O convite



Capítulo um: O convite

Cho Chang atravessou o campo de quadribol deserto, distraída. Segurava sua velha vassoura de corrida sobre o ombro. O sol acabar de raiar totalmente, iluminando os arredores dos terrenos de Hogwarts com seu brilho aquoso por trás das nuvens cinzentas que cobriam o céu. Como fazia todos os dias, Cho acabar de retornar de seu rotineiro vôo matinal que executava logo depois de acordar, antes mesmo de tomar o café-da-manhã. Era como um ritual, ela pulava da cama cedinho e ia voar um pouco para espairecer as idéias. Antes de realmente iniciar o dia, antes de começar a trabalhar, ela voava em sua Comet 260 para substituir seus momentos de lazer que eram represados pelo trabalho constante.

Respirando fundo, ela aspirou o ar fresco a sua volta, sentindo o delicioso cheiro de grama orvalhada que exalava do gramado a sua volta. Enquanto andava calmamente, sentindo os raios fracos de sol banharem seu rosto, ela olhava pensativa para o céu colorido de um cinza-chumbo, típico de um amanhecer nublado que começava a dar indícios de que uma tempestade viria.

Voar sempre fora como um refúgio para ela, sentia como se enquanto estivesse voando ninguém poderia alcança-la, dando-lhe uma sensação de liberdade e extremo prazer, assim como um certo sentimento de superioridade, pois encontrava-se acima de todos, olhando o mundo de cima. Subitamente, lembranças de sua adolescência invadiram seus pensamentos e ela lembrou-se de como era bom sentir o vento tocar sua face suavemente enquanto acelerava sua vassoura a toda a velocidade, circundando o campo em busca do pomo de ouro numa acirrada disputada contra a Firebolt de Harry Potter.

Sacudindo a cabeça como que para livrar-se de tais lembranças, ela acelerou o passo, seguindo para fora do campo de quadribol, caminhando apressadamente em direção as portas de entrada do castelo de Hogwarts que erguia-se imponente a sua frente. Não gostava de pensar em Harry. Pensar nele trazia-lhe lembranças dolorosas de um passado que ela esforçava-se para esquecer.

Doía pensar no quanto fora burra e estúpida ao descartá-lo como fazia com todos os outros, mas naquela época ela era apenas uma menina fútil e mimada que acabara de perder um de seus brinquedinhos favoritos: Cedrico. Ela sabia que era cruel pensar daquele jeito de um menino tão doce feito Cedrico, mas era exatamente assim que ela o via. Ele era somente mais um garoto que corria atrás dela, apaixonado por sua falsa imagem de ternura e doçura que encobria sua real face repleta de egoísmo e arrogância.

Harry fora um deles. Mas, ao contrário dos demais, ele fora um dos únicos rapazes que realmente lhe chamara a atenção, uma parte por sua fama como sendo “O menino que sobreviveu”, outra por seu incrível talento como apanhador, mas principalmente por sua coragem e jeito de “bom moço revoltado” que encantava muitas moças como ela.

Agora, Cho se arrependia amargamente por ter brincado com ele, numa época em que dispensar os rapazes era o seu passatempo preferido. Divertia-se em ver como os meninos ficavam abatidos e postavam-se a tentar atrair a sua atenção, implorando para que ela reatasse o relacionamento. Ela achava graça e o fazia exatamente para que eles corressem atrás dela depois, fazendo seu ego inflar e sua vaidade atingir níveis enormes...

Cho dispensara Harry e, sem saber, acabara perdendo-o para sempre. Ela nunca imaginara que ele fosse apaixonar-se por outra, ainda mas alguém tão desprovida de seus atrativos, que ela achava grosseira e feia. Invejara Gina Weasley por anos por ter-lhe roubado Harry.

Só de pensar na caçula dos Weasley, seu estômago revirava e seu rosto corava de raiva. Pensar naquela atrevida causava-lhe dor de cabeça e sentia sua auto-estima murchar. Afinal, não era normal para ela ser trocada por uma garota tão... tão... tão sem sal, como aquela pobretona. Ainda perguntava-se o por quê de um rapaz tão cheio de prestígio ter preferido a companhia da Weasley a sua, apesar de admitir que tivera uma certa participação nessa escolha de Harry.

