Capítulo 6



Capítulo 06



Draco:


Em todos os outros dias que se seguiram eu evitei chegar cedo à faculdade. Não queria ser tentado pela vontade de procurá-la. Dediquei-me arduamente aos estudos, não havia espaço para mais nada e continuaria não havendo.
É óbvio que era impossível não pensar nela em nenhum momento, isso acontecia geralmente à noite, quando me deitava para dormir. Aquela saudade que não tinha nome. Mas minha vida continuava, tinha que continuar.

Fiz amigos, Gina e Harry, ambos com aquele complexo de salvador da humanidade. Era bom ter pessoas com quem dividir ideais e gostos em comum. Logo os apresentei para Blaise Zabini  meu amigo de infância e vizinho. Este era um pouco menos humanista, era modelo e gostava de o ser. E não quero que minha forma de falar pareça preconceituosa, mas simplesmente não entra na minha cabeça como alguém gosta de ficar tirando fotos e exibindo-se como troféu, era medíocre demais. Mas falando diretamente de Blaise, era uma excelente pessoa, um amigo para todas as horas, sabia mais de mim do que eu mesmo.
Gina e Harry eram legais, ele sempre queria ser o maduro e dono da verdade, mas não era teimoso e isso já bastava e Gina, além de linda e meiga, era engraçada e absurdamente inteligente, lembram que eu passei no vestibular em terceiro? Adivinhem quem passou em primeiro.
Era mais fácil empurrar os dias com pessoas como eles ao meu lado. Meus amigos.
Assim como eu quis que Hermione fosse um dia, assim como eu sabia que ela nunca seria. Com o passar do tempo ela tornou-se uma lembrança vaga, quase esquecia os detalhes de seu rosto, já não lembrava mais o cheiro daquela blusa de frio e o tom de voz já era silencioso.

O tempo estava passando e ela estava se transformando em um passado distante. Absurdamente cheguei a temer que a esquecesse por completo, era preciso lembrar do sacrifício que tinha feito, era parte de todo o processo, aquilo engrandecia meu ato, não que eu precisasse provar algo a alguém, além de a mim mesmo.
As férias de julho chegaram e se foram. Muito estudo, muita conversa e muita risada. Fim de ano, natal, ano novo, férias. Viagem. Curtição. Grupo de estudo. Trabalho. Muitas manhãs. Muitas tardes. Muitas noites. Um monte de muitas coisas, que não eram quase nada. E horas, minutos, segundos e décimos de segundos. Meses, semanas, dias. Aquele dia. Um ano, quatro meses e dezesseis dias.
Todo esse tempo de nada adiantou, pois em minutos tudo voltava ao ponto inicial.
Ela precisava de mim.


 


***




Hermione:
.
Era tão ridículo me deixar abater por aquilo, afinal de contas, eu já não sabia que aquilo ia acontecer? Era tão óbvio quanto um e um são onze, e não me venha dizer que são dois, porque aí seria um mais um é dois, entendeu?
Certo, abstrai.
Era só a dor chegando de novo. E a mente preparando o terreno com uma tentativa frustrada de humor. Ora bolas! Para alguém que desejava a morte eu estava me importando demais com uma dorzinha banal, que nem física era. Dores na alma não matam. Alma? Quem falou em alma?
Nem era algo tão importante assim, eu apenas perdi um amigo, mais um e nada mais. Eu pensei em correr para o armário do banheiro e pegar a lâmina, mas na noite anterior não havia adiantado, continuaria não adiantando. E, então, pensei nos comprimidos, eles me apagariam, mas eu não queria apagar, já estava cansada daquilo. Não havia nada que me tirasse a dor, mas sem me tirar a consciência junto?
Para meu azar, não havia. Não para aquele tipo de dor.

Naquela noite eu não fiz nada, dormi como um ser humano qualquer, e olha que eu estava bem longe de ser um. Quando acordei a dor ainda estava ali, mas resolvi ignorá-la. Entretanto, não consegui ignorá-lo.
Ao invés de chegar vinte minutos mais cedo, agora eu chegava quase uma hora antes do meu horário de aula. O motivo era apenas um, eu caminhava até o campus de medicina e procurava por ele e quando encontrava, me escondia em algum lugar e ficava a observá-lo até que entrasse em sua sala.
Vi seu nervosismo para as provas, as olheiras de noites mal dormidas, as roupas que usava e o material que carregava, já sabia todos os detalhes de tudo de cor e salteado. E a parte que mais doía: vi quando fez amigos novos e como eram próximos e, principalmente, vi o que mais ninguém ali parecia ver, o rapaz moreno era apaixonado pela ruiva e ela por sua vez, era apaixonada por Draco, mas ele não fazia idéia.
Eu não conseguia entender o que ganhava o vigiando, mas como também não via o que tinha a perder, continuava.
Meus dias sempre rotineiros, apenas ganharam uma nova rotina. Acordar, me arrumar, ir vê-lo, estudar, ir para a casa, ouvir música ou ver filmes, estudar e dormir. De vez em quando uns cortizinhos na horizontal, uns comprimidos e a vida ia seguindo seu curso.
Eu sei, eu sou medonha.

