivar um caso com ele tendo Lucius a vigiando de perto, ele perceberia… Mas algo fundo em sua mente a dava forças para tentar, a dizia que valeria a pena. Poderia estar errada e apenas se afundar mais em infelicidade no fim das contas, mas ela tentaria. A presença de Rodolphus a fizera sentir bem demais para não arriscar. Por hora, no entanto, ela dependia do que aconteceria na manhã seguinte, não queria continuar pensando em hipóteses loucas que o medo ou a esperança costumavam cultivar, deitou-se no sofá e adormeceu ali.








Aparatou na Mansão Lestrange e não se deu ao trabalho de bater antes de entrar pelo hall e ir direto procurar Bellatrix. Mandou um elfo qualquer que passou por perto dizer aonde ela estava e foi informado que deveria ir até a biblioteca, seguiu até o cômodo e a encontrou lá, sentada em uma poltrona lendo um livro enorme de capa escura.


- Lucius, o que faz aqui? - percebeu assim que ele entrou, odiando quem quer que fosse por atrapalhá-la, descansou o livro aberto nas pernas cruzadas e o olhou, erguendo uma sobrancelha.


- Esse não é um jeito muito educado de receber visitas, Bellatrix.


- E desde quando eu me importo? - fechou o livro o cruzou os braços, dirigindo a ele um olhar entediado - Faça me o favor, Malfoy, diga logo o que quer.


- Vim saber como anda minha querida cunhada. - tirou sua capa de viajem e a deixou em cima de uma mesa dando alguns passos adiante.


- Do mesmo jeito de sempre. - disse devagar estreitando o olhar para o homem. Não estava gostando daquilo, Lucius agindo daquela forma certamente precedia algo detestável.


- Tem certeza? Nada de diferente?


- E por que eu deveria te contar o que se passa na minha vida? - disse um pouco mais irritada.


- Ora, Bella, seja mais receptiva - deu um sorriso largo, sentando-se em seguida a sua frente em um sofá de dois lugares - Venho aqui saber sobre você e é assim que agradece a minha visita?


- Mas que po…- falou muito baixo já com uma vontade enorme de lhe mandar uma cruciatus no meio da testa, respirou fundo e sorriu falsa - Minha vida anda ótima, maravilhosa, não podia estar melhor. Satisfeito?


Aquela conversa ridícula já a estava irritando, detestava Lucius e uma visita dele era o que ela menos desejava, ainda mais quando a atrapalhava no meio de uma leitura para fazer aquelas perguntas. Mas ele queria algo, era claro que tinha algo errado, nem ele com toda sua falta de senso de conveniência iria até ela com o propósito de estreitar os laços e saber como ela andava.


- Ah, me dê mais detalhes… - por alguns segundos brincou com a bengala que apoiava no chão e segurava na mão esquerda, e então a olhou - Tem visto Narcissa? - observou-a buscando guardar qualquer sinal de sua reação que denunciasse algo.


- Por que quer saber? - percebeu que ele a olhara com mais atenção ao fazer a pergunta, até porque não era o tipo de coisa que ele perguntaria em uma situação normal. Ele nem ao menos falaria com ela em uma situação normal, era realmente estúpido e típico de Lucius visitá-la assim. A raiva de antes por ter sido interrompida se esvaiu com a ideia de brincar com as expectativas dele. Ergueu a sobrancelha e esperou que ele respondesse, e tendo o silêncio de volta ela continuou sondando - Por que, Lucius? Narcissa por um acaso disse algo...? - deixou a frase terminar pairando no ar.


Estreitou os olhos, guardando os detalhes da reação da mulher e não demorou muito em responder


- Me falou sobre ter te visitado.


- E qual o problema nisso? - disse sem mudar a expressão. Era no mínimo interessante saber que Narcissa andara mentindo para o marido, sendo sempre tão submissa e fiel a ele, algo muito significativo devia ter acontecido para levá-la a inventar histórias para Lucius. Não que Bellatrix se interessasse por qualquer “aventura” que sua irmã caçula estivesse metida, mas se fosse algo contra o trasgo que era seu marido, ela não se negaria a encobrir a mentira.


