A Maldição Imperius



— CAPÍTULO SEIS —
A Maldição Imperius




Para tentar impedir Sirius de voltar por sua causa, Harry mandou outra carta para o padrinho, dizendo que tinha imaginado a dor na cicatriz e que escrevera a carta anterior quase dormindo. Hermione imaginou que Sirius não acreditaria naquilo, mas não quis contrariar Harry.
Em sua próxima aula, Olho-Tonto Moody disse aos alunos que lançaria neles a maldição Imperius, para que aprendessem a resistir a ela.
— Mas, professor... — Hermione começou, receosa. — Se as maldições são ilegais, o senhor...
— Dumbledore quer que aprendam a resistir a elas. Se prefere aprender da pior maneira, lá fora, quando alguém lançá-la contra a senhorita, está livre para ir.
Moody apontou o dedo para a porta. Ela engoliu em seco, juntou as mãos atrás do corpo e baixou a cabeça. Encarando os próprios pés, murmurou:
— Não quis dizer que queria sair, professor. Me desculpe.
Moody chamou cada um dos alunos à frente da classe para lançar-lhe a maldição, enquanto os outros observavam. Uma vez amaldiçoados, eles comportavam-se das maneiras mais improváveis, conforme a vontade do professor. O primeiro aluno a conseguir algum resultado contra a maldição foi Harry. Moody gostou tanto que o fez repetir quatro vezes, até conseguir resistir totalmente.
Na vez de Hermione, quando o professor apontou para ela a varinha e gritou ”Imperio!” , ela sentiu sua mente esvaziar-se completamente, e os movimentos que Moody lhe ordenava não exigiam o mínimo esforço. Ela perguntou-se por onde poderia começar a tentar resistir. Ouviu uma voz dizer-lhe: “dê uma cambalhota de costas”. Deitou-se de costas no chão e começou a levantar as pernas. A sensação da saia começando a cair-lhe pela lateral das pernas gerou-lhe um motivo urgente para impedir que elas se movimentassem. Sentiu uma dor intensa com o esforço que fez para manter as pernas totalmente encostadas no chão, ao mesmo tempo em que tentava ainda levantá-las.
Ocorreu-lhe então que a vontade de resistir à maldição era ampla demais para se sobrepor à simples ordem de Moody de levantar as pernas. Era preciso, portanto, concentrar-se na resistência de cada movimento. Concentrou-se no único objetivo de sentar-se, enquanto a ordem do professor era permanecer deitada. Sentiu na região da barriga uma dor lancinante, como se os músculos se estivessem dilacerando. Ouviu sua voz gritando de agonia, de algum lugar muito distante.
Moody desistiu de fazê-la continuar deitada, e fez com que ela se levantasse e começasse a pular para a frente, como um coelho. Hermione apertou os olhos, tentando concentrar-se inteiramente em manter os pés fixados no chão. Para impedir o impulso das pernas para cima, lutou para abaixar-se. Sentia-se como se estivesse sendo repelida pelo chão, quando na verdade a força que a empurrava para cima era de suas próprias pernas. Ela conseguiu abaixar-se, e num esforço urgente envolveu os joelhos com os braços, fazendo força para impedir que se mexessem. Sentiu a sensação terrível dos joelhos tentando desdobrar-se e dando a impressão de que rasgariam os braços que tentavam segurá-los.
De repente, tudo cessou, e ela sentiu todos os músculos aliviando-se. Levantou-se, ofegante, sacudindo a poeira das vestes e sentindo o corpo cansado como se tivesse corrido por horas e horas.
— Parabéns — disse o professor, com um sorriso satisfeito.
Ela juntou-se a Rony e Harry. Dos três, Rony foi o último a ser testado, e o que demorou mais tempo para conseguir resistir. Acabou machucando a perna, e saiu mancando da aula quando ela terminou.
— O que será que temos agora, teste de resistência aos efeitos do pus de bubotúberas? — comentou ele com ironia. — Se conseguirmos sobreviver ao quarto ano já será uma grande coisa; passar para o quinto, então, será um milagre...
Rony estava exagerando um pouco, mas estava certo. Todos os professores estavam exigindo muito mais deles, até mesmo Hagrid. Em sua aula seguinte, ele convidou os alunos a visitarem sua cabana à noite para observarem os explosivins e fazerem anotações sobre o desenvolvimento deles. Malfoy resmungou:
Eu é que não vou vir.
