Confusos sentimentos



A novidade que corria por toda Hogwarts agora como fogo espontâneo era de que Harry Potter e Gina Weasley namoravam. Harry sabia que a notícia tivera mais impacto desta vez porque todos já o tinham visto com Hermione.
- Que houve, Potter? - gritou Pansy, quando ele ia passando com Gina a caminho do treino. - Cansou daqueles dentões?
O garoto fingiu não ouvir. E fingiu não notar também os milhares de olhares curiosos, zombadores e de censura que lhe lançaram até o campo de quadribol. Não ligava ser rotulado como traidor, uma vez que Hermione conseguira ser uma sem o menor esforço.
- Vocês - berrou Harry -, venham até aqui! Precisamos treinar os novos artilheiros!
Harry viu Dino Thomas lançar-lhe um olhar de puro rancor, o que fez com que ele acrescentasse:
- Muito bem, como sei que alguns pretendem desistir do time por pura imaturidade, eu digo que a artilharia está precisando de voluntários.
Harry montou sua firebolt e deu impulso no chão, levantando-se no ar, leve como uma pena.
E eles treinaram. Rony defendia muito bem agora. Max, que se inscrevera, estava se ajustando muito bem para um primeiro treino. Gina também treinava, e todos ficaram surpresos de ver que ela não era só uma boa apanhadora, mas uma boa artilheira também. James e Oliver, dois gêmeos que se inscreveram como batedores, lembravam muito Fred e Jorge, mas ainda não tinham o mesmo nível dos ruivos.
- Muito bem! Para cá agora! - gritou Harry, sobrevoando uma das balizas, com o pequeno e alado pomo de ouro seguro na mão direita.
Mas, distraindo-se completamente do treino, Harry se pôs a observar uma figura solitária na janela da torre da Grifinória. A garota de cabelos castanhos e cheios que sempre o abalava de uma forma ou de outra...
- HARRY!
Ele se virou a tempo de ver um balaço que vinha com uma velocidade incrível em sua direção. Mudou rapidamente e inconscientemente o rumo da vassoura, apontando-a para o céu, em direção à torre da Grifinória. Subiu como uma bala, o balaço logo atrás, ameaçando o derrubar. Não podia parar, mas se não o fizesse, sofreria uma colisão, enquanto que se parasse seria abatido pelo balaço. Hermione saiu correndo da janela. Parou, mas o balaço não, e, batendo na traseira da vassoura, fez Harry voar janela adentro da torre, com vassoura e tudo.
O garoto, mal conseguindo respirar direito, se viu de cara no chão, percebendo que caíra dentro do dormitório feminino.
- Entrando pela janela, Romeu? - zombou Hermione, embora estendendo a mão para que ele a segurasse.
- Ah, não, Julieta... - ironizou ele, passando a mão pelas costas. - Eu não entrei, fui lançado. Sabe a diferença? Ai!
- Engraçadinho - disse Hermione. - Se você não estivesse tão ocupado olhando para a janela, notaria que estava pedindo que atirassem um balaço em você. Sabe, quando você disse "para cá agora", acho que foi assim que os seus companheiros entenderam. Mas eu não sei...Você nunca soube se expressar como devia, se é que me entende...
Harry retrucou, zangado, e querendo também não deixar claro que ele a observava durante o treino (embora o fizesse):
- Não! Quando eu disse "para cá agora", eu quis dizer que eles deveriam ir para o MEU lado do campo, e não lançar um balaço amalucado em minha direção! - e segurou o tornozelo, caindo sentado.
- Está tudo bem? - perguntou ela, desconfiada.
- Estou ótimo - retrucou ele, com violência, pondo-se de pé com dificuldade. Era óbvio que não estava.
Ele viu Rony lá embaixo, acenando.
- Tudo bem aí, Harry? - perguntou o amigo.
- Ah, lógico! - ironizou em resposta. - Bom, eu atravessei uma janela, acho que quebrei a coluna e torci o tornozelo. Mas claro! Estou ótimo!
Ele se virou para sair do dormitório, mas o que viu foi Hermione, o encarando, emburrada, de braços cruzados.
- Que foi?
