Primeiro



I was so lost, didn't know what to do with myself,
I was my own worst enemy, I was lost and oh I needed help,



A mansão Malfoy estava escura e vazia. Desde que aquele metido Harry Potter derrotara Voldemort, os Malfoy vinham passando mais tempo nos tribunais do ministério do que no conforto de sua enorme casa. E ainda que os julgamentos não contassem mais com a presença perturbadora dos dementadores, nem com as correntes mágicas que seguravam com força os acusados, continuavam sendo um processo penoso e incômodo.


Tentando aproveitar aquela rara tarde de descanso, com o tribunal em recesso e seus pais reunidos com o advogado no escritório dele, Draco estirou-se em sua cama, tentando cair em um sono que teimava em não vir. Sua cabeça doía e ele sentia uma acidez pressionar-lhe a boca do estômago, sinal característico da gastrite que adquirira nos últimos anos. Ele respirou fundo, concentrando-se em não vomitar. Gostaria de poder tomar uma poção sonífera, mas sabia que aquilo somente intensificaria o efeito doloroso da gastrite.


Chegara a pensar que, com Voldemort morto, as origens de seu estresse também sumiriam, mas os últimos meses haviam lhe mostrado que a tranqüilidade ainda estava longe de sua vida, se é que não seria algo inatingível para um Malfoy com um passado como o seu.


Abriu os olhos e encarou o teto. Por mais que tentasse, não conseguia apagar da mente a imagem da mãe sentada na cadeira de ré, diante dos juízes e jurados convocados pelo ministério. Diante daqueles três grifinórios insuportáveis de nariz empinado, claramente orgulhosos demais de si mesmos.


Ele não ia vomitar. Não podia.


 Draco não se lembrava de jamais ter visto os pais tão abatidos quanto nos últimos meses, durante as intermináveis sessões de julgamento a que eram obrigados a participar. Mas o pior de tudo, para ele, era dever a Potter a liberdade provisória de sua família.


Logo após a derrota de Voldemort e seus seguidores, o ministério não perdeu tempo em prender o maior número possível de comensais e colaboradores do Lord. Influenciados pelo depoimento de Potter, contudo, os juízes decidiram que a família Malfoy poderia responder ao processo em liberdade, desde que assinasse um pacto mágico que os impedia de deixar o país.


Na sessão do dia anterior, Potter foi novamente ouvido sobre o caso Malfoy, reafirmando seu depoimento de que Draco poderia tê-lo entregue a Voldemort quando fora capturado por Bellatriz, e que Narcisa salvou sua vida ao garantir ao Lord das Trevas que ele estava morto, quando na verdade ainda respirava. O resultado disso, segundo o advogado dos Malfoy, era que o tempo de Lucius e Narcisa em Azkaban poderia ser reduzido, ao passo que Draco ainda tinha chances de obter uma absolvição.


Draco devia seu futuro e o de sua família a Harry Potter. Lembrar-se disso definitivamente o fazia querer vomitar.


Levantando-se da cama, ele saiu para distrair a cabeça.


 


Chegou a um pub trouxa não muito longe da entrada principal do ministério. Pedir algumas doses de uísque ao barman careca após as longas sessões no tribunal – às vezes antes – já havia se tornado habitual a ele.


-“Saindo de mais uma sessão?”


-“Não, o tribunal está em recesso. Sem gelo, por favor.”


O barman serviu a dose. Draco riu por dentro de como aquele desconhecido sabia quase tudo sobre seu processo legal (à exceção dos detalhes que se referiam expressamente ao mundo bruxo, é claro), mas um não sabia o nome do outro.


Àquela tarde, porém, Draco não estava para conversa. Bebeu calado, cozinhando os pensamentos no fogo lento de sua amargura.


Após algumas doses, porém, viu-se falando sozinho.


-“Aquele maldito Potter! Não pode perder uma oportunidade de me humilhar!”


Bateu o copo no balcão, pedindo mais uma dose. O barman encarou-o, Draco sustentou o olhar.


-“Está bem, mas é a última.” – Disse o homem barrigudo à sua frente.


Draco riu. Conhecia as ameaças do careca, e bem sabia que ele sempre servia duas ou três “últimas doses” a cada cliente. Bebeu o puro malte de um gole só.


-“Se acha tão superior, o bonzinho Potter!” – Cuspiu ele, a ninguém em particular. – “Acha que se não conseguir me mandar para a prisão agora poderá me cobrar alguma coisa depois, mas não! Não de um Malfoy!”


Os outros poucos clientes do pub não lhe davam mais atenção do que Barman. O silêncio, contudo, parecia encorajá-lo.


-“Eu ainda vou pegá-lo. Pegá-lo e fazê-lo pagar pelo que me fez!”


-“Hei, devagar aí!” – O barman decidiu parar de fingir que não o ouvia. – “Pela minha experiência, quando as ameaças começam significa que é hora de ir para casa.”


-“Eu quero minha última dose!”


-“Já a teve.” – O homem contornou o balcão, pegou Draco pelo braço e o conduziu até a porta.


-“Me larga!” – Apesar dos protestos, não resistia com muita força. E nem poderia, já que o outro era mais alto e pelo menos dez quilos mais pesado.  – “Não pode me expulsar!”


 -“Espere para ver! Vá para casa, rapaz, é o melhor que pode fazer.”


Draco viu-se na rua, abraçado a seu casaco. Leves flocos de neve começavam a cair, dançando no ar da noite. Ele apertou o estômago com a mão. Não podia vomitar.


 


 


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