Qualquer um diria que eu estava pirando, mas não. Eu já era pirada muito antes daquela época. Eu pensei que seria possível levar minha vida assim por muito tempo, pelo menos até o curso acabar, mas estava enganada.
Aquela dor sem nome e razão, ainda não havia me deixado e acostumei-me a ela, mas em um momento ela foi fatal, ganhou forças extremas e me deixou em frangalhos.
Todo aquele papo de a morte ser a única certeza era uma tremenda lorota. Eu não queria ter certeza de nada, quer dizer, que ela fosse certeza para mim e para ninguém mais. Ela estava levando o meu único motivo para seguir em frente, a força divina que me fez abrir mão de sonhos, estava levando a única parte de mim que ainda vivia. A morte estava levando meu pai.
De certa forma, isso podia ser a minha carta de alforria, mas não. Agora eu estava mais presa a minha sina do que em qualquer outro momento. Tantas pessoas naquele velório, era impossível não lastimar aquela perda. Meu pai, o melhor homem do mundo.
Faleceu sem ver o meu sucesso, sem assistir a nossa vitória. Eu devia isso a ele. O laudo médico apontou parada cardíaca como causa da morte.
Como um coração ousa parar de bater?
A vida é muito injusta e por isso a morte me parecia tão mais preciosa, mesmo que dolorosa. Naquela noite após o enterro, quando cheguei em casa, corri para o banheiro. Logo estava nua, o corpo inerte observando a água avermelhada escorrer para o ralo. Eu tinha que ser forte, havia uma longa jornada para continuar, mas era tão difícil. Eu havia perdido o chão e a única pessoa que podia me ensinar a voar.
O corte na vertical ultrapassava o ponto limite que qualquer uma de minhas munhequeiras cobriria. Desta vez o sangue não coagularia, não havia tempo. Tudo a minha volta parecia névoa, meu corpo estava dormente e, então, as luzes se apagaram.


 


***


 


Draco:
.
Foi uma conversa entre Gina e Harry que transformou o passado em presente. Cheguei na faculdade e os encontrei conversando.
- Olá bom dia! – cumprimentei.
- Bom dia Draco. – respondeu Gina com um sorriso fraco.
- Bom dia. – respondeu um Harry estranho.
Percebendo que havia algo acontecendo, resolvi questionar.
- O que foi que houve? Por que estão com estas caras?
- É uma história triste que acabaram de nos contar. – explicou Gina.
- Que história?
E foi Harry que relançou os dados.
- Uma garota da administração, perdeu o pai a dois dias, e ontem tentou suicídio. Algo assim.
Checando o número de alunos de administração, subtraindo os homens, ainda assim sobravam muitas opções, mas meu coração sabia, era ela.
- A tentativa deu certo? – perguntei com o coração impedindo qualquer som menos sufocado.
- Não, mas ela está mal. – respondeu Harry.
- Sabem em que hospital ela está?
- O Reitor deve saber.
E, então, eu corri. A reitoria não era tão longe, mas eu tinha pressa.


Foi um sacrifício dos diabos conseguir o endereço do hospital, contei tanta mentira que minha nuvem no céu se dissipou em segundos. Mas não havia nada do que me arrepender, pelo menos não em relação àquilo, pois no demais, o arrependimento estava devorando minhas entranhas.
Não tinha como não me sentir um completo idiota. Se não fui capaz de ajudar uma única pessoa, o que me fazia acreditar que seria de ajudar centenas?
Hermione... A busquei em minha mente e como já vinha temendo, sua imagem agora era turva, mas no auge de meu desespero uma lembrança permanecia vívida, quase palpável. A munhequeira rosa manchada de tinta, maquiagem e lágrimas e, assim, a imagem das outras munhequeiras surgiram. A preta do dia da prova e a verde do último dia em que a viu.
Loucura talvez, mas meu pensamento se manteve fixo nelas e quando cheguei no hospital e consegui permissão para vê-la, a primeira coisa que vi quando entrei no quarto foram seus pulsos enrolados em faixas e tudo ficou claro demais para que minha consciência pudesse suportar.
Aproximei-me da cama, ela estava dormindo. Segurei sua mão e despejei as palavras presas em minha garganta.
- Desde quando você faz isso Hermione? – Meu Deus como havia sido capaz de quase esquecer aquele rosto? – Eu sinto muito por ter lhe abandonado, mas é que as coisas estavam confusas demais para mim e ao invés de encarar de frente eu fugi. Sinto muito por ter te decepcionado, por não ter estado presente quando precisou de mim. Sinto muito por seu pai. Eu queria poder fazer algo, mas sei que é tarde demais, nem vou ousar lhe pedir perdão. Eu... Eu... Eu queria tanto que...
E, então, fui interrompido.
- Amizade: do latim amicitate. Sentimento de amigo; afeto que liga as pessoas. Reciprocidade de afeto. Benevolência. – Um suspiro. - Amor.
- Ah Mione...
E, então, eu chorei.


