Ano Novo Agitado



- Tiago! Acorda! – falei balançando o corpo dele, que durante minha explicação de Poções tombara a cabeça de lado e começara a roncar.


Ele abriu os olhos, sonolento.


- O que foi? – balbuciou.


- Acorda. – falei, virando impaciente a página. – Capítulo 13. O líquido de uma Poção do Esquecimento é formado por duas gotas de...


Fui interrompida por Tiago, que soltou um alto e longo bocejo. Suspirei.


- Eu acho que não vou te explicar nada. – eu disse, irritada.


- Não, não. Continue, Lílian. – ele disse, deitando um pouco no braço da poltrona.


- Eu não estou aqui pra contar historinhas de ninar.


- É que... eu estou com sono... – ele disse, a voz fraca.


- Vai dormir então. Amanhã eu te explico.


Ele não respondeu. Ele decididamente dormira.


- Sirius, se eu fosse você levaria seu amigo pra cama. – falei pra ele, que tava a um canto debruçado sobre os deveres junto com Rabicho.


Notei que ele tinha as mesmas olheiras que Tiago e estava igualmente sonolento, assim como Rabicho.


Sirius respondeu com um aceno de cabeça seguido por um alto bocejo.


- O que aconteceu com vocês?


- Sabe que dia é hoje, Lílian? – perguntou uma voz as minhas costas. Aluado vinha se juntando a gente.


- Trinta de dezembro. – respondi prontamente, ao mesmo tempo em que tudo ficava claro. – Ah, esses dias é...


- Lua cheia. – ele completou com a voz baixa, sentando em uma poltrona ao lado de Sirius que parecia ter dormido também. – Eu não queria que eles ficassem desse jeito por minha causa, mas eles insistem em sair altas horas da noite comigo e então resulta nisso.


Rabicho agora encostara a cabeça em uma poltrona também e uma pequena baba caía pela sua boca.


- Os N.I.E.M's estão próximos e isso pode atrapalhar eles, entende. – ele disse desgostoso.


- Aluado, não fique assim. – eu disse, segurando sua mão. – Eles são seus amigos, e não existi prova maior do que isso. Eles se sentem bem fazendo isso. E os N.I.E.M.'s nem estão tão próximos assim. Fique tranquilo, eles vão saber se virar.


O tempo todo ele olhava pra baixo, mas então um pequeno sorriso surgiu em seu rosto.


- Obrigado, Lílian.


- Agora é melhor nós irmos levar esses três lá pra cima. – eu disse. – Mas asseguro que é melhor você levar o Rabicho.


O banquete de Ano-Novo do dia seguinte foi igual aos outros. Sirius e Tiago providenciaram comidas vindas da cozinha para a Sala Comunal mais tarde. Foi uma festa até altas horas para comemorar a chegada do ano de 1978.


- Feliz Ano-Novo, Lílian. – Tiago falou, me beijando. – Mas agora já tenho que ir, sabe como é...


- Tudo bem, divirtam-se.


Ele, Rabicho e Sirius saíram pelo buraco do retrato, mas antes que ele pudesse se fechar jurei ter visto um vulto passar rápido atrás deles.


- Lílian, aonde você vai? – perguntou Maria.


- Vou ver uma coisa.


Passei por entre a multidão de alunos amontoados e empurrei o retrato.


- Sev! – gritei, mas se ele me ouviu ou não nunca se sabe, pois ele tinha acabado de virar o corredor. Eu o segui.


Pra minha sorte ninguém estava presente nos corredores nestas horas. Supus que estivesse cada um comemorando o Ano-Novo em algum lugar.


Quando cheguei ao Saguão de Entrada as portas em direção aos jardins estavam já entreabertas.


O vento estava forte do lado de fora do castelo, o céu estava limpo e a noite estava clara, iluminada pela grande lua. Ainda havia grandes quantidades de neve pelo chão.


Com certo arrepio ouvi um uivo alto e distante e imaginei que seria de Aluado. A lua refletia sobre Sev, seus cabelos longos e negros inconfundíveis.


Ele corria em direção ao Salgueiro Lutador. Eu corri atrás dele desembestada, com milhares de coisas passando em minha cabeça. E se Sev se machucasse? E se Sev machucassem os outros? E se ele fizesse algum mal contra Tiago?


- Sev! – gritei mais alto. Ele não me ouvira.