Hagrid levantou os olhos para ele e disse, com aspereza:
— Você vai fazer o que eu mando, Malfoy, ou eu vou arrancar uma página do livro do prof. Moody. Ouvi dizer que você ficou muito bem de doninha.
Hermione, Rony e Harry riram com gosto. Depois de todos os esforços de Malfoy no ano anterior para conseguir a demissão de Hagrid, era genial vê-lo desmoralizando o garoto, que ficou absolutamente vermelho e sem palavras.
Quando voltavam da aula de Trato das Criaturas Mágicas, Hermione, Rony e Harry viram uma aglomeração no saguão de entrada, ao redor de um aviso afixado na parede com o título: "Torneio Tribruxo". A informação que constava no cartaz era que as delegações de Beauxbatons e de Durmstrang chegariam no dia trinta de outubro, uma sexta-feira, às seis da tarde. Neste dia, as aulas terminariam uma hora antes.
— É daqui a uma semana — exclamou um aluno da Lufa-Lufa. — Vou avisar Cedrico!
— Cedrico? — Rony perguntou.
— De certo vai se inscrever — Harry disse.
— Aquele idiota, campeão de Hogwarts?
— Ele não é idiota — Hermione retrucou. — Você não gosta dele porque ele venceu a Grifinória no quadribol. Ouvi dizer que ele é muito bom aluno, e é monitor.
Rony pareceu tomar o comentário como ofensa pessoal.
— Você gosta dele porque ele é bonito.
Foi a vez de Hermione se indignar.
— Perdão, eu não gosto de pessoas só porque são bonitas!
Rony forçou um pigarro, fazendo-o soar ironicamente como "Lockhart".
— Golpe baixo — ela resmungou, baixo o suficiente para que ninguém ouvisse além dela mesma.

Rony e Harry pagaram os dois sicles de suas inscrições no F.A.L.E., mas Hermione percebeu que eles não estavam dispostos a ajudar. Ela fazia campanha sozinha na sala comunal, passando com a lata de coleta pelos colegas e repetindo discursos como:
— Vocês sabem que seus lençóis são trocados, as lareiras acesas, as salas de aula limpas e a comida preparada por criaturas mágicas que não recebem salário e são escravizadas?
Havia quem concordasse com o movimento, mas a maioria o encarava como piada. Numa média geral, pouquíssimas pessoas se inscreviam, e a maioria provavelmente apenas para fazê-la se calar. Como podiam ser todos tão cegos e conformistas? E se fosse com eles? Será que gostariam de levar a vida de um elfo doméstico?
Na manhã do dia trinta, pairava pela escola uma ansiedade quase palpável pela chegada dos visitantes estrangeiros. O salão principal estava decorado com cinco enormes bandeiras: a da Grifinória, vermelha com um leão dourado; a da Corvinal, azul com uma água de bronze; a da Lufa-Lufa, amarela com um texugo negro; a da Sonserina, verde com uma serpente prateada; e a de Hogwarts, atrás da mesa dos professores, que tinha uma grande letra H no centro e os quatro animais representantes das casas ao redor.
Durante o café da manhã, Hermione comentava sobre o F.A.L.E., quando Jorge ajoelhou-se ao seu lado e disse:
— Mione, você já foi à cozinha da escola?
— Não — ela respondeu. — Não acho que os alunos devam...
Ele interrompeu-a com um gesto de impaciência e disse:
—Bem, nós já fomos, para pegar comida. Os elfos são felizes; acham que têm o melhor emprego do mundo!
— Isso é porque eles não têm instrução e sofrem lavagem cerebral!
Jorge revirou os olhos, num gesto de desistência. Nesse momento as corujas invadiram o salão, trazendo o correio. Hermione reconheceu Edwiges, e trocou um olhar ansioso com Harry e Rony.
— Por que tão rápido? — Harry murmurou. — Ele deve estar perto...
Tão logo a coruja pousou na mesa, Harry pegou o pergaminho. Hermione e Rony aproximaram-se dele, e ele começou a ler a carta, em voz baixa:
— “Não me convenceu, Harry. Estou de volta ao país e bem escondido. Quero que me mantenha informado de tudo o que estiver acontecendo em Hogwarts. Não use Edwiges, para não chamar a atenção. Não se preocupe comigo, cuide-se. Não esqueça do que eu lhe disse sobre a cicatriz. Sirius”
Harry suspirou Desta vez não estava com raiva; parecia aliviado e até reconfortado com a idéia de ter o padrinho por perto.

