O Prólogo do Céu



Obs: Sim, o enredo da história se passa na época da segunda Ascensão de Lord Voldemort, ou seja, após Harry Potter e o Enigma do Príncipe. Entretanto, exclusivamente o prólogo retrata o final da Primeira Guerra até a morte dos pais de Harry e é estritamente importante para o desenrolar da história, pois o primeiro capitulo é já protagonizado por Harry, Rony, Hermione, etc. Então, boa leitura e aguardo comentários!

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Prólogo do Céu

O céu para os bem-aventurados. O inferno para os pecadores. E a Terra...A Terra para templo de oferenda das almas ainda em transição. Deus saiu na frente no alistamento de seus seguidores ao criar a sua imagem e semelhança Adão e Eva. O Anjo Caído deu o passo seguinte infiltrando-se como serpente no Paraíso, entretanto, baseado em sua soberba acreditou estar livre dos olhares do Todo-Poderoso.
Tolice! Pois, Deus, em Sua infinita Sabedoria, escondeu o Inferno no meio do Paraíso para que nós estivéssemos sempre atentos!

Anos 80, mais precisamente início do ano de 1981. Um ano a mais, um ano como qualquer outro pelo menos para boa parte do mundo. A exceção à essa normalidade atendia pelo nome de Inglaterra. Se para Adão e Eva o mal se figurou sob a couraça de uma sádica serpente, para a sociedade contemporânea inglesa este tomou forma humana, e também desumana, de Lord Voldemort. Tal ser espalhou tamanho terror e devastação, que em pouco tempo tornara-se raro aquele que possuía coragem suficiente para proferir seu nome.

Um caos apenas equiparado ao holocausto nazista era o que predominava na gelada e enevoada Inglaterra, tragédia que fez com que boa parte do mundo se compadecesse e enviasse aos montes algum ou todo tipo de ajuda. No entanto, um fato curioso constatado é que as principais fontes de auxílio vieram de partes ermas e frágeis do globo, exemplo da América Latina, destaque para o Brasil e Argentina que conduziram ao local do conflito dezenas de batalhões de soldados, medibruxos e aurores.

_ Não consigo entender o que lhe motiva à arrumar as malas e ir para o outro lado do planeta atrás de um guerra!

_ Mãe, basta de discussões! Eu fui convocada pela Força Nacional e já me decidi: eu vou!

_ Mas minha filha...A guerra nunca atravessará o oceano, não há necessidade da sua ida.

Calmamente, a jovem, que não ultrapassava os vinte anos, dobrou as últimas peças de roupas e fechou sua mala. Não desferiu mais palavra a sua mãe, limitou-se a lança-la um olhar...É, aquele olhar! Sua mãe suspirou derrotada. Não havia mais o que argumentar, ela conhecia a filha que tinha e sabia que aquele olhar era sinônimo de decisão tomada. Sua filha partiria e ponto.

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_ Atenção! Pelotão. Alto!

Ordenou no costumeiro tom autoritário o coronel Silva, Gregório Silva, comandante da Força Nacional Brasileira que partiria dentro de poucas horas para Londres. Depois de analisar minuciosamente cada coluna de sua tropa, o militar precisou reunir as forças para esconder sua frustração. Não era mero palpite, era sim uma certeza: sua missão estava fadada ao fracasso.

Simplesmente, dos 300 convocados inicialmente apenas 86 se apresentaram: 35 soldados, 21 enfermeiros e 17 aurores e 12 medibruxos. Dezenas de desistências eram sem sombra de dúvida esperadas, mas, nunca em tão grande escala. Justiça seja feita aos “desertores”, o chamado não era obrigatório.

Em tese, a operação brasileira seria secundária, restringindo-se a auxiliar o exército e o Ministério Bruxo inglês. Só que interinamente, era de conhecimento o quão perigoso era ultimamente pisar em solo britânico. Suicídio coletivo, nada mais e nada menos do que isso fora o credito dado ao pelotão do comandante Silva.

À sua frente um esquadrão que apesar de ter a faixa etária na casa dos 25 anos, continha alguns dos melhores homens das forças armadas bruxas do Brasil. E era nesse importante fator em que se agarravam as esperanças do coronel de 37 anos.

Um ranger de dentes era o som que emanava de uma quase centena de militares perfilados em frente ao Ministério Bruxo Inglês. Março ainda conservava o frio intenso do inverno, mesmo que este estivesse próximo do final. E desacostumados à temperaturas tão baixas não foi de se estranhar tremedeiras e bater de dentes na maioria dos brasileiros.

_ Pelotão, alto! – ouvisse pela primeira vez as ordens do Coronel Silva em solo estrangeiro – Coronel Silva, membro do Exército Brasileiro, se apresentando ao serviço.

A fim de mostrar o devido respeito à figura que lhe recepcionava, o oficial bateu continência, seguindo o exemplo de seus subordinados.

_ Ora, ora meu caro Coronel, eu dispenso essas formalidades. Venho aqui recepcionar amigos e não subalternos. – pronunciou-se elegantemente um senhor de idade avançada, mas de fala mansa e de aparência benevolente.

_ Bem... – surpreendeu-se o chefe brasileiro – Pelotão! À vontade! – decidiu-se por fim.

_ Muito, muito melhor. – sorriu o velho – Oh! Que gafe a minha. Sou Alvo Dumbledore, diretor da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts.