Já estávamos perto o bastante da árvore para sermos atingidos, porém a árvore estava imóvel.


- SEV, NÃO! – berrei, quando pro meu desespero ele sumiu por dentro das raízes do Salgueiro.


Fiquei atordoada, pensando em o que estaria acontecendo lá dentro e rapidamente tomei a decisão de me esgueirar pelo buraco também.


Meio hesitante, com medo de a árvore voltar a se mexer eu fui em direção a entrada do buraco. Me preparei para a dor caso o Salgueiro viesse a atacar, mas nada aconteceu.


Quando cheguei, porém, só via o escuro.


- Lumus. – murmurei. A varinha acendeu e revelou um túnel estreito, onde facilmente eu passaria.


Escutei um rosnado. Fui atirada para trás e bati a cabeça contra a grama coberta de neve, que por sorte era macia.


Na minha frente encontrava-se um cão grande e preto, seus olhos também negros brilhavam a luz do luar.


- Sirius? – perguntei.


Antes que eu pudesse fazer alguma coisa aconteceu novamente um uivo distante e em seguida um grande barulho vindo de dentro do buraco.


Sirius rosnou quando eu corri em direção ao buraco; eu não lhe dei atenção, mais preocupada com o que estaria acontecendo.


Houve um estampido e um clarão branco novamente me jogou pra trás.


Eu me levantei a ponto de ver Sev emergir do buraco, a varinha erguida seguido por um grande cervo marrom.


E num piscar de olhos Tiago estava parado ali, com sua varinha erguida e seu rosto enfurecido.


- Seu desgraçado! – gritou Tiago. – O que você fez com ele?


- Eu dei o que ele merecia! – grasnou Sev.


- Não! – gritei e corri, meio manca, até eles. Senti minha perna arder, com certeza eu me cortara de alguma forma.


- Lílian? – perguntaram ao mesmo tempo Sev e Tiago, pasmos.


- Parem com isso! – ofeguei.


- O que você está fazendo aqui, Lílian? – perguntou Tiago estupefato.


- Parem. – repeti.


- Você a trouxe com você seu verme? – gritou Tiago, apontando a varinha pra Sev, que o imitou.


- Eu não pedi pra ela vir!


- Fica calmo, Pontas. – falou Sirius, que também se transformara. – Lílian veio aqui depois dele.


- Mas nada justifica o fato de ele vir aqui espionar!


- Isso é verdade. – concordou Sirius, divertido, e também erguendo a varinha para Sev, que estreitou os olhos.


- Dois contra um? Você é covarde a ponto de ter que chamar um amiguinho seu pra te ajudar também Potter? Realmente, a fama não é tudo...


- Eu não sou covarde porque felizmente eu não sou da sua família, Ranhoso. – disse Tiago, enfurecido. – Almofadinhas, eu cuido dele...


Sev riu desdenhoso.


- Você? – ele riu novamente. – Você não é nada. Você não passa de um garoto mimado qualquer...


Sev não terminou a frase. Novamente vários raios dispararam para todos os lugares.


Sirius substituiu Maria na função de me afastar. Eu olhava a cena novamente aterrorizada.


Feitiços de todos os tipos iam em todas as direções, clarões enchiam o céu.


Um feitiço azul atingiu Tiago e ele tombou.


- Não! – me dirigi a ele, mas Sirius me segurou.


Tiago já estava de pé cambaleante novamente. Sev, sem piedade, aproveitou o momento para atacá-lo outra vez.


Me soltei do aperto de Sirius e me joguei para empurrar Tiago de volta no chão, sem sorte. O feitiço de Sev me atingira no peito e senti meu corpo ceder.


Eu sabia que não havia desmaiado, apesar de estar com os olhos fechados. Mas uma dor alucinante queimava no peito e eu jurava sentir algo molhado descer pelo rosto.


- NÃO! – berrou Tiago; a voz dele estava muito perto.


- Seu...! – Sirius falou um longo palavrão. – Olhe o que você fez! Você queria o quê? Matar ela? Já não basta o que fez com Aluado seu desgraçado!


Senti certo medo. O que acontecera com Aluado?


- Lílian, fala comigo. – dizia Tiago, desesperado.


Eu tinha medo de que se eu fizesse outra coisa sem ser ficar parada a dor aumentasse.


- O que fez com ela? – tornava Sirius. – O que você fez? Fale!