Ao alcançar as portas de carvalho do castelo, seus pensamentos voaram até a sua primeira aula do dia. Teria de ensinar algumas táticas de vôo aos alunos da Lufa-lufa e da Corvinal, casa ao qual era regente e não conseguia deixar de demonstrar sua preferência por esta que fora sua acolhedora por longos sete anos, anos estes que foram os mais felizes e, em contrapeso, os mais aterrorizantes de toda a sua vida.

Assumira o lugar do Professor Flitwick na direção da Corvinal após a morte do bruxo há alguns anos atrás durante a sangrenta guerra contra você-sabe-quem. Várias vagas de ensino em Hogwarts foram desocupadas naquela época devido as trágicas perdas causadas pelo falecimento e desistência de professores que optaram por o descanso e a aposentadoria depois de tempos tão negros e assustadores.

Um deles fora Madame Hooch que, de início, resolvera apenas tirar umas férias da rotina fatigante das aulas de vôo em Hogwarts após todo o sofrimento causado pela guerra, indo descansar nas belas praias tropicais do Brasil, mas acabou por acostumar-se com a vida calma, pedindo a aposentadoria para continuar a viver no país. Cho soube que ela juntou algumas economias após os tantos anos de trabalho na escola e construiu uma pousada que é administrada por ela própria.

Sendo assim, depois da demissão de Madame Hooch, a Professora McGonagall gentilmente concedeu a vaga de professora de vôo para Cho quando esta foi despedida do time de Quadribol em que trabalhava, por causa de uma lesão grave que a afastou para sempre dos campos, profissionalmente falando.

Cho reconhecia que a rotina de professora como sendo professora de vôo era exaustante e por vezes até monótona. Somente podia sair da escola durante suas poucas folgas, nos feriados e às vezes após o término de seus turnos, mas para aparatar para qualquer lugar que fosse era preciso caminhar até a estação de Hogmeade, fora dos terrenos de Hogwarts, pois dentro do colégio não era possível executar esta atividade. Além disso, para quem já fora uma excelente profissional do quadribol, apanhadora oficial do Montrose Magpies, ser professora de vôo para pirralhos de 11 anos de idade que se achavam adultos era no mínimo frustrante.

A mulher levara um tempo para se acostumar também com o salário. Não que o dinheiro fosse muito pouco, garantindo-lhe uma vida miserável, mas para quem estava acostumada a ganhar uma fortuna para jogar um jogo por semana no máximo, o salário era baixíssimo. Desde pequena ela sempre estava cercada por riquezas sem fim, comendo do bom e do melhor, vestindo-se como uma princesa e sustentando milhares de galeões no cofre de sua família. Mas após a morte de seus pais o dinheiro foi se desmantelando, sumindo aos poucos através de gastos desnecessários em bens supérfluos.

Depois de sua demissão, ela teve de aprender a controlar-se, sendo esta uma tarefa dificílima nos primeiros meses de seu trabalho em Hogwarts. Seu salário não conseguiu cobrir suas dívidas e ela acabou mergulhando mais e mais em prejuízos que foram pouco a pouco afogando-a em meio aos devedores. Somente conseguiu se reerguer com a ajuda dos poucos amigos que lhe sobraram depois de ter sido despedida da prática de quadribol, amigos estes que se mostraram verdadeiros, não se importando com o seu dinheiro como aqueles que abandonaram-na após ter baixado de classe social.

Assim que ela subiu os degraus da escadaria e abriu a porta de entrada do castelo, uma fina e fria chuva começou a cair, engrossando com o passar do tempo. Tremendo, Cho abrigou-se dentro do cavernoso saguão de entrada, começando a subir a escada de mármore em direção ao quarto de Neville Longbottom, o novo professor de Herbologia que tomou o lugar da Professora Sprout quando esta aposentou-se.

Ela tinha a intenção de pedir o conselho profissional de Neville sobre algumas ervas mágicas calmantes que curassem suas constantes dores-de-cabeça e seu cansaço. “Preciso tirar umas férias urgentemente” - pensou ela, esfregando os olhos enquanto subia lentamente os degraus da escadaria.

Os corredores do castelo estavam desertos durante aquele horário, pois a maioria dos alunos encontravam-se dormindo ou tomando café-da-manhã. Durante o seu trajeto até o dormitório do amigo, ela cumprimentou vagamente alguns colegas de trabalho e uns estudantes que atravessaram seu caminho, chegando a assustar-se quando Madame Snow, a nova gata do zelador Filch, cruzou a sua frente. Porque Filch pusera esse nome no bicho, ninguém sabia. Afinal, a gata não tinha nada a ver com seu nome, pois ao invés de ser branca como a neve, ela era negra feito carvão, parecendo um mau agouro.