As aulas passaram rápido, e no final da tarde os alunos formaram filas em frente à entrada da escola para esperar a chegada das delegações de Beauxbatons e Durmstrang. Uns comentavam com os outros, curiosos, se eles chegariam de trem, vassoura ou outro tipo de transporte. Havia uma certa tensão no ar; uma mistura de ansiedade com curiosidade.
Depois de algum tempo de espera, apareceu no céu uma enorme carruagem azul-clara, puxada por também enormes cavalos alados. Hermione ouviu suspiros de admiração ao seu redor. A carruagem pousou e saiu de dentro dela uma mulher enorme, da altura de Hagrid; o que explicava o tamanho da carruagem. Uma vez passado o susto, Hermione achou-a bonita. Atrás dela, vinham cerca de doze garotos e garotas usando leves capas de seda azuis.
Dumbledore iniciou uma salva de palmas, que todos acompanharam, depois cumprimentou-a:
— Madame Maxime... Bem-vinda a Hogwarts.
— Obrrigada, Dumbly-dorr... — respondeu ela, com voz grave.
Como estavam com frio, a diretora e os alunos de Beauxbatons entraram no castelo. Já estava quase totalmente escuro agora, e os alunos de Hogwarts permaneceram em fila, esperando. Hermione apertou os braços ao redor do corpo, tremendo um pouco de frio.
Algum tempo se passou em que todos estiveram analisando atentamente todos os lados do céu e da terra à espera de algum veículo que trouxesse a delegação de Durmstrang, até que, aos poucos, surgiu de dentro das águas do lago um navio enorme. Alguém atirou uma âncora, e pouco depois começaram a descer do navio garotos vestindo pesadas capas de peles. Um homem de cabelos grisalhos e vestes prateadas vinha conduzindo-os, e aproximou-se para cumprimentar Dumbledore.
— Dumbledore, como vai!
— Muito bem, prof. Karkaroff, obrigado.
Karkaroff voltou a virar-se para trás e chamou:
— Vítor!
Hermione reconheceu o garoto que vinha vindo em direção ao diretor de Durmstrang; era Vítor Krum. Karkaroff tratava-o como uma estrela, queria fazê-lo entrar antes dos outros e disse a Dumbledore, com gravidade, que o garoto sofria com um resfriado.
— Francamente! — murmurou para si mesma, perguntando-se onde fora o garoto de expressão desapontada, com um pomo de ouro na mão e o rosto ensangüentado, querendo ficar junto aos companheiros para encarar a derrota de cabeça erguida.
Todos puseram-se em movimento para entrar na escola, vagarosamente por causa da quantidade de pessoas.
— É ele, Vítor Krum! — murmurava Rony insistentemente e de um jeito irritante para Harry, que não parecia muito satisfeito com as sacudidas que recebia do amigo.
A euforia de Rony era comparável à das garotas que enfileiravam-se atrás de Krum, disputando batons para pedir autógrafos.
Francamente! — ela repetiu.
— Não acredito! — dizia Rony. — Vítor Krum, Vítor Krum!
— Pelo amor de Deus, Rony, — Hermione disse — é só um jogador de quadribol...
— Como só um jogador de quadribol? — perguntou Rony, incrédulo. — Ele é um dos melhores apanhadores do mundo, é um gênio! Eu não fazia idéia de que ele ainda estava na escola... Vou pedir um autógrafo a ele se puder...
Já no salão principal, os três sentaram-se à mesa da Grifinória. Rony tinha os olhos grudados em Krum, provavelmente esperando fervorosamente que ele se sentasse com eles. No entanto, os alunos de Durmstrang acabaram sentando-se à mesa da Sonserina, enquanto os de Beauxbatons escolheram a da Corvinal.
— Malfoy vai se gabar muito por isso — Rony resmungou. — Onde será que eles vão dormir? Eu poderia ceder a minha cama, sem problema nenhum...
Hermione e Harry entreolharam-se, os cenhos franzidos. Lá na frente, ao lado de Dumbledore, sentaram-se Madame Maxime e o prof. Karkaroff. Havia ainda duas cadeiras sobressalentes, que estavam vazias, e Hermione perguntou-se quem chegaria para ocupá-las.
