Remorso



Continuei aborrecido enquanto Hermione me dava um relatório completo do que havia feito até então em Godric’s Hollow. Por fim, ela própria notou que havia algo errado e, hesitou. Piscou algumas vezes antes de perguntar:

- Algo errado, Harry? – ela perguntou, o mais polidamente possível.
- Não... continue... – respondi, abanando a mão, enquanto ajeitava com a outra, a mala nas costas.
- Bem, acho que podemos começar pela sua casa... – respondeu ela, parecendo distante então.

Hermione me levou até um bairro bem distante. As casas eram bonitas e os habitantes pareciam ser bem simpáticos. Uma senhora me reconheceu enquanto passávamos na frente da casa dela. Ela queria me fazer entrar e comer de seu bolo, mas Hermione insistiu em continuarmos... tínhamos um longo caminho pela frente. Quinze minutos depois, estava eu parado à frente de uma casa em ruínas. Era a minha casa... a casa que fora de meus pais... a casa em que eu seria criado feliz se não fosse por aquele demônio (o que citei no capítulo anterior) não ter interferido em minha vida e não ter me feito herdar essa sina.
Era estranho estar na frente da minha casa, ou andar sobre os escombros do que um dia já foi um lar feliz. Eu me senti miseravelmente infeliz e a lembrança de meus pais me assombrou.
- Desculpe-me... Harry. Achei que queria ver este lugar. – disse Hermione, de repente. Enquanto eu estava perdido em meus pensamentos, minha amiga estava a me observar.
- Eu estou bem... – respondi vagamente. Não queria falar meus sentimentos agora.
Hermione pareceu compreender, pois ficou calada.
- Onde iremos depois daqui? – falei. Eu queria sair dali o mais rápido possível. Era engraçado. Eu deveria gostar de estar ali, mas uma dorzinha chata na minha cicatriz estava realmente me perturbando.
- Pensei em visitarmos os túmulos de seus pais. Podemos ir andando. O cemitério fica aqui perto.
Enquanto caminhava ao lado de Hermione, em direção ao cemitério que ficava numa colina, acabei por me irritar ainda mais com minha amiga. Que tipo de tour era aquela? Visitar minha casa destruída e depois ver os túmulos de meus pais? Ela havia me chamado para aquilo?
Entramos no cemitério sem nos falar. Eu estava muito aborrecido e Hermione estava pensativa. Estava a ponto de sair correndo dali quando minha amiga apontou para um mausoléu. Estava escuro ali dentro, mas quando entrei e meus olhos se acostumaram a escuridão vi que havia duas lápides muito bonitas, enfeitadas com flores recém postas. Fora Hermione. Ela tivera o cuidado de limpar o pó daquele lugar e colocar flores. Flores brancas para meu pai e flores rosas para minha mãe. Eu senti minha garganta embargar e os olhos lacrimejarem. Como eu era injusto. Eu queria esquecer a memória da morte de meus pais, mas Hermione não estava tentando me aborrecer, tentando me fazer lembrar do caminho de destruição que ainda havia pela frente. Pelo contrário, ela estava querendo que eu me fortalecesse na memória deles.

Quando pensei em falar alguma coisa para minha amiga, Hermione colocou uma das mãos nos meus ombros. Eu não precisei falar mais nada. Ela estava ali. Ela me apoiava. É por isso que Hermione sempre foi minha amiga. Quando todos nem percebiam o que eu estava sentindo, ali estava Hermione, com um olhar atencioso, um sorriso bondoso. Sempre tentando cuidar de mim.

Eu saí um pouco menos tenso do mausoléo de meus pais, mas Hermione não quis parar por ali.
- Se formos rápido, poderemos chegar até a casa de que lhe falei.
Ela havia falado alguma coisa sim, mas como eu estava aborrecido, nem prestei atenção, mas não quis ser óbvio, então disfarcei:
- Ah... e o que você espera encontrar nessa casa? – perguntei. Achei que era melhor do que “Que casa?”, mas Hermione percebeu que mais uma vez havia sido evitada.
- Já lhe falei. O cofre, com duas cobras de prata entrecruzadas na fronte. – respondeu ela, parecendo um pouco aborrecida.
- Desculpe, Hermione, acho que estava cansado. Não escutei direito. Podes repetir?
Depois de um muxoxo, ela cedeu:
- Pesquisei muito essa região. Visitei alguns amigos de seus pais. Cheguei até a casa de um velho auror. Ele me disse que havia uma casa muito suspeita na região. Quando eu fui até essa casa, achei atrás de um falso quadro um cofre, mas não consegui abrir por nenhum feitiço normal. Achei que o que dispara o cofre é a língua de cobra, foi por isso que chamei você aqui... não conheço ninguém mais que fale língua de cobra.
- Sim, sim, claro... claro... – disfarcei. – Então é melhor irmos.