Ao aproximar-se do quarto de Neville, Cho bateu na porta e esperou pacientemente que o homem se manifestasse e permitisse a sua entrada, mas não ouviu sequer um barulho no cômodo. Como a paciência não era uma de suas virtudes, Cho forçou a porta enquanto dizia:

- Licença... Tô entrando!

A moça girou a maçaneta, entrando no quarto. Ao perceber que não havia ninguém no âmbito, ela ficou parada no meio do cômodo, esperando que Neville voltasse de onde quer que estivesse. Espreguiçando-se, ela alongou os braços, bocejando alto. Enquanto esperava, olhou tudo a sua volta. Já estivera ali há algum tempo atrás quando tivera de resolver junto de Neville um problema relacionado com uma praga que fizera com que o gramado do campo de quadribol secasse.

A mobília era simples, bem ao estilo de Neville. Havia uma cama no centro do cômodo coberta por lençóis desarrumados, indicando que ele havia acabado de acordar e não se dera ao trabalho de arrumar a roupa de cama. Uma escrivaninha lotada de anotações e livros sobre Herbologia sustentava também um rádio bruxo onde repousavam várias cartas empilhadas.

Sorrindo, Cho aproximou-se do rádio e colocou numa estação bruxa que adorava. No momento a famosa cantora Daisy Warbeck cantava um sucesso re-gravado da antiga banda bruxa “As Esquisitonas”. Balançando a cabeça de acordo com o ritmo da música, Cho sorriu, sentando-se na cadeira em frente a escrivaninha do colega, cruzando as pernas e apanhando a correspondência do amigo a fim de arrumá-la e acabar com aquela bagunça.

Enquanto cantava o refrão da canção, acompanhando a voz de Daisy, ela arrumava as cartas em ordem crescente de tamanho, sempre tivera uma certa neurose em relação a arrumação, confessava. Enquanto olhava os remetentes distraidamente, assustou-se ao passar os olhos por um que indicava que os autores da carta eram Harry Potter e Virgínia Weasley.

Enrugando a testa, ela separou a carta das demais, colocando as outras sobre a escrivaninha e erguendo a carta endereçada por Harry em frente aos olhos negros e ligeiramente puxados. Sentindo um arrepio percorrer a sua espinha lentamente, ela engoliu em seco, mirando o pergaminho lilás claro e ligeiramente perfumado com as inscrições escritas em caprichosas letras em tom prateado, ligeiramente inclinadas para a direita.

Foi com um arrombo de ansiedade que ela reconheceu a letra de Harry. Respirando ofegante, ela sentiu como se seu coração parasse de bater em meio a uma batida particularmente forte. Cho acompanhava a vida de Harry pelas notícias que lia no Profeta Diário e guardava todas as reportagens que o envolviam, recortando as fotos das manchetes do jornal em que mostravam Harry Potter, mais conhecido como um dos mais famosos aurores da Inglaterra e apanhador reserva do Chudley Cannos nas horas vagas.

Mas agora era diferente. Eram notícias de Harry e Gina. Aquele Weasley de novo, arght! Vivia atormentando a sua vida. Lembrava-se muito bem de como ficava irritada toda a vez que ouviu falar sobre o namoro da pobretona com Harry. Sentia uma raiva incrível, como se seu corpo inteiro entrasse em ebulição e seus olhos saltassem, aumentando de tamanho. Mas o pior era que sempre lia reportagens que falavam sobre o relacionamento dos dois. Afinal, eram as relações amorosas do grande Harry Potter e o namoro com a Weasley parecia estar indo muito bem, já estava durando três anos pelas suas contas.

Com as mãos trêmulas ela abriu o lacre da carta, não conseguindo se controlar. Sabia que era errado mexer daquele forma na correspondência de Neville, mas aquele assunto estava acima de qualquer relação de amizade que tivesse com o amigo. Quando o assunto era Harry, tudo mudava. Olhando para os lados, como se esperasse que Neville atravessasse a parede e a pegasse no flagra mexendo em suas coisas, ela tornou a desviar sua atenção para a carta.

