Conversa na Madrugada



A primeira semana de Novembro começou com uma chuva violenta e trovoadas, de modo que Harry, mesmo contrariado, foi obrigado a cancelar o treino daquela noite. Ele decidiu aproveitar a folga do quadribol para estudar Poções, e para isso procurou o silêncio e a privacidade da biblioteca. Há muito tempo que Harry já não fazia mais lição, pois simplesmente não tinha tempo. Os professores também não cobravam muito, o que era um alívio para quase todo mundo. O garoto sabia que nem Hermione estava fazendo as atividades extra-classe, o que era um fato realmente fantástico.

A biblioteca não estava tão vazia quanto ele gostaria e, visivelmente, Harry não fora o único que decidira aproveitar a noite para estudar. Com um suspiro, ele escolheu uma mesa e sentou-se, largando a mochila do lado da cadeira. Abaixou-se para apanhar o livro de Poções, e quando estava se levantando percebeu que Gina e Luna estavam ocupando a mesa vizinha. Elas estavam lendo um livro qualquer e dando risadinhas estúpidas. Harry sentiu vontade de ir até lá e mandar elas calarem a boca, mas não foi preciso: cinco minutos depois elas fecharam o livro e saíram apressadamente da biblioteca. Harry revirou os olhos e voltou a atenção para o seu livro.

Ele ficou até muito tarde na biblioteca, sublinhando os trechos do texto que achava mais importantes e tomando nota numa folha de pergaminho. Harry sabia que essa era a melhor estratégia para ele memorizar a matéria. A medida que as horas iam passando, a biblioteca ia ficando mais vazia e, conseqüentemente, mais silenciosa. Harry só foi embora quando Madame Pince veio "gentilmente" pedir a ele que se retirasse para que ela pudesse trancar as portas e ir dormir. Ele meteu o livro e as folhas de pergaminho rabiscadas na mochila, jogou-a nas costas e saiu lançando um olhar contrariado a bibliotecária.

Subiu a escadaria da torre da Grifinória lentamente, e precisou sacudir o quadro da Mulher Gorda para que esta acordasse e lhe desse passagem, resmungando mal humorada. O salão comunal já estava vazio, conforme Harry previra, e ele largou-se displicente em uma poltrona, as pernas jogadas sobre o braço da mesma. Ele fitou o teto, perdido em seus pensamentos. Estava tão distraído que nem reparou que, na verdade, não estava sozinho.

- Achei que você já estivesse dormindo.

Harry levantou-se de um pulo, assustado. Então identificou a figura de Hermione, sentada na cavidade da janela com um livro anormalmente grosso sobre suas pernas dobradas. Ela deu uma risadinha.

- Assustei você, não foi?

Harry resmungou, largando-se outra vez na poltrona. Hermione quase o matara do coração.

- Será que você nunca dorme? - indagou Harry, erguendo uma sobrancelha.

- Eu já estava indo dormir, quando você chegou - Hermione falou encolhendo os ombros.

- Então você decidiu ficar e esperar na penumbra para me dar um susto - Harry disse com ironia. - Parabéns, funcionou.

Eram raras as vezes em que Harry e Hermione ficavam sozinhos. Na realidade, partia de ambos a iniciativa de evitar que isso acontecesse. Harry não sabia porquê, mas tinha a impressão de que nunca tinha o que falar com Mione quando estavam só os dois. Eles conversaram normalmente quando estavam com Rony, mas as coisas não funcionavam muito bem quando eram apenas eles. Harry simplesmente não conseguia evitar ser estúpido, e Hermione não parecia se esforçar para ser menos fria.

- Na verdade - Hermione disse, e algo em seu tom de voz fez Harry enxergar um sorrisinho cínico no rosto da garota, embora estivesse escuro demais para que pudesse distinguir ao certo. - Eu decidi ficar para lhe pedir o aletômetro emprestado mais uma vez.

- De novo? O que você tanto faz com ele? - indagou Harry, sem muita cortesia.

- Eu tenho lido muito a respeito dele, e estudado os seus símbolos também - Hermione disse simplesmente. - Por isso gosto de ter ele comigo.

Harry ergueu a sobrancelha, intrigado.

- Eu estou enganado - ele disse lentamente. - Ou você está tentando aprender a ler o aletômetro? Porque se está, isso é muito pretensioso da sua parte.

- Talvez seja - Hermione disse controlada. - Mas ao menos eu estou tentando, não é?

- Isso foi uma indireta? - perguntou Harry.

- Entenda como quiser - Hermione disse. Fechou o livro e desceu da janela, passando por Harry de nariz empinado. Ele a conteve. - O que foi?

- Você está conseguindo alguma coisa? - ele perguntou, mas no fundo já sabia a resposta. Então meteu a mão no bolso do casaco e estendeu o aletômetro para Mione. - Me mostre.

Hermione suspirou, e então sentou-se na poltrona diante de Harry. Ela apanhou o objeto com delicadeza, e encarou o amigo.

