A vida de Brian



Capítulo 2

A vida de Brian

Por mais oito quadras Snape se misturou a trouxas, agora amargando uma chuvinha fininha e cuidando para atravessar a rua no local certo, sem chamar a atenção da polícia de novo. Ele não se arriscava a lançar o feitiço Impervius para não chamar a atenção. O resultado foi um mestre de Poções encharcado, com capas pesadas e - nos últimos tempos - com pés doloridos, no auge de seu mau humor.


Chegando ao centro comunitário, verificou que se tratava mesmo de um local onde se concentravam serviços públicos - inclusive médicos. Havia mulheres grávidas, outras com seus trouxinhas irrequietos, adolescentes de aparência displicente, trouxas com roupas puídas e alguns efetivamente cheirando mal. Quando ele entrou no local - uma construção que aparentava ser um pouco mais nova que o Castelo de Hogwarts, mas que não teve a mesma manutenção -, uma mulher sorridente com um crachá escrito VOLUNTÁRIA indagou:


- Olá. Precisa de ajuda?


Como esses trouxas gostavam de dar informação! Os espiões deles não tinham problema nenhum.


- Procuro Internet.


- Ah, ótimo. Vai receber e-mail ou navegar?


Hum, uma língua diferente.


- Procuro uma pessoa.


- Então eu sugiro as páginas brancas. Claro, o senhor pode preferir o Google, MSN Search, AlltheWeb ou o Teoma, mas para localizar pessoas, esse é o melhor - Ela apontou para a esquerda. - Os computadores ficam na primeira sala à direita naquele corredor. É só se inscrever com Brian. E não se preocupe com Brian. Ele é muito manso.


- Brian - ele repetiu. - Obrigado.


Brian era um homem vestido de couro dos pés à cabeça, com algumas argolas que deveriam servir para tortura pregados na pele na altura das sobrancelhas e no queixo. Ele era grande e largo, como se fosse um irmão menor de Hagrid, de cabelo comprido e barba na altura do peito. Uma colorida tatuagem podia ser vista saindo de debaixo da sua camiseta.


Snape não se intimidou, especialmente depois que a moça chamada Voluntária havia dito que Brian era manso. Obviamente domesticado.


- Procuro Internet.


- Na legal. Pode se abancar ali e eu chamo quando alguém desocupar, falô?


Oh, um jargão. Ao contrário de Hagrid, cujo modo de falar era perfeitamente entendível, esse homem tinha palavras que Snape não entendia. Sem saber direito o que responder, o mestre de Poções repetiu:


- Falô.


Brian assentiu, com uma risada, enquanto Snape ia para um conjunto de cadeiras de plástico. Brian ficou olhando para ele e indagou:


- Lan house tava cheia?


Snape piscou um minuto, tentando entender o que ele havia dito. Respondeu com sinceridade:


- Eu não saberia dizer.


- Veio jogar, navegar ou dar um rolé?


- Procuro uma pessoa.


- Só.


Nesse momento, um adolescente de sardas e óculos muito engordurados se ergueu de um computador e veio até Brian, para bater sua mão aberta contra a mão do grandão. Brian saudou:


- Valeu, brô.


- Só - respondeu o adolescente, saindo da sala.


Snape ergueu uma sobrancelha. Embora tosca, aquela linguagem era mais difícil do que ele imaginara inicialmente.


- Gente boa - chamou Brian, dirigindo-se a Snape -, pó pegá a última no cantão.


Snape se ergueu e disse:


- Só.


Brian grunhiu alguma coisa e Snape se dirigiu ao computador que havia sido vago pelo adolescente. Hum, dispositivo interessante. Ele olhou a tela colorida, parecida com a de um quadro, e viu os pequenos desenhos nela. Imaginou como o artefato funcionaria. Ele tocou os desenhos, mas nada aconteceu.


Discretamente, Snape olhou em volta e viu o que os outros estavam fazendo: empurrando os pequenos montinhos de plásticos que tinham uma espécie de corda saindo dele. Snape observou que seu computador tinha também o montinho de plástico do lado esquerdo. Empurrou-o e a pequena seta branca que estava parada na tela deu um pulo. Ele empurrou o montinho mais um pouco e a seta andou mais um pouco, acompanhando o movimento.


Fantástico.


Mas como aquele montinho de plástico e aquele quadro colorido iriam ajudá-lo a encontrar os pais de Hermione Granger? Será que a tal Internet estava aprisionada dentro da tela colorida?


- Aí, gente boa - Snape deu um pulo ao descobrir Brian atrás de si, em pé. - Primeira vez na rede?


Não valia a pena fingir que ele não estava tendo dificuldades. Snape foi sincero:


- Temo que sim.


- 'Xa comigo - Brian puxou uma cadeira e sentou-se ao lado de Snape. - Posso?


- Por favor.


Ele apertou alguma coisa no montinho de plástico e não gostou do resultado, porque xingou:


- Merda de mouse.


Snape arregalou os olhos. Os trouxas sabiam transfigurar ratos!


Brian levou a seta até um pequeno "E" azul no quadro e então Snape se assombrou, ao ver uma transformação na tela. O grandão inclinou-se para colocar seus dedos grossos e curtos na tábua cheia de estranhos botões com letras e números.


- Ah, agora vai - ele disse, satisfeito. - Como é o nome da pinta que você procura?


- Na verdade, eu não sei. Só sei que são Granger, pais de uma menina chamada Hermione.


- Moram por aqui?


- Presumivelmente em Londres, sim.


- Só.


Que palavra versátil, aquela.


Brian apertou mais outras teclas e uma nova tela apareceu. Apareceram várias entradas com a palavra Granger.


- Tamo com sorte. Tem 890 mil resultados. Se reduzirmos para Granger e Londres - ele digitou de novo -, cai para 98.100.


- E como vou saber qual deles é o que eu procuro?


Brian deu de ombros:


- Reduz a pesquisa ainda mais ou vai de um por um.


- Dos quase 100 mil?


- Só. Cara, você é novo nessa parada, não é?


Com um suspiro, Snape respondeu:


- Só.


Brian riu-se:


- Você é uma figura, sabia? Mas eu tô te achando mó legal.


Ah. Legal ele entendia.


- Muito obrigado.


- Esses caras Granger são sua família?


Snape riu:


- Não, não. Eu esperava... que eles pudessem me hospedar por uns tempos.


- Você é sem-teto?


- Acho que sim.


- Ih, cara, que mó ruim. Você não conhece mais ninguém?


- Lamento que não.


- Quer ficar no meu muquifo? A patroa vai adorar te receber. Você é gente boa.


Snape olhou para o homem, pronto para recusar a oferta prontamente. Mas ele pensou bem e deixou seus instintos sonserinos tomarem conta. O que ele tinha a perder? Avisou, por precaução:


- Eu não tenho dinheiro.
- Tudo bem, cara. Eu também não tenho - Brian riu-se ruidosamente da própria piada.


- Eu também não tenho emprego no momento.


- Posso te ajudar a encontrar trampo. Como é o seu nome?


- Severo Snape.


- Brian McTaggart. Posso te chamar de Sev?


Snape não podia ter preferências, embora ele odiasse o apelido.


- Snape está bom.


- Na boa. A gente vai para casa. Minha mulher Edna vai trazer a Henriqueta no fim do dia.


- Henriqueta?


- Ah, é o meu bebê.


Snape empalideceu - crianças, não!


Mas as próximas palavras de Brian o acalmaram:


- Uma Vulcan 750 cilindradas, motor V4. Melhor do que muito carro japonês. Beleza de bike. Vale mais do que eu tenho. A patroa fica com ela por causa do pedágio aqui da City.


- Pedágio?


- É a taxa de cinco libras para quem usar o carro no centro da cidade. Cara, de que planeta você veio?


- Eu vim.... de longe.


- Legal. Depois você me conta tudo lá desse seu lugar. Mas agora eu tô no trampo. Não pagam muito, mas uma graninha sempre vai, na moral. Olha, finge que tá navegando um tempo, depois senta ali até a Edinha chegar. Se quiser procurar esses Granger, faz assim.


Brian ensinou-o a mexer no computador. Mas nenhuma das informações que ele queria estavam na tal Internet (embora o conceito de Internet parecesse interessantíssimo), então ele desistiu, com alguma relutância. Jamais encontraria os pais da Srta. Granger sem saber onde moravam ou, pelo menos, o nome de um deles.


Snape estava sentado havia algum tempo, observando os usuários da intrigante Internet quando uma mulher também vestida de couro como Brian entrou na sala. Ela se jogou para cima dele.


- Oi meu bruzundungo!


- Minha bruzundunguinha! - disse Brian, colocando-a no colo. E não era uma façanha menor, visto que a mulher era tão grande quanto Brian, com um cabelo tão desgrenhado quanto o dele, de cor loura desbotada e lábios pintados de um vermelho bem vivo. Snape sentiu um cheiro de perfume floral vindo da mulher. Eles se beijaram longamente.


- Edinha, olha só quem vai se encostar lá em casa uns tempos: o Sev!


A Sra. Brian olhou para a direção que o marido apontava e perguntou:


- Você também tem bike?


- Não, madame.