Cumprimentaram-se com um caloroso aperto de mão.

_ Suponho que todos estejam esgotados pela viagem e pelo excessivo frio. Mas, permitam-me que eu os detenha por mais alguns instantes aqui fora. – solicitou o mago Dumbledore.

_ Prossiga, diretor. – respondeu-o imediatamente Gregório Silva.

_ Quero agradecer muitíssimo a ajuda que estão nos oferecendo nesse momento tão obscuro da história de meu país. Imagino o quão difícil fora abandonar seus lares, sua pátria para socorrerem problemas alheios em terras tão longínquas. Em um momento, não esse fiquem tranqüilos – descontraiu Alvo arrancando gargalhadas de todos – pretendo dizer um “obrigado” a cada um de vocês!

Com uma salva de palmas finalizando o seu pequeno discurso, Alvo Dumbledore adentrou com o pelotão recém-chegado no Ministério. Conduzindo em seguida, o Coronel Silva, o tenente Menegaro, a jovem auror Ana Luiza Andrade e o renomado medibruxo Fernando Padilha ao gabinete particular do Ministro da Magia.

_ Seja bem-vindo à Inglaterra, Coronel Silva. Agradeço a ajuda voluntária do Brasil... – pausou bruscamente o político.

_ Estamos as or... – iniciou cordialmente o militar.

O ministro gesticulou interrompendo-o, de maneira até impaciente se analisarmos o fato em si.

_ Contudo, devo admitir que com base nas minhas conversas com o embaixador brasileiro eu esperava um número mais significativo de homens.

Após a menção grosseira do ministro inglês, não foi de estranhar o incomodo que decaiu sobre os brasileiros ali presentes.

_ Por favor, ministro, não estamos em condições de exigir nada aqui. Muito pelo contrário, devemos dar graças a Merlin a cada um que vem em nosso socorro. – apaziguou os ânimos Dumbledore.

_ Bondade as suas palavras, diretor. Mas tenho plena certeza que não é a mim ou ao meu pelotão que o senhor deva lembrar da situação em que se encontram. – respondeu rispidamente Gregório – Quanto a Vossa Excelência, senhor Ministro, sinto-me na obrigação de lhe expor os motivos que nos renderam uma tropa menor. Achamos mais apropriado deixar a convocação em ponto facultativo aos nossos soldados, já que no Brasil também somos necessários ainda mais agora que estamos em transição do governo militar para o civil. – conclui serenamente o coronel.

_ Suas explicações são dispensáveis, meu caro. – ironizou o político – Contudo, pude notar que os senhores e o diretor Dumbledore se entenderam a ponto de minha ausência passar desapercebida. Tenho plena certeza de que o magnânimo líder de Hogwarts poderá me substituir a altura. Agora, se me derem licença, há outras coisas que requerem minha atenção. – finalizou o ministro já se retirando.

_ Só imagino que coisas... – ridicularizou a jovem chefe dos aurores, Ana Luiza Andrade.

Sem mais conter as risadas, o tenente e o medibruxo perdem a compostura recebendo um olhar de censura de seu comandante.

_ Ana! – retrucou o homem sem ocultar o tom divertido na voz.

Com a saída do político, o ar tornou-se mais respirável e os planos militares, enfim, foram iniciados. Dumbledore foi honesto ao confessar sua ignorância sobre as táticas do governo, acrescentou que para a auror e seu grupo havia reservado uma missão em particular: proteger a família do bebê que através de uma profecia fora considerado o escolhido para deter o crescente Império de terror de Voldemort.

Gregório Silva, impaciente diante daquela interminável conversa, cedeu a sua conterrânea, a baiana Ana Luiza, permissão para reunir um número suficiente de combatentes para efetuar o encargo proposto pelo velho bruxo.

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Assim tomando a frente de 6 aurores, 5 soldados, 4 enfermeiros e 1 medibruxo, Ana Luiza viu-se no ápice de sua recente e meteórica carreira de auror. Há menos de 4 anos havia concluído seus estudos na Academia Brasileira de Magia (ABM) em Salvador. E graças as excelentes notas e as indicações de alguns professores, ingressara diretamente na Escola de Aurores, da qual se formara com todas as honras vindo a ocupar um cargo de confiança no Governo Bruxo Baiano. Agora, estava ali diante do primeiro pelotão que comandaria e de uma árdua tarefa: assegurar a segurança da família Potter, especialmente do filhinho do casal, Harry, o menino eleito.

_ Pelotão, alto! – Ana Luiza elevou a voz para executar sua primeira ordem: bater continência para as últimas recomendações de seu superior, o Coronel Silva.

_ Bom, muito bom minha auror! – referiu-se carinhosamente o Comandante. Poucos sabiam, mas Silva fora o primeiro instrutor de Ana, desenvolvendo pela jovem uma afeição paternal – À vontade, pelotão!

Em poucas palavras, o chefe da missão brasileira oficializou o posto de liderança de sua conterrânea e a missão especial destinada aquela comissão. Em seguida, Alvo Dumbledore reapareceu para comunicar a chegada de dois aliados que os guiaram, primeiramente, a sede da Ordem da Fênix, um grupo bruxo liderado pelo próprio diretor, e depois a residência dos Potter.

Com a partida de alguns de seus homens, Gregório balançou a cabeça negativamente, a situação inglesa era realmente desesperadora.