- Você é tão grosso - disse ela friamente. - Eles só estão preocupados com você, e você vem e fala desse jeito com eles, tão estúpido...
- Ah, claro - disse Harry. - Sabia que não demoraria muito para você começar. Vamos lá, eu me joguei na sua janela, não foi?
- Me diz uma coisa: - quis saber Hermione, alucinada, como se não o ouvisse - como é beijar a Gina?
O garoto achou aquela pergunta muito inconveniente para o momento, mas, seguindo o embalo de Hermione, devolveu:
- E por que você se importa? Estava lá, toda entretida com o Vitinho Krum. E como foi lá com ele? Não, nem me fala... Se foi nojento até para quem estava vendo, imagino para você...
- Nojento?Verdade? - perguntou Hermione, vermelha. - Você já tentou beijar um tal de Harry Potter?
Harry, explodindo, se dirigiu, mancando, à saída do dormitório feminino, mas parou, e respondeu, aos berros:
- Não, mas ele... Quero dizer, eu, não saio por aí beijando todo o mundo e ferindo o sentimento das pessoas!
- EU NÃO FAÇO ISSO! - berrou Hermione. - EU NÃO BEIJEI O KRUM, ELE ME BEIJOU! SE ESTIVER ME CHAMANDO DE GALINHA, EU...
- Você não beijou o Vítor? - perguntou Harry, desconfiado, embora muito mais calmo.
- É CLARO QUE N... Quero dizer, claro que não - acrescentou ela, envergonhada. - Você que interpretou mal a cena...
Harry olhou para o rosto da garota. Não encontrou o que dizer, embora mil palavras passassem voando por sobre sua cabeça agora. Pensou em Gina. Pensou em Hermione, ali, na sua frente, aparentemente decidida a lembrar-lhe os momentos que passaram juntos ou os momentos que poderiam passar... Mas isso não daria em nada, uma vez que agora Harry tinha Gina, e, Hermione, por sua vez, tinha Vítor.
Porque a vida é tão confusa? pensou, descendo as escadas , com a vassoura no ombro. Só então percebeu que não conseguia andar direito.
Hermione pelo visto também percebera isso, porque se levantou e foi até ele.
- Se você quiser... - começou, desajeitada, oferecendo o ombro para que Harry se apoiasse. - Eu posso te ajudar a descer as escadas.
Harry assentiu com a cabeça. Já estava na hora, pensou.
- Sabe, Hermione - começou ele enquanto desciam as escadas -, eu acho meio infantil a gente ficar brigando desse jeito.
- Acha? - ironizou ela. - Que eu saiba foi você quem começou quando beijou a Gina.
- Se isso fizer alguma diferença, eu também não beijei a Gina - disse ele, tentando manter o pouco de calma que lhe restava. - Você estava lá, viu como aconteceu.
- Eu não quero discutir isso agora - disse ela, impaciente, aumentando a velocidade da caminhada.
- Está bem - concordou Harry, virando-se para encará-la, ficando a centímetros de seu rosto; nenhum dos dois pareceu se incomodar. - É pedir muito a gente parar de ficar se xingando?
- No momento sim - disse ela, friamente.
Os dois chegaram ao campo de quadribol pouco depois. Hermione pareceu demasiadamente incomodada com Gina e o resto da equipe, quando estes rodeavam o capitão e deixaram-na ali, como parte da decoração.
- Posso saber qual foi o engraçadinho que lançou aquele balaço na minha direção? - perguntou Harry.
- Harry? - falou Gina, preocupada, abraçando o namorado. - Você está bem? Se machucou?
- Tirando o fato de que fui perseguido por um balaço e entrei voando por uma janela... Sim, estou bem.
- Harry, foi mal, cara - disse Rony, que vinha correndo ao seu encontro. - Não consegui segurar o bicho... Bem, mas suponho que o treino vai muito bem.
- É, suponho que sim - confirmou, dando um beijo em Gina. - Muito bem, podem descansar. Eu preciso ir até a ala hospitalar.
Ele viu Hermione encostar-se num canto abaixo da arquibancada. Perguntou em seu pensamento se ela o esperava.
- Eu vou com você, querido - murmurou Gina, apoiando o garoto em si mesma.
- Não, Gina. Pode ir - disse ele. - O treino foi exaustivo, você merece um tempo para descansar. Eu posso ir sozinho.
- Está bem, então - murmurou ela dando um beijo em Harry e voltando para os vestiários com a vassoura no ombro.
Harry saiu do campo do jeito que seu tornozelo permitiu. Os olhos de Hermione ainda o observavam, mas ele não deu atenção. Sentou-se à beira do lago, esquecendo-se completamente de ir à ala hospitalar. Quando o céu já estava cravejando-se de estrelas, Harry sentiu uma mão quente e de toque incrivelmente leve segurar-lhe o ombro por trás.
- O que foi, Hermione? - perguntou sem se virar.
- Como sabia que era eu? - disse Hermione lentamente; Harry virou-se para ela, sorrindo de lado. - Estão chamando você lá dentro.
- Ah, esse toque é inesquecível - Hermione sentiu o rosto esquentar. - Obrigado por me avisar - disse, um tanto quanto encabulado. - Pode me dar uma mão aqui?
Ela estendeu a mão para ele e os dois caminharam em direção ao castelo.
- Harry... - começou ela, sem jeito.
- Sim?
- Você não... Não gosta da Gina, gosta?
Harry ergueu as sobrancelhas.
- Por que está me perguntando isso? Eu não... Ah, quem se importa? - Gaguejou ele, envergonhado. - Quem está me chamando?
- Dumbledore - respondeu ela, parecendo desanimada com a resposta do garoto. - Voltou agora a pouco e me pediu que levasse você até a sala dele, já que você não consegue dar um passo sem cair de cara no chão.
- Muito engraçado - ironizou ele. - Mas o que ele quer comigo?
- Eu não sou legilimens - respondeu ela no mesmo tom. - E tudo que ele me disse foi: "srta. Granger vá chamar o Harry. Talvez ele não possa caminhar bem, então o traga até aqui. A senha é sapo de chocolate. Não demore, por favor, o que tenho para dizer a ele é urgente".
Os dois chegaram nas gárgulas de pedra pouco depois. Harry murmurou a senha e começou a subir as escadas. Hermione parou no pé da escada e cruzou os braços. Harry virou-se para encará-la.
- Vai ficar aí?
- Vou. É assunto de vocês dois, sabe... É melhor eu... Ir andando.
Harry acenou e abriu a pesada porta do escritório.
Ela tem muito mais a ver com isso do que imagina, pensou, um pouco triste.
- Boa noite, Harry - cumprimentou Dumbledore, virando-se para encará-lo. - Sente-se, por favor.
Harry obedeceu, não conseguindo esconder a excitação quando perguntou:
- E então? O que o senhor quer falar comigo? Descobriu alguma coisa?
- Acalme-se, meu garoto - respondeu ele, paternal. - Tudo a seu tempo. Primeiro iremos rever questões fundamentais. Tem praticado oclumência? - Harry fez que sim. - Ótimo. Teve mais algum sonho com a srta. Granger?
- Sim - respondeu num sussurro rouco, embaraçado. - Mas ela não foi torturada e nem capturada, nem nada parecido...
- Ah, claro - disse Dumbledore, com um quê de diversão quase implícito. - Você tem acompanhado as notícias, eu suponho.
- Sim. Mas o que aconteceu...?
- Fique calmo, Harry. Lembra-se da aparição de Rabicho na Floreios e Borrões? - Harry fez que sim. - Na época eu pensei que seria algo banal. Mas recentemente eu tive acesso a algumas informações que serão valiosas para as nossas "investigações".
- O senhor descobriu o que ele fazia lá? - arriscou Harry.
- Por assim dizer - respondeu Dumbledore. - Eu descobri o conteúdo do livro que ele pegou.
- Ele pegou um livro? - disse Harry de repente. - E daí? Se fosse de magia negra não estaria na Travessa do Tranco... estaria?
- Não era bem magia negra, Harry - ele respirou fundo. - Era a descrição daquele ritual sobre o qual falamos quando fomos ao Japão.
- O da invencibilidade? - disse o garoto, sem entender. - Aquele que o Sirius disse?
- Exato - respondeu.