- O que você quer saber?

- Sei lá, pergunte o que você quiser - Harry falou dando de ombros.

Mione apertou os olhos para ele, e então fixou sua atenção no aletômetro. Harry a observou mover os ponteiros com calma, mordendo o lábio inferior quando parava pensativa. Então ele teve a impressão de que ela estava entrando em uma espécie de transe, os olhos movendo-se rapidamente acompanhando o movimento dos ponteiros que respondiam a sua pergunta. E então, finalmente, ela suspirou e sorriu.

- Pronto - disse, satisfeita.

- O que você perguntou? - indagou Harry, curioso.

- Qual é a cor da sua cueca - Hermione disse simplesmente. Harry sentiu as bochechas corarem furiosamente.

- C-como?

- Minhas suspeitas se confirmaram. Eu sempre achei que você usava cueca vermelha - Hermione disse com um sorriso gozador.

- O QUÊ! - exclamou Harry, horrorizado. O garoto não sabia se devia ficar furioso ou impressionado. - Como você sabe disso?!

- Fale baixo! - sibilou a garota. - E Harry, na verdade eu não sabia, porque não foi isso que eu perguntei para o aletômetro. Você mesmo confirmou. - Harry sentiu o rosto pegar fogo. Como pôde cair nessa? - Eu perguntei onde você estava. Na biblioteca estudando Poções, certo?

Harry escorregou para fora de sua poltrona e foi de joelhos até Mione.

- Como você fez isso? - indagou ele.

- Bem, essa pergunta particularmente foi bastante simples - ela falou com certo orgulho. - Eu usei o Grifo, que significa coragem, para representar você, porque... bem, você é corajoso; o Globo para saber a sua localização e o Alfa, que quer dizer finalidade, para saber o que você estava fazendo. Então ele me respondeu com a Maçã, de conhecimento que pode ser encontrado em livros, e livros estão na biblioteca; A Vela, que significa aprendizado e o Caldeirão, que tem como significado principal a alquimia... Então eu deduzi que você estava na biblioteca estudando Poções.

Harry encarava a amiga boquiaberto, cheio de admiração.

- Hermione - ele disse, impressionado. - Hermione, isso é incrível! Desde quando você consegue ler o aletômetro?!

- Ah - Mione corou. - Eu tenho praticado muito sempre que você me empresta ele, mas a coisa só começou a fazer sentido de umas duas semanas para cá. Mas eu ainda não estou boa o suficiente, existem várias coisas que eu ainda tenho dificuldade de compreender.

- Hermione, você é um gênio! - Harry disse, rindo.

- Não exagere...

- Você já tentou perguntar alguma coisa mais séria? Como aquela coisa da Ordem, o tal traidor...

- Já - Hermione disse. - Mas eu não consigo entender a resposta... Ele sempre me dá uma seqüência de muitos símbolos. Eu já tomei nota deles, mas não consigo compreender o que o aletômetro está dizendo. Marionete, Serpente, Camaleão, Espada, Coruja, Grifo e Caveira, essa é a resposta dele. Eu acho que a Caveira tem algo a ver com os Comensais da Morte, mas isso não ajuda muito. E o Grifo pode significar dinheiro...

Harry observava a garota falar com um sorriso no rosto. Hermione ficava incrivelmente linda quando estava pensando e, embora ela não soubesse, o modo como mordia o lábio inferior quando estava confusa era bastante sensual.

A garota percebeu que Harry não estava prestando atenção, e tomou isso como uma ofensa.

- E já que você não está interessado, eu vou dormir - ela disse, pondo-se de pé.

- Não é isso, Mione - Harry falou apressado. - Eu estou prestando atenção sim!

- É claro que está - disse Hermione, orgulhosa. Diabos, como ela ficava irresistível invocada. - Boa noite, Harry.

E ela passou pelo garoto com toda a sua dignidade.

- Hermione, espera - ele exclamou, segurando-a pelo pulso. Mione se virou, irritada.

- Escute aqui...

E antes que a garota pudesse perceber o que estava acontecendo, Harry se precipitou e a beijou. Ele esperava ser empurrado, levar um tapa... Mas não foi isso o que aconteceu.

Hermione passou os braços em volta do seu pescoço, colando seu corpo no dele. Era impressão sua ou aquele barulho eram tambores? Então percebeu que era o coração da garota, que estava batendo incrivelmente acelerado. Aquilo era surreal. Ela cheirava deliciosamente a alecrim e primavera - como nunca percebera antes? -, e sua boca tinha gosto de hortelã.

O beijo era lento, calmo, carinhoso e sofrido. Um beijo tão esperado, um momento que parecia eterno. E havia dor. Harry sabia que havia dor. Ele apertou Hermione com força contra si, desejando que pudesse apagar toda e qualquer lembrança ruim que ela possuísse. Queria que ela sentisse que sim, ele se importava!

E então desejou que tivesse feito certo.

***

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.