Capítulo XXX



- Tudo bem? – Rony perguntou quando Harry saiu.

- Sim. – Hermione ofereceu um sorriso que parecia falso e forçado. Gostaria de saber se os lábios estavam vermelhos e úmidos como os sentia, ou se o rosto refletia parte do desejo espantoso que experimentara. – Querem um pedaço de bolo de abóbora com sorvete? Era o prêmio para o vencedor do concurso de pizzas.

- Eu quero! – Bryan exclamou, aparentemente inconsciente da tensão que dominara a cozinha por um breve período. Ele se sentou à mesa. – Mas acho que devia dizer quem venceu o concurso.

- Creio que todos nós vencemos. – Rony opinou antes que ela pudesse responder. – Todos nos divertimos muito fazendo pizza e contando histórias engraçadas, e isso faz de nós vencedores.

- Seu pai está certo. Todos saíram vencedores. – Hermione ocupou-se cortando os pedaços e bolo, grata pela atividade que distraía a mente das emoções confusas e incômodas.

O beijo a abalara profundamente, provocando um incêndio em seu corpo como nunca antes acontecera. O coração ainda batia acelerado, e todas as terminações nervosas pareciam estar carregadas de eletricidade. Sentada, bebeu mais uma xícara de café enquanto Rony e Bryan comiam o bolo e conversavam sobre coisas importantes para um menino de nove anos. Ela tentou se concentrar na conversa, mas era impossível. Só conseguia pensar em Harry.

A mente, os sentidos e o coração estavam repletos dele. Os seios pulsavam clamando pelo toque daquelas mãos, e o estômago sofria a dor da frustração. E numa afirmação breve e direta, ele revelara o que pensava sobre o beijo. Havia sido apenas uma estupidez provocada pelo descontrole emocional. E para ela, o que havia sido? Uma experiência devastadora e marcante. Como voltar para casa depois de uma ausência prolongada. E estava apavorada.

- Mãe? – O tom de voz de Bryan indicava que ele tentava atrair sua atenção há algum tempo. Hermione fitou-o e tentou esconder a culpa atrás de um sorriso. - Papai perguntou se quer ir jogar quadribol amanhã à tarde com os tios Fred e Jorge.

A expressão ansiosa do menino traía o desejo de poder contar com a companhia da mãe.

- É claro, querido. – disse.

Não ficaria em casa com Harry enquanto Rony e Bryan estivessem fora. Precisava manter-se longe dele. E nos cinco dias seguintes, Harry entregou-se ao trabalho com o mesmo afinco com que tentava manter a distância entre eles. De manhã, enquanto Bryan estudava com o professor particular e Rony saía para ir à cidade, Hermione permanecia no quarto ou na cozinha.

Sempre que estava sozinha, descobria-se pensando na conversa que tivera com Harry antes daquele beijo devastador. Teria contribuído para a imaturidade de Rony? Afinal, as pessoas se esforçavam para corresponder às expectativas, e não esperara nada dele. Teria sido sua falta de expectativas um obstáculo para o crescimento do ex-marido? Sempre acreditara ser uma pessoa independente, e considerava essa característica bastante positiva. Mas de repente se perguntava se não havia sido um pouco egoísta, também. Nunca dividira seus medos, suas apreensões ou seus problemas com Rony.

Fizera questão de mantê-lo afastado de todas as áreas privadas de sua vida por não conhecer outra maneira de ser. No entanto, nos dois dias que passara na floresta com Harry, havia dividido mais com ele do que em toda uma vida conjugal com Rony. Quando o ex-marido perguntara por que ela precisava de uma lâmpada noturna em seu quarto, havia respondido que gostava de enxergar o caminho para o banheiro no meio da noite. Nunca pronunciara uma só palavra sobre o trauma que a deixara com medo do escuro. Por que confessara a verdade a Harry, se nunca a revelara ao homem que fora seu marido? Não queria conhecer a resposta. Tinha medo de descobri-la.

Tudo que sabia era que Harry estava certo; ambos haviam contribuído para a imaturidade de Rony de uma forma ou de outra. Uma outra coisa tornou-se clara em sua mente. O beijo de Harry confirmara que, apesar de todo o carinho por Rony e do anseio de construir uma família a seu lado, jamais o amara de verdade. Existira pouca paixão no casamento. O beijo de Harry havia provocado um desejo muito maior do que todas as intimidades que conhecera com Rony. E no esforço de evitar encontros com Harry naqueles cinco dias, acabara passando muito tempo com Bryan e Rony.

Foram jogar quadribol (coisa que ela não gostava muito), ao cinema e à sorveteria, e passearam muito pela cidade. Estava surpresa por ter descoberto uma nova maturidade no ex-marido. Havia uma espécie de sobriedade em seus olhos, como se ele se tornasse mais introvertido e buscasse o homem que poderia ser. Ela e Bryan estavam na Toca há uma semana quando Rony os acordara cedo para uma cavalgada matinal (hobby que Rony adquiriu por viver numa cidade trouxa por tanto tempo).

Hermione vestiu um jeans e uma regata de algodão pink, prendeu os cabelos num rabo de cavalo e dispensou a maquiagem, certa de que o filho e o ex-marido a esperavam ansiosos no estábulo. O coração disparou quando, ao chegar, ela viu Harry montado em um esplêndido animal preto. Ele também vestia jeans e uma camisa estilo machão que enfatizava o peito largo.

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