Uma fuga imprevista



Uma fuga imprevista



Os quatro colegas não sabiam mais o que pensar sobre o assunto, aliás, era como se tudo o que já tivessem imaginado sobre Voldemort fosse apenas uma espécie de bode expiatório para a verdade, um pano que encobria o grande fato. Sempre haviam visto Voldemort como um bruxo de poderes fenomenais que, um belo dia, resolveu se aproveitar disso para deixar os bruxos de todo mundo a seus pés. Nunca, em hipótese alguma, haviam imaginado que ele poderia ter sido um jovem normal, muito menos um demônio sanguinário.

Após uma boa meia ora de silêncio, Sírius se manifestou:

-Mas, Sr. Dumbledore, porque nunca contou isso antes. Digo, se o Ministério tivesse descoberto, eles certamente encontrariam uma forma de combat...

-Me diga, Sr. Black - interrompeu-o bruscamente - Que diferença faria se o Ministério descobrisse sobre as “condições especiais” em que se encontra o Sr. Riddle?

Sírius pensou bem e respondeu desanimado:

-Nenhuma, eu acho.

-Exato, revelar que o bruxo mais temido de todos os tempos é na verdade um devorador de almas apenas iria causar pânico, uma vez que não exista nada com o que se possa derrotá-lo.

-Mas o senhor disse...

-Na época, não havia nenhuma prova definitiva de que Harry tinha de fato a lendária imunidade de Arthur. Seria realmente muita tolice minha expor uma criança dessa maneira.

-Mas Harry realmente trazia a herança de Arthur, não é?

-De fato, ele herdou muito mais do que isso.

Os quatro se entreolharam, sem entender.

-Creio eu que Voldemort, ao ouvir parte da profecia de Trelawney, não imaginou que Harry fosse um descendente de Arthur, provavelmente deve ter concluído que se tratava apenas de um bruxo capaz de alcançar um nível de poder superior ao seu. Então, resolveu usar em Harry o mesmo truque que usou em Tom, devorar a alma e tomar o corpo.

-E assim que entrou no corpo de Harry teve a grande surpresa!

-Teria sido muita sorte de nossa parte se tudo tivesse ocorrido desse jeito.

Lupin o olhou de forma interrogativa.

-Uma peculiaridade pouco conhecida dos devoradores de almas é que eles só são capazes de sugar uma alma se estiverem fora de um corpo. Se quiserem trocar de hospedeiro devem primeiro eliminar a alma que se encontra em seu alvo de forma a torná-lo apenas uma casca vazia, ou seja devem matá-lo. Nessa área, Voldemort já era mais do que experiente, além do mais, qual seria a dificuldade de usar o famoso Avada Quedavra em um garotinho?

-Mas se ele não entrou em contato com o sangue de fênix, então como?

-Eu andei me perguntando isso nos últimos quinze anos - ele abriu um sorriso maroto e continuou - e, felizmente, Harry teve tempo o suficiente para me dar a resposta antes de sumir repentinamente esta manhã.

Todos o olharam ainda mais confusos. Ao que parecia, Harry também não sabia nada sobre sua origem nobre, muito menos sobre como derrotara Voldemort quando era pequeno.

-Como estava dizendo - continuou Dumbledore - hoje de manhã, recebi uma carta de Harry - ele então tirou um envelope da capa - e devemos agradecer por esta carta ter chegado a minhas mãos.

-O que diz a carta? - falaram todos em coro.

O diretor deu um pequeno riso antes de responder:

-Bem, podemos dizer que, por algum motivo que desconheço, Harry voltou a ter visões relacionadas a Voldemort mas, desta vez, o que ele pode ver eram fatos que aconteceram há muito, muito tempo...

-Quer dizer que Harry viu o passado de Voldemort como Tom?

-Não, quero dizer que ele se lembrou do que aconteceu na noite em que se tornou o Menino Que Sobreviveu.







Harry ainda se sentia tonto quando acordou. Ainda de olhos fechados tentou se lembrar a seqüência de fatos que parecia estar toda embaralhada dentro de sua cabeça. Primeiro, acordara no meio da noite atormentado por mais um sonho, mas esse era diferente dos outros. No sonho via o dia em que Voldemort atacou sua casa, porém numa versão diferente de tudo o que imaginara, nela, seus pais não haviam morrido, tinham sido apenas “raptados” pelo Lord das Trevas e, quando ele tentara matá-lo usando a imperdoável maldição Avada Quedavra, algo diferente acontecera, uma fênix dourada apareceu e o quarto se encheu de chamas que consumiram Você-Sabe-Quem por completo, no final do sonho podia ouvir quase que num sussurro uma vozinha lhe falar “Iluminnus Totalus”.

