Um pequeno empréstimo



- O que foi que aconteceu? Você está pálida!

Lúthien encarava Mia, que havia se levantado e acendido a luz do quarto. A ruiva andava de um lado para o outro e não conseguia falar nada. Estava muito apreensiva, o cabelo fofo completamente despenteado e caindo-lhe sobre o rosto. De repente, ambas ouviram uma batida na porta. Era Hermes, que não esperou pela resposta para poder entrar:

- Acho que tem alguma coisa errada. Está tudo bem com vocês?

Logo atrás dele entrou Harry Potter, encarando Mia com os olhos bem abertos e a cicatriz brilhando na testa ligeiramente suada. Ele usava uma capa de inverno sobre as roupas e parecia pronto para sair. Hermes, que também estava vestindo um blusão grosso de moletom, notou a apreensão da amiga, indicou Harry e começou a explicar:

- Eu estava quase adormecendo quando o Potter aqui bateu na minha porta. Ele disse que eu precisava vir te acordar, Mia. E eu queria entender o que diabos está acontecendo, porque essa história está me deixando realmente confuso. Ele disse que vocês tiveram um sonho... como podem sonhar a mesma coisa?

- Acho melhor nos vestirmos – Mia apenas orientou, dirigindo-se para Lúthien enquanto abria a porta do armário para pegar uma roupa quente. – Vamos ter que fazer uma viagem.

- Uma viagem no meio da noite? Com esse frio? Você só pode estar ficando maluca, Mia! – Hermes ponderou, tentando entender o que acontecia com a amiga.

- Nós precisamos ir para Hogwarts! – ela disse, com urgência na voz.

Hermes olhou para Lúthien, procurando algum apoio para tentar persuadir Mia daquela idéia maluca. Eles sequer sabiam onde ficavam os terrenos da Escola de Magia e Bruxaria e, pelo que o Oráculo havia dito, Hogwarts estava nas mãos da Ditadura Voldemort e era um instituto de ensino de Magia Negra. A ruiva só poderia estar enlouquecendo. Mas Lúthien não foi muito encorajadora enquanto fitava os amigos, sentada na cama e coberta com uma manta rosa desenhada com ursinhos. Hermes resolveu tentar ele mesmo fazer com que Mia desistisse da imprudente idéia:

- Você sabe muito bem que Hogwarts está nas mãos de Voldemort! Você pretende ir até lá e fazer o quê? A não ser que queira dizer a ele: ”Boa noite, senhor bruxo das trevas que quer me matar. Vim aqui tomar um chá com você e seus Comensais”. O que deram para você beber no jantar, hein, Mia?

- Hermes, você não precisa vir conosco – era Harry quem falava, tocando no ombro do menino e fazendo com que este o encarasse, os olhos cinzentos muito parecidos com os do próprio pai. – Isso é algo que eu e Mia pretendemos resolver, embora eu saiba que ela prefira ter a companhia de vocês dois.

- E o quê exatamente vocês pretendem fazer? – perguntou Lúthien, apontando seus grandes olhos negros para Harry.

- Nós vamos resgatar o Daniel – ele disse de maneira firme, recebendo o apoio de Mia com um aceno determinado de cabeça.

Lúthien apenas concordou, voltando a se calar em seguida, enquanto Hermes era sacudido por uma incrédula gargalhada. Tentando respirar novamente, ele começou a falar, o tom de voz carregado de ironia:

- Vejo que você conseguiu persuadir até mesmo o grande Harry Potter para a sua empreitada, Mia. Parabéns! – e, nesse momento, o loiro desatou a bater palmas, enquanto continuava caminhando pelo quarto. – Sim, nós vamos até Hogwarts resgatar o Daniel, eu, você e Lúthien, três adolescentes, acompanhados de um bruxo que, até outro dia, mal se lembrava de quem era e agora chega aqui querendo fazer parte da família. E destruir a minha.

Hermes encarou Harry com os olhos inflamados de fúria, mas este continuava calmo quando respondeu:

- Foi uma escolha do seu pai vir até aqui me ofender. Eu fui bem recebido nessa casa porque agi de acordo com o que sou. Ele não o foi porque agiu exatamente como é e sempre será. Entenda isso, Hermes, eu e Draco Malfoy seremos sempre inimigos, não importa o lado em que ele estiver.

- Mas ele nunca vai deixar de ser o meu pai! E o homem que minha mãe ama, se você quer saber! – Hermes defendeu o senhor Malfoy, alterando o tom de voz para atacar Harry com as palavras. A calma do homem tinha o poder de irritar ainda mais o menino.