Quando chegamos na tal casa o sol já se punha ao longe, e por isso, Hermione evitou.
- Acho melhor voltarmos amanha! – disse ela, temerosa.
- Não... vamos poupar tempo hoje! – eu retorqui.
Muitas vezes Hermione aconselhou-me e na grande maioria de vezes, ela estava certa e eu errado. Parte de mim sabe que se eu tivesse seguido os conselhos de Hermione, talvez hoje eu tivesse meu padrinho, Sirius Black, comigo. Ou que não teria me deixado influenciar pelo Príncipe enquanto deveria estar aprendendo coisas sobre meu arqui-inimigo, ou teria deixado para entrar naquela casa noutro dia. Eu nunca vou saber ao certo, já que escolhi um caminho. Naquele dia, sei que escolhi um caminho... se foi o certo.. não sei... e imagino muitas vezes o que aconteceria se eu não entrasse naquela casa naquele dia. Minha memória, caros leitores, já não é a mesma, mas o que lembro vou lhes contar.

Arrastei Hermione para dentro a puxando pela mão. Ela estava nervosa. Dizia o tempo todo que queria ir embora... que fóssemos rápido. Ela me levou até uma biblioteca muito antiga. Como havia explicado, Hermione retirou um quadro velho da parede e mostrou um cofre antigo com as duas cobras de prata na fronte.
Eu disse “abra” em língua de cobra e a pequena portinhola se abriu.
Hermione ficou surpresa. Seus olhos brilharam quando viu o que havia ali: um medalhão, um anel, uma tiara, um retrato velho com a pintura de minha mãe. Seriam orcruxes? Não estariam naquele cofre se não o fossem.
Hermione abriu a bolsa e tirou um lenço branco, usando-o para se proteger contra qualquer tipo de feitiço. Com cuidado ela depositou os objetos todos num saco de papel e o colocou na bolsa. Quando nos viramos, prontos para ir embora, vimos que não estávamos sos naquela casa.
- Sabia que viriam aqui...! – respondeu uma voz sibilante que pertencia ao demonio cruel que tirara a vida de meus pais e de outros amigos muito amados. Um demônio que terminaria por mudar minha vida inteira.
Enquanto ainda pensava no que fazer, Hermione se moveu. Atirou um feitiço em Voldemort que ele prontamente revidou. Ela caiu para trás, mas quando o Lord das Trevas pensou em matar-me com o Avada Quedavra, eu cai propositalmente para fugir do raio e o atingi com um sectumsempra. A face de Voldemort abriu-se numa ferida que jorrou sangue sobre mim, mas eu não perdi mais tempo e o ataquei com Crucios. Ele não demorou muito para se reerguer, revidando um dos meus ataques. Feliz ou infelizmente, Hermione havia se levantado e conseguiu atacar nosso inimigo em comum.
Eu estava brandindo minha varinha, quando vi o olhar demoníaco de Voldemort virando-se para minha amiga. O desespero tomou conta de mim, mas a lógica mundana não conseguiu fazer-me veloz naquele instante. O feitiço de Avada Quedavra atingiu Lord Voldemort no mesmo instante que um feitiço inominável saia de sua varinha para alcançar o ventre de Hermione.
- Ah...! – Ela gritou de dor, levando a mão ao ventre e caiu sobre o tapete coberto de pó.
- Mione! – gritei, mas antes que a alcançasse uma nevoa esverdeada me cobriu ao mesmo tempo em que o corpo de Voldemort se dissipava no ar.
- Hermione, repeti quando alcancei a garota, segurando-a firme nos braços. – Mione?
Ela tremia e do canto dos lábios, uma gota de sangue começou a escapar.
- d-dor.... – ela conseguiu dizer com uma sobre-vida.
- Calma, Mione... acalme-se.
Um terrível sentimento de remorso tomou conta de mim. Remorso por te-la tratado mal desde o momento em que havia pisado em Godric’s Hollow. Remorso por ter-me irritado com a tour sentimentalmente preparada por ela. Remorso por te-la obrigado a entrar naquela casa maldita. Remorso.
Remorso pode ser o pior dos sentimentos. Eu senti muito desse sentimento naquele dia e jurei naquele momento, sobre o corpo frágil e tremulo de Hermione que a recompensaria por aquele trágico acidente. E fora um acidente. Como sempre havia sido um acidente causado pela minha ceguice, pela minha falta de tato e pela minha irritação por Hermione conhecer tão bem minha alma, quando mesmo eu não a conhecia.
Naquele instante, com Deus por testemunha, eu jurei que se Hermione vivesse eu a faria minha, casaria-me com ela e a protegeria para todo o sempre. Mesmo sem ama-la. Mesmo amando Gina como achava que amava, mesmo assim, Hermione seria para sