Capitulo 2



CAPITULO DOIS

“Oh, meu Deus, é ela!” Somente ao levar a torta no peito, Harry Potter percebeu que se tratava de Mione — sua protetora na infância. Ele sorriu divertido. Mione ainda era tão impetuosa quanto fora na infância, ao correr em sua defesa quando era vítima das outras crianças.
Harry fora uma criança frágil — pálido, magro e desajeitado — incapaz de enfrentar os coleguinhas nas brincadeiras, e alvo de troças, portanto. Certo verão, o médico lhe recomendara passar as férias no campo e seus pais, preocupados com sua saúde, o mandaram ficar com a tia Faye, em Greely. Na época já com uns setenta anos, esta não se dispusera a distrair um menino de onze anos ocupado, e ele, meio abandonado, acabara conhecendo Mione — uma pimentinha boa de briga!
Lembrava-se de que acontecera algo naquele verão... algo re­lacionado à mãe dela... que a obrigara a dar socos ainda com mais freqüência. Companheiros unidos contra o resto do mundo, eles haviam se tornado irmãos de sangue, embora Mione fosse menina. Ela brigava como um menino, e isso bastava para ambos. O pacto fora idéia dela, naturalmente, e o corte no polegar deixara cicatriz. O fato era que, sempre que via aquela cicatriz, renovava a autoconfiança.
Fitando a marca no dedo, Harry balançou a cabeça, as gotas de água respingando de seus cabelos sobre os ombros. Mione. Sua protetora. Após todos esses anos...
Ela não o reconhecera. Ele não a reconhecera de imediato tampouco, mas quando ela lhe atirou a torta, soube de quem se tratava. Sem dúvida, aquele verão significara mais para ele do que para ela. E tinha que reconhecer que mudara muito... exter­namente.
Ainda assim, ressentia-se do fato de ela não o ter reconhecido. Não era lógico, mas nunca pretendeu ser lógico. Eis por que voltara a Greely após vinte e tantos anos de ausência. Chegara a uma encruzilhada na vida.
Enfrentava uma crise da meia-idade aos trinta e três anos. Sua risada não tinha graça, de fato não houvera muito do que rir em sua vida ultimamente... até que a pimentinha lhe atirara uma torta. Com riso genuíno desta vez, passou o dedo indicador no creme que lhe cobria o peito e o degustou. Hum, nada mal.
Divertido, recordou a pose desafiadora que Mione adotara após o arremesso certeiro — com as mãos aos quadris, tamborilando com o pé — exatamente como fazia quando criança, ameaçando as outras ante as provocações. Mas nada havia de infantil na curva daqueles lábios. Mione se tornara mulher. Uma mulher que ele queria ver novamente.

— Então, minha cara, conheceu nosso homem misterioso? — especulou Beatrice Beasley ao cruzar com Hermione na calçada. — Hermione, querida! — Ela e a irmã correram atrás dela. — Eu estava falando com você.
— O quê? — Hermione parou ao captar a voz das mais nova das irmãs Beasley finalmente, arrancando-a da fúria interior. — O que disse?
— Perguntei se conheceu o nosso homem misterioso — repetiu a anciã, enxugando o rosto com o lenço rendado.
— Sim, conheci, e é um babaca — sentenciou Hermione, sucinta.
— Ele estava de calça jeans ou não? — Alberta quis saber.
— Sim, estava de jeans — respondeu Hermione, irritada consigo mesma por se entusiasmar com a lembrança de como ele ficava bem de jeans.
— Está vendo? Eu lhe disse — informou Beatrice à irmã, com um cutucão de cotovelo. — Me deve cinco dólares.
— O fato de ele estar de jeans naquele momento não significa que estava antes — disparou Alberta. — Não perguntou isso a ele, perguntou? — Voltou-se para Hermione.
Hermione recordou aqueles quadris esguios apertados no jeans macio e balançou a cabeça a fim de afugentar a imagem.
— Está vendo? Ela não perguntou — informou Alberta triun­falmente à irmã. — Então, não tenho que pagar cinco dólares a você. A aposta ainda está valendo.
Hermione perdera a paz de espírito. Havia anos não se sentia tão zangada. Na verdade, aquele forasteiro em quem atirara a torta representava 'todos' os homens — incluindo aquele que a deixara praticamente esperando no altar.
