Eternos rivais



Depois de se recuperar do breve desmaio, Mia tentou inutilmente conversar com Harry Potter nos dias que se seguiram, mas era como se o homem evitasse ficar nos lugares onde ela estava. O sábado, enfim, chegou, e o primeiro treino da OdRR estava marcado para aquele dia. Portanto, o senhor Potter não teria como fugir. Apesar de saber que haveria montes de bruxos e bruxas entre eles, Mia estava determinada a conseguir conversar sobre Daniel.

O ritual foi uma idéia mais que perfeita para comprovar que Lúthien era mesmo a terra, o quarto elemento que faltava para completar o ciclo. De início, a intenção de Mia foi apenas provar que a loirinha compartilhava do mesmo poder que a unia a Hermes. Mas fato era que o ritual foi muito mais longe que apenas a prova concreta da existência do elemento terra. Por meio da invocação de cada um dos três elementos naturais que eles representavam, a água foi capaz de, onde quer que Daniel estivesse, se manifestar também. Embora os outros tentassem convencer a ruiva do contrário, ela tinha certeza de que Daniel ainda vivia em algum lugar. Seu coração não podia negar isso, e ela sabia que o único que concordava com ela, mesmo que silenciosamente, era o senhor Potter.

Mia e Lúthien foram as primeiras a entrarem na sala secreta, onde Fred e Jorge passaram toda a manhã fazendo os preparativos para o treinamento. Havia algumas almofadas coloridas e fofas, que seriam usadas para praticar estuporamento. Penas se espalhavam pela escrivaninha, para que eles pudessem praticar levitação. Bichento estava na sala também, e Mia ficou desconfiada de que o gato seria usado para algum feitiço de transfiguração. Ele, no entanto, não demonstrava nenhuma desconfiança enquanto se esparramava pelas almofadas coloridas, espreguiçando-se de tempos em tempos e soltando pequenos miados de puro deleite. Lúthien correu até Bichento para lhe afagar a barriga, enquanto Mia se virava para tio Jorge:

- Vocês reforçaram os feitiços protetores da sala?

- Claro que sim, minha querida sobrinha – tio Jorge falou, o olhar traduzindo um visível orgulho por terem conseguido reunir os Renegados e começarem a resistência à Ditadura Voldemort. – Não queremos nenhuma participação surpresa da Polícia Negra em nossa ”festinha”.

- E essas varinhas? – a ruiva se dirigiu a tio Fred, que organizava uma pilha de varinhas de diferentes materiais dispostas numa das mesas. – Para que vão servir?

- São varinhas produzidas por nós – começou a explicar tio Fred, apoiado pelo irmão. – Conseguimos contrabandear cernes mágicos, e madeira não é problema entre os trouxas, não é mesmo? Se você não se esqueceu, Mia, Voldemort destruiu todas as varinhas dos Renegados. Nós só temos varinhas aqui porque as fizemos. Mas queremos ver quais delas se adaptam melhor a cada bruxo. Por isso, buscamos mais opções.

- Não são como as do Olivaras – comentou tio Jorge. – Ele era o melhor fabricante de varinhas do Beco Diagonal, mas não sabemos o que aconteceu com ele durante a Guerra. A única coisa que conseguimos descobrir foi que Olivaras foi raptado por Voldemort para que o lado negro tivesse as melhores varinhas mágicas. Depois da vitória, nunca mais tivemos notícias dele, por mais que o procurássemos. Mas veja, os membros da estão chegando, entrem, entrem!

O senhor e a senhora Weasley foram os primeiros a adentrar a sala, seguidos pelo casal Longbottom e vovó Molly. Tio Gui e Fleur chegaram com as malas, pois conseguiram vender as terras que tinham no interior e agora passariam a morar na mui antiga e nobre casa. O senhor Potter entrou alguns minutos depois, indo se instalar próximo à janela, um pouco afastado do grupo, como sempre. Mia fez menção de seguir para lá a fim de poder conversar com ele, mas um barulho no hall da casa acabou chamando sua atenção. Era a voz de Hermes, seguida por outras duas que Mia conhecia muito bem:

- Qual é o problema, Gina? Eu vou participar do treinamento de vocês e ponto. Por um acaso você vai me proibir? Eu também sou um Renegado!

- Eu não consigo compreender – era a voz de tia Gina, claramente alterada. – Primeiro você não queria que eu viesse, e agora me segue até aqui como se quisesse fazer parte da Nova Ordem! Eu te conheço, Draco Malfoy. Sei que está planejando alguma coisa e eu não quero causar confusão.

- Chega, mãe! – Hermes se interpôs entre os dois, o rosto afogueado pela raiva contida a muito custo. – Você vive achando que o meu pai tem más intenções, ou vai aprontar alguma coisa. Eu estou cansado disso! Deixe ele te provar que está do nosso lado, não é paizão?