_ Senhor, acha que essa guerra tem jeito, senhor? – perguntou seu braço direito, o Tenente Menegaro.

_ Jeito!?! Sinceramente, tenente...O ministro desses ingleses é um cretino. Eles são comandados por um velho lunático e o trunfo deles é um bebê. Jeito não, eles precisam é de um milagre. – concluiu duramente o coronel ao mesmo tempo em que empunhava na mão esquerda um fuzil e na direita a varinha.

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_ Remus! Sirius! É bom vê-los inteiros! – cumprimentou os dois recém-chegados o diretor Dumbledore.

_ Sentimos o mesmo, professor. Mesmo que esteja cada vez mais difícil permanecermos intactos. – relatou tristemente o jovem Remus Lupin, de 20 anos.

_ Difícil, mas não o bastante para deterem Sirius Black. Enquanto eu estiver por perto, você pode ficar tranqüilo, Aluado. – abriu a boca pela primeira vez um rapaz altivo, moreno, de cabelos pretos rentes a nuca e olhos extremamente azuis.

O velho diretor como boa parte dos comandados de Ana Luiza, permitiu-se rir da gracinha do desconhecido Sirius Black. A auror o olhou de cima a abaixo, procurando por qualquer coisa que pudesse lhe explicar o quê de irritação que a fala arrogante do moço a provocou.

_ Diretor Dumbledore, se o senhor me permite a intromissão, eu pediria para que fossemos o mais rápido possível. Creio que como eu, meus companheiros estão esgotados e ansiosos por um repouso. – interrompeu a baiana.

_ Oh! Você está com toda a razão, senhorita Andrade. Vamos imediatamente! – tomou a liderança Dumbledore.

_ Aluado, quando chegarmos na Ordem, me faça um favor, sim?! – Remus observou o amigo sem entender – Me lembre de te agradecer por me arrastar até aqui – resmungou Sirius em um tom audível apenas a Remus.

E enquanto Lupin tentava se livrar dos tapas, antes de agradecimento e agora forçados, de Sirius, este se perdia contemplando a bela silhueta de uma certa mulata a sua frente.

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Os dias que se seguiram foram de uma calmaria quase incomoda, àqueles homens e mulheres que abandonaram casa e pátria, até então à toa. Alojados no Largo Grimmauld, sede da Ordem da Fênix, o esquadrão de Ana Luiza esperava pelas próximas instruções de Alvo Dumbledore. De acordo com as informações dos componentes da Ordem, a demora era rotineira e devia-se aos rigorosos processos de segurança da Família Potter, ninguém poderia entrar em contato com eles sem ser antes previamente investigado.
Durante aquele marasmo podemos dizer que o anfitrião, Sirius Black, fez tudo para Ana Luiza se sentir o mais em casa possível. Era incontestável o quanto àquela mulata tirava do sério o herdeiro dos Black.

Uma verdadeira baiana arretada, filha dos orixás, fiel as crenças de sua terra e sua gente, uma mulata na flor da idade, meramente 20 anos, com formas capazes de tirar o fôlego de qualquer homem, um olhar negro e misterioso como seus descentes africanos. Em suma, uma beleza genuinamente brasileira, mas, amigos, um gênio...Que gênio! Um senso aguçadíssimo de independência e segurança suficiente para inibir as pretensões de meia dúzia de abobalhados, como ela gostava de frisar.

Entretanto, esse termo não fazia jus ao seu mais novo galanteador. Sirius Black estava anos-luz a frente da maioria dos homens que tentaram algo com Ana Luiza. Além de irresistível fisicamente, ele comprovara que havia alguma massa cinzenta dentro daquele exuberante corpo. Se era incontestável a fixação dele pela brasileira...Incontestável também, que ela, dona de si, não era imune a ele.

O chamado! Dumbledore, enfim, convocara a todos para tomarem imediatamente o caminho de Godric’ Hollows, o caminho da casa dos Potters. Para a infelicidade antagônica da comandante brasileira, os dois primeiros guias Lupin e Sirius, os acompanhariam novamente.

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_ Protego! Pelotão, recuar imediatamente! – gritou Ana Luiza ampliando magicamente a voz para que todos a ouvissem.

Emboscados! Em sua primeira missão, em sua primeira ordem como superior...Ela caira no truque de guerra mais simplório. Feitiços malignos ou não cortavam o céu fazendo com que o alvoroço se intensificasse, entretanto, o terror estava meramente entrando em cena.

Partindo de algum ponto desconhecido o aterrorizador jato verde de um Avada Kedavra sagrou-se eficiente. A primeira vitima, o primeiro corpo a tocar o chão. Gilberto Souza, o soldado Souza, de 23 anos, mineiro...O primeiro brasileiro a ser abatido em solo britânico, sob comando da baiana. Algo que a célebre auror jamais se esqueceria, uma falha pela qual ela jamais se perdoaria...

Veteranos de guerra afirmam que você após algum tempo no fronte já não distingue o ruído de um cadáver colidindo com a sua última morada, a terra, os gritos de clemência ou de dor dos disparos sejam de varinhas ou de armas de fogo. Contudo, asseguram ainda os sobreviventes que a imagem e o som do primeiro companheiro perdido em confronto é algo insuperável, indestrutível. Como se tudo a sua volta por um instante, o instante da queda, se congelasse e desse foco apenas a tragédia a sua frente. Depois de presenciarmos uma morte, nunca mais somos os mesmos.

