Detenção



A chuva estrondosa caía ao redor do castelo na manhã seguinte.


A última aula do dia, Herbologia, fora cancelada por causa da tempestade, então eu e Maria tínhamos o tempo livre antes de sair pra cumprir nossas detenções.


- Isso é muito injusto! – disse Maria pela milésima vez, enquanto estávamos na sala comunal aproveitando para adiantar os deveres. – Nós duas nem fizemos nada e McGonagall nos dá detenção!


- Você até que poderia ser poupada, mas foi por minha causa que eles brigaram. – eu disse escrevendo o sétimo parágrafo da minha redação de Poções: Como o sangue de um erumpente é essencial na preparação de venenos?


- Você não pediu para eles brigarem, pediu? – ela disse irritada.


- Concordo com a Maria, Lílian. – falou Dougie, comendo um sapo de chocolate. – Isso não foi nada correto da parte da McGonagall.


Eles trocaram sorrisos. Ultimamente a relação deles estava tão boa que eu não tinha o que reclamar: eles viviam rindo, trocando olhares e como agora, sorrisos.


Passado um tempo Maria decidiu subir e tomar um banho antes da detenção.


- Dougie? – chamei ele, aproveitando a oportunidade.


Ele ergueu seus olhos do livro Defesa contra as Artes das Trevas: um manual completo de feitiços.


- O que? – ele perguntou.


- Você gosta de Maria, não é?


Ele abaixou a cabeça para voltar ao livro, mas eu tinha certeza que ele não estava lendo.


- Você também gosta. Somos amigos, não é?


Revirei os olhos.


- Você entendeu o que eu quis dizer.


Ele corou levemente e tentou disfarçar coçando sua barba recém-crescida.


- É... bem, eu... – ele gaguejou, sem graça. – É, acho que sim.


Eu sorri, feliz.


- Então porque não fica com ela?


Ele ficou totalmente escarlate agora.


- Eu não sei. – ele disse com a voz rouca. Ele pigarreou antes de voltar a falar. – Acho que não vai dar certo se eu tentar.


- Como pode saber se nunca tentou? – indaguei.


- Ela acabou de terminar com Kingston. – ele disse, e percebi que sua voz demonstrava raiva ao dizer aquele nome. – Não vou forçar ainda mais a barra dela.


- Não está forçando. Eu tenho certeza que ela gosta tanto de você quanto você gosta dela. – comentei, me levantando. – E se eu fosse você, não perdia mais tempo.


- O que quer dizer com isso?


- Bom, digamos que há muitos Kingstons por aí... – falei.


Sua expressão era ainda pensadora quando eu subi para o dormitório.






Faltavam cinco minutos para as oito quando eu e Maria descemos para a sala comunal, prontas para ir à detenção.


Potter já estava a nossa espera.


- Olá. – cumprimentou ele, sorrindo como sempre.


- Oi Tiago. – cumprimentou Maria.


- Olá Potter. – falei.


- Pensei que já tinha parado com essa história de Potter, Lílian. – comentou Maria quando íamos em direção a sala de McGonagall.


- É, também acho. – comentou Potter.


- Não sei por que vocês insistem em se incomodar se eu falo Potter ou não.


- Você não me chama de MacDonald, chama? – disse Maria.


- Por que você é minha amiga há mais tempo.


- Mas você conhece Potter tanto tempo quanto eu. – reclamou Maria enquanto desviávamos dos gizes que Pirraça tentava nos acertar.


- Mas sou sua amiga há mais tempo.


- Então quando é que você vai me chamar de Tiago? – Potter perguntou.


- Daqui a uns dois anos, talvez...


Ele e Maria riram.


Chegamos à porta da sala e batemos.


McGonagall já estava lá e (me deu um aperto no peito) Severo.


- Boa noite. – ela disse, indicando para que sentássemos.


Havia no centro da sala quatro carteiras e cadeiras, uma já ocupada por Severo.


- Boa noite. – a cumprimentamos, desanimados.