- Diga-me desde quando se interessa por se tornar próxima de Narcissa? Eu arriscaria dizer que seria mais provável te ver com Andrômeda do que com sua irmã caçula.


- Não me fale de Andrômeda! Sabe muito bem que ela não é mais considerada uma Black, aquela traidora. - revirou os olhos e apoiou a cabeça em uma das mãos. - Por Merlin, Lucius, deixe de ser controlador. Se sua esposa quer vir me ver, não se meta!


Estava surpreso com a reação dela, poderia jurar que acharia absurda a ideia de ter visitinhas de Narcissa para conversar e tomar chá a tarde.


- Não me venha como se fosse totalmente do seu feitio programas de família, seja sincera, Bellatrix. - a essa altura ele não mais forçava um sorriso falso, a encarou irritado torcendo para que a maldita mulher dissesse o que ele queria ouvir.


- Mas quanta petulância sua falar assim comigo. - voltava a se irritar. Era certo que ela gostava de se divertir torturando-o daquela forma, mas não ia aceitar que um verme como Lucius falasse com ela assim em sua própria casa. Percebeu que aquilo não chegaria a lugar nenhum e a paciência para aguentar aquela conversa já estava chegando ao fim - Você sabe muito bem que eu não tenho tolerância para esse seu jeito irritante de tentar controlar a todos, então pode abaixar seu tom de voz. Não me importa o que acontece entre você e minha irmã mas se ela quiser vir aqui não é você quem vai impedir. Agora, essa conversa acabou e você vai sair da minha casa neste segundo antes que eu te faça sair.


Não podia acreditar no que estava ouvindo, odiava Bellatrix com todas as suas forças e receber ordens dela o fazia ferver em raiva. Mas não havia nada que pudesse fazer afinal, tentar prolongar aquela conversa seria inútil. Levou alguns segundos para ter alguma reação além de olhá-la revoltado. Levantou-se e andou até a saída sem dizer uma palavra.





Lucius saiu da Mansão Lestrange quase explodindo de raiva. Narcissa estava diferente nos últimos dias, algo quase insignificante mas ele sabia identificar quando ela estava diferente. Andava um tanto impaciente pela casa, como se procurasse constantemente algo com que se ocupar, aparentando mais aérea que o normal. E então ela vinha com uma história ridícula de ir visitar Bellatrix. Podia jurar que aquilo tudo era uma mentira e esperava descobrir o que diabos passava pela mente de sua esposa quando foi até lá pela manhã. Nem se incomodou pelo fato de ela ter dormido na sala ao invés de se deitar com ele, apenas a ignorou e saiu sem falar nada tendo no pensamento que tudo seria esclarecido, mas quando a conversa com Bellatrix terminou ele seria capaz de qualquer um que cruzasse seu caminho tamanha era a raiva.







Acordou com os raios de sol que entravam pela varanda e atingiam seu rosto. Estava morrendo de fome e com uma dor de cabeça horrível, tentou se apoiar no braço para se sentar e sentiu uma dor forte, olhou e percebeu que haviam marcas roxas dos dedos de Lucius. Tentou ignorar as imagens da discussão da noite anterior e foi até a cozinha para o desjejum. Ficou um bom tempo sentada olhando o nada enquanto comia suas torradas e bebia o café até ver o marido passar pela porta e parar em frente a ela.


- Surpreendentemente, Bellatrix confirmou essa loucura.


Ficou surpresa quando o ouviu. Era certo que ela cogitara a possibilidade de aquilo acontecer, mas imaginara que teria de ir até lá e conseguir um jeito de dar um sinal para a irmã. Quando ele a proibiu de ir, Narcissa jurava que tudo estava perdido, ela não acharia uma desculpa para Lucius e teria de contar a verdade, fim. Ficou um tanto intrigada quanto à razão de Bella ter mentido, mas se concentrou em permanecer com a expressão neutra e não colocar tudo a perder.


- Como eu disse. - ergueu uma sobrancelha enquanto mordia uma torrada. - O que ela falou?


- Apenas confirmou. - disse seco, retirando a capa e colocando-a em cima da cadeira mais próxima à mesa, do lado oposto de Narcissa.


- Agora que acredita no que eu disse, posso visitar minha irmã sem passar por todo esse drama quando chegar em casa? - tentava parecer como se tudo fizesse sentido, se esforçava ao máximo para não deixá-lo perceber que ambas mentiam. Mas era um fato inegável que a loira não sabia mentir. A presença de Lucius a desconcertava, talvez fosse a submissão que ela tão naturalmente sempre aceitara e a falta de coragem em tentar quebrar aquilo que tanto a incomodava. Ela não fazia nada a respeito, nunca fizera e muito provavelmente não o faria; tentar mentir para ele era contra sua natureza.


- Cuidado com a sua língua, Narcissa. Saiba que ainda acho isso muito estranho - estreitou o olhar e cruzou os braços para ela - De qualquer forma, não acho que vá precisar visitá-la tão cedo. Vamos ter uma reunião aqui com o Lorde das Trevas e os comensais. Como sempre, você vai ficar fazendo qualquer coisa nos jardins para não atrapalhar, mas quando acabar pode entrar para falar com ela já que faz tanta questão. - olhava a mulher em uma expressão cuidadosa.


- Perfeito então - ignorou o aviso dele e terminou seu café. - Se está tudo resolvido, então vou subir para tomar um banho. - levantou da cadeira começou a andar até a saída, passou pelo lado dele e Lucius a segurou pelo braço. Olhou-a por alguns instantes ainda tentando decifrar o que ela escondia, e era terrivelmente irritante perceber que ela estava conseguindo manter o que quer que fosse escondido sob aquela expressão ensaiada que mostrava culpa e escondia a razão ao mesmo tempo.


- Que a noite passada não se repita. Sabe que detesto quando a minha esposa fala daquela forma comigo. E essa noite a quero na nossa cama, como todas as outras noites, entendeu? - falou aos sussurros com os rostos muito próximos e um olhar autoritário dirigido a ela.


- Claro, querido. - forçou um sorriso e se soltou, continuando o caminho até a porta.






Ela estava sozinha no jardim, andava por ele calmamente pois sabia que a reunião demoraria a chegar ao fim. Imaginava como naquela noite ela e Rodolphus estariam tão próximos e tão distantes ao mesmo tempo. Ela não arriscaria conversar com ele no meio de tanta gente e ainda por cima com Lucius em sua cola. Mas saber que ele estava lá, em sua casa e tão perto a deixou mais animada que o normal para aquela reunião, poderia ao menos vê-lo de longe afinal.


Percebeu o movimento que se iniciava no terceiro andar. Finalmente chegara ao fim. Foi em direção à casa e ao chegar no salão de entrada os comensais conversavam.


Lucius estava à esquerda, do lado oposto à lareira junto a McNair provavelmente falando sobre algo inútil. Rabastan se juntou repentinamente aos dois ficando deveras próximo de McNair, um pouco afastado de Lucius e com a postura um pouco rígida. Achou estranho aquele tipo de comportamento, mas ultimamente era comum e não deu importância, desviou a atenção do trio antes que seu marido a visse. Um pouco mais adiante, próxima à lareira e obviamente não muito longe das bebidas, estava Bellatrix. Narcissa precisava fazer algo ao invés de permanece ali parada como uma retardada e achou o momento oportuno para sondar sua irmã a respeito do incidente com Lucius.


No curto caminho entre as duas, aproveitou para procurar Rodolphus pelo espaço, os olhos varreram todo o salão sem encontrá-lo em parte alguma. Contendo um suspiro de decepção, disse ao parar próxima à irmã:


-Bella! Como vai? - apenas após terminar de falar foi que percebeu o quão nervosa estava. Usou o perfeito tom de anfitriã que estava habituada a usar com qualquer um, mas Bellatrix estava longe de ser qualquer uma, percebera claramente que havia algo errado e arqueou a sobrancelha em resposta.


-Sabe que não sou estúpida como as suas visitas para aceitar essa cortesia forjada, não é?


