Capítulo XXXII



Era ridículo como o coração assumia um novo ritmo. Ridículo e irritante.

- Bem, parece que a partir de segunda-feira você não terá mais de se preocupar com nossa presença em sua casa. – ela disse depois de alguns instantes, incapaz de suportar o silêncio tenso por mais tempo. – Rony fará a cirurgia no centro, e Bryan e eu voltaremos para casa.

- A presença de vocês nunca me incomodou. Durante os dez dias que passaram aqui, a casa não pareceu tão quieta e grande, tão… tão vazia.

Por um momento teve a impressão de que ele diria solitária, mas era tolice. Um homem forte e independente como Harry nunca sentia solidão. Como mulheres fortes e independentes como ela jamais se sentiam solitárias. Mas se sentia solitária, e amedrontada, e ardia com a necessidade de ser amparada por alguém tão forte, independente e solitário quanto ela.

Desde o momento em que tomara conhecimento do tumor no cérebro de Rony, Hermione se mantivera forte. Havia sido forte por Rony e pelo filho, demonstrando otimismo e esperança e se recusando a reconhecer o medo que se ocultava nas sombras de seu coração. Mas agora a cirurgia de Rony fora marcada para dali dois dias, e o medo saltava das sombras para atormentá-la como um animal feroz à espera da presa.

- Harry? – A voz tremia e, horrorizada, notou que o rosto dele perdia a nitidez por conta das lágrimas inesperadas. Sem dizer mais nada, deu um passo à frente com os braços estendidos.

Harry a viu desmoronar diante de seus olhos. As lágrimas transbordavam dos olhos castanhos e corriam pelo rosto corado, e os lábios tremiam de aflição e desespero. Sabia que seria loucura tocá-la, mas não tinha alternativa. Não podia negar consolo a uma mulher angustiada, como não podia negar a necessidade de senti-la em seus braços mais uma vez. O contato físico destruiu o pouco controle que ainda lhe restava, e ela explodiu num pranto convulsivo cortado por soluções. Harry a abraçava com força, sentindo sua dor e seu medo, desejando poder apagar tais sentimentos de forma a livrá-la do sofrimento. As lágrimas partiam seu coração… um coração que já sofria há dias pela doença do amigo.

- Eu sinto muito. – Hermione murmurou entre um soluço e outro, embaraçada pela demonstração de fraqueza. – Sinto realmente. – Tentou afastar-se, mas ele a manteve presa entre os braços.

- Desabafe. Ponha para fora o que a está torturando.

Hermione chorou como uma criança, até que, minutos mais tarde, os soluços foram perdendo intensidade. Mesmo assim, ela se mantinha aninhada em seu peito. Harry afagou seus cabelos, sentindo neles o calor dos primeiros raios de sol.

- Sente-se melhor? Ela assentiu.

- Tenho tanto medo. – confessou em voz baixa, os olhos castanhos buscando os verdes dele. – Também está com medo?

Harry hesitou. Jamais revelara medo a quem quer que fosse depois da derrota de Voldemort, isso não levava a nada.

- Sim, estou com medo. – disse. – Para ser mais exato, estou apavorado. Ela segurou seu rosto com as duas mãos.

- E quando está com medo, quem o consola? Quando a escuridão o cerca, quem o abraça e o faz sentir segurança? Quem o faz ter certeza de que, eventualmente, tudo vai ficar bem?

- Ninguém. Nunca precisei de ninguém… até agora. – Os lábios tocaram os dela num beijo suave e rápido. Hermione gemeu.

Não era um gemido de dor ou angústia, mas um som que brotava do fundo de sua alma e traía um desejo intenso e incontrolável. O beijo de Harry pretendia manter leve e sem conseqüências transformou-se num contato apaixonado, sensual e íntimo. Os corpos se encontraram, e as bocas se abriram num encontro verdadeiro e envolvente. A razão deu lugar ao instinto.

Harry sabia que perdera o controle e, pela primeira vez desde que se lembrava, não estava preocupado com as conseqüências. Pensava apenas no momento e naquela mulher. Hermione. Doce e forte Hermione. Queria deitá-la na relva perfumada, despi-la e mergulhar em seu corpo quente. Queria fazer amor com ela, possuí-la como nenhum outro homem jamais fizera. A idéia foi como um balde de água gelada sobre sua cabeça. O frio da realidade. O desgosto o invadiu… sentia repugnância pelo próprio desejo, por ele mesmo.

Harry soltou-a, interrompeu o beijo e recuou um passo. Depois respirou fundo, como se buscasse forças para resistir à tentação de tocá-la novamente.

- É evidente que existe uma espécie de química entre nós. – disse, irritado com a instabilidade na voz. – Não vou mentir, Hermione. Quero tê-la em meus braços… em minha cama. Nunca em toda minha vida desejei outra mulher com a mesma intensidade. Por favor, não interprete minhas palavras de maneira errada. Refiro-me a uma necessidade física, e não porei em risco o relacionamento com meu amigo ou seu bem-estar emocional por uma ligação passageira com você. – Viu a dor causada por suas palavras, mas tinha de certificar-se de que nada daquilo voltaria a acontecer. Sabia que, se a tivesse nos braços mais uma vez, não seria capaz de deter-se antes de cometer um erro irreparável. – É pura luxúria, Hermione. Não confio em mim quando estou perto de você. – Enquanto falava, ele montou novamente. - Depois da cirurgia de Rony, acho que será melhor se não nos encontrarmos mais.

Sem esperar por uma resposta, Harry partiu num galope alucinado e não olhou para trás. Cavalgava em alta velocidade, sentindo o vento de outono no rosto, tentando apagar o desejo que ainda queimava em seu corpo e corria por suas veias. Hermione. O nome era uma maldição em seus lábios, em seu coração. Mais dois dias. Só teria de passar mais dois dias perto dela, e depois nunca mais teriam de se encontrar.

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