Notei que Potter fechou o punho com força quando olhou pra Severo. Eu e Maria fizemos questão de sentarmos longe dos dois.


- Vocês vão copiar pra mim o capítulo 3 do livro Os detalhes da Transfiguração. – ela fez um gesto com a varinha e materializaram-se quatro livros de capas grossas e antigas sobre cada mesa. – Caso terminem, podem começar o capítulo 4.


Abri o livro e com certo desânimo notei que cada capítulo ocupava dez folhas com letras miúdas do tamanho de formigas. Um gemido as minhas costas indicava que Maria estava tão desanimada quanto eu.


O tempo passava silenciosamente exceto pelo barulho das penas arranhando o pergaminho e o barulho da chuva martelando no telhado. Severo continuava a escrever, sem ousar olhar em outra direção se não o pergaminho a sua frente.


Finalmente, depois de duas horas em que eu apenas tinha passado da metade do capítulo, McGonagall se levantou.


- Acho que por hoje está bom. – disse ela consultando seu relógio. – Amanhã, no mesmo horário.


Entregamos o pergaminho a ela e saímos da sala sem fazer outro comentário.


Severo olhou de relance para mim, com o olhar triste e constrangido, e eu rapidamente abaixei a cabeça.


- Acho que minha mão nunca mais será a mesma. – comentou Maria massageando o pulso enquanto eu via Severo se afastar. – Eu nem cheguei à terceira página se quer saber.


- Eu estava no começo do quarto. Mas eu mesmo não consegui entender uma só palavra do que eu escrevi. – comentou Potter.


- Se sua letra for parecida com seu quarto a professora McGonagall estará mesmo encrencada. – falei, brincando.


Maria riu e Potter também, apesar de ter ficado vermelho.


Estávamos passando pela porta do Salão Principal, agora fechada, quando Dougie apareceu no fim do corredor, andando em nossa direção. Sua expressão era séria e decidida.


Estiquei meu braço para fazer Potter parar de caminhar. Ele olhou pra mim com a cara intrigada e eu apenas balancei a cabeça.


Maria, que não percebera que eu e Potter tínhamos parado, continuava a andar.


- O que foi? – ela perguntou.


Dougie andava mais rápido agora. Eles estavam numa distância considerável quando Maria abriu a boca para perguntar.


- O que aconteceu, Dou...?


Dougie a silenciou puxando ela para um beijo, agarrando-a pela cintura. Potter exclamou baixinho ao meu lado.


Maria largou sua mochila no chão para poder o abraçar melhor e colocar seus braços em seu pescoço.


Talvez estivessem esquecido da presença minha e de Potter ali, pois eles começavam a se agarrar mais voraz e rapidamente ainda.


- Vamos logo. – eu sussurrei para Potter, que tinha a expressão surpresa e divertida.


Passamos de fininho por eles, não tentando atrapalhar o clima, mas não que isso fosse preciso. Eles pareciam ter esquecido onde estavam e o que faziam.


Quando viramos o corredor, suas posições ainda não tinham se alterado.


- Uau! – murmurou Potter.


- Já estava na hora. – comentei, rindo.


- Por que ele fez isso justo agora? – ele perguntou, intrigado.


- Digamos que dei um empurrãozinho hoje.


Ele também riu.


- Virou cupido agora, é?


- Eu não aguentava mais ver os dois separados, sendo que eles se gostam tanto. – eu disse, chegando a Mulher Gorda.


Entramos na sala comunal, ainda ocupada por alunos.


- Acho que quem se gosta não deve ficar separado. – falou Potter, me fitando. De novo tive aquela sensação de que ele olhava bem nos meus olhos.


- Por que diz isso? - perguntei, intrigada.


- Porque é isso que eu acho, você não? - ele disse, chegando mais perto.


Eu dei um passo para trás.


- Er... – comecei sem graça. – Acho que vou me deitar. Boa noite então, Potter.


- Boa noite, Lílian. – ele falou.


Subi meio atordoada as escadas em espiral, ainda absorvendo aquelas palavras e tentando entender porque minhas pernas tremiam tanto.

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