- Por Merlin! Estou tentando ser educada, pode por favor colaborar? - cruzou os braços tentando parecer natural. Imediatamente se arrependeu de ter ido abordá-la, sua irmã era muito inflexível e contundente, Narcissa não tinha ideia de como prosseguir. Mas ela não iria simplesmente virar as costas e fugir, então se esforçou para continuar. - De verdade, Bella, como está? - tentou imprimir em sua expressão o pequeno ponto de verdadeiro interesse que possuía - Nos falamos tão pouco, quero saber como as coisas estão. - disse após poucos segundos antes que ela respondesse, as palavras soando mais verdadeiras. E realmente eram, Narcissa costumava ter aquele tipo de relação com Andrômeda e, após o distanciamento forçado entre as duas, a irmã caçula sempre sentiu falra do sentimento fraterno do passado.


Bellatrix revirou os olhos à resposta da loira, não se importou em forçar um sorriso e apenas disse - Vou bem.


Permaneceu parada olhando-a e frente a uma resposta tão displicente, Narcissa mostrou indignação. Prevendo os protestos que viriam, Bella completou com um revirar de olhos.


- Não me diga que quer uma descrição completa do que eu faço todos os dias.


- Só queria que fosse mais receptiva. - a mais nova bufou impaciente e desviou a atenção novamente desistindo de continuar. Se incomodou ao perceber que Bellatrix a obervava e tentou achar o mais rápido possível um motivo para sair dali.


Bella podia notar claramente o desconforto da loira, aquela era uma das raras vezes que Narcissa Malfoy tentava sem sucesso parecer natural forçando a anfitriã perfeita. E era fácil imaginar uma razão.


- Se está tão interessada assim, recebi uma visita de seu querido marido há não muito tempo. - disse sem precedentes, antes de a conversa se esvair por completo.


Narcissa ergueu as sobrancelhas e voltou a olhar a irmã ao ouvi-la falar.


- Ah… claro. Eu soube. - pensou nas palavras certas a dizer. Fora pega de surpresa, nem imaginava mais entrar no assunto e então Bellatrix daquele jeito direto e irritante a pega desprevenida.


- De nada. -  Bella respondeu frente à demora da outra, sorriu com a reação dela divertindo-se com a situação já que se irritar não valia a pena. Já perdera a paciência inúmeras vezes com aqueles rodeios de Narcissa, sempre floreando o assunto ao invés de ser direta. - Merlin santo, pare com isso, Narcissa. Sem teatros, vá direto ao assunto. O que quer saber? Por que menti?


De início a loira tentou manter a pose mas, como sempre, fora desarmada e acabou por se render.


- Sim. - soltou a palavra junto ao ar que estava inconscientemente preso em seus pulmões - Diga logo por que diabos fez isso. Por compaixão eu sei que não foi. - disse em um tom quase impaciente.


Não pôde deixar de rir com o que ouviu - Quando drama, Cissy. - uma risada abafada - Mas confesso que adorei torturar seu marido com algo que ele não pode controlar. - disse em quase um sussurro contendo o impulso de dar um passo para trás ao ver Narcissa se aproximar exageradamente.


- Oh. Certo. - o alívio tomou conta de si. A única coisa que tomara conta de seus pensamentos até ali era que Bellatrix tinha descoberto tudo. Não conseguia achar uma desvantagem concreta nisso, mas não queria que ninguém soubesse. Era um segredo dela e de Rodolphus, seria totalmente errado se qualquer outra pessoa tomasse conhecimento.


- Olhe, não me interessa o que você esteja aprontando por aí pelas costas do traste do seu marido. Mas meus parabéns. - Narcissa demonstrou espanto e Bellatrix sorriu - Nunca imaginei que fosse fazer algo assim.


- Merlin, Bellatrix! Não estou fazendo nada. - desviou o olhar levemente envergonhada - Apenas gosto de me distrair sem precisar dar satisfações a Lucius.


- “Se distrair” - riu um pouco mais alto atraindo a atenção de um comensal não muito longe delas e então falou mais baixo ainda com um sorriso - Como eu disse, não me importa o que isso seja. Apenas me orgulhei de saber que fez alguma coisa por conta própria. - olhou pelo salão já bem mais vazio e um pouco irritada disse - Agora, se não tem mais nada a dizer, vou ver aonde Rodolphus se enfiou, estou exausta e preciso da minha cama. - e saiu.