Até então, não se permitira sentir raiva de Wayne por sua traição e deserção. Sentira dor, humilhação e até culpa por não ter percebido que havia algo errado, por não ter captado nenhum sinal. Ao atirar a torta, desabafara pela primeira vez. E fora muito bom.
— Minha cara, você está bem? — perguntou Beatrice. — Seu rosto está vermelho, e você parece ausente, se não se importa que diga isso.
— Ela apenas tem muito em que pensar — opinou Alberta. — Quem não teria em sua situação?
— Que situação? — replicou Hermione, olhando direto para a velhinha Alberta, enfrentando a provocação pela primeira vez desde que Wayne lhe deixara aquele bilhete. — E não gosto que fale como se eu não estivesse aqui!
— Eu também não gosto quando faz isso — confessou Beatrice à irmã.
— Só está zangada porque não ganhou a aposta — rebateu Alberta. — E Hermione está zangada porque o noivo era um fraco.
— Wayne não é um fraco — protestou Hermione automaticamente, a espinha se enrijecendo.
Sempre tomava as dores daqueles que eram aviltados verbalmente. A lembrança de um menino pálido e magrinho de óculos fundo de garrafa lhe surgiu na mente. Admirava-lhe a determi­nação, embora contasse apenas oito anos na época.
Wayne tinha uma prateleira cheia de troféus para comprovar sua força física. Ainda mantinha o recorde no condado como o atleta com o maior número de vitórias num ano escolar — uma distinção que obtivera no segundo grau; como treinador, levara os Troianos de Greely às quartas-de-final no campeonato estadual do ano anterior.
— É bom que esteja zangada com Wayne — dizia Alberta.
— Estou zangada com todo mundo no momento — resmungou Hermione, esfregando a testa e afastando os cabelos dos olhos. — O que significa que não sou boa companhia. Se as senhoras me dão licença...
— Claro, minha querida — compreendeu Beatrice.
— Parece que ela não descobriu muita coisa — resmungou Alberta.
— Fique quieta, mana.
— Vou contar uma coisa — bufou Hermione. — Não há dúvida de que azul é a cor que cai melhor nele.
Com um riso, deixou as irmãs Beasley fofocando.

Ao chegar ao trabalho na manhã seguinte, Hermione sentia que perdera um pouco da segurança obtida na noite anterior. A raiva a sustentara até chegar em casa. Então, a casa vazia e a mesa cheia de presentes de casamento ainda a ser devolvidos a fizeram desabar. Nem a presença de sua gata Magic ajudara.
Apelando para o freezer, pegara um pote de sorvete de cho­colate com gotas de chocolate e, sem se preocupar com taças, mergulhara a colher. Sustentando o pote na mão, consumira quase tudo de uma vez.
Sonhos perdidos. Confiança traída. As lágrimas rolaram en­quanto permanecia de pé ao lado da geladeira, com Magic ani­nhada a seus pés. Por fim, se compenetrava da verdade. Não exibira o magnífico vestido de noiva que escolhera e mandara vir de Springfield. Não trocaria votos com o homem que amava. Não partilharia a vida com ele. Estava tudo acabado.
Durante os seis meses de noivado com Wayne, finalmente se integrara à sociedade da cidade, como se o escândalo envolvendo sua mãe a afetasse pessoalmente. Com ela tão sociável quanto Wayne, passaram a freqüentar festas e até se associaram ao Country Club de Greely. Mas não era por isso que estava ali chorando. O fundo do poço se representava pelo fato de não ser amada pelo homem amado, afinal de contas. Eis a causa das lágrimas incessantes.
Eis o motivo da insônia naquela noite, que a fizera rolar para lá e para cá na cama estreita, tanto que Magic procurara outro canto para dormir. Quando finalmente adormeceu, foi para sonhar com um homem com uma torta de framboesa no peito musculoso.
Agora, porém, terminado o sonho, tinha que encarar o traba­lho... e a bisbilhotice de todos. O movimento na biblioteca au­mentara durante a semana anterior, e ela sabia por quê. A boa gente de Greely passara a freqüentar a biblioteca só para ver como a "pobre Hermione" estava indo. Já fora a "pobre Hermione" aos dezesseis anos, quando o pai abandonara tudo e se mudara para a Califórnia com sua nova família. Agora, voltava a ser a "pobre Hermione".
Um colírio removeu as marcas do choro da noite anterior. O rico sorvete, embora não houvesse solucionado seus problemas nem aliviado sua dor, fizera-a sentir-se melhor por algum tempo. Então, finalizando a noite terrível, a imagem do forasteiro bo­quiaberto ao levar aquela torta no peito.