Ela arregalou os olhos:


- Cai fora! - Mas ela estava rindo, e parecia maravilhada. - Sai dessa! Você me chamou de madame?


- Sim, senhora.


- Viu, Brian? Esse cara é um cavalheiro e sabe como tratar de uma dama.


Ele se apresentou, com uma mesura:


- Severo Snape, madame. Encantado.


- Edna McTaggart. Acredita que Brian se casou comigo de verdade? - Ela se riu da própria piada. Obviamente eram um casal muito bem-humorado. - Taí. Gostei de você, Sev. Posso te chamar de Sev?


- Ao que tudo indica, minha opinião pouco importa a esse respeito.


- Fazer o quê? Você tem cara de Sev! - Ela se virou para o marido. - Mô, pintou mó estresse. Henriqueta tá na oficina.


Brian quase a deixou cair:


- Pô! Mó mal, aí! Que foi?


- Ah, ela começou a engasgar, aí fui lá no Curly, e você sabe, pá daqui, pá de lá, rebimboca da parafuseta - ele ficou com ela. Num tá andando!


- Saco! - bufou Brian. - O Sev tava doido para conhecer.


Snape inclinou a cabeça:


- Com certeza.


- Tá limpeza. Vamos ter que ir de busão - disse Madame McTaggart. - Sev, tá com algum aí?


Antes que Snape perguntasse algum o quê, Brian disse:


- Ele tá durango kid, môzinho.


- Sem estresse. A gente pega o metrô até a Linha Urbana e depois o L12.


Brian se virou para Sev:


- A gente mora meio que nas periferia, entende?


Snape sem sentir respondeu:


- Só.


- Então simbora, galera!


Snape seguiu o volumoso casal pelas ruas de Londres. E qual não foi sua surpresa ao ver que eles desceram uma escada que dava para o subsolo. Ele observou a quantidade de trouxas que se dirigiam ao local e teve apressar o passo para acompanhar os McTaggart.


Dentro do buraco na terra, havia uma verdadeira cidade. Trouxas se deslocavam sem andar usando uma espécie de escada que rolava para cima e para baixo. Mas os McTaggart primeiro pararam em frente a algumas grades, que escondiam cabinas.


- Edinha vai comprar as passagens. Ela é que tem a cabeça de negócios da família! - Olhou para Snape e perguntou: - Não vai me dizer que é a primeira vez no metrô?


- Na verdade, é, sim.


Brian abriu-se numa risada franca e gostosa:


- Taquipa! Sev, cara, você é do baralho! Deixa que eu te explico como as coisas funcionam.


Snape teve alguma dificuldade em passar pelo que Brian chamava de roleta. Primeiro ele tinha que esperar até o pequeno papel ser processado num dispositivo totalmente revolucionário, depois a chamada "catraca" era liberada. Mas quando ele estava passando pela tal "catraca", as capas dele se enroscaram no dispositivo, e ele quase caiu de bunda no chão. Foi preciso uma espécie de policial diferente do que o tinha abordado antes vir liberar a infernal catraca.


Depois de toda a confusão, que Snape experimentou com considerável mau humor, eles finalmente adentraram nuns minhocões feitos para carregar trouxas, que iam a uma velocidade comparável à do Expresso de Hogwarts. Na verdade, Snape notou que os tais minhocões (metrôs) eram na verdade uma espécie de trem. Ele entrou com cuidado num dos vagões, que estava lotado de trouxas, e, por orientação de Brian, segurou-se a um dos prendedores que estavam no teto. E de repente, sem aviso, a coisa andou.


Snape quase foi jogado para o lado e, quando ia cair em cima de uma mulher que o olhou feio, conseguiu se reequilibrar. A partir daí, segurou-se firme. Depois de duas estações (paradas), ele já estava acostumado. Parecia ser uma espécie de Nôitibus sobre trilhos. Brian avisou que eles saltariam na próxima parada, então ele se preparou.


De volta à terra firme, finalmente, Snape viu que não seria por muito tempo. Os McTaggart se encaminharam à escada rolante e Snape demorou alguns segundos até pegar o "ritmo" dos andares móveis. Mas finalmente ele conseguiu subir. Para descer, segurou a ponta das capas e pulou, com graça e agilidade.


Madame McTaggart era a líder da pequena excursão. Snape observou um daqueles ônibus pararem e eles entraram. A Sra. McTaggart foi pagar as passagens enquanto eles conseguiam se sentar no segundo andar. Era aberto, estava frio e ventando, mas pelo menos a chuva tinha parado. Aparentemente, aquilo pouco importava para Brian. Ele fazia Snape lembrar muito de Hagrid. Será que toda pessoa grande era assim expansiva?




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