- Como é que o senhor tem certeza?
- Ainda é cedo para maiores detalhes. Só o que você precisa saber é que tudo indica que é isso mesmo que Rabicho procurava - respondeu, misterioso. - Mas eu posso garantir que estou trabalhando para que você possa... Harry? Você pode parar de pensar na srta. Granger e me dar atenção por um instante?
Harry, que como dissera o diretor, pensava na mesmíssima garota de cabelos castanhos e cheios de sempre, levantou a cabeça, assustado.
- O quê? - disse Harry, esvaindo-se do devaneio de repente e se dando conta do que o diretor dizia. - Eu não estava... Ah, me desculpe, senhor, eu sinto muito.
- Não precisa se desculpar - cortou Dumbledore, dando um tapinha amistoso nas costas de Harry. - Não é exatamente a mim que você deve pedir desculpas.
- Sim, eu sei - disse ele, cabisbaixo.
- Lembre-se, Harry, o perdão pode até ser a maior das virtudes para alguns, mas é superada pela capacidade de admitir um erro - entoou ele, encarando Harry nos olhos. Sabia bem do que ele estava falando. - Sabe, às vezes nem é preciso voltar no tempo para mudar o passado.
Harry abaixou a cabeça.
- Eu estou perdendo tempo - disse ele, num impulso. - Se tudo que eu estiver pensando...
- Quanto a isso não se preocupe - interrompeu o diretor mais uma vez. - A única profecia que deve nos preocupar, ou melhor, me preocupar, é a que você destruiu no Departamento de Mistérios no ano passado.
- Preocupar o senhor? - repetiu Harry.
- É, Harry, preocupar a mim - disse Dumbledore com um quê de impaciência na voz. - Por hoje é só. Pode ir.
- Por hoje? - repetiu ele, confuso. - O senhor vai mandar me chamar quando descobrir alguma coisa, não vai?
- Sim, Harry, é claro - respondeu o diretor, sereno. - E se você sonhar novamente com a srta. Granger conte a ela, e não a mim. E você sabe de que sonhos eu estou falando.
- Sim, senhor - disse Harry, fechando a porta com um sorriso zombeteiro.
- Em breve nós vamos partir para a ação que você está pensando - disse Dumbledore, de repente. Harry colocou a cabeça para dentro da sala. - Muito em breve sairemos em busca de respostas. Das suas respostas. Mas antes você deve resolver suas questões internas, se é que me entende. Não faça nem diga besteiras. As peças vão se encaixar naturalmente ao decorrer do tempo. Boa noite.
- Boa noite, senhor.
Harry foi caminhando devagar de volta ao salão comunal. Gina já deve estar dormindo à essa hora, pensou, esperançoso, lembrando do quão tarde Hermione costumava dormir. Por que ela resolveu se importar de uma hora para outra?, pensou ele, encarando os próprios pés. Ela voltou a falar normalmente comigo, quem sabe ela não está... Ah, não seja idiota, Harry.
Os corredores estavam absortos num silêncio modorrento. Talvez pudesse contar a Hermione o que o diretor lhe dissera. Ou talvez ela nem queira saber se ele morreria no dia seguinte ou não. Ela nem liga, concluiu confuso, olhando para os lados. Não faça nem diga besteiras, repetiu ele, num sussurro rouco. Questões internas... Mas no que ajudaria? Em tudo, percebeu quando pensou melhor. Notou então que alguém o observava. Empunhou a varinha e ficou esperando, andando devagar em direção à torre da Grifinória. Quando chegou na frente do quadro da Mulher Gorda, sentiu uma mão segurá-lo pelo ombro esquerdo, uma mão gelada e firme. Ele virou-se automaticamente para ver de quem se tratava.
Deparou-se com um rapaz que aparentava ter seus vinte anos, que possuía uma expressão dura no rosto. E que quando falava tinha um sotaque búlgaro forte, mas no momento estava calado. Harry levantou os olhos para o estrangeiro, sem sorrir e nem nada, já que ele permanecia sério. Ficaram se medindo por vários minutos até que o rapaz resolveu falar.
- Podemos conversar, Potter? - perguntou Vítor Krum, lentamente.

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