O chamado



Remo Lupin era um homem de muitos rótulos: fora um dos Marotos na adolescência, monitor e ex-professor em Hogwarts, integrante da Ordem da Fênix, esposo da auror Ninfadora Tonks, pai de Teddy Lupin e, sobretudo, um lobisomen. Essa última faceta o fazia uma pessoa normalmente reservada, cujos sentimentos e ações eram permanentemente contidos, como se, com isso, pudesse contrabalançar a explosão de violência irrefreável que o acometia todos os meses.


Depois que seu filho nascera, isso passara a ser uma parte ainda mais importante de sua vida, pois o amor o elevava tão alto quanto a responsabilidade parecia esmagá-lo. Considerara ser pai, em sua condição, uma loucura, mas nunca se arrependeu desde a primeira vez em que pusera os olhos no filho.


Naquela noite, o segurava no colo, enquanto caminhava calmamente pelo modesto apartamento que abrigava a família. A sala era mobiliada com uma mesa de jantar redonda e duas poltronas em torno da lareira fria. Indo e voltando pela sala, via, de um lado, uma cozinha pequena, muito limpa. Não fosse pelas várias mamadeiras por lavar espalhadas por ali, daria a impressão de que não era utilizada. Ao dar a volta, pela porta entreaberta do quarto do casal, podia observar uma Tonks que dormia tranquilamente, aproveitando o silêncio daquelas horas calmas.


O cabelo de Teddy, que mudava de cor desde suas primeiras horas de vida, em seu sono adotava uma coloração condizente com os sonhos que parecia ter. Naquele momento Lupin sorriu porque o cabelo do pequenino assumira três tonalidades diferentes de uma vez só, coisa que nunca havia acontecido até aquele dia, o que parecia remeter a uma aventura muito interessante.


Observando o filho, Lupin apercebeu-se que momentos como aquele eram um bálsamo para a crueza dos dias que viviam. Lembrava-se de como havia sido a primeira ascensão de Voldemort. A violência explodira pela Inglaterra bruxa como uma praga mortal, cuja disseminação culminara e acabara justamente com a morte de dois de seus amigos mais queridos: Tiago e Lílian.


O retorno das trevas, dessa vez, se revestira de um método muito mais insidioso e sistemático: o de minar as forças que lhe eram contrárias de dentro da própria estrutura. Não havia por que combater o Ministério, pois ele próprio fora tomado e o poder era exercido por meio de fantoches, enquanto o mal se entranhava no próprio sistema que devia proteger o mundo mágico.


Os acontecimentos dos últimos dias, contudo, lhe diziam que algo estava para acontecer. Depois de meses de total silêncio, Harry Potter havia reaparecido no Chalé da Conchas, onde fora encontrá-lo para noticiar o nascimento de Teddy e convidá-lo para ser padrinho de seu filho.


Apesar da imensa felicidade daquela noite, Lupin pudera sentir um Harry muito mais sério, totalmente desvestido das alegrias da adolescência que deveria estar vivendo. As marcas da recente morte de Dobby, em alguma obscura e perigosa aventura, ainda não haviam sido cicatrizadas. Por outro lado, percebera nele uma nova determinação, das que encontram aqueles que, perdidos em um labirinto infindável, finalmente decidem qual caminho seguir, ainda que o preço seja alto demais.


No fim da tarde, uma notícia impressionante havia corrido o mundo mágico como rastilho de pólvora. Dizia-se que o Gringotes havia sido invadido em plena luz do dia e que os assaltantes haviam conseguido fugir. De fato, centenas de pessoas no Beco Diagonal testemunharam quando um dragão emergiu dos níveis inferiores e, destruindo completamente o salão principal do banco, partiu em um voo alucinado através do céu de Londres.


Lupin tinha certeza de que os assaltantes eram seus ex-alunos e amigos Harry Potter, Rony Weasley e Hermione Granger. Só não conseguia atinar para o que os levara até o Gringotes, embora imaginasse a importância daquele ato para a missão que Dumbledore deixara para Harry.


Depois daquilo sentira-se incapaz de dormir e passara as horas a espera de notícias. No fim, pegara o filho para o tradicional “passeio” pelo apartamento, perdido em devaneios e com a permanente sensação de que algo estava para acontecer.


- Remo? - uma voz sonolenta desviou-o de seus pensamentos. Entrou no quarto e cuidadosamente repôs o filho no berço que ladeava a cama de casal.


- Alguma novidade? - Tonks perguntou, olhando o filho mudar novamente a cor dos cabelos.


- Nenhuma, Dora. Isso é que me deixa mais preocupado.


- Eles estão bem! - rebateu a mulher, aprumando o corpo na cama - Se algo de ruim houvesse acontecido a eles o Ministério já teria noticiado.


- É. É verdade - respondeu, embora não parecesse muito convencido.


Aproximou-se da esposa, mas antes do abraço que pretendia lhe dar, sentiu, às suas costas, uma luz prateada invadir a sala do apartamento. De varinha em punho, correram para o cômodo e se depararam com uma doninha luminosa que falou com a voz de Arthur Weasley.


“Harry está em Hogwarts. Todos os que puderem devem ir para lá. O acesso será pelo Três Vassouras. Aberforth já foi avisado.”


Os dois ficaram estáticos mesmo depois que o patrono se dissipou em uma névoa prateada. Lupin ficou de olhos fechados por alguns segundos, absorvendo cada palavra, até que sentiu uma mão se entrelaçar à sua.


Virou-se para Tonks, que tinha uma expressão de medo nos olhos. Um medo que ele sabia não ser da batalha em si, afinal ela era uma mulher corajosa, uma auror que já enfrentara situações perigosas muitas vezes antes.


Era o mesmo medo que ele sentia: chegara o momento que esperavam há meses, o momento a partir do qual tudo se definiria, o momento a partir do qual o mundo mágico seria um lugar seguro para que seu filho vivesse ou, do contrário, um mundo terrível, de angústia e clandestinidade, de miséria e violência.


Chamou a mulher para um abraço em que tudo isso se transmitiu sem que palavras fossem ditas. Ficaram assim por vários minutos, até que Lupin sussurrou em seu ouvido:


- Dora... chegou a hora. Você sabe que eu tenho que ir.


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Comentários (2)

  • Neuzimar de Faria

    Um tema diferente de todos os demais. Quando a gente pensa que todos os temas já foram abordados, alguns de vocês acabam por pensar em alguma coisa inédita e escrever muiiiiiito bem sobre ela. É o seu caso. Sua história começou muito bem e, para mim, você está no caminho certo. Continue, por favor.

    2013-01-18
  • AnaLú

    O Remo ta tão fofinho com o teddy.Estou gostando, continuee :D

    2013-01-15
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