Eu não conseguia dizer se Sev falara alguma coisa ou não; talvez ele perdera a fala.


- Lílian... – Tiago falava bem perto de mim agora, sua voz mais amargurada que nunca, ao mesmo tempo em que a dor aumentava. Estaria ele chorando?


- Que feitiço é esse? Fala um contra-feitiço! Acorde ela! Vamos! – gritava Sirius.


Escutei passos pela neve.


Eu senti a respiração assustada e trêmula de Sev perto de mim e em seguida sua voz murmurar palavras desconhecidas. Aos poucos eu sentia meu corpo voltar a normalidade e minha respiração ficar regular; a dor cessara.


Abri os olhos atordoada.


- Lílian. – suspirou aliviado Tiago, que me abraçou com tanta força que senti minhas costas estralarem.


- Estou bem. – falei com a voz fraca.


Sev estava parado ali, seu rosto o mesmo do ultimo duelo que tivera com Tiago. Seus olhos estavam arregalados.


- Eu vou acabar com a sua raça, Ranhoso... – rosnava Sirius com um som parecidíssimo com o seu rosnado de cachorro. Ele agarrou as vestes de Sev.


- Deixa ele em paz, Almofadinhas. – disse Tiago enfim se desfazendo do abraço. – Eu vou me vingar de você um dia, você verá. Só não é agora porque tenho que cuidar de Lílian...


Sirius largou Sev, com um olhar que mesclava raiva e desprezo.


- Vaza, Ranhoso. – ele falou, rosnando novamente.


Sev meio atordoado lançou um olhar em mim; eu apenas assenti.


Ele saiu correndo, a lua ainda iluminando sua figura.


- E o Aluado? – perguntei.


- Aquele desgraçado lançou um feitiço nele. Próprio pra lobisomem sabe. Rabicho está com ele lá dentro.


- Ele vai ficar bem?


- Espero que sim. – Tiago falou. – Almofadinhas, fique com eles, vou levar Lílian pra dentro.


Sirius se transformou rapidamente em um cachorro e sumiu pelo buraco do Salgueiro.


Antes que eu previsse, meu corpo já não estava mais no chão. Tiago me pegara no colo com facilidade.


- Eu sei andar. – falei, corada.


- Sua perna está machucada. – Tiago respondeu, ainda com a voz abalada.


Eu não respondi. Era apenas audível o som de seus pés na neve.


- Você não deveria ter feito isso Lílian. – ele disse com a voz seria. – Imagine o que poderia ter acontecido com você... eu nunca me perdoaria... eu...


- Mas eu estou bem, não estou? Isso que importa.


- Não. Poderia ter sido eu, não você.


Eu não respondi. Tínhamos chegado ao Saguão de Entrada.


- Vai me levar à Madame Pomfrey?


- Eu faria isso, mas vai complicar as coisas pra gente. – ele respondeu, me levando para dentro de uma sala vazia.


Ele me colocou gentilmente em uma mesa e começou a curar meus ferimentos, inclusive o da cabeça, que não sei como havia um grande corte.


- Tem certeza que está bem? – perguntou Tiago, me fitando.


- Sim. – falei, me pondo de pé, antes que ele me envolvesse em outro abraço.


- Nunca. – ele disse em meus cabelos. – Nunca mais faça isso.


- Tudo bem. – eu suspirei. – Vamos voltar, Maria deve estar louca me procurando.


Quando chegamos à sala comunal ainda tinha muitos alunos que aparentemente não notaram nossa presença e nem ausência.


- Lílian. – localizei Maria, com a mão no peito e suspirando, seguida por Dougie. – O que aconteceu?


- É uma longa historia. – adiantou-se Tiago. – É melhor voce ir dormir Lílian...


- É. – concordei. Eu estava realmente exausta.


- O que...?


- Depois Maria. – falei.


Ela nos lançou um olhar curioso, mas depois se afastou com Dougie.


- Você está bem então, né? – Tiago perguntou novamente, me fazendo revirar os olhos.


- Já disse que sim. Boa noite.


Fiquei na ponta dos pés pra beijá-lo e depois subi para o dormitório sem Maria perceber. Eu não estava com vontade de contar isso pra ninguém.


Só sei que assim que me deitei na cama, até mesmo sem vestir o pijama ou tirar as botas, eu tive uma noite sem sonhos.

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