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Eu passei o dia inteiro pensando no bilhete e na resposta que eu ia dar. Eu nem estudei. Conversei com a minha mãe, ela disse que eu tinha que tomar essa decisão sozinha. Justo nas horas que eu mais preciso de ajuda, ela deixa a bomba na minha mão.


 


Indignada pela falta de decisão da minha mãe (e a minha também), eu fui pra casa do Harry. Mas eu fui de mala e cuia. Estava com saudades dos meus tios, e podia aproveitar pra pedir ajuda pro meu melhor amigo.


 


Meu pai me levou até lá de carro. Eu toquei a campainha e o Thiago, pai do Harry e meu tio, atendeu.


 


--Oi tio. –eu o abracei. –Cadê a tia?


 


--Provavelmente ela está no banheiro vomitando pela décima vez só hoje.


 


Eu fiz uma cara de “nojo-preocupado”.


 


--O que ela tem?


 


A essa altura já estávamos na sala.


 


--Disse que comeu peixe e ficou assim.


 


Um grito bizarro veio do banheiro. Thiago me olhou e correu pra lá. Eu torci para que tudo estivesse bem com a  minha tia, e subi pro quarto do Harry.


 


Ele estava no computador.


 


--Ei, cabeção. –Ele me olhou – Cadê seus óculos?


 


Harry usava óculos desde pequeno, assim como seu pai. Os dois tinham miopia, e os óculos eram idênticos: redondos e pretos. Aliás, Harry e Thiago eram idênticos, exceto por uma cicatriz curiosa que o mais novo tinha na testa, e adquirira num acidente de carro com seus tios. Ele foi o único que sobreviveu.


 


--Ah, tirei um pouco pra descansar. Você não gosta dos meus lindos olhos verdes?


 


Harry veio na minha direção, envesgando os olhos.


 


--Sai pra lá! –eu ri quando ele me abraçou.


 


O abraço do Harry era bom, mas não era igual ao do Rony. Só que este durou pouco, porque uma mensagem de voz veio pelo computador dele.


 


--Larga ele, Mione, ou eu conto pro Ron!


 


Meu primo engoliu em seco quando viu a minha expressão, que deve ter sido apavorante.


 


--Você contou pra ela!


 


Fui pra cima dele, enchendo-o de tapas, até a outra mensagem:


 


--Não danifique ele, Granger, ou um certo ruivo vai pro hospital hoje...


 


Eu fui até a webcam que estava ligada e mostrei a língua pra ela, que retribuiu.


 


Depois disso eu fiz o Harry desligar a bendita câmera e o computador, pra poder conversar direito comigo. Mas também, poxa, eu estou passando por um momento mega complicado, ele tem que me dar atenção!


 


--E então, Mione. O que você pretende responder? Sou todo ouvidos.


 


Estávamos sentados, depois do jantar, no quarto do Harry. Ele adiou essa bendita conversa até o jantar. Não sei se ele queria me dar tempo pra pensar, ou não queria conversar comigo sobre aquilo. Acho que a primeira opção combina mais com ele.


 


--O que você acha que eu devo fazer?


 


Eu vi que ele estava com um ar de riso. Me estressei, mas ao invés de brigar com ele, eu abaixei a cabeça.


 


--Ei! –Ele levantou meu rosto. –Para com isso. O que você está sentindo?


 


Eu respirei fundo, tentando entender o que eu estava sentindo.


 


--Estou confusa. É o que eu mais quero, você sabe disso. Mas eu estou com medo. Eu prezo a nossa amizade mais do que tudo.


 


--Acho que a amizade não vai ser a mesma depois do pedido dele, que foi bem direto, aliás.


 


Eu engoli em seco, tentando segurar o choro. Droga, o Rony é o meu melhor amigo, e eu não sabia se valia a pena arriscar essa amizade.


 


--O que você faria no meu lugar? –Eu perguntei.


 


--Diria que não.


 


Ele respondeu isso tão espontaneamente que eu quis saber o porquê.


 


--Mione, ele é homem, pombas! Eu jamais aceitaria ficar com ele.


 


Depois dessa eu tive que respirar fundo três vezes. Eu tava falando sério!


 


Ficamos alguns minutos em silencio, refletindo. Até que a resposta veio na minha cabeça.


 


--Mande ele vir falar comigo. Sem bilhetes ou Harry.


 


Afinal, eu tinha que saber até onde ele arriscaria a nossa amizade, se a causa realmente valia a pena.



 



 


Devo confessar que no dia seguinte eu acordei demasiadamente nervosa. Na verdade, eu nem consegui dormir direito.


 


Depois de me arrumar, eu desci até a cozinha. A família Potter já estava me esperando na mesa do café, todos sorriam abertamente, pareciam ter recebido uma notícia muito feliz.


 


--Bom dia! –Eu disse me sentando.


 


Todos responderam sem tirar o bendito sorriso do rosto. Eu estranhei e tive que perguntar:


 


--Aconteceu alguma cois...?


 


Mas não pude terminar, o Thiago me interrompeu:


 


--Você vai ganhar um primo!


 


--Ou prima. –Lílian acrescentou.


 


Tá, meu queixo caiu. Eles estavam meio velhinhos pra isso, não? Se bem que trinta e poucos nem é tãão velho assim.


 


Mas eu fiquei muito feliz. De verdade! Eu sempre soube que a tia Lílian queria mais um filho. Me levantei e os abracei, os dois ao mesmo tempo.


 


Depois eu pulei no Harry.


 


--Vai ganhar um irmãozinho, Potter!


 


Rimos juntos. Percebi que o Harry era, talvez, o mais feliz dali.


 


Bom, depois da ótima notícia, fomos pro colégio. Eu não queria esperar pelo Rony na esquina de casa, e o Harry respeitou a minha vontade. Ainda bem.


 


Quando chegamos na sala, Rony já estava sentado, fazendo uma lição de inglês às pressas. Eu dei bom dia pra ele, na maior cara de pau, e me sentei em sua frente. Quis passar a impressão de que não tinha visto o recado ainda, e acho que funcionou.


 


As três primeiras aulas passaram rápidas como duas lesmas apostando corrida. Tá, eu tenho que perder essa minha ironia. Mas que a aula passou devagar, passou.


 


Por fim, quando o sinal bateu, eu fui pra cantina comprar o meu costumeiro suco de laranja matinal. Me sentei com Neville, Luna, Gina e Fred e Jorge. Sim, eles ainda estudavam, estavam no ultimo ano. Quanto a Harry e Ronald? Sumiram.


 


Nos sentamos no chão mesmo, na grama tomando sol. Estava um pouco frio.


 


Nós estávamos conversando sobre a vinda de um novo Potter ao mundo, quando Harry e Ronald apareceram. Já devia ter passado mais da metade do intervalo.


 


--Oi gente. –Harry cumprimentou e se sentou do lado da Gi – Novidades?


 


--Você quem tem novidades. Está feliz com a vinda de um irmão? –Neville perguntou.


 


E eles começaram a conversar sobre isso, mas eu não pude participar da conversa, porque o Rony me disse assim:


 


--Mione, posso falar um minuto com você?


 


Eu respondi um “claro”, mas a minha voz estava muito tremida, e eu suspeito de que ele não tenha escutado. O ruivo me guiou pela mão até um lugar mais reservado, onde só tinha casais namorando. Esse ambiente me deixa um pouco desconfortável.


 


Eu me encostei na parede e ele ficou de frente pra mim. Nós dois estávamos nervosos, mas ele tinha um tom vermelho-chocante no rosto.


 


--Pode falar, Rony.


 


Ele engoliu em seco, mas olhou nos meus olhos quando disse:


 


--Mione, você leu o meu recado. –Não era uma pergunta – Você disse pro Harry que iria me responder se eu viesse falar com você pessoalmente. Então eu vim.


 


Tá, não era bem isso que eu esperava ouvir. Uma linda declaração e um beijo roubado não cairiam nada mal na situação. Como ele ficou quieto, eu falei:


 


--O que o levou a mandar aquele recado? Quero dizer, sempre fomos amigos.


 


--Você sabe que não somos bem o exemplo de amizade, Mione. Sempre brigávamos, e ainda brigamos. E, bom, já tem algum tempo que eu não te vejo somente como amiga.


 


Ele disse isso num fôlego só, mas quem ficou sem ar fui eu.


 


--Desde quando?


 


Eu tinha que saber isso.


 


--Acho que desde quando você começou a sentir isso por mim. Digo, acho que começou junto.


 


Cara, como é que ele podia afirmar uma coisa dessas?


 


--O quê? –Foi a única coisa que eu pude dizer.


 


--Hermione, me desculpe por ser tão sincero, mas eu percebi isso já faz algum tempo. Você não é muito... sutil.


 


Pasma era meu estado de espírito. Acho que ele ficou com vergonha quando viu que eu estava sem graça. Acho que eu estava bem corada, porque eu senti minha face ardendo.


 


O sinal tocou, mas nós ignoramos.


 


--Me desculpe, Hermione. Não queria te deixar com a mesma vergonha que eu estou sentindo nesse momento. Mas eu optei por ser sincero. Pelo tanto que eu te conheço, achei que fosse a melhor opção.


 


--Também achei que foi. –Respondi.


 


--Eu abri o meu coração, Mione. O que você tem a dizer?


 


Tá, ele me pegou agora. O que eu ia falar?


 


--Ron, eu não sei o que dizer. Foi tudo muito inesperado. Ainda não sei se vale arriscar a nossa amizade.


 


Eu sei que a amizade não ia ser a mesma, como Harry falou, mas eu tinha que ganhar tempo.


 


--Me prova que vale a pena, Rony. Me prove que é algo realmente sério.


 


Virei as costas e saí, ainda tinha uma aula.

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