Todavia, se o seu redor é instantaneamente freado, os reflexos de seus inimigos não. E seria esse o maior estigma da brilhante carreira que Ana Luiza Andrade trilharia no futuro, ter estacado quando seu batalhão mais precisara de sua liderança. O que custaria uma outra vida...

Encurralados na viela de uma cidade fantasma, o pequeno grupo se viu em maus lençóis. As proporções eram de 3 comensais para cada membro honorário ou oficial da Ordem da Fênix, o desespero exalava dos poros daqueles que estavam em desvantagem.

Uma risada sinistramente familiar distraiu Sirius Black pouquíssimo, estritamente o suficiente para ele ser atingido no peito por um Cruciatus. Estatelado no chão, ele berrava mais por tentar conter a sensação avassaladora de dor que o tomava por inteiro do que propriamente pelas conseqüências de tortura que aquele feitiço causava. Ele empreendia um esforço gigantesco para sustentar o olhar a altura do “homem” de preto que o atacara. E a resposta para tal resistência viria com a descoberta da identidade daquele “servo” de Voldemort:

_ Olá, primo! Que ótima hora para uma reunião familiar, não é? – revelou-se Belatrix Lestrange, prima de Sirius.

_ Eu esperava que fosse você! – cuspiu raivosamente as palavras Sirius, ainda caído.

_ Não está feliz em me ver, meu querido primo? – satirizando a expressão enojada do parente, ela continua – Oh! Você não tem idéia de como isso fere meus sentimentos, Six! Crucio!

O familiar da comensal já preparava o corpo para mais uma sessão de dor infinita, quando, inesperadamente os olhos de seus companheiros atentaram contra a ameaça:

_ Protego! – falou Ana Luiza postando-se à frente de Sirius.

_ Que falta de educação, priminho. Nem me apresentou a nova namoradinha! Sectumpsempra! – atacou Belatrix.

_ Revides! – a brasileira rebateu o feitiço mandando-o de volta a comensal. – Sirius, você consegue se levantar? – o ferido acenou afirmativamente – Bom! Agora, rápido, me responda: é possível aparatar perto ou mesmo na casa dos Potters?

_ Er...Nas proximidades é possível, mas...Mas... – travou o moreno.

_ Diga logo, eu preciso tirar meus soldados daqui imediatamente! Não temos condições de vencer essa batalha, estamos cercados, será que você não enxerga isso?

Os berros daquela mulata, que o ajudava a equilibrar-se, fez com que ele despertasse para o que acontecia ao seu redor. Todos seriam mortos senão abandonassem aquela luta logo. Sirius havia jurado que, se necessário, morreria para proteger seu melhor amigo, Tiago Potter, e sua família, porém, um sacrifício naquela situação era no mínimo dispensável, para não citarmos idiota.

_ Sim, podemos aparatar há pelo menos um quilometro da vila em que eles estão escondidos. Só que eu preciso da ajuda de Remus!

_ Então, ande homem! E deixe sua doce priminha por minha conta! – sorriu malignamente a auror baiana.

_ Isso tudo só por que ela lhe chamou de minha namorada? Oh, que Merlin me ajude a nunca lhe pedir em casamento! – disse ele assustado antes de fazer menção de ir procurar por Lupin.

_ Ei, não se preocupe. – falou Ana Luiza atraindo a atenção de Sirius – Se realmente for o caso, eu faço o pedido a você! – finalizou dando as costas a um abobado Black e partindo de volta a batalha.

Gritos, lamentações e ataques eram vociferados há alturas capazes de levar a loucura o mais são dos homens. O cenário grotesco beirou o inferno quando a comandante assistiu de camarote e impotente a morte de mais um de seus compatriotas: uma enfermeira...Desarmada! Os capachos de Voldemort não se limitaram a tirar-lhe a vida, quiseram desfrutar do satânico espetáculo, a torturaram e por fim, cortaram-lhe a garganta com uma adaga. O sangue de mais uma brasileira misturou-se ao solo no momento em que Ana Luiza, dominada pelo ódio, silabou o seu primeiro: avada kedavra! O comensal ainda mantinha na mão a pequena faca manchada de sangue quando foi atingido e instantaneamente morto.

A poucos metros, Sirius berrava a Remus que negava-se a conduzir seus aliados a casa do amigo. Indignado pela passividade do companheiro, Sirius mandou às favas a luta e os cuidados que deveria manter e avançou sobre Lupin, erguendo-o pela gola da gasta camisa.

_ NÓS TEMOS QUE TIRAR ESSA GENTE DAQUI AGORA. E EU PRECISO DA SUA AJUDA PARA ISSO!!! – gritou raivosamente Black.

_ Mas, Sirius! Vamos colocar Tiago em perigo fazendo isso! – tentava se livrar das mãos que quase o agonizavam, Lupin.

_ Se não sairmos daqui imediatamente, NÃO VAMOS VIVER PARA COLOCAR E NEM LIVRAR PONTAS DO PERIGO!!! – argumentou pela última vez soltando o relutante amigo.

O primo de Belatrix Lestrange liberou-se do fardo que era suspender seu melhor amigo, apenas para contemplar o caos. Por mais que girasse seus olhos por todas as direções imagináveis e inimagináveis era insuficiente para desfocar o mínimo que fosse daquele martírio. Cabeças iriam rolar e uma coisa ele tinha certeza, uma delas seria a de Remus, caso ele não cooperasse.

