Tudo em família



Para se ouvir a voz de tia Gina da porta de entrada da mui antiga e nobre casa dos Gêmeos Weasley, era porque alguma coisa a estava aborrecendo tremendamente. Jorge abriu a porta e cumprimentava a todos com cordialidade, como se não houvesse nenhuma voz feminina berrando como louca lá dentro. Vovó Molly, com um ar preocupado, questionara-o para ver se havia escutado exatamente com quem sua filha mais nova conversava:

- Ela falou... Luna?

- É, mamãe – Jorge completou, evidentemente aborrecido pelos problemas que estavam enfrentando desde que a caçula dos Weasley chegou para a festa de Natal. - Achamos que seria uma boa surpresa, mas vejo que...

- Oh, Jorge, por Merlin!!! Luna e...

- Sim, mamãe! Luna e Neville.

Sem entender absolutamente nada da conversa dos dois, Mia tirou o casaco rapidamente, pendurou-o nos cabides logo atrás da porta e correu para acompanhar a avó até a movimentada sala de jantar. O ruído provocado pela chorosa tia Gina enchia o aposento, enquanto uma mulher de cabelos muito compridos, loiros e mal-cortados, tentava confortá-la. A misteriosa figura estava de costas para a entrada, e Mia não conseguia ver seu rosto. Em compensação, as roupas... a ruiva tentava se lembrar onde já havia visto vestimentas semelhantes, totalmente descombinadas, quase que de propósito, num estilo que só poderia ser o de...

- Mia! Oh, vejo que você veio para o nosso Natal em família! Que legal!

A ruiva levou os nós dos dedos aos olhos e esfregou, numa tentativa de tornar a enxergar novamente a realidade. Mas lá estava a pequena loira parada diante de Mia, olhando-a com aqueles olhos muito pretos e esbugalhados e um sorriso enviesado no rosto. As bochechas reluziam e tornavam a imagem acolhedora, não fosse pela estranha combinação de um vestido preto de mangas muito compridas que quase lhe cobriam as mãos e todo bordado com pequenas libélulas de diferentes colorações. Os sapatos eram os mesmos de sempre, usados com as meias de lã pretas que não combinavam em nada com a leveza do vestido. E o colar de rolhas de garrafa não poderia deixar nenhuma dúvida: parada diante de Mia estava Lúthien, a pequena loirinha pentelha do Joana D´Arc.

- Oh, Mia querida – agora era tia Gina quem falava com a ruiva, secando com a ponta de um lenço cor-de-rosa os olhos marejados. – Que bom que você está aqui! Desculpe eu não estar... bem... você sabe... tão bem quanto deveria estar, mas é que as coisas têm andado bem difíceis lá em casa, como você obviamente deve saber por meio do seu primo.

- E Hermes, tia Gina? – Mia não conseguiu se conter e logo em seguida se sentiu extremamente estúpida por isso. A tia se debulhando em lágrimas e tudo o que ela era capaz de fazer era perguntar sobre Hermes?

Como se esperasse o questionamento, tia Gina não pareceu abatida:

- Hermes virá mais tarde, minha querida. Ele prometeu que estaria aqui, mas antes vai tentar convencer Draco... bem... – e recomeçou a chorar, no que foi prontamente abraçada pela mulher loira.

Fred apareceu logo em seguida, carregando com a ajuda da varinha algumas travessas que faltavam para completar a decoração da mesa. Foi então que os olhos de Mia saltaram da pequena Lúthien, que continuava diante dela sorrindo de forma insistente, para a mesa arrumada pelos gêmeos. Aquilo parecia um banquete dos céus! Todos os tipos de pratos doces e salgados, enfeitados das mais diversas formas, tudo o que vovó Molly trouxera já organizado pelos dois esmerados anfitriões. Havia ali comidas que Mia nunca tinha provado, pequenos pudins parecidos com bolos de carne, carne de carneiro assada, caixinhas coloridas com balinhas, e ainda embalagens com desenhos de sapos de chocolate que pareciam pular sozinhas em cima da mesa, guardando sabe-se lá qual segredo. A árvore de Natal logo ao fundo da sala parecia feita da mesma matéria que os sonhos: pequenos anjos tocavam harpas que tinham o mais puro som do Natal. As bolas coloridas enchiam o pinheiro, que parecia de mentira de tão grande e verde no meio daquele inverno rigoroso. Uma estrela na ponta da árvore cintilava de tempos em tempos, como que alimentada pelas canções natalinas. Mas o mais surpreendente era olhar para o alto e se deparar com o teto da sala, do qual caíam pequenos flocos de neve que não chegavam a atingir o chão, sem que Mia pudesse explicar como. Percebendo a evidente surpresa da sobrinha, Fred se aproximou após deixar a última terrina de molho na mesa e comentou:

- O céu está encantado magicamente. Era assim em Hogwarts desde a época dos fundadores. Ele mostra o mesmo céu do lado de fora da casa. Um feitiço bastante complexo, mas que Jorge conseguiu dar um jeito de fazer para esta noite tão especial. Numa escala menor, eu diria, e ainda bem que foi assim, pois caso contrário não conseguiríamos enfeitiçar um teto do tamanho do Castelo de Hogwarts.

Fred sorriu com a recordação e, no momento seguinte, tomou a dianteira da mesa. Pouco depois surgiram pela porta de entrada da sala dois novos ruivos, um deles acompanhado de uma belíssima loira. Mia sorriu ao lembrar de tio Gui, tia Fleur e tio Carlinhos, pensando que realmente aquela noite deveria ser especial para trazê-los de tão longe. A ruiva não se lembrava muito bem do último Natal no qual sua família esteve reunida quase que por completo. Após os abraços de saudades, os cumprimentos afetuosos, e a surpresa dos tios diante da loira e de seu companheiro, Fred tomou a palavra para recepcionar os convidados antes da ceia. Todos se muniram de taças de vinho dos elfos para o brinde que viria logo após a recepção oficial.