Narcissa permaneceu um tempo ainda parada ali, refletindo sobre aquilo. Olhou as pessoas em sua casa e subitamente se sentiu mais envergonhada que nunca. Estava traindo seu marido. Merlin santo, o que seus pais diriam daquilo? Pensar na situação assim no meio de todos era mais vergonhoso do que parecia. Mas Bellatrix tratava do assunto com uma naturalidade assustadora. Ela a parabenizara. Bellatrix a parabenizara. Recebera o apoio da irmã e estava traindo o próprio marido com o marido dela. E ela obviamente não ligaria para aquilo também. Era tão absurdo que a fez rir. Estava tentando implementar na própria mente a visão da irmã, queria pensar nela e Rodolphus como algo natural.


E era natural. O caso dos dois era o mais perto de uma ocorrência espontânea que ela já vivera. E ainda assim Narcissa sentia suas faces ruborizarem e um sorriso de canto brotar toda vez que pensava em sua última visita à Mansão Lestrange.


- Prometa que ainda vai me dar uma foto sua. - a voz grave soou subitamente perto dela. Quase deu um salto de susto, imediatamente a reconheceu e seu coração desparou batendo forte contra o peito. Imaginou se os outros ali percebiam a cena, passou os olhos por todos antes de se virar para trás, mas percebeu que apenas restava um pequeno grupo de comensais do outro lado da sala e Lucius conversava distraído entre eles, e viu que não haveria problema em se virar. Ele estava trajado em um terno cinza escuro que o fazia parecer ainda mais bonito. O sorriso que ele exibia, apesar de discreto, a fez esquecer o que ia falar.


- Te assustei? - ele disse em uma risada baixa.


- Sim. - respondeu em um sorriso após respirar melhor. - Minha nossa, não faça isso de novo. - ambos riram juntos e por um segundo ela se esqueceu que seu marido estava na mesma sala que os dois. Ao se lembrar de aonde estavam, diminuiu os risos tentando agir como agiria com qualquer outro ali.


- Então, promete que vai me dar uma foto? - colocou as mãos nos bolsos da calça - Acho muito injusto que você ande pelos cantos sorrindo sozinha sem que eu possa carregar uma cópia dessa bela imagem comigo.


Narcissa sorriu, sempre olhando em volta para saber se estavam sendo observados. - Tudo bem, já que insiste. - respondeu olhando novamente para ele - Mas pare de me envergonhar assim em público, Rold.


- Ninguém está vendo, Cissy. E mesmo que estivessem, somos apenas um bruxo e uma bruxa conversando após um evento cotidiano. - disse, dessa vez ele mesmo olhando a volta do local. - Não se preocupe.


Ele sorriu, ela também. Ficaram assim por o que, à visão dos outros, seriam poucos segundos, mas para os dois era uma pequena porta ao mundo deles. Um instante em que se contemplavam dentro das eras que eram forçados a passarem separados um do outro, cada um na própria casa no próprio casamento.


- Rold - disse ela suavemente


- Sim. - ambos pareceram voltar à realidade.


- Quando nos veremos de novo? - ele suspirou e pareceu pensar no assunto. Aquele era um ponto que incomodou profundamente ambos durante cada segundo que permaneceram separados. E Rodolphus não fazia ideia da resposta.


- Bom, Bellatrix não costuma passar os finais de semana em casa.


- E Lucius vai passar um período maior em casa dessa vez antes de sair novamente. - pela primeira vez estava profundamente incomodada com o fato de seu marido demorar a viajar novamente. Ele sempre dizia que eram viagens a trabalho, seja pelo ministério ou em missões para o Lorde. E Narcissa nunca questionara, mas no fundo sabia que nem todas eram por aquela razão. Mas agora aquilo não mais a incomodava, na verdade o que ela mais desejava era a ausência do marido. - Prometo que te aviso quando ele sair. Até lá…


- Até lá aguentaremos como aguentamos até aqui. - disse em um sorriso terno antes que ela terminasse de falar. Podia perceber que ele não dizia as palavras apenas para ela, tentava convencer a si mesmo também de que seriam fortes em aguentar a distância.