Cho puxou a carta de dentro do envelope e desdobrou o pergaminho também lilás, onde linhas caprichosamente traçadas revelavam letras prateadas e arredondadas, onde se lia:


Caro Neville Longbottom,


As famílias
Potter e Weasley
Sentir-se-ão honrados com a sua presença e de sua família
Na
Capela de Hogsmeade, ás vinte horas, do dia 18 de setembro de 2002
Quando seus filhos:
Harry e Virgínia
Sob a proteção de Merlin e debaixo do manto de suas
Preces, unirão em matrimônio as suas almas, que, um dia,
Deus determinou que se completassem.
Após a cerimônia, os noivos recepcionarão os convidados
Na
Toca, no alto do morro do povoado de Oterry St. Catchpole
Desde já agradecemos a sua atenção e contamos com a sua presença
Sinceramente,
Harry Potter e Virgínia Weasley


Cho arregalou os olhos, entreabrindo a boca, descrente. “Não, não pode ser” - penso, rindo sozinha. Ainda soltando risadinhas ligeiramente irritadas, ela voltou-se para trás, mirando a porta com um sorriso trêmulo.

- Está bem, está bem, Longbottom! Você venceu, agora pode sair de onde quer que esteja escondido que eu já saquei a sua brincadeirinha de mal-gosto! - exclamou, esperando que Neville irrompe-se porta a dentro com um grande sorriso gozador no rosto e grita-se: “Primeiro de Abril!”.

Foi aí que ela lembrou-se de que não era do feitio de Neville pregar peças nos amigos, ainda mais se tratando de um assunto tão delicado feito aquele. Começando a desesperar-se, ela notou que nem ao menos era Primeiro de Abril, na verdade, a data no calendário pendurado na parede do quarto informava-lhe que hoje era dia 14 de setembro. Mas era um dia 14 de setembro como qualquer outro, certo?

Errado. Aquele não era um 14 de setembro comum, a partir daquele dia começava a contagem regressiva para o casamento de Harry Potter e Virgínia Weasley que se realizaria dali a quatro dias.

“Não!” - gritou consiga mesma, não permitindo-se acreditar naquela história. A possibilidade de Harry casar-se com a pobretona Weasley era ridícula, simplesmente inaceitável. “Não é verdade, não pode ser verdade” - pensava insistentemente enquanto lágrimas de raiva começavam a formar-se em seus olhos assim que seu cérebro finalmente conseguiu processar a informação. Seu Harry e a Gina Pobretona Grosseira Mal-educada Estúpida Baranga Mocréia Weasley iriam se casar. A Gina Pobretona Grosseira Mal-educada Estúpida Baranga Mocréia Weasley se casando com o seu Harry. Hary Potter se casando com Gina Weasley. Aquilo tudo era irreal demais.

Suas lágrimas começavam a molhar o pergaminho, borrando a tinta em várias pontos e tornando difícil a leitura da carta. Suas mãos começaram a tremer incessantemente e seus dedos afrouxaram-se, permitindo com que o convite escapasse de seu aperto e caísse suavemente no chão. Ela ficou bem um minuto parada, apenas olhando para o pergaminho, tremendo. Até que, num assomo de raiva, ela levantou-se brutalmente, atirando para o alto a cadeira em que estava sentada, fazendo-a cair com um baque alto, quebrando um dos pés.

Rilhando os dentes com força, Cho apanhou o convite e amassou-o furiosamente, aproximando-se na lareira do quarto e agachando-se em frente a ela. Com raiva, ela rasgou o pergaminho em centenas de pedaços, jogando um por um dentro do fogo crepitante, observando-os queimaram vagarosamente. Assim que só restaram cinzas do convite, ela deixou-se cair tristemente no chão, as lágrimas escorrendo livremente por sua face. Não eram lágrimas de dor. Eram lágrimas de raiva. Raiva por sua futilidade. Raiva por sua estupidez. Raiva por sua ignorância. Raiva por Harry ter trocado-a por uma qualquer.

Enquanto observava as chamas crepitarem alegremente na lareira, Cho sentia a raiva lentamente ir diminuindo, cedendo lugar para pensamentos maldosas cada vez mais constantes. Seu cérebro começara novamente a trabalhar muito rápido, bolando planos e mais planos para impedir a união do casal. O soluços foram vagarosamente cessando e ela foi se acalmando, sua mente imaginando várias situações e maneiras para causar a separação de Harry e Gina.

