Desculpas




Harry passou sua última semana de férias, na maior parte do tempo, em companhia de Gina. Rony e Hermione continuavam sem falar com ele, evidentemente esperando um pedido de desculpas e um reconhecimento de que errara da parte de Harry. Mas a verdade é que o garoto não sabia se desejava mesmo voltar às boas com os amigos, por isso adiava o máximo possível o momento em que seria obrigado a encarar o casal novamente.

Chovia muito naquele domingo, véspera da viagem para Hogwarts. Harry estava jogando uma partida de xadrez de bruxo com Gina - perdendo, diga-se de passagem -, quando Rony e Mione entraram em casa razoavelmente molhados.

- Esse é o preço que se paga por alguns momentos de privacidade e agarramento - brincou Gina, sendo fulminada pelos olhares de Harry e Rony, cada qual com o seu motivo.

Sem dirigir uma palavra a Harry, os amigos deixaram as capas na sala e subiram para o quarto de Rony. O garoto resmungou, aborrecido, e ao voltar sua atenção para o tabuleiro de xadrez constatou que estava prestes a receber um xeque-mate da torre de Gina.

- É, acho que hoje não é o meu dia - suspirou Harry, largando-se no encosto da cadeira e jogando a cabeça para trás. - Aliás, esse decididamente não é o meu melhor ano.

Gina revirou os olhos, entediada.

- Papai costuma dizer que você tem aquilo que acha que merece. Se você está dizendo que esse ano é ruim, então ele realmente será ruim. - ela disse simplesmente. - E, sinceramente, se eu fosse você resolveria logo essa coisa boba com o Rony e a Mione.

- É fácil falar - resmungou Harry. - O Rony nem está olhando na minha cara, e a Hermione... Diabos, ela me odeia!

- Ela não odeia você - Gina disse com uma careta. - Ok, talvez só um pouquinho. Isso é natural, ela está magoada. E você também não pode querer tudo de uma vez, certo? Fale com o Rony, peça desculpas. Ele só está esperando você fazer isso. Quanto a Mione, ela não vai ficar muito tempo de cara amarrada com você, se você e Rony fizerem as pazes. Apesar de tudo, ela não é de guardar rancores. Você sabe disso.

- Não é o que parece - suspirou Harry, desanimado. - E, francamente, eu não sei se quero pedir desculpas a eles. Vai ser muito chato ter que segurar vela para o Rony e a Mione em tudo o que é lugar...

- É, não será uma experiências das mais agradáveis - riu-se Gina. - Mas o Rony e a Mione são um casal bem discreto. Eles nem parecem namorados quando estão em público... E, Harry, sejamos realistas: as aulas estão prestes a começar, e você não vai querer ficar andando comigo e com a Luna, vai?

- Decididamente não - Harry disse, fechando a cara.

- Então deixe de ser orgulhoso e vá falar com o Rony e a Mione! Você pode até não admitir, mas sente falta da companhia deles.

Harry não deu o braço a torcer na frente de Gina, mas depois que ela subiu para tomar banho, o garoto foi até o quarto de Rony. Bateu na porta com os nós dos dedos, e entrou antes mesmo de esperar uma resposta.

Hermione estava deitada na cama de Rony, que estava sentado no chão com as costas escoradas na beirada da cama; A garota estava brincando com os cabelos dele. Quando viu Harry, Mione se levantou e sentou.

Por um momento, Harry pensou em desistir. Mas lembrou-se das palavras incontestavelmente sábias de Gina e, respirando fundo, fechou a porta do quarto e sentou em sua cama.

- E então, podemos conversar? - ele perguntou, erguendo uma sobrancelha de maneira um pouco arrogante demais do que seria apropriado.

- Estou ouvindo - disse Rony, encolhendo os ombros.

Harry parou por alguns momentos, pensando no que poderia dizer.

- Me desculpe - falou finalmente. E, de algum modo, sentiu uma pontada desagradável quando pronunciou essas palavras; Hermione estava com a mão no ombro de Rony. - Eu sei que eu tenho sido um... um...

- Imbecil? - ajudou Hermione, sarcástica.

- Obrigada, Hermione - Harry disse com um sorriso amarelo. - Não era bem a palavra que eu procurava, mas... Encaixou-se bem no contexto da frase.