Mais tarde na mesma noite decidiu enviar uma carta para Dumbledore contando tudo o que acontecera no sonho, se alguém tinha uma resposta para tudo aquilo, era ele! Mas tão logo despachara Edwiges sentira um vulto se aproximar por trás e alguma coisa o acertar pelas costas, fazendo-o desmaiar.

O jovem abriu os olhos devagar, mas isso não lhe ajudou muito, uma vez que o lugar estava imerso em escuridão total. Pelo tato, podia dizer que estava deitado em uma plataforma macia, algum tipo de amarra o impedia de se levantar e, não importasse o quanto tentasse, as cordas, ou seja lá o que fossem, não cediam.

Depois de algum tempo, Harry pôde ouvir pessoas murmurando, como se estivessem discutindo alguma coisa, mas era impossível entender naquele tom. Os murmúrios foram seguidos pelo som de passos que vinham na direção de Harry.

Quando os passos já estavam muito próximos, o som de uma porta sendo fechada foi ouvido e, em seguida, apenas o silêncio restou.

Harry, que já estava ficando apavorado com a situação, sentiu uma dor lacinante se apoderar de seu braço direito, como se alguém tivesse lhe desferido um golpe de espada. Ele respondeu a agressão com um grito de dor, que foi seguido por vozes falando em uma língua ininteligível.

Alguém estalou os dedos e a sala foi iluminada por algumas dezenas de tochas, o que permitiu que Harry finalmente visse o aposento. Até onde o garoto era capaz de enxergar, ele se assemelhava a um tipo de quarto egípcio, se tratava de uma sala retangular, sustentada por grandes colunas nas quais se viam diversos hieróglifos já desgastados pelo tempo.

Harry ficara a observar a tudo impressionado, ficara estático por vários minutos quando um silvo baixo e agudo chamou sua atenção. Então, para seu desespero, ele finalmente percebeu que o que o prendia a cama onde estava deitado não eram cordas, e sim enormes serpentes douradas com presas afiadas.

O jovem bruxo tentou se esquivar das serpentes para se soltar, mas um homem coberto dos pés a cabeça tirou uma flauta de sua imensa capa e se pôs a tocar. Ao ouvirem a música, as serpentes se prenderam com mais força a cama, quase fazendo Harry sufocar.

O misterioso estranho se voltou para outros que se vestiam iguais a ele e sussurrou alguma coisa, os demais responderam em voz baixa. Logo após, iniciou-se uma conversa em um idioma desconhecido para o jovem sobre a cama, que só podia supor o que diziam.

Depois de aproximadamente meia hora, os homens encapuzados se retiraram da sala. Quando o último estava atravessando a porta, sua capa se enroscou na maçaneta e caiu no chão, deixando a mostra o rosto mais desfigurado que um ser humano poderia imaginar: o crânio parecia levemente amassado, como se alguém o tivesse acertado com um objeto pesado; haviam vários rombos na pele, esta mesma já apodrecendo, deixando ossos e músculos expostos; o rosto era marcado por cicatrizes e havia sido costurado com agulha e linha em alguns pontos; para completar a visual, podia-se ver um cabelo ralo e queimado em certos pedaços da nuca onde este ainda não havia caído.

O jovem entrou em choque de tal forma que nem ao menos percebeu o homem puxar sua capa e trancar a porta, deixando-o sozinho novamente.



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Todos olhavam para o velho, os olhos cheios de expectativa quanto ao conteúdo da carta. Dumbledore pôs o envelope sobre a mesa e gesticulou para Lupin para que ele lesse. O ex-professor não esperou nem um minuto para fazê-lo. Porém, quando pôs os olhos na carta sua expressão mudou drasticamente, cheio de espanto ele pousou o pedaço de pergaminho sobre a mesa enquanto dizia lentamente:

-Mas... ela está... em branco...

Todos ficaram a olhar a carta estáticos.

-Eu pensei a mesma coisa quando a vi pela primeira vez – o velho puxou sua varinha e conjurou um candelabro – até que, por acaso, eu passei por uma tocha enquanto segurava a carta – o bruxo então mirou para o pedaço de papel sobre a mesa – Vingardium Leviosa! – ele flutuou de modo que ficasse contra a vela e, repentinamente, letras e palavras começaram a surgir pouco a pouco, formando, alguns minutos depois, um texto completo. Todos leram silenciosamente.