Frente ao novo dia, tentara elevar o astral usando um vestido florido para ir trabalhar. Tomara especial cuidado com a maquiagem e o cabelo. O resultado final era... legal. Sabia que não era nenhuma beldade. Tinha uma estrutura elegante, cabelos castanhos aceitáveis num corte na altura dos ombros, c boas feições. Uma franja escondia boa parte de sua testa, que considerava larga. Tendo sempre um sorriso pronto, gostava de pensar que seus olhos azuis refletiam sua inteligência. Wayne lhe dissera que tinha um lindo sorriso... Mas, naquela época, Wayne dissera muitas coisas.
Infelizmente, já terminara o trabalho de catalogação que a ocu­para no dia anterior. De qualquer forma, parecia que as pessoas já não estavam vindo tanto para vê-la. Pela primeira vez na se­mana, o lugar estava vazio e deserto.
Os passos de Hermione ecoavam no assoalho de madeira en­quanto ela arrumava os jornais deixados nas mesas de leitura. Talvez fosse hora de procurar outra colocação, numa cidade maior, numa biblioteca que contasse com verba e uma equipe profissio­nal, ao invés de um grupo de voluntários. Talvez fosse hora de sair de Greely...
Mas então, sua amiga Luna Lovegood chegou, lembrando a Hermione por que permanecia. Por causa de pessoas como Luna.
— Então, como está indo? — perguntou a amiga, com sua voz suave, enquanto se juntava a Hermione à mesa de leitura.
— O melhor possível, acho.
Luna deu-lhe um abraço. Conheciam-se desde a sexta série. Ao longo dos anos, haviam partilhado confidências, risos e lá­grimas. Numa época de amizades descartáveis, aquele relaciona­mento de décadas dava a Hermione a estabilidade que ela tanto valorizava. Luna teria sido a dama de honra em seu casamento, e fora a primeira pessoa que ela chamara após receber o bilhete de Wayne.
— Como posso ajudar? — perguntava Luna agora, como já fizera antes.
Hermione balançou a cabeça.
— Você já faz muito me dando apoio, e me mantendo sã.
— Gostaria de poder fazer mais. — Luna era muito tímida, preferindo recuar em qualquer situação. Hesitara em aceitar o convite para ser dama de honra, pois se constrangia sob os olhares de todos. Mas aceitara porque Hermione precisava, e era amiga de verdade.
— As irmãs Beasley pegaram no seu pé de novo? — perguntou Luna, em voz baixa.
Alberta Beasley fora sua professora no jardim-de-infância, quando muito a intimidara.
— Ainda não, mas devem aparecer logo.
— Acho melhor voltar ao trabalho — disse Luna. Era caixa numa loja de conveniência, que tinha o orgulho de vender de aspirinas a zíperes. — Estou na hora de almoço. Passo em sua casa mais tarde.
Após a partida de Luna, a biblioteca ficou em silêncio nova­mente. A casa de cerca de trezentos metros quadrados em que funcionava fora doada à cidade para tal fim. Uma empreiteira fizera as reformas necessárias graciosamente, e inaugurou-se a biblioteca, no mesmo verão em que a mãe de Hermione fugira.
Pouca coisa mudara na biblioteca desde aquele tempo. Hermione tentara incrementar o serviço, organizando uma sessão mensal de leitura para crianças pequenas, um clube de leitura para crianças maiores e uma livraria para arrecadar dinheiro visando a novas aquisições.
O menor dos dois quartos fora transformado na sala de leitura onde se encontrava nesse momento, abrigando o acervo de ma­teriais de referência e as enciclopédias, assim como um arquivo de panfletos. O outro quarto, muito maior, abrigava a coleção de não-ficção, ao passo que os livros novos e os de ficção ficavam na prateleira da antiga sala de estar. A seção infantil ocupava a garagem dupla pintada com cores vivas.
Havia cadeiras à disposição em todo canto possível. Havia também uma mesa de estudo junto ao balcão, que dava para a antiga cozinha e agora constituía o espaço de trabalho de Hermione. Não existia espaço ocioso, nem espaço desperdiçado, tampouco.