- Quero que todos sejam muito bem vindos à nossa casa e a esta noite tão especial. Não apenas porque é Natal, mas também porque reunimos aqui hoje uma força incrível, algo que demorou vinte anos para acontecer. A resistência está novamente cara-a-cara, ao menos aqueles que sobreviveram aos dias de trevas. Muita coisa mudou, meus caros, e sabemos disso mais do que ninguém. Não estamos aqui para julgar nenhum de vocês, pois cada um teve um bom motivo para se manter no anonimato e não procurar nenhum de seus irmãos mágicos durante todo este tempo. Mas não tem problema. Eu e Jorge os encontramos. Alguns estavam extremamente debilitados pela Arma do Lorde das Trevas, e ainda sofrem as conseqüências de tudo o que ocorreu. Mas chegou o tempo e o dia em que precisaremos lutar contra isso. Agora iremos provar ao mundo negro que ainda pode existir luz! E a prova maior está aqui, diante de vocês, pois essa menina, na altura de seus dezesseis anos, conseguiu algo que muitos de nós sequer tentou! Exatamente porque ela tem a pureza, a coragem e a inteligência que nós perdemos no limiar da guerra.

- Tio... eu... – Mia se sentia absolutamente constrangida diante do discurso inflamado de seu tio em relação a ela. Não sabia como proceder, nem o que dizer, mas não havia como desmenti-lo. Tudo que lhe veio a cabeça foi completar, num tom de voz quase que inaudível – não fiz nada disso sozinha. Daniel e Hermes estavam comigo.

- Sim! Daniel e Hermes, dois valorosos rapazes – e Fred prosseguia, sem se preocupar com o incômodo que causava na sobrinha. – Vocês percebem? É um novo trio. Mesmo que uma perda difícil tenha atingido este novo trio, ainda há esperança para aqueles que ficam. Juntamos aquilo que de melhor há dentro de nós para resistir às trevas. Para provar ao ditador que hoje ocupa o Ministério da Magia que não vamos mais aceitar passivos tudo o que ele nos fez e faz passar! Agora, ele terá que enfrentar a resistência dos Renegados!

Murmúrios de aprovação invadiram a sala, deixando Fred ainda mais confiante para prosseguir com o discurso.

- É quase como uma nova Ordem, meus companheiros! Levantem-se e vamos brindar à nova Ordem da Fênix, amigos! À Ordem da Resistência dos Renegados!

Havia lágrimas nos olhos das mulheres, e os homens bradavam palavras de ordem e de estímulo enquanto levantavam os copos para brindarem junto com Fred. Jorge se precipitou para o lado do irmão e continuou, não sem antes abraçá-lo para transmitir força e segurança.

- Neville e Luna Longbottom, todos nós queremos lhes desejar um bom retorno às origens. Sei que tudo pode parecer muito novo para vocês, mas ainda vamos recuperá-los por completo. Ambos viviam com sobrenomes diferentes, no sul da França, longe dos olhos de quem quer que pudesse reconhecê-los. Eles estiveram conosco na batalha, e foram submetidos ao poder do Obliviate da mesma forma que nossa mãe, nosso irmão e Hermione. Todos eles sofrem, às duras penas, a recuperação difícil deste feitiço cruel que tenta apagar aquilo que somos. Mas há um problema com esta Arma, que a mente doentia de Voldemort jamais conseguiria prever. Jamais!

- O poder está dentro de cada um – Mia se viu completando a frase do tio.

- Sim, Mia! O poder está dentro de cada um de nós, independente das lembranças que conservamos. Basta não deixar que ele morra. Assim poderemos nos unir de novo e ter forças para desafiar as trevas com luz quantas vezes forem necessárias até o fim de nossas vidas.

Então era aquilo. Estavam novamente juntos. Mia encarava o rosto de cada um naquela sala, seus parentes e amigos. Aquelas pessoas seriam sua força para seguir em frente. Via em seus rostos emocionados que ela, Hermes e Daniel trouxeram esperanças para o mundo bruxo com a ousadia de invadir Azkaban. E, no entanto, ela mesma se sentia vazia deste sentimento depois da perda do moreno. Restava a ela apenas o loiro, e ele também não estava ali. Ao mesmo tempo em que se sentia responsável por cada um dentro daquela sala, sentia-se completamente abandonada sem a força dos dois amigos.

Foi quando sentiu uma mão que pousou suavemente sobre seu ombro, como a imprimir força e coragem para a missão que estava por vir. A mão continuou lá, quieta, provocando uma estranha sensação de reconhecimento, até que Mia conseguiu virar o corpo e deu de cara com Lúthien. A loira não se parecia em nada com a menininha maluca que vivia perseguindo os dois amigos pelos corredores do Joana D´Arc. Havia força e determinação em seus olhos de um jeito que fez com que Mia julgasse que o trio não estava acabado. Pelo contrário: que ele podia renascer a qualquer momento, ainda mais forte. Não apenas como um trio, mas como um grupo perfeito dos quatro elementos, mesmo sem a presença física de Daniel. E tudo o que ela conseguiu fazer foi sorrir, antes que um craque bastante audível tomasse conta da sala, seguido de várias palavras duras de um novo convidado que chegou à mui antiga e nobre casa dos gêmeos Weasley.


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