Rony deu uma risadinha, o que fez surgir um fio de esperança para Harry: o amigo não estava mais tão furioso, afinal.

- Você foi muito idiota com a gente, cara - disse o ruivo, agora sério.

- É, eu... eu sei - Harry lançou um olhar significativo para Mione, que desviou os olhos. - A verdade é que eu... Bem, acho que eu fiquei com um pouco de ciúmes. Achei que, agora que vocês dois estão namorando, a nossa amizade seria afetada e tudo o mais. Achei que as coisas ficariam diferentes entre nós três.

- Isso é paranóia sua, Harry - Rony disse sacudindo a cabeça. - A nossa amizade é algo muito sólido, nunca vai mudar. E muito menos porque eu e a Mione estamos juntos!

Harry mordeu o lábio inferior. Agora estava se sentindo culpado. Rony falando com tanta consideração da amizade deles, e ele agindo feito um estúpido apenas porque não conseguia aceitar o fato de que, pela primeira vez, Rony o superara em alguma coisa. Enquanto que Harry fora covarde demais para tentar fazer dar certo com Mione, Rony lutara pelo amor dela e, pelo que parecia, tivera sucesso.

O garoto baixou a cabeça tristemente sob o peso desses pensamentos. Hermione não dizia nada, o que era bastante incômodo. Harry gostaria de saber o que ela estava pensando. "Provavelmente em como você é imbecil" pensou amargamente.

Rony levantou-se e sentou ao lado de Harry, que ergueu o rosto para encarar o amigo.

- Eu não sou muito bom com essas coisas sentimentais, cara - Rony disse parecendo constrangido. - Mas você sabe que Hermione e eu estaremos sempre com você, não importa o que aconteça. Você é meu melhor amigo, é praticamente da família. E a nossa amizade sempre vai estar acima de qualquer outra coisa.

Harry sorriu um sorriso sincero, e não se arriscou a dizer nada.

- Agora é a parte em que vocês se beijam! - brincou Hermione, rindo, e pulando para juntos dos três começou a empurrar as cabeças de Harry e Rony uma contra a outra.

- Pára, Mione! - exclamaram os garotos.

Os três amigos começaram uma guerra de travesseiros, enchendo o quarto com o som de gargalhadas. Por um momento, Harry sentiu que tudo voltaria a ser como era antes. Só por um momento...

- Vem aqui, pequena - disse Rony, puxando Hermione. Deitou-a no chão bruscamente, arrancando um gritinho da garota, e a beijou.

Harry desviou os olhos, sentindo um aperto terrível no peito.

Agora ele sabia que as coisas jamais voltariam a ser as mesmas, porque ele não era mais o mesmo. Hermione não era a mesma menininha mandona com cabelo de arbusto que ele conhecera há seis anos atrás; Ela era uma mulher, e uma mulher que mexia muito com seus sentimentos. Rony? Era o seu melhor amigo, é claro... Mas agora era também seu rival. Seria isso possível?

- Rony, não - murmurou Mione, empurrando o namorado constrangida. - Não...

- Oh, se é por minha causa, não se acanhe Mione! - exclamou Harry, sentindo que sua voz soava estranha. - Eu tenho que me acostumar com isso, não é mesmo? Esse com certeza foi só o primeiro de muitos beijos de vocês que eu presenciarei. Aliás! Desculpe a curiosidade, mas eu simplesmente não posso evitar... A Mione beija bem, Rony?

- Harry! - Hermione exclamou, fuzilando o garoto com os olhos. Rony, evidentemente, não entendera o intuito provocativo daquela pergunta. Ele considerou apenas uma brincadeira. Mas Mione, para quem Harry olhava fixa e desafiadoramente, compreendera muito bem.

- Eu só estou brincando! - Harry disse com falsa descontração. - A propósito, Mione, o primeiro beijo de vocês foi juntos? Isso é realmente romântico... Ei, vocês já terão algo para contar aos netinhos!

Harry fora visivelmente longe demais dessa vez, e até Rony percebeu que havia algo errado. O clima entre eles ficou bastante pesado, e ninguém ousava dizer nada. Rony ria um sorriso forçado, e Harry permanecia impassível fitando Mione. Será que ele fora o primeiro garoto a beijá-la, ou houve outros antes dele? Krum, quem sabe?

