O Colar



O dia anterior às férias de natal amanheceu com mais neve do que nunca. Muitos alunos aproveitaram o dia para brincar de guerra de bola de neve ou então ficar trancados na sala comunal, fazendo os deveres à luz da lareira.


Havia uma agitação entre todos; muitos estavam ansiosos para ir pra casa e visitar os parentes. Maria e Dougie iriam passar o natal em Hogwarts; eles até me chamaram para ficar também, mas nos últimos dias o que eu mais queria era ficar um pouco longe da escola.


Percebi que Tiago havia se afastado um pouco de Laura. Ele voltara à andar com seus amigos, mas mesmo assim me recusei a conversar com ele, não que ele tivesse tentado: muitas vezes ele usara o mesmo método de Sev para falar comigo; ele me esperava sempre em um andar deserto enquanto eu patrulhava os corredores, mas eu sempre dava um jeito de despistá-lo.


Finalmente os professores sossegaram um pouco nesses últimos dias de aula. Quero dizer, sossegaram em partes, pois tem centenas de deveres para fazer durantes as férias.


Eu já havia arrumado todas minhas coisas. Guardei tudo o que eu precisaria durante as férias dentro do malão e outras que eu não iria utilizar eu resolvi deixar no dormitório. Enquanto isso Maria continuava a insistir que eu ficasse:


- Por favor! – ela disse, implorante. – Você nunca passou um só dia de férias de natal aqui comigo!


- Você vai ficar com Dougie, Maria, não sei por que quer que eu fique. – respondi, jogando fora alguns pergaminhos velhos.


- Você poderia ficar com a gente só pra variar.


- E segurar vela? Nem pensar. – respondi, rindo.


- Você não precisa segurar vela. – ela falou, com a voz insegura. - Ainda por que... bem... o Tiago também vai ficar.


Fechei o malão com mais força que o necessário.


- Mais um motivo para eu ir. – eu disse irritada. – Além do mais eu já falei pra minha mãe que eu vou. Não tem como mudar de idéia em cima da hora.


- Ah, Lílian, por favor! – implorou ela.


- Eu já disse que não, Maria! Nada vai me convencer a ficar.


Ela deu um suspiro alto e profundo.


- Eu tenho um motivo pra você ficar.


- Ah, é? O quê? – perguntei sarcasticamente. – Não venha me dizer do Tiago outra vez ou...


- É do Tiago sim.


- Ah, então nem vou perder meu tempo ouvindo. – eu disse me dirigindo à porta, para o jantar. – Ele está namorando agora Maria, e isso é o bastante para você já ter parado com essa mania de falar para eu dar uma chance a ele!


- Pois é. É sobre isso que eu quero falar. – disse ela torcendo as mãos. – Ele não está namorando.


- Eles terminaram? – perguntei, tentando confirmar minhas suspeitas; um fiozinho de felicidade despontou de mim.


- Não, Lílian. – Maria falou chorosa. – Eles nunca começaram. Eu menti pra você.


- Sei.


- Sério, Lílian! – ela começou a andar de um lado pro outro do quarto. – Ele nunca namorou com a Laura! Eu aproveitei aquela oportunidade na sala comunal pra inventar essa mentirinha, porque voce estava morrendo de ciúmes dele!


Olhei pra ela incrédula.


- Mas você ia me contar antes mesmo de eu ver os dois juntos!


- Ah, eu ia contar outra coisa sobre ele. Eu ia te contar que ele ia passar o natal aqui. E que era pra você passar também, porque ele também nunca passou as férias aqui.


Eu continuava a fitar ela, atordoada.


- Porque fez isso?


- Pra você abrir os olhos! Pra você ver o tanto de tempo que está perdendo longe dele! Tanta coisa ele fez por você e você simplesmente joga tudo pela janela!


- Mas e a aproximação dele com a Laura?


- Ah, eles são só amigos acho. Parece que os pais deles e dela são muito chegados, não sei. E também Laura contou pra mim outro dia que estava saindo com Peter Holding.


- Você não deveria ter feito isso. – murmurei.


- Eu sei. Mas eu não resisti. – ela disse, sem graça. – Você me desculpa?


Eu suspirei e sentei na cama.


- Tudo bem. Mas...


- Mas o quê?


- Aconteceu uma coisa.


Contei a ela toda a discussão que eu tive com o Tiago e a maneira que eu gritei com ele. Depois disso tudo me senti constrangida e envergonhada. O que ele pensou de mim depois disso tudo?


- Meu Deus! – exclamou Maria. – E a culpa foi toda minha?


- Acho que vou pedir desculpas pra ele. – eu disse, me levantando, meio tremula.


Porém, eu não o encontrei nem na sala comunal e nem no Salão Principal. Fui à biblioteca e dei uma volta pelos corredores, mas não o vi em parte alguma.


Decidi voltar pra Torre da Grifinória; talvez a gente tivesse desencontrado e então eu poderia esperar por ele lá.


Quando eu estava subindo às escadarias pro segundo andar, uma voz me chamou.


- Oi, Lílian. – era Aluado. Fiquei feliz em vê-lo.


- Oi, Aluado! Tudo bom?


- Sim. E você?


- Também. – eu disse exasperada. – Olhe, você viu o Tiago por aí?


- Acho que ele foi ao corujal mandar uma carta para os pais dele. – ele respondeu.


- Ok, obrigada! – eu disse e saí correndo pelo corredor.


Quando subi as escadas, senti o frio bater no meu rosto e balançar meus cabelos. No meio de várias corujas, pretas, brancas e marrons, estava Tiago, de costas, olhando a paisagem.


- Oi. – falei, meio envergonhada.


Ele se virou e seu rosto mostrou surpresa.


- Lílian?


- É. Oi Tiago.


- Oi. – ele respondeu, me fitando, como se eu fosse começar a gritar de novo. Me senti péssima.


- Eu... – comecei buscando as palavras. – Eu vim te pedir desculpas.


- Quê?


- Vim pedir desculpas. Por eu ter gritado com você aquele dia.


Ele franziu a testa.


- Er... tudo bem. – ele falou, meio sem entender. – Mas que mal me pergunte, porque aquilo tudo?


- Não era um dos meus melhores dias. – expliquei, não tentando prolongar o assunto.


- Ah. – ele disse, sorrindo. – Você me assustou um pouco aquele dia.


Não pude deixar de rir.


- Eu me assustei um pouco comigo também. – respondi com sinceridade.


Eu me juntei a ele pra olhar o horizonte. As montanhas que rodeavam a escola estavam totalmente brancas.


- Vai passar o natal aonde? – perguntei, fingindo não saber.


- Em Hogwarts mesmo. Você vai pra casa não é?


- É. Eu até ficaria por aqui, mas meus pais já estão me esperando.


- Ah. – ele disse desapontado. Como pude brigar com ele daquela maneira?


Depois de um tempo senti meu estomago roncar e percebi que eu estava morrendo de fome.


Eu convidei Tiago pra jantar e então, ainda sem falar muita coisa, descemos para o Salão Principal.


O Salão estava lindo com suas decorações natalinas. As doze árvores enfileiradas ao redor das mesas estavam perfeitamente decoradas com fadas brilhantes.


Maria e Dougie já estavam sentados. Maria sorriu aliviada quando me sentei junto com Tiago.


A refeição estava realmente excelente, tive que concordar, ainda mais julgando pelo fato de Tiago estar sentado do meu lado.


- Então, você ainda vai pra casa Lílian? – perguntou Dougie, com a boca cheia de batatas, as palavras quase inaudíveis. Maria lhe deu uma cotovelada, repreendendo-o. Eu e Tiago rimos.


- Vou. Mas as férias de páscoa eu vou passar por aqui mesmo.


- Menos mal. – Maria olhou para de mim para Tiago e sorriu. Fingi não ter visto.


Eu já estava com a barriga cheia quando os pratos repentinamente se esvaziaram. Me despedi dos outros, pois hoje era minha noite de patrulha na escola.


Estava realmente monótono andar pelos corredores, sendo que estava tudo calmo e normal. Uma ótima despedida para as férias, pensei rabugenta.


Já estava realmente tarde quando voltei para a sala comunal, bocejando e com as pálpebras pesadas.


Quando cheguei à sala, pra minha surpresa, Tiago estava me esperando. A sala estava totalmente vazia.


- Tiago, o que está fazendo aqui?


- Não vai começar a gritar comigo de novo não, vai? – perguntou ele divertindo-se.


- Não, acho que não. A não ser que você mereça.


Ele riu.


- Acho que não vai ser preciso. – ele disse, batucando em alguma coisa que ele segurava. – Eu só vim te desejar um feliz natal, já que amanha voce vai partir cedo, né?


- É. – respondi, sorrindo. – Obrigada.


Ele veio até a mim com a caixa estendida.


- Tenho um presente pra você.


Eu corei.


- Presente?


- É. – ele respondeu. – Já fazia um tempo que eu havia comprado. Desde aquela vez que eu te perguntei se voce ia passar o natal em casa, lembra?


- Lembro. – eu disse, sem graça. – Não precisava, Tiago eu nem...


- Eu quis comprar. – ele me interrompeu. – Se você pudesse se virar...


Fiquei indecisa se virava ou não, mas então fiquei de costas pra ele.


Eu estava meio trêmula, imaginando o que ele estaria fazendo.


Senti alguma coisa sobre o meu pescoço. Era gelado. Eu apalpei a procura do que quer que fosse que ele havia colocado em mim, até achar algo redondo. Era um colar.


Ele levantou meu cabelo para poder prender o colar certo no meu pescoço. Senti certo arrepio quando senti ele tocar em minha pele.


Eu me virei pra ele atordoada.


- Não precisava.


- Quando eu vi esse colar imaginei você com ele. – ele falou, seus olhos brilhando.


Se é que podia, fiquei mais vermelha ainda. Dei uma olhada rápida na janela escura para ver meu reflexo. Era um lindo cordão prata, com um simples pingente brilhante. Era tão lindo, tão pequeno, que me simpatizei na hora com o colar.


- Gostou? – ele perguntou.


- É... lindo Tiago. Eu nem sei o que dizer.


- Não precisa dizer nada. – ele disse, dando um passo em minha direção.


Eu podia ouvir meu coração bater acelerado no peito, e minha respiração ficar irregular.


- Feliz natal, Lílian. – ele sussurrou.


- Feliz natal. – respondi baixinho.


Ele estava mais perto agora. Eu parecia ter congelado. Eu já podia sentir seu hálito em meu rosto...


E então seus olhos, anteriormente centrados nos meus, desceram para minha boca, e eu fiz o mesmo.


Ele se aproximou o bastante.


E me beijou.


Seus lábios se movimentavam suavemente nos meus. Não era o beijo que eu esperava de Tiago Potter (na verdade nunca tinha pensado muito nisso). Eu imaginaria que seria um beijo brusco, como eu sempre achei que o próprio Tiago fosse. Mas não. Meu coração martelava no mesmo ritmo que o nosso beijo, e eu, meio sem-graça, abracei seu pescoço, bagunçando – se é que é possível – ainda mais seus cabelos negros.


Era um beijo bom. Mais que bom. O melhor de todos (não que eu já tivesse provado muitos).


Eu não sei quanto tempos ficamos ali. Só eu e ele, a pessoa que no fundo agora eu sabia que era quem eu sempre desejara. Que eu sempre sonhara, e não sabia.


E eu também podia sentir o sorriso em seus lábios, ao ter, finalmente, Lílian Evans em seus braços.

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