[N/A: não vou escrever o que havia na carta, uma vez que já é óbvio que se trata dos acontecimentos do capítulo 2]

Ao final da leitura todos voltaram-se para Dumbledore, esperando que ele complementasse as respostas dadas pela carta. O velho examinou atentamente os olhos ansiosos antes de continuar.

-Há alguns anos atrás, foram encontrados, perto das ruínas hoje conhecidas como Stone Range, alguns documentos, aparentemente escritos pelo grande Merlin. Nesses documentos, o príncipe dos feitiços revela que Arthur, além da imunidade aos devoradores de almas, recebeu também outros dons. Ao perceber os efeitos colaterais de sua experiência, o bruxo submeteu seu mais fiel amigo a uma grande série de testes, dessa forma o jovem rei pode desenvolver um leque extremamente variado de feitiços... o Illuminnus Totalus entre eles.

Esse feitiço é, na verdade, a invocação de um patrono, um patrono com a forma da Fênix, capaz de atacar não apenas dementadores, mas todas as formas nas quais as trevas se materializam. Um pássaro sagrado que emana a luz de um Sol, traz consigo o segredo da própria existência. Arde e queima na hora da morte com todo o seu esplendor áureo, renasce das cinzas ainda mais belo, a única criatura pertencente a esse mundo que realmente sabe o que é ser imortal!

O diretor parou momentaneamente, deu um suspiro longo antes de continuar em um tom distante.

-Uma coisa que poucos sabem, é que Lílian e Thiago não deixaram de lado seus deveres em relação à Ordem quando Voldemort passou a persegui-los. Eles continuaram trabalhando secretamente a meu pedido. Entre os diversos serviços que prestaram, o mais importante foi, sem dúvida, a pesquisa sobre uma comunidade da qual eu suspeitava ter relações com o Lord das Trevas, uma sociedade completamente fechada para o mundo e que chamava a si mesma de Seita dos Imortais.

O pequeno grupo passou as horas seguintes entre novas e intrigantes revelações. Revelações estas que fariam da busca por Lílian e Thiago ainda mais urgente.





Por mais que tentasse, Harry se via incapaz de se soltar das cobras que o prendiam firmemente. Quando já estava cansado, relaxou o corpo e se pôs a pensar em alguma outra saída. Deu uma boa olhada a sua volta, a cama onde estava se encontrava em uma plataforma alta no centro do quarto, não haviam janelas, a porta parecia destrancada, em um canto pode ver uma pequena escrivaninha e, para sua surpresa, vários de seus pertences estavam sobre ela. Por algum motivo, eles se importaram em trazê-los até lá.

Após analisar todo o aposento, tentou se lembrar da cena que presenciara há alguns momentos: seu braço fora ferido com um punhal, as tochas se acenderam repentinamente, as pessoas encapuzadas, o homem tocando uma flauta, o rosto monstruo...

Tudo se iluminou na mente de Harry. A flauta! O homem controlava as cobras com uma flauta! Harry olhou novamente para a escrivaninha e, para sua sorte, a flauta que Hagrid lhe dera em seu primeiro ano estava lá.

O rapaz olhou para as duas cobras e, utilizando-se de muita concentração, sibilou para elas o que um bom ofidioglota entenderia como levantem-se. As duas cobras, porém, não mexeram um único músculo. Ele tentou usar a língua de cobra novamente, desta vez num tom mais forte, dando a impressão de comando.

Uma voz fraca sibilou para ele obedecer... mestre... apenas...

Ótimo, Harry pensou. Ao que parecia aquelas cobras não iriam ceder tão facilmente. “Vejamos, o que chamaria a atenção de uma cobra?”. O jovem ficou alguns minutos refletindo, mas só chegou a conclusão de que ratos não eram uma boa distração, não tinha certeza de que cobras comiam ratos, e mesmo se comessem, não havia nenhum ali.

Ele continuou a divagar sobre as mais absurdas possibilidades em que uma mente desesperada era capaz de imaginar. Foi acordado de seu transe quando ouviu o barulho da porta se abrindo novamente, mas ninguém entrou na sala. Ao apurar os ouvidos, Harry pode ouvir um som baixo que lembrava, muito vagamente, o barulho de um objeto sendo arrastado.

Ao fazer um exame completo da sala em busco do recém-chegado, o jovem percebeu surpreso que sua flauta havia sumido da mesa, junto com sua única esperança de uma escapatória.