O diretor de Hogwarts anunciou o início do banquete, e as travessas de ouro encheram-se de comida. Além dos pratos habituais, havia ainda pratos típicos dos países dos visitantes. A certa altura do jantar, uma garota aproximou-se deles e perguntou, apontando para uma travessa:
— Posso levarr?
Ela usava o uniforme de Beauxbatons, e era muito bonita. Tinha grandes olhos azuis, um rosto delicado de bochechas rosadas e uma enorme cascata de cabelos dourados. Rony ficou mais boquiaberto ainda do que quando vira Krum. Ele fez um esforço enorme para responder, mas não saiu nada de sua boca. Harry alcançou a travessa à garota, e ela voltou para a mesa da Corvinal.
Rony continuou a olhá-la, embasbacado. Hermione sentiu a testa fervendo e um vazio atordoante no estômago, muito diferente de fome ou qualquer outra sensação que já tivesse sentido. Procurou Gina na mesa da Grifinória, mas ela estava muito longe; de repente ela pareceu-lhe a única capaz de ajudá-la. Mas ajudá-la em quê?
— É uma veela — Rony balbuciou, pateticamente.
— Claro que não! — Hermione disse, um pouco mais alto do que planejara. — Não vejo mais ninguém olhando para ela com a boca aberta, como um idiota!
— Não é uma garota normal... Não fazem garotas assim em Hogwarts.
A sensação no estômago de Hermione piorou. Parecia estar espalhando-se pelos pulmões, atrapalhando sua respiração. Cortou a carne com tanta força que sentiu o prato arranhando-se por baixo da comida.
— Fazem garotas legais em Hogwarts — Harry disse, também com os olhos postos na mesa da Corvinal. Ele olhava, porém, para Cho Chang, apanhadora do time da casa.
Sentindo-se acuada, Hermione soltou um suspiro ruidoso de impaciência e pôs o pedaço de carne que cortara na boca, mastigando-o com ferocidade. Passou os olhos pela mesa dos professores e viu que as cadeiras vazias agora estavam ocupadas por Bartô Crouch e Ludo Bagman.
— Quando vocês repuserem os olhos dentro das órbitas, poderão ver quem acaba de chegar — disse, enérgica.
Ela não conseguiu mais comer direito. O mal-estar do estômago que se propagara para os pulmões parecia agora estar apertando com força seu coração. Não tinha o menor ânimo de olhar para a frente e ver a cara de bobo com que Rony continuava a admirar a garota de Beauxbatons.
Ao final da refeição, Dumbledore retomou a palavra.
— O Torneio Tribruxo vai começar. Farão parte da banca que julgará os campeões, além dos diretores das três escolas, Ludo Bagman e Bartô Crouch, funcionários do Ministério da Magia e partes vitais na organização do evento. Quem escolherá os campeões, porém, não será nenhum de nós. Sr. Filch, por favor.
O zelador trouxe um baú, abriu-o e tirou dele um cálice de madeira, do qual irrompiam chamas branco-azuladas.
— O cálice de fogo — anunciou Dumbledore. — Ele ficará no saguão de entrada durante vinte e quatro horas. Quem quiser se inscrever para o torneio deve escrever seu nome em um pedaço de pergaminho e depositar nas chamas azuis. Na noite de amanhã, durante a festa do Dia das Bruxas, o cálice devolverá três nomes, um de cada escola, e estes serão os campeões. O julgamento do cálice de fogo é imparcial, e uma vez escolhido por ele, o campeão não terá escolha senão participar. Portanto, recomendo que ninguém se inscreva sem ter a certeza absoluta de que está pronto para encarar o desafio. Os menores de dezessete anos não poderão inscrever-se, pois eu me encarregarei pessoalmente de traçar uma linha etária ao redor do cálice.
E com isso a festa deu-se por encerrada. Os alunos começaram a se levantar e deixar o salão principal. Hermione sentia-se extremamente irritada, e o mal estar transformara-se numa espécie de enjôo. Ela puxou Gina pelo braço assim que chegou perto o suficiente da amiga. Contou a ela o que estava sentindo, e ela disse:
— Mione... Isso é ciúme, sabia?
Fosse o que fosse, a sensação era terrível; Hermione tinha certeza de que aquilo era pior do que resistir à maldição Imperius.

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