A tensão que surgira repentinamente entre os três só se quebrou quando Gina abriu a porta do quarto com estardalhaço.

- Mamãe mandou dizer para vocês acabarem de arrumar as malas e depois descerem para jantar - ela recitou, visivelmente contrariada por ter que parar o que quer que estivesse fazendo para dar recados. Então ela percebeu as expressões nos rostos dos garotos. - Quem morreu?

***

Choveu muito durante toda a viagem de regresso a Hogwarts. Harry, Rony, Mione, Gina e Luna dividiram um vagão no final do trem, como de costume. Harry tentou ignorar o fato de que Hermione e Rony passaram a viagem inteira de mãos dadas. Tão pouco prestou atenção na conversa deles e das meninas, focando a sua atenção na paisagem. Se mais tarde usasse um vira-tempo para voltar àquele momento, Harry perceberia que estava muito mais desligado do que a própria Luna Lovegood - o que era certamente um recorde.

Foi ótimo estar de volta a Hogwarts, de modo que Harry até esqueceu um pouco seus problemas sentimentais e aproveitou o jantar de boas vindas. Dumbledore contratara a Caçada dos Sem Cabeça para animar a festa e, de um modo geral, os estudantes gostaram do espetáculo. Não se pode dizer o mesmo de Nick-Quase-Sem-Cabeça, é claro. Ele sequer apareceu no salão principal, mas ninguém chegou a reparar.

Harry gostou de rever seus companheiros da Grifinória. Parvati e Lilá não paravam de lançar olhares para eles, mas Harry desconfiava que era porque elas já tinham percebido que Rony e Mione estavam namorando. Mas elas não foram as únicas a reparar no novo casal, e quando estava saindo do salão principal Harry precisou reunir toda a sua força de vontade para não quebrar a cara de Draco Malfoy.

- Mas que beleza! - ele disse alto o bastante para que todos que estavam passando pudessem escutar. - Weasley e Granger, o novo casalzinho ternura de Hogwarts. O pobretão e a sangue-ruim!

- Malfoy... - Rony disse entredentes, apertando os punhos. Hermione segurou-o pelo braço.
- Ignore-o - ela sussurrou no ouvido dele.

Malfoy deu uma risadinha debochada.

- E você, Potter? Quem diria, heim? Passado para trás pelo seu fiel escudeiro! É isso o que acontece com quem não sabe escolher direito as suas companhias. Mas você não pode dizer que eu não avisei.

- Malfoy - Harry disse lenta e controladamente - Faça um favor a você mesmo, e cale essa boca grande.

- Você deveria fazer um favor ao Weasley e a Granger aqui - disse Draco sorrindo maldosamente. - E emprestar a chave de casa para eles. Porque aquele barraco onde o Weasley mora certamente não tem estrutura para suportar... bem, você sabe do que eu estou falando.

- Cala a boca, Malfoy! - exclamaram Hermione e Rony ao mesmo tempo, mas foi Harry quem perdeu o controle e avançou para Malfoy.

A cena atraiu a atenção de várias pessoas: Draco e Harry, um segurando o outro pela gola da camisa.

- Você está querendo apanhar essa noite? Porque eu realmente não vou me importar em satisfazer o seu desejo - Harry falou entredentes.

- Não abuse da sorte, Potter - sibilou Malfoy.

Harry e Draco estavam prestes a sair na pancada quando McGonagall apareceu para interferir.

- O que está acontecendo aqui? Potter! Malfoy! - ela exclamou, separando-os. - Não acredito que vou ter que me aborrecer com vocês antes mesmo do primeiro dia de aula!

- Não vai, professora - disse Draco sarcástico - Eu só estava cumprimentando o novo casal e, por algum motivo, Potter se irritou.

- Sr. Malfoy, faça o favor de retirar-se para o seu dormitório antes que eu mude de idéia e aplique-lhe uma detenção - McGonagall mandou. Draco lançou um olhar desafiador para Harry antes de se afastar. A professora voltou-se para ele. - Potter, preciso falar com você na minha sala amanhã. Agora, o que vocês três estão esperando? Para os dormitórios!

Harry, Rony e Mione obedeceram e subiram para a torre da Grifinória sem trocar nenhuma palavra.

***

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