Quando um sorriso malévolo já se formava em seu rosto e o gosto salgado das lágrimas tornara-se doce, doce como o sabor da vingança, Cho ouviu a porta abrir e o som de passos invadir o silêncio do quarto apenas interrompido pelo crepitar da lareira e seus escassos soluços. Limpando o rastro das lágrimas em seu rosto com pressa, ela tentou engolir os soluços no momento em que virou a cabeça para mirar Neville que acabara de entrar no cômodo.

Neville ficou paralisado em frente ao batente da porta, segurando a maçaneta e olhando espantado para Cho, mirando a cadeira quebrada no chão e o estado deplorável da amiga que tinha os olhos vermelhos e inchados.

- O que aconteceu? - perguntou surpreso.

Cho não respondeu de imediato, apenas fungou tristemente, erguendo-se com o auxílio da escrivaninha e voltou-se para o amigo.

- Nada - respondeu, tentando parecer bem apesar da voz trêmula e fraca.

Neville ergueu uma das sobrancelhas, esticando o pescoço e olhando por cima do ombro de Cho, mirando a lareira onde ainda haviam alguns resquícios de pedaços de pergaminho lilás carbonizando-se. Engolindo em seco, ele ligou os pontos e finalmente entendeu o que estava acontecendo com a amiga.

- Oh, Deus... - sussurrou ele, arregalando os olhos. - Você viu o convite, não é?

- Ele vai casar, Nev. Ele vai casar... - suspirou ela, cerrando os punhos enquanto uma expressão de determinação formava-se em seu rosto.

- Sinto muito - disse Neville, penalizando-se pela amiga.

- Eu que deveria dizer que sinto muito - riu Cho triste - Rasguei o seu convite inteiro.

- Não foi nada - Neville dispensou as desculpas da colega com um aceno de mão enquanto aproximava-se, escondendo algo atrás das costas.

- O que é isso que você está escondendo? - perguntou Cho franzindo o cenho.

- Nada - foi a vez dele mentir, utilizando essa mesma palavra.

- Deixe eu ver - pediu ela, estendendo a mão para tentar apanhar o que ele escondia. Tinha a forte impressão de que ele estava escondendo algo dela, algo importante.

- Não - negou Neville, afastando-se de Cho.

- Longbottom, o que você está escondendo de mim? - indagou Cho num tom de voz grave, colocando as mãos na cintura numa posição autoritária.

- De você? Nada! - mentiu Neville, mas Cho percebeu, pois ele não era um bom mentiroso e logo percebia-se quando ele não falava a verdade.

- Me dá isso aqui - disse Cho, caminhando rápido atrás de Neville. Este acelerou o passo, andando em marcha ré e somente parando quando a colega o prensou contra a parede. A mulher, utilizando-se de seus reflexos provindos do quadribol, com um movimento rápido alcançou o que ele escondia atrás das costas, mas Neville aproveitou-se de seus centímetros a mais e impediu-a de apanhar o jornal do dia que ele tanto tentava esconder.

Profundamente irritada, Cho começou a dar pulinhos inúteis para tentar alcançar o jornal, mas ele era mais alto que ela e seus esforços foram em vão. Cansando-se daquele joguinho, ela bufou exasperada e, antes que ele previsse seu próximo movimento, alcançou a varinha no bolso da veste e lançou-lhe um feitiço de cócegas:

- Rictusempra! - gritou, mirando a varinha na barriga de Neville, pois sabia que aquele era um lugar onde ele certamente sentiria cócegas, já que ela soubera desta informação num episódio muito constrangedor quando Neville, bêbado, contara a todos numa festa que a barriga era o lugar onde mais sentia cócegas.

Um jorro de luz prateada atingiu Neville no estômago e ele dobrou o corpo, com dificuldade de respirar, mal podendo se mexer de tanto rir.

- Golpe... baixo... Chang - disse ele em meio a uma gargalhada, a voz saindo entrecortada.