Um silvo ressoou pela sala, chamando a atenção do garoto que finalmente foi capaz de identificar a pessoa que havia entrado na sala, ou melhor, o animal. Erguendo-se em frente a ele, sendo sustentada por seus poderosos músculos e segurando a flauta de Harry entre os dentes, estava a figura de uma jibóia que, de acordo com sua memória, havia ajudado a fugir do zoológico quando, sem ao menos perceber, fez o vidro que a prendia sumir.

A jibóia fez um aceno com a cabeça, ao qual Harry respondeu como se entendesse o que a cobra tinha em mente. Esta se aproximou lentamente até que estivesse a pouco menos de um metro e meio da cama, ergueu-se de forma que parte de seu longo corpo ficasse ereto e atirou a flauta para o alcance do jovem.

No momento em que o velho instrumento deixou a boca, as duas imensas cobras, que facilmente alcançavam uma vez e meia o tamanho da jibóia cada uma, resolveram agir. Ambas se levantaram imperiosas como só as najas sabem fazer e atacaram.

Apesar de sua força extrema, elas não eram pareis para a velocidade de sua presa, que se esquivou com a graça de uma atleta, fazendo com que suas atacantes atingissem apenas o chão duro. Mal tinham se recuperado e um silvo, que se aproximava de um tom zombeteiro, fez com que elas voltassem ao ataque.

Conseguindo o que queria, a jibóia se infiltrou por entre os poucos móveis do lugar que, por serem pequenos e baixos, não permitiam a livre passagem das cabeças avantajadas das najas. Estas esbarravam neles, destruindo-os e ferindo-se ao mesmo tempo.

Quando os poucos obstáculos que restaram não mais lhe garantiam proteção alguma, a jibóia atraiu as adversárias para um canto vazio e habilmente passou a correr por entre as duas de forma a fazê-las se enrolarem uma na outra e, conseqüentemente, se prenderem em um nó duplo.

As duas enormes serpentes se debatiam enquanto tentavam se livrar da engenhosa armadilha e, freqüentemente, utilizavam suas cabeças e caudas para açoitarem uma a outra, como se culpassem a próxima pelo acontecido.

A outra cobra olhava a cena enquanto vislumbrava sua vitória satisfeita. O orgulho pelo feito, porém, fez com que perdesse a precaução e por isso se manteve muito próxima das duas aparentemente derrotadas. Essas, ao perceberem a vantagem que lhes fora dada, deram um bote em conjunto, do qual a jibóia não escaparia nem ao menos se rastejasse na velocidade da luz.

Sem defesas, ela se preparou para receber o golpe derradeiro quando a música de uma flauta ressoou pelo aposento. Ao ouvir o som, as poderosas najas deixaram-se cair ao chão e adormeceram. A jibóia virou-se para a origem do som e lá estava um jovem de uns dezesseis anos com o instrumento musical nas mãos.

Ela então fitou o garoto e lhe direcionou um olhar que, para as cobras, deveria ser o mesmo que um sorriso de gratidão. Em seguida, aproximou-se do local onde ele continuava parado e indicou com o rabo os outros pertences espalhados pelo chão. Gesto que Harry interpretou como sendo um comando para que arrumasse suas coisas, e rápido.

Ele amontoou tudo em sua mochila que, para sua sorte, também ali se encontrava, deixando apenas a varinha junto de si. Terminado o trabalho, fitou novamente a cobra e, pela primeira vez desde que a viu, percebeu que, apesar de sua aparência não ter mudado em nada, seu comprimento havia diminuído consideravelmente, na verdade, ela não media mais que um dos braços do rapaz.

Harry abriu a boca como se fosse fazer um pergunta mas a cobra o deteve falando:

-Não há tempo para isso! Siga-me!

-Pelo menos me diga seu nome e como chegou aqui.

A cobra enviou-lhe um olhar mortificado e triste antes de responder num silvo quase que inaudível:

-Meu nome é Nadia, estou aqui porque buscava o mesmo de todas os outras, e como as outras paguei o preço, não tão alto talvez, mas paguei e meu único consolo até agora foi ter aprendido a tempo. Foi por ter aprendido que não me deixei levar como as outras, foi por ter aprendido que não perdi meu espírito e alma e foi por ter aprendido que sou grata a minha boa sorte.

-Ter aprendido? Mas ter aprendido o quê?

A cobra lhe lançou um olhar incrivelmente penetrante e disse em seguida enfatizando cada palavra:

-Ter aprendido que aqueles que desejam a imortalidade são os que ainda não sabem viver!

Dando o diálogo por encerrado, Nadia saiu pela porta seguida pelo jovem, ainda mais confuso e atordoado.

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