Todavia, o pronunciar de um “avada kedavra” trouxe-o átona. Nem tanto pela azaração, mais pela conhecida voz. Era Ana Luiza. Ela que confessara numa das monótonas noites na casa dos Black que nunca conseguiu lançar o feitiço mortal, agora o utilizava sem o menor receio, algo se passou com ela durante o misero momento em que ele se distraiu ocupado com Lupin. Algo se passou com ela, algo que ele teria que descobrir, contudo, não ali.

Uma maldição ricocheteou perto de Sirius lançando um outro brasileiro metros longe. Senão bastasse ingleses morrerem em uma estúpida guerra, outros agora envolviam-se em uma situação completamente insana. Volveu novamente o olhar a baiana que duelava bravamente próxima dele, distinguiu gotas de lágrimas e sangue contrastando com a negritude de seu rosto. Disparou alguns feitiços não verbais em comensais que puseram-se em seu caminho. Chegou, com algum custo, onde Remus estava.

_ Sinceramente, eu espero que você esteja guardando cada momento e movimento desse pequeno espetáculo. – debochou Sirius enquanto disparava mais proteções e azarações – GENTE MORREU AQUI, ALUADO! VOCÊ ME OUVIU? MORREU! E não foram ingleses...Você tem consciência do que significa? Essas pessoas – disse virando para contemplar os soldados brasileiros que resistiam apesar da iminente derrota – apenas hoje, fizeram mais do que a maioria dos malditos britânicos que estamos protegendo, e você não reconhece isso? – finalizou berrando na cara do amigo.

_ Não precisa dizer o que está evidente! – gritou já exausto Lupin. Moveu a cabeça em direção ao pelotão estrangeiro – É por ela, não né? – referiu-se a Ana Luiza.

_ Por ela e por cada um deles. Melhor do que ninguém, você sabe que estou disposto a arriscar e perder minha vida protegendo Pontas, e principalmente, meu afilhado. Mas, morrer aqui não é sacrifício, é desperdício.

_ Como queira, Almofadinhas! Você sabe o que fazer...Precisamos de um telepata ou de um legilimens. Então, rápido!

Sirius, com a cobertura de Lupin, fez o caminho inverso às pressas para chegar em Ana Luiza e verificar se contavam ali com um bruxo capaz de enviar mensagens telepáticas à uma pequena multidão. Assustado, ele foi ferido com um feitiço desconhecido no ombro, que além de rasgar a camisa e a pele profundamente, despertou uma verdadeira cascata de sangue, cobrindo o braço dele de vermelho por completo. Ao aproximar da comandante brasileira, ele sussurrou a necessidade e ela se prontificou a tal ato, o, quer dizer, a legilimens estava encontrada.

Mentalmente indicando aos seus soldados uma retirada estrategicamente e armazenando uma espécie de “palavra-chave” em cada cérebro, Ana Luiza indiretamente ofereceu-lhes a pista do esconderijo: Godric Hallow.

Ao mesmo tempo, Sirius e Remus bradaram as varinhas e silabaram: portus. Um tipo de portal apareceu e por mais que os comensais tentassem seguir por ali, eram impedidos. Somente os que possuíam o “código” eram, digamos, aceitos na passagem até o vilarejo em que se escondiam os Potters.
Um dos militares sobreviventes, juntamente com o relutante Remus, trouxe os corpos das vítimas fatais.

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_ Prometo que vou ser rápido. – Sirius entrou inesperadamente no cômodo que Ana Luiza ocupava na propriedade da família Potter – Há dois dias uma dúvida vem me consumindo: o que eu encontraria aqui? Ana ou apenas o fragmento do que fora aquela mulata? – concluiu.

_ Fragmento, espectro, fantasma ou como queira me chamar...Tenha a certeza de que isso – disse referindo a si mesma – irá sobreviver!

_ Dói? – preocupou-se verdadeiramente Almofadinhas.

_ Fisicamente? – limitou-se a responder sem encara-lo ou deixar de sussurrar.

_ Não! Fisicamente, eu compartilho da certeza de que esta aqui a minha frente irá, sim, sobreviver. – falou mansamente aproximando-se – Acho que entendi... – retomou a fala e a proximidade sentando-se na ponta da improvisada cama que ela ocupava – Você busca por salvação!

_ Como? – exclamou olhando-o nos olhos pela primeira vez.

_ Você quer absolvição por ter matado aquela gente que, eventualmente, estava tentando nos matar. A sua dor busca por alívio, você por salvação.

_ Tolice, não é? Digo...É loucura me martirizar por comensais, mas...Mas, eu não consigo deixar de pensar que...Não aqui, não agora, isso se voltará contra mim.

_ Me desculpe...Eu, er...Não posso te salvar! – confessou desolado pronto a deixar o local.

_ Jamais esperei por isso, Sirius. – retrucou amargamente Ana Luiza.

Ele permaneceu estático, visivelmente afetado. Escutar a voz dela tão áspera e ao mesmo tão estigmatizada...Esquisito, que um antigo indício de avanço como o de ser tratado pelo primeiro nome, agora ali, caísse na mesmice. Como soube, era costume dos brasileiros atender pelo nome amigo ou desconhecido. Mantendo novamente suas visões em campo comum, despejou:

_ Como não? Sou a primeira pessoa com quem você troca mais de três palavras nas últimas 48 horas! – a brasileira recua, volvendo a face em direção oposta a ele – Não se torture, você não foi a primeira e nem será a última a matar para proteger, a matar para não morrer...

_ Engraçado como essa colocação não me traz muito conforto. – desdenhou pesarosa.

_ Sinceramente, não há muita coisa que traga. Talvez, aquele clichê de todo comandante: “ou eles, ou nós”. – ela permitiu-se formular um breve sorriso, ele acompanhou o riso culpado, ainda havia a última e dolorosa constatação – Quanto a sua preocupação de um futuro pós essa existência, bom, como eu já disse, não posso te salvar. Não posso nem ao menos garantir a sua absolvição, todos passam por isso, acredite. Todos aqueles que acham que matar é absolutamente imperdoável.

_ Uma confissão? Quer dizer, que você em algum tempo já se lamentou por um comensal? – Ana Luiza deu corda para o “desabafo”.

_ Sim, é inevitável. Sentir raiva, ódio é natural, é humano, não é? Tirar a vida de outro que foge a regra. E essa exceção, fere, e me perdoe por dizer, não cicatriza. Não há cura para a culpa. Há a lógica, nada mais. Se existe algo além do aqui e agora, como você definiu, em que condição nós dois nos encaixaríamos? Na mesma daqueles que matar e destroçar é uma forma de vida e não de sobrevivência, como foi para nós? Foi esse raciocínio que me colocou de pé depois do meu primeiro avada kedavra.

_ Gostei da sua lógica, Sirius Black. Não é nenhuma teoria da relatividade, mas tem potencial. – sorriu agora completamente a jovem.

_ Reconheço que não é genial, porém, em uma guerra sendo suficiente para sobreviver está bom! Ah, claro que se for capaz de arrancar elogios e sorrisos de uma baiana que anda por ai será... – com uma bufada enfurecida dela, ele se cala.

_ O extremo do convencimento e da soberba. – fartou-se do segundo sorriso em dias a moça.

_ Eu me limitaria ao animador, no entanto, se você avalia assim...Eu preferiria retornar às minhas “suposições”. Estou autorizado? – com um balançar positivo de cabeça ela confirmou – Uma noite em que, infelizmente, trocamos APENAS confidências, você me assegurou que nunca pode lançar uma azaração mortal, agora, acha esse “avanço” ruim?

_ Não citaria isso como avanço, quem sabe, uma mudança. Ao meu ver, necessária e desprezível ao mesmo tempo...

_ Necessidade, era esse o contra-peso. Às vezes efetuamos ações e atitudes em desacordo com a nossa consciência e por que fazemos? Por necessidade. Não somos heróis, por mais que eu a ache perfeita para esse papel – brincou o maroto – mas, todo herói precisa de pessoas assim, que assegurem as condições para ele salvar o mundo. Não chegamos ao patamar de santos, apenas elaboramos a base para que os verdadeiros operem seus milagres. – finalizou.

_ Bases de uma pirâmide? Ou ainda, instrumentos de uma operação? Não o todo, e sim, uma parte necessária do conjunto. Ah! Eu sabia que havia algo a mais do que essa sua bundinha para justificar o meu súbito interesse por você, Six.

Bundinha!?! Six!?! Essa baiana possuía um dengo a mais, ou como um ou outro conterrâneo dela gostava de frisar, era arretada, quer fosse o que fosse aquilo! Uma cara de completo pateta e o olhar beirando a ofensa foi demasiado pouco para o que se sucedeu a seguir...

Ana Luiza chegou perto, perto demais do paralisado Black e sem mais meias, ou melhor, inteiras palavras o beijou. Assim, simples. De imediato, ele, fora de órbita, não concebeu em que rotação girava aquele mundo a que fora transportado. A reação de Sirius veio amansada, atrasada, calorosa e impecável. O riso infantil dela atrapalhou o quê de romance ali exposto. Sem cogitar abrir os olhos e estragar aquele ápice, ele, para recuperar a dignidade, tomou primeiramente a palavra:

_ Espero que eu tenha compensado a falta de genialidade das lógicas... – sussurrou debochado sem quebrar o contato entre eles.

_ Digamos que todo o conjunto da obra foi impecável – devolveu a tirada Ana Luiza – Você foi fiel a sua palavra, não pode e nem quis me absolver, tampouco, me salvar. Só que muito acima disso e de nós mesmos, Six, me fizeste acreditar que um dia um Alguém superior irá me julgar com uma justiça inatingível para nós. Certo ou errado é esse raciocínio, é esse seu raciocínio que me colocará de pé a partir de agora.

_ Quem sabe... – Sirius refletiu divertido enquanto depositava um mero selinho nos lábios dela – Eu deva investir nessa coisa de fiso...Filosofia trouxa! Quem sabe, eu posso ser o próximo Sócrates, ou Platão, ou Aristóteles...

_ CALADO! – exigiu a brasileira estapeando a própria testa pela ridícula brincadeira – E me responda algo de útil, que dia da semana é hoje?

_ Hã...Sexta-feira!?! – arriscou sem entender o que havia de importante em datas.

_ Não está ouvindo? – referiu-se ao som de batuque – Six, por acaso você já foi a uma roda de samba?

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“Os meus olhos coloridos
Me fazem refletir...(...).”


O batuque ritmado em dois, três tambores e tamboris, improvisados pandeiros ou mesmo caixas que pudessem produzir algum som, tudo tão simplório e todos ali parados, batendo palmas segundo indicado pela melodia e admirados.

Com a vigília dos dois primeiros dias reforçada, entretanto, sem nenhum mal ser flagrado na sexta-feira, de acordo com a tradição do batalhão o matar das saudades da pátria amada, idolatrada, Brasil, era com a musicalidade. E como se houvesse precisão de mais algum subterfúgio para o completo fascínio de Sirius pela brasileira, a última dose do encantamento apresentou-se dando continuidade a festividade dos soldados, Ana Luiza encorajada por alguns mais chegados tomou, no extremo da palavra, a roda e cantou sendo e honrada de ter “sangue crioulo”:

“...(...)Você ri da minha roupa
Você ri do meu cabelo
Você ri da minha pele
Você ri do meu sorriso”


Tomados pela curiosidade em relação à estranha movimentação no exterior de sua residência, Tiago acompanhado de sua mulher, Lílian, que carregava no colo o pequeno Harry que logo completaria o primeiro ano de existência, dão-se ao luxo de pisar no jardim e conquistados de imediato pela musicalidade, colocam-se ao lado dos amigos Sirius e Remus. Entre o Black e a Andrade era impossível a ausência de um flerte agora mais sereno, observador. O sentimento se aprofundava no interior de ambos, aflorar uma paixão repentina, seria normal. Sentir aquilo era extraordinário...

“A verdade é que você,
Tem sangue crioulo
Tem cabelo duro
Sarará crioulo!”


Tem sangue crioulo! Às avessas dele, Ana Luiza mostrava-se fiel e orgulhosa de suas raízes brasileiras, negras, familiares. Intrigante, no momento em que batalhavam em uma luta imbecil contra débeis conceitos, ela cantava exatamente uma música que narrava o oposto, o riso da inveja que em verdade quer ser igual ao inferiorizado. Igualdade! Conquistado pela baiana, pelo gingado da mesma, pela essência guerreira e irreverente daquele povo que mal conhecia, conquistado...Arretadamente, com o perdão da gramática, apaixonado!

Ao fitar pela primeira vez o semblante do menino eleito, a auror deixou-se derreter. E desenvolvendo em instantes e olhares uma intimidade de anos com Lílian, pegou no colo o pequenino que transbordava ares de entusiasmo pela barulhenta novidade. Agradando plenamente o garotinho, conduziu-o até pertinho dos atabaques. Soquinhos de uma mão minúscula fizeram ecoar um ruído que trouxe o sorriso cheio do bebê, que afastado da percussão prosseguiu batendo leves palminhas até retornar, faceiro como só ele, ao colo da risonha mãe.

“Sarará crioulo, sarará crioulo,
Sarará crioulo, sarará crioulo!”

(Sandra de Sá – Olhos Coloridos)

Aplausos e pedidos discretos de bis, que não foram correspondidos, finalizaram a pequena volta à vida da líder da missão brasileira. Importunado pelos amigos marotos, Sirius dirigiu a então cantora enlaçando-a pela cintura como a um precioso prêmio:

_ Você deve ao mundo um bis, sabia? – sussurrou-lhe o inglês.

_ Ao mundo, não a você, Black.

_ Caso não se lembre, preta, você rejeitou o mundo. E tenho a ligeira intuição que isso não se repetirá comigo. Estou certo? – questionou-a sorridente.

Dando de ombros, Ana Luiza o incitou a tomar, desta vez, a rédea da situação. E em explosão de aplausos e assobios nada abaixo do que pouco antes privilegiavam a voz dela, o romance do amigo de quem deveria ser protegido e a responsável pela proteção é descoberto, em versos de realidade, é delineado em formas concretas.

***************

A neve já não caia e acumulavasse nos solos britânicos, em contradição, as notícias e as ações de Lord Voldemort que seguiam-se horrendas e, miseravelmente, bem sucedidas. Excluindo as investidas contra a família guardada pela legião brasileira, esta permanecia intransponível. Nos três meses transcorridos desde a instalação da tropa ali em Godric Hallow, duas tentativas foram interceptadas com boa antecipação do pelotão e, principalmente, pela liderança e ação imediata da jovem auror.

Sirius e Remus de tempos em tempos também eram solicitados por Dumbledore para missões sigilosas a favor da Ordem da Fênix, nessas circunstâncias não era necessária uma grande percepção para averiguar sintomas de aflição e medo nas feições de Ana Luiza. Seu envolvimento com o maroto era de conhecimento dos mais íntimos dele e dela. Até mesmo, o “pai” militar da moça, o Coronel Silva, em passagem para avaliação do desempenho dela como comandante, é devidamente informado quanto ao caso amoroso de sua favorita. Ressabiado, ele conhece Sirius, e volta a suas funções sem aprovar ou condenar o namoro.

O verão chega ao cenário da Inglaterra, trazendo consigo ares mais amenos e festivos: celebra-se o primeiro aninho de Harry Potter. Na festa improvisada, o amor de brasileira e britânico é, enfim, consumado na plenitude humana e carnal: Sirius e Ana Luiza dormem juntos pela primeira vez. A partir de tal entrega, desenrola-se o restante da missão, em controvérsias do que se imaginava, sem grandes perdas ou desgraças. De fato, os brasileiros fazem extraordinariamente bem o seu trabalho.