A biblioteca ficava aberta quarenta horas por semana, e fechava aos domingos e segundas-feiras. Hermione pretendia usar suas férias de duas semanas, quando a biblioteca permanecia, na lua-de-mel. Ao ter o casamento cancelado, cancelara as férias também, mas prometera a si mesma uma viagem curta no verão — a qual planejaria sozinha.
Não fazia idéia de onde Wayne pretendia levá-la na lua-de-mel.
Ele insistira em tratar de todos os preparativos, e ela aceitara. Nada disso importava agora.
Naquela mesma tarde, Hermione redigia cartas para vários de­partamentos agrícolas requisitando material gratuito para o arqui­vo de panfletos quando sentiu que alguém a observava. Erguendo o olhar, viu o forasteiro de pé junto ao balcão. De camiseta branca, com uma caixa de papelão, ele a olhava com expectativa.
Hermione já lidara com bagunceiros na biblioteca — como Dennis, de doze anos, pego fumando no banheiro, e o sr. Obersdorf, de noventa anos, que insistia em que a biblioteca devia assinar a Playboy. Sendo assim, poderia lidar com o homem misterioso também — fosse quem fosse.
— Trouxe uma coisa para você — disse ele. Ela não se intimidou, permanecendo em silêncio.
— Após sua recepção de boas-vindas exótica ontem, pensei que podia devolver o favor. — Vendo-a mais tensa, ele continuou: — Relaxe. Não vou jogar em você. — Abriu a caixa para mostrar a torta lá dentro. — É de framboesa. Para substituir a que foi destruída ontem.
— Não precisava — comentou ela, cautelosamente mantendo a distância.
Harry sentiu-se desapontado. Mesmo a tão pouca distância, sem ele estar todo molhado, ela não o reconhecera. Tivera esperança de ver seu rosto se iluminar com um sorriso. Não teria essa sorte. A decepção seguiu-se a raiva — de si mesmo e dela, por lhe provocar essas idéias tolas.
— Ora, olá, Hermione, espero não estar interrompendo — in­terrompeu a sra. Cantrell, entrando na biblioteca. Chegando mais perto, observou Harry com curiosidade indisfarçada. — Então, se conhecem, hein?
— Não — apressou-se Hermione.
— Sim — disse Harry, ao mesmo tempo.
— Não está interrompendo nada, sra. Cantrell — sentenciou Hermione, firme. — Em que posso ajudá-la?
— Queria saber se o livro de Dean Koontz já foi devolvido — informou a sra. Cantrell, sempre observando o homem a seu lado.
— Não — respondeu Hermione. — Como já disse ontem, vai levar de uma semana a dez dias para estar de volta. A senhora é a próxima na lista de reserva.
— Oh, certo. — A sra. Cantrell olhava para Harry de soslaio.
— Você me disse. Devo ter me esquecido com todo esse movi­mento aqui ultimamente. — Por fim, encarou Hermione. — Então, me diga, está se sentindo melhor, querida? Ainda não posso acre­ditar que o nosso Wayne tenha feito uma coisa dessas. — Quase insinuava que Hermione é que fizera algo para que o noivo desistisse no último minuto. — Teve notícias dele?
— Não, e espero não ter — informou Hermione, seca. A sra. Cantrell se fez de solidária.
— É uma vergonha. Vocês pareciam um casal perfeito. Bem, acho que é melhor ir e deixar vocês dois voltarem ao que estavam fazendo. — A mulher saiu rápido, ansiosa por espalhar as novi­dades sobre o homem misterioso levando doces a Hermione.
Hermione fechou os olhos, imaginando a sra. Cantrell exagerando os fatos, totalmente fora de controle. Todos saberiam em quinze minutos.
— Quem é o caro Wayne e o que ele fez? — perguntou Harry, com tamanha presunção que ela arregalou os, olhos.
— Não é de sua conta — rebateu Hermione.
— Passa a ser agora.
— Quem pensa que é?
— Eu sei quem eu sou — respondeu ele —, mas você, não, correto?
— É a sua maneira de dizer que é alguém importante? Porque se for isso, não estou impressionada.
— Pareceu impressionada a noite passada — ponderou ele, perspicaz.
Hermione olhou para ele. Harry sorriu.
— Sabe, a última vez que perdeu a calma, você abriu o lábio de Biff por ele ter me dado um soco. Lembra disso, Mione?





Obs:Oiii pessoal!!!!Capitulo postado!!!!Espero que tenham curtido!!!!Até o final de semana tem fic nova na área!!!!Bjux!!!!Adoro vocês!!!!

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