Cho sorriu, abaixando-se na altura do rosto de Neville enquanto tomava cuidado para sair da zona de tiro da varinha dele. Satisfeita, ela apanhou facilmente o jornal das mãos do homem que ainda contorcia-se num riso interminável. Erguendo-se novamente, ela desdobrou o jornal, avistando logo de cara o que Neville tentava esconder. Em letras vermelhas e garrafais, estava escrita na manchete da capa do Profeta Diário daquele dia:

CASAMENTO DE HARRY POTTER E VIRGÍNIA WEASLEY ABALA AS ESTRUTURAS DO MUNDO MÁGICO

Logo abaixo da manchete havia uma foto de um Harry sorridente, abraçando Gina pela cintura enquanto a mesma pendurava-se em seu pescoço, dando-lhe um discreto beijo na bochecha. Sentindo um ódio tomar conta de seu peito, ela imaginou-se no lugar daquela ruivinha na foto, enquanto tomava coragem para ler a matéria que seguia depois da fotografia.

A reportagem, assinada por Rita Skeeter, contava detalhadamente sobre como o casal estava feliz, esperando ansiosamente o casamento que realizaria-se no dia 18 daquele mês. Relatava também, muito extensamente, alguns dos preparativos para a festa e continha uma entrevista com os noivos e alguns convidados, como os padrinhos de casamento e melhores amigos de Harry, Rony e Hermione Weasley.

Sentindo-se extremamente envaidecida, Cho jogou o jornal sobre a mesa com ferocidade. Sua cabeça doía após tantas novidades e a risada escandalosa de Neville não ajudava em nada para a cura de sua enxaqueca. Irritada, ela apanhou a varinha e desfez o feitiço de cócegas, um alívio imenso tomando conta de sua cabeça assim que as gargalhadas cessaram. Suspirando, a mulher sentou-se da cama desfeita do amigo e apoiou a testa na palma das mãos, os cotovelos apoiados nos joelhos.

- Deve ter sido um choque para você, não? - Neville disse ofegante, formulando um comentário extremamente desnecessário na opinião de Cho que ergueu os olhos, olhando para o amigo. Ele estava encostado na parede, a mão postada sob a barriga enquanto ele tentava recuperar-se do ataque de riso.

- Realmente - concordou Cho, passando a mão pelos longos cabelos negros - Afinal, isso tudo é um absurdo enorme! Como que o Harry pode preferir aquela Weasley à mim?

- Você pergunta logo pra mim? - riu Neville tristemente. Sempre tivera um certa queda pela caçula dos Weasley, paixão ao qual nunca fora correspondida.

- Eu sinto muito, Nev, mas eu realmente não consigo entender como você pode gostar daquela garota tão insossa! - repreendeu-o Cho com um olhar frio.

Neville soltou uma risada pelo nariz que a irritou ainda mais, fazendo-a bufar. O homem mirou-o com os olhos brilhantes de lágrimas de riso que escorriam por sua face redonda e rosada, vendo que a amiga estava prestes a ter um colapso nervoso.

- Cho, acalme-se. Pense pelo lado bom: Harry será feliz, vai casar, constituir uma família, ter filhos... - disse Neville triste, morrendo de vontade de ter tudo o que Harry tinha, principalmente uma certa ruiva de olhos castanhos que lhe tirava o fôlego...

- Mas ele não vai ter isso tudo comigo, ao meu lado! - replicou Cho, torcendo as mãos e balançando o corpo para a frente e para trás incessantemente. - Como ele pôde fazer isso comigo?

- Do mesmo jeito de que você fez com ele quando o dispensou pelo Diggory - Neville tentou parecer razoável, mas Cho não gostou, reclamando:

- Mas eu não casei com o Ced! Nem mesmo namorei com ele sério! Mas o Harry não! Está fazendo planos para o casamento com a Weasley pobretona! Certamente sonhando em ter uma penca de filhos ruivinhos de olhos verdes com ela. Que decadência! Por que ele faz isso? Ou melhor, por que aquela Weasley foi botar essa coisas na cabeça dele?

- Você realmente acha que eu sei o que se passa na cabeça de um Weasley? - indagou Neville chateado - Se eu soubesse já estaria casado com a Gina e nós dois não estaríamos aqui, chorando pela cerveja amanteigada derramada...

E quem disse que eu estou lamentando? Não, não mesmo! Eu estou começando a traçar alguns planos e logo logo os colocarei em prática. - disse ela com um sorriso malévolo.

- E o que você pretende fazer? - perguntou Neville desconfiado.

- Simples: Destruirei o casamento, darei uma surra na noiva, roubarei o noivo e viverei feliz para sempre nos braços do meu amor - sorriu Cho, enumerando as etapas do plano nos dedos.

- Você não pode fazer isso! - escandalizou-se Neville, sacudindo a cabeça perplexo.

- Por que não?

- Por que é errado! - disse o homem como se aquilo fosse a coisa mais óbvia do mundo.

Cho riu, dispensando o comentário.

- Ah, não me venha com essa porcaria de certo e errado. Já passei dessa fase há muito tempo.

- Então só me resta desejar-lhe boa sorte - suspirou Neville resignado.

- Como assim boa sorte? - Cho arregalou os olhos - Você não vai me ajudar?

- É óbvio que não!- Neville mirou-a como se ela estivesse louca.

- Mas eu preciso de você! - Cho olhou-o suplicante.

- Pra que? Você não tem um monte de “planos” aí na sua cabeça? - perguntou Neville ironicamente.

- Tenho, mas para executar esses plenos eu preciso primeiro comparecer ao casamento para poder estragá-lo e para isso eu preciso que você me leve lá - explicou Cho impaciente.

- Eu não posso fazer nada quanto a isso - negou-se Neville, desligando o rádio. - Você não foi convidada. Mas acho que não tem problema para você entrar de penetra.

- Vamos lá, Nev! No convite diz... - começou Cho, mas Neville olhou-a com as sobrancelhas erguidas e ela corrigiu-se - No convite dizia que você pode levar a sua família, o que incluí a sua querida amiguinha Cho aqui, não é?

- Não. - negou ele, cruzando os braços.

- Então me leve como a sua acompanhante. - exigiu ela.

- Eu não posso levá-la comigo, Cho!

- Por que não? - desanimou-se a mulher, emburrada.

- Porque você vai tentar estragar o casamento e isso eu não posso permitir.

- Conta outra, Senhor Santo do Pau Oco! - irritou-se Cho - Eu sei muito bem que você quer acabar com esse casamento tanto quanto eu!

- Não, não quero - desconversou Neville, corando.

- Você quer, sim! - acusou-o Cho, levantando-se da cama e apontando um dedo acusador para ele - Você gosta da Gina!

- Por isso mesmo que eu não quero acabar com o casamento dela - disse Neville - Você não entende? Eu quero a felicidade da Gina justamente porque eu gosto dela! E para mim não importa como ela consiga isso, desde que ela consiga ser feliz, seja comigo ou seja com Harry!

- Corta essa, Longbottom! Você é masoquista, por acaso?

- Não, não sou. Por isso que eu não posso estragar a felicidade da Gina, pois a felicidade dela é a minha felicidade. - disse Neville sério.

- Isso não existe! - Cho disse, fazendo um som abafado de descrédito.

- Então você não ama o Harry de verdade - alertou-a Neville com a voz rouca - Se você realmente o amasse veria que o que falei é verdade.

- É óbvio que eu amo o Harry! - Cho alterou o tom de voz, furiosa.

- Não, você não o ama. Você é obcecada por ele e essa sua obsessão não é saudável, sabe, Cho? Desde que ele começou a namorar a Gina que você cismou que o ama. Mas na verdade você apenas ficou com inveja e ciúme da Gina porque o Harry te trocou por ela. Pela primeira vez um de seus brinquedinhos apaixonados não se importou com o fora que você deu nele. Muito pelo contrário, ele se reergueu com a ajuda da Gina, começando a amá-la, um amor que ele nunca sentiu por você.

- Pare com isso! - berrou Cho, vermelha de raiva - Eu amo o Harry e sempre vou amá-lo, escutou bem? Eu vou me casar com ele e ter filhos com ele! Mas para isso eu preciso acabar com aquela pobretona e com aquele casamento de quinta! E eu vou acabar, pode escrever, eu vou acabar com esse maldito casamento! Com ou sem a sua ajuda!

Cho atravessou o quarto, lançando um olhar assassino à Neville que a observava apreensivo. Bufando, a mulher saiu pela porta e bateu-a com estrondo, fazendo-a estremecer nas dobradiças que sustentavam-na. Neville suspirou enquanto ouvia o barulho dos saltos do sapato de Cho distanciando-se e o silêncio voltava a reinar em seu quarto. Mas ele sabia que aquela história não havia acabado. Ainda teria de resolver muitos problemas que Cho certamente causaria. Começando pelas palavras que ela gravara com um feitiço atrás da sua porta: TRAIDOR MAL AMADO!


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