 


***




Hermione:
.
Em um momento eu estava no chão do banheiro e no outro em um quarto de hospital, com Draco segurando minha mão e falando comigo. Não me lembro exatamente do que ele disse, mas eram palavras de alguém que estava arrependido de algo que fez. Eu podia abrir os olhos, puxar minha mão e pedir para que ele saísse, mas não. Desde que ele mesmo havia me pedido para pesquisar, o significado da palavra amizade não saía de minha cabeça: afeto que liga as pessoas.
Ligados. Sim, essa palavra explicava muita coisa.
A maneira exagerada com a qual eu e Draco nos importávamos um com o outro, tendo nos conhecido tão pouco. A necessidade que eu tinha dele e ele de mim.
Ao invés de fazer o que podia ter feito. Apertei sua mão e o interrompi repetindo como um computador as palavras do dicionário a respeito de amizade.
- Amizade: do latim amicitate. Sentimento de amigo; afeto que liga as pessoas. Reciprocidade de afeto. Benevolência. – E a mais importante definição: - Amor.
- Ah Mione...
E, então, ele chorou. Como um bebê.
Enquanto ele chorava – e isso levou muito tempo – permaneci com meus olhos fechados. Se ouvir aquilo já era angustiante, ver seria horrível.
Sempre pensei que por conta do machismo da sociedade e até mesmo dos genes, os homens choram menos que as mulheres, bem menos e, então, quando um homem chorava era porque algo realmente doía. Portanto, homens chorando, sempre acabavam comigo, era mais um dos meus pontos fracos.
E sei que é sádico pensar assim, pois a dor de ninguém deve ser algo bom, mas o fato de que aquilo que doía tanto era relacionado a mim, me encheu de uma sensação absurdamente boa. De repente, eu era importante.
Sei que no meio de todo aquele pranto, o foco inicial estava se perdendo, ele com certeza chorava por uma série de coisas que minha e/ou nossa situação o fez pensar, mas eu não ia interromper, eu bem sabia o poder de libertação de uma cachoeira de lágrimas.
Que ele chorasse o quanto quisesse, o importante era que não se movesse dali. Infelizmente, ele já havia soltado minha mão fazia um certo tempo, mas mesmo de olhos fechados eu conseguia sentir a sua presença bem ao lado da minha cama.
O ar barrado por seu corpo não me atingia, o som soluçante, o perfume e o aperto em meu peito me diziam que ele estava ali, olhando para mim.
Se aquilo tudo representava um recomeço, eu não tinha motivo nenhum para me opor. Draco era meu amigo ou pelo menos pretendia ser. Tudo daria certo, tinha que dar. Uma nova fase começava em minha vida, uma onde meu pai não estaria, onde eu teria que lutar contra muitas coisas.
A amizade de Draco me ajudaria em cada luta, não seria as armas, mas sim a fortaleza.
Mas havia muitas lutas - que começavam naquele instante, quando abri os olhos e encontrei os de Draco sobre mim, as lágrimas cessadas, a mão acariciando a minha e aquele sorriso insistente, minha lanterna cheia de pilhas no meio da escuridão – que ele não poderia me ajudar, pois era parte inimiga: A luta contra o desejo, a paixão e o amor.
Eu sabia onde tudo ia terminar e podia ver em seus olhos que ele também sabia, mas por um motivo que eu desconhecia, ele também estava com medo e, principalmente, tinha a mesma certeza que eu de que aquilo que nossos corações começavam a almejar nunca aconteceria.
E foi com cumplicidade de conformismo que retribui o seu sorriso e fechei os olhos para receber o beijo estalado na testa e as palavras que marcavam o novo começo daquela história que seguiria o seu curso, independente se concordávamos com seu fim ou não:
- Seja pelo afeto, pela benevolência ou pelo amor. O fato é que quero e preciso estar ao seu lado, minha Hermione.


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N/A:  Yeaaaah!! *-* Como prometido, o capítulo não demorou nada... e ainda foi maior do que os anteriores!!  Obrigada Marcella Regionato pelo coments, que ótimo que você gostou, espero que goste ainda mais desse... que foi fofo né??!! Bjs e comentem xD

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