- Com certeza, Hermes... com certeza... – Draco afagava os cabelos do filho, bagunçando-os, mas parecia alheio aos comentários feitos por Hermes, enquanto encarava os membros da OdRR, que não estavam nem um pouco convencidos de suas boas intenções para comparecer ao treinamento.

No entanto, nada disseram para impedir que o senhor Malfoy adentrasse a sala secreta, em respeito à tia Gina, o que não significava que ele fosse bem vindo ali, pois todos mantinham as expressões nada convidativas. Afinal, a última vez em que ele estivera na casa tinha sido para causar uma grande confusão, na qual acabou estuporado por metade da família. No entanto, o senhor Malfoy parecia não se importar com isso. Mantinha uma postura ereta, altiva, e um sorriso desdenhoso nos lábios muito finos. E foi com essa mesma expressão que encarou o senhor Potter, que continuava ocupando o canto próximo à janela, que já era quase marcado como seu.

Não era preciso que Harry Potter fosse submetido ao Recordatus Memoriae para se lembrar de seus sentimentos em relação a Draco Malfoy. E isso ficou absolutamente claro para todos os presentes, inclusive para Mia, Lúthien e Hermes. Este último sentia o desconforto dos parentes e amigos com uma visível vergonha, já que era provocado pelo seu próprio pai, a quem o garoto fazia questão de defender sempre que era acusado.

Depois de um silêncio constrangedor, durante o qual tia Gina encontrou um local afastado do senhor Potter para permanecer de braços dados com o senhor Malfoy, os gêmeos caminharam para o centro da sala para dar início aos treinamentos. Tio Jorge e tio Fred fizeram uma mesura exagerada antes de começar a falar:

- Bem vindos todos à sede da Ordem de Resistência dos Renegados, OdRR, ou simplesmente Nova Ordem - tio Fred começou o discurso, no qual todos os presentes faziam questão de prestar a máxima atenção, até mesmo a senhora Longbottom. – Nosso objetivo aqui é desenvolver novamente as habilidades mágicas daqueles que foram prejudicados pelos feitiços de memória utilizados pela Polícia Negra da Ditadura Voldemort.

- E também aprender com nossos mais novos membros um diferencial que pode nos ajudar a vencer esta nova guerra que se inicia – completou Jorge, olhando diretamente para Mia, Hermes e Lúthien. – Agora, se estiverem prontos, vamos começar. Mas antes, façam uma fila diante desta mesa para testar as nossas novas varinhas.

Logo os bruxos e bruxas presentes estavam alinhados diante das varinhas confeccionadas por Fred e Jorge. Para testá-las, cada um deveria pegar uma varinha e apenas sacudir no ar. Se fosse o instrumento certo para aquela pessoa, seriam produzidas fagulhas coloridas.

Logo a sala se encheu de pequenos lampejos luminosos quando todos já tinham suas varinhas em mãos. Para Mia, Lúthien e Hermes não seria necessário que se fizesse a escolha do instrumento mágico, pois eles continuariam utilizando a habilidade de conjurar a magia natural por meio da imposição das mãos.

O interesse maior de Mia estava voltado para as aulas sobre os patronos, já que os outros feitiços eram considerados relativamente simples. Mas tentava ser compreensiva em relação a isso, pois sabia que todos os Renegados precisavam reencontrar seus poderes dentro de si mesmos para que pudessem ir à guerra novamente. E ela, juntamente com Lúthien e Hermes, estava disposta a ensinar a magia natural para todos também, o que, com certeza, levaria certo tempo para se concretizar.

As aulas começaram com os feitiços de levitação, de abrir e fechar portas e convocar objetos. No começo, havia uma pequena dificuldade por parte daqueles que tiveram suas memórias arrancadas à força pelo Obliviate. A primeira a conseguir convocar um dos livros da prateleira foi a senhora Weasley, que provocou sorrisos e comentários de que certas coisas não mudam, mesmo depois de muito tempo. Ela sempre foi a mais inteligente de Hogwarts, não seria diferente agora que tinham que recuperar seus poderes. Ela se sentia feliz e orgulhosa quando conseguia realizar um feitiço antes dos outros, provocando uma ligeira inquietação no senhor Weasley. Ele procurava imitá-la, uma expressão de emburrado no rosto. Quando conseguiu convocar uma almofada, esta voou velozmente na direção do senhor Longbottom, acertando-lhe em cheio na cabeça. O homem cambaleou e caiu sentado no chão, provocando risadas de todos os presentes, inclusive do próprio senhor Weasley.

Mas Harry não conseguia se divertir em nenhum momento. Participava das atividades e praticava os feitiços ao lado do senhor e da senhora Weasley, ambos absolutamente felizes por verem o trio dos tempos de Hogwarts novamente juntos. A senhora Weasley tinha um carinho todo especial pelo amigo, cuidando para que ele realizasse os movimentos de maneira correta e proferisse as palavras com a entonação exigida. Mas Mia notou que ele parecia irritado, e corria pela sala certa tensão, visível principalmente entre os olhares trocados por Harry, tia Gina e o senhor Malfoy.