- Mas agora você não vai gritar mais, Hermes – disse Mia, aproximando-se do amigo e tocando-lhe os lábios com a ponta dos dedos antes de prosseguir. – Se você quiser esquecer suas desavenças com Harry para tentar salvar seu melhor amigo, eu aceito que você venha conosco. Mas, se caso contrário, você quiser ficar, eu também compreenderei. O que eu não posso deixar é que você grite e acorde toda a casa, de forma que os membros da OdRR nos impeçam de sair.

Hermes virou as costas para a amiga e permaneceu calado por alguns instantes. Pisava duro no chão de madeira do quarto, os pensamentos fervilhando na mente. Escolheria continuar nutrindo a raiva que guardava por aquele que havia destruído sua família ou iria salvar Daniel, que ele já começava a acreditar que pudesse estar vivo? Por fim, quebrou o silêncio:

- Era o que eu devia fazer – murmurou, entre dentes. – Acordar a casa inteira e dizer o quanto vocês são malucos. Mas não vou fazer isso. Se você e Lúthien pretendem ir a algum lugar, Mia, não pensem que vou deixar que sigam sem mim, ok?

Mia sorriu diante da concordância do amigo, embora ele lhe tenha virado o rosto quando percebeu a atitude. Satisfeito, Harry fez sinal silenciosamente para que eles o seguissem. Lúthien só teve tempo de jogar um blusão por cima do pijama, saindo com as calças largas e coloridas do agasalho de flanela. Mas não parecia se importar nem um pouco com isso.

Rumaram para o jardim da mui antiga e nobre casa. Harry, munido da varinha de cauda de unicórnio que ganhou dos gêmeos, murmurou um feitiço para abrir a porta da frente sem fazer barulho. Pé ante pé, rumaram até um galpão de madeira que ficava atrás de algumas árvores mais frondosas do jardim, no qual Mia já havia reparado, mas que não julgara importante até aquele momento. Harry usou o mesmo feitiço que havia usado para abrir a porta da casa e retirou de dentro do galpão quatro vassouras de palha meio esfiapadas nas pontas e bastante gastas. Entregou uma para cada um deles. Os olhos negros de Lúthien ficaram ainda mais abertos quando ela disse:

- Vamos voar em vassouras como os bruxos de verdade?

- Nós somos bruxos de verdade, Lúthien – Harry sorriu diante da constatação inocente da menina. – E, por isso, vamos sim voar nessas vassouras. Espero que Fred e Jorge não se importem de as tomarmos emprestadas. Agora, escutem, é simples comandar uma vassoura, ok? Vocês só precisam dar impulso para que ela suba, e movimentar o corpo para os lados que querem que ela voe. Quando descermos, apenas arqueiem as costas de forma a empurrar o cabo da vassoura para baixo. Se tiverem problemas, eu estarei com vocês, basta chamar pelo meu nome. Eu acho que sei voar bem... ao menos me lembro de algo parecido.

- Você não só sabe voar bem, como foi o mais jovem apanhador de quadribol do século! – disse Lúthien, surpreendendo a todos com a informação antes de completar – Foi o senhor Weasley quem me disse isso uma vez.

- Bom saber – Harry sorriu, como se uma ligeira lembrança dos tempos antigos o atingisse depois do comentário de Lúthien, algo como um grito de “Weasley é nosso Rei”, ou coisa parecida.

Ele sacudiu a cabeça e passou a mão pelos cabelos negros, espetando-os na parte de trás. Aquilo deu forças a Mia para continuar. Ela sabia que precisavam seguir em frente, mesmo que Daniel tivesse pedido para que não fossem buscá-lo. Ela não conseguia entender o porquê, mas sabia que precisava tirá-lo de lá. Não fazia mais sentido deixá-lo sofrer enquanto sabiam que ele estava vivo. Ela só não entendia como o amigo não havia sido prontamente assassinado por Voldemort, mas não queria pensar nisso agora. O importante era que ele ainda vivia. E que estavam indo buscá-lo para tirá-lo daquele inferno.

- Prontos? – Harry perguntou quando todos já estavam posicionados nas vassouras. – Então subam!

E os quatro ganharam os céus noturnos de Londres, sentindo o vento gelado que entrava por todas os lugares onde as roupas não conseguiam cobrir completamente. Mia sentiu o nariz congelar, mas o coração estava absolutamente aquecido. Ela voava para recuperar Daniel. Ela voava de volta para o lugar onde havia deixado um pedaço de si mesma. E voava para recuperar esse pedaço de volta para si.

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