- Sim, aguentaremos. - ela sabia que seria uma tortura, mas sorriu ainda assim.


- Mas agora, tenho que ir. - visualizou Bellatrix vindo em sua direção - Sua irmã não parece muito satisfeita.


- Não mesmo - viu a expressão dela e viu Rodolphus indo em sua direção após um aceno de cabeça e seu sorriso acompanhado de um “Até logo”.


Sentiu um onda de inveja se avolumando em seu peito ao vê-lo aparatar com ela. Nunca antes Narcissa havia invejado tanto sua irmã. Bellatrix sempre fora mais querida por todos, apesar de irritar os pais com o jeito hostil de ser e com todas as irreverências, era nítido como todos os seus talentos sempre chamaram a atenção de todos e sim, Narcissa já a invejara muito por todos aqueles motivos. Mas ela tinha seus sonhos, tinha seu jeito de ser que era oposto em muitos níveis aos de Bella. O fato de não ter o que ela tinha era suprimido pelo alcance do que ela sempre quis, mesmo no fim das contas descobrindo a grande farsa que era seu casamento, o principal plano desde sempre.


E agora ela tinha um novo foco, um novo sonho. Um belíssimo sonho que a encantava todas as noites e também quando pairava nas memórias que as tomavam durante o dia. Uma única esperança, e ele era dela. Sabia que nenhum dos dois ligava para aquele casamento. Mas Narcissa foi incapaz de conter o rancor ao ver sua irmã levar consigo seu ponto de luz para desprezá-lo depois.


Demorou algum tempo para perceber que seu sentimento era o mais puro ciúmes. Ciúmes este que se juntou à inveja, à saudade e ao estranho sentimento que nutria por aquele homem.




Os outros comensais foram embora. Os vivos pesadelos diários aos quais ela era submetida vieram e, como sempre, se foram deixando uma ou duas lágrimas. Já foi pior, ela pensou, as lágrimas já foram mais volumosas e a dor mais sufocante quando ela não tinha nada em que se agarrar.


Aquele dia em especial ela demorou um pouco mais a dormir, um certo bolo se avolumava em algum lugar do peito que insistia em continuar ali ao invés de se esvair com as lágrimas.


Fechou os olhos, suspirou e uma imagem lhe veio à mente: Rodolphus…


Não. Rodolphus e Bellatrix. Merlin santo, ela estava se roendo de ciúmes. Ainda se ressentia por ter que assisti-lo partir após terem estado tão próximos e tão distantes ao mesmo tempo. Ela queria enchê-lo de beijos, abraços, toques, e tudo o que aquilo podia desencadear. Queria se afogar nele e nunca mais emergir, tornar-se um ser nativo vivendo em sua essência, cuja sobrevivência em qualquer outro lugar seria impossível. Já se tornava impossível cada dia mais. Rodolphus era sua força nos piores momentos, mas sua falta se tornava exponencialmente mais crítica.


Imaginou que isso estivesse chegando a um nível doentio, que talvez uma dependência excessiva tomasse conta dela, todos os momentos de seu dia era ele quem dominava os pensamentos. A cada segundo que se passava Narcissa se perguntava o que ele estaria fazendo, se também estaria pensando nela. Tinha consciência de que muito provavelmente estava exagerando... Mas também sabia que já era tarde para voltar atrás. A conexão já tomava conta dela e não seria capaz de eliminá-la. Nem ao menos tentaria.


Mais uma vez cansada de tentar entender, ela suspirou. Um suspiro cansado no qual foi imprimido todo o turbilhão de pesares que preenchiam seu interior.  Uma respiração pesada se seguiu, o fluxo constante do ar entrando e saindo era como suas próprias emoções. O contraponto criado entre a expectativa e a realidade a fazia migrar de um estado melancólico para a mais intensa alegria salpicada de esperança. E em noites confusas como aquela, a inconstância a perseguia por horas a fio.










Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.