Os gêmeos anunciaram, então, que todos deveriam ficar em pares para praticar o feitiço de desarmamento. Rapidamente a sala começou a se organizar, um barulho quase ensurdecedor enquanto cada um escolhia seu parceiro. Mia ficou de frente para Hermes, enquanto Lúthien permanecia com a mãe. A ruiva observou a sala para ver com quem o senhor Potter ficaria, no mesmo momento em que ouviu tio Fred dizer:

- Muito bem, pessoal, onde está o Harry e... – e aqui o tio de Mia interrompeu a fala com o olhar estupefato na direção da porta, local para o qual convergiram os olhares dos outros bruxos, inclusive o da ruiva.

E lá estavam Harry Potter e Draco Malfoy. Um diante do outro, como parceiros de feitiços.

- Bem, acho que vocês dois não deveriam...

Tia Gina tentou argumentar, mas foi interrompida pelo próprio Harry:

- Deixe-nos, Gina. Somos dois adultos e vamos nos comportar, não é mesmo, Malfoy? – a voz de Harry estava carregada de desdém ao pronunciar o sobrenome de seu inimigo.

- É isso mesmo, Potter. Está na hora de vermos se você recuperou mesmo os seus poderes, ou se foi patético a ponto de perder todos eles para um simples feitiço como o Obliviate.

- Eu acho que não é uma boa idéia, Harry – a senhora Weasley se aproximou com cautela e tocou no ombro do amigo, visivelmente contrariada pelo fato de ver que o senhor Malfoy queria duelar com Harry mesmo depois de tanto tempo. – Deixem isso para lá e vamos trocar de pares, você fica com o Rony e eu com o Malfoy.

No entanto, Draco e Harry ignoravam categoricamente as tentativas de separá-los. Apenas se encaravam, olhos cinzentos contra os verdes, ambos com as varinhas em riste. Mia agarrou a mão de Hermes, que estava ao seu lado, sem se importar com o que ele poderia pensar. Apenas sentia medo do que pudesse acontecer quando um dos dois bruxos resolvesse pronunciar um feitiço. Por isso, sobressaltou-se ao ouvir a voz do senhor Malfoy:

- Eu conquistei a Gina, Potter. EU! Entendeu? Ela não vai voltar para você.

- Você jogou sujo, Malfoy. Aproveitou-se de um momento de fraqueza dela e arrebatou-a para si. Eu não chamaria isso de conquista.

- Parem com isso, vocês dois, pelo amor de Merlin – tia Gina suplicava, ao mesmo tempo em que tentava se posicionar entre Draco e Harry. Mas o marido a afastou delicadamente, porém com firmeza, enquanto se voltava novamente para o oponente.

- Ora, seu testa-rachada insolente! Não ouse contestar a escolha da minha mulher. Ela sabia muito bem quem eu era e, diferente de você, não a tratei como uma menininha indefesa precisando de cuidados. Vi nela uma mulher de verdade, alguém que era capaz de lutar ao meu lado, e de fugir ao meu lado também. Não duvidei da capacidade dela como bruxa em nenhum momento, querendo privá-la de enfrentar o mal. Dei a ela algo pelo que lutar. E você, o que fez? Foi bancar o Santo Potter e salvar o mundo bruxo! Fugiu de Ginevra com o rabo entre as pernas, deixando-a sozinha para que ela fosse seqüestrada pelo Lorde das Trevas – o senhor Malfoy estava lívido, os olhos inflamados de fúria, o tom de voz muito mais alto do que o normal.

- Eu jamais a abandonei – Harry também estava furioso, a voz crescendo na mesma intensidade que a de Draco, enquanto procurava se justificar. – Eu apenas queria protegê-la!

- E tanto fez para protegê-la que a perdeu e...

- Sectusempra!

- Protego! Crucio

O corpo de Harry parecia uma boneca de pano quando vôou para longe, caindo em seguida e se contorcendo por um breve período de tempo no chão. Todos avançaram para Draco, mas este já havia se precipitado para a porta, um pequeno filete de sangue escorrendo do lábio e do supercílio por conta do feitiço cortante lançado por Harry. Estava prestes a alcançar o jardim pela porta da frente quando avistou o rosto pálido de Gina. Virou-se para ela e apenas disse:

- Você fez a sua escolha. Eu fiz a minha. Adeus!

- NÃOOOOOOOOOOOOO!!!

Gina tentou correr para alcançar o marido, mas este já havia aparatado no momento em que pisou o pé no jardim da mui antiga e nobre casa. Sem conseguir se controlar, a ruiva gritava de desespero, ajoelhada onde momentos antes estivera a figura do homem que ela amava.

Enquanto isso, Harry permanecia de olhos fechados, estirado no chão da sala secreta, sentindo as dores da Maldição Cruciatus e também as do seu próprio coração.

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