Agosto toma seu lugar de direito no calendário inglês, contanto com isso a troca das forças brasileiras. Ana Luiza após longo e exaustivo semestre longe de sua pátria retorna a sua amada Bahia, deixando para atrás a história que, definitivamente, seria a do grande amor de sua vida. Promessas e declarações são trocadas ao decorrer do tempo em cartas com Sirius, estampando-se a saudade que envolvia a ambos e os planos futuros que traçavam casamento e a mudança dele ou dela para seus respectivos países.

Contudo, em cenário tempestuoso como o de guerra, é irremediável que paz e silêncio em demasia é a combinação fatal de tragédia...

Ana Luiza Andrade arrastou-se da cama até a cozinha de sua casa na parte baixa e menos nobre de Salvador, era a terceira vez naquela mesma semana que aquele mal estar a atacava desde cedo. Seu travesso irmão Caetano, de dez anos completados enquanto ela estava de serviço, causava o estardalhaço seu de cada dia no café. Seu pai, o pescador Ismael, lia atentamente o jornal Correio Soteropolitano antes de aventurar-se em alto-mar. Sua mãe, Amélia, servia religiosamente a primeira refeição daquele dia. Com a saída dos dois homens, do adulto para o mar e do pequeno para a escola, a matriarca da família Andrade preocupa-se com a saúde de sua filha:

_ Vexe Ana, cê ta aperreada, minha filha! É alguma coisa no trabalho?

_ Não, não mãe! No Ministério ta tudo em ordem...Eu só acordei meio indisposta hoje!

_ Venha cá, Ana. Diga uma coisa aqui pra sua mãe, não é de hoje que cê ta acordando assim indisposta, não é mesmo? – alarmou-se a senhora.

_ Agora que a senhora perguntou...Sabe que não é a primeira vez não...Acho que... – foi cortada pela mãe.

_ Vixi! Se minha intuição não falha, como nunca falhou, esse não foi o segundo e nem será o último aborrecimento que você irá ter, filha. Me fale a verdade, que tipo de liberdade você tomou com aquele seu moço inglês? – levantou uma suspeita Amélia.

_ O Sirius? Mas, o que ele pode ter haver com...Oxalá, mainha! A senhora realmente acha que eu possa estar...? – receia completar a frase a jovem.

_ De barriga? Olhe, que já faz um par de dias que eu venho observando que essa sua indisposição pode ser alguma coisa mais séria! Por Oxalá e nossa Mãe, Iemanjá, acho que cê devia é consultar com um doutor, fazer algum teste ou o que for! E quando confirmar aquilo que eu já sei, trate de avisar imediatamente o inglesinho.

Com a folga dada pelo superior, o Coronel Silva, Ana Luiza seguiu os conselhos de sua “mainha”. Respeitada por toda a população da baixa Salvador, a Mãe Amélia era conhecida pela clarividência e pela percepção de energias emanadas de pessoas e locais. A jovem baiana sabia o poder de acerto de sua mãe e se comprovadas as desconfianças, uma outra complicada missão se formaria: como comunicar algo tão singular a Sirius? Mantinham um regular contato através unicamente da coruja que ele a enviava sempre. Ele estava embrenhando em algum lugar ermo executando uma tarefa para Ordem como havia lhe contado na última correspondência. Ela seria capaz e sucinta o suficiente para explicar e contar em uma mera carta o que se passava em seu ventre?

Muito mais confiável que todas as bulas e laudos médicos, a previsão de dona Amélia para muitos é mais sagrada do que as leis que regem as vidas de cada um de seus fiéis. Agora era oficial: Ana Luiza Andrade, auror baiana de 20 anos, esperava há aproximadamente dez semanas um filho de Sirius Black, jovem inglês de seus 21 anos.

Foram quatro noites praticamente em claro aguardando amargamente a resposta de Sirius e formulando mentalmente a melhor maneira de compartilhar com ele, a, até então, assustadora notícia de sua gravidez.

Se em pormenores pretéritos, fora narrado que a combinação para tragédias história seria silêncio e paz em demasia, a receita não se aplica a repentina gestação de nossa compatriota, muito pelo contrário...No amanhecer do quinto dia, a moça fora desperta pelo piar quase desmaiado de uma pequenina coruja branca: era a carta de Sirius! Levantando-se subitamente para apanhar a correspondência, ela é novamente retirada de seu mundo de sonhos, ora agora reais, pelos gritos pavorosos de seu irmão.

Quando adentrou na cozinha notou a causa de todo o horror: a manchete do Correio Soteropolitano jazia em letras garrafais: “Morte de Voldemort traz paz ao Reino Unido”, acompanhada da macabra cobertura: “Preso Sirius Black acusado de trair e causar as mortes de Lílian e Tiago Potter.”

Levando a mão a barriga e a tristeza como flecha ao coração, Ana Luiza pasma pelo choque sem conter o mar de lágrimas que se sucedeu ao mar vermelho de sangue...Ela sentia muito mais do que lágrimas, tristezas e planos futuros naufragando, sentiu evaporar a esperança que crescia dentro de si, sentia morrer o seu filho...

_ MÃE!!!

Sussurrou no último fiapo de voz que conseguiu soltar de sua garganta antes de cair inconsciente com a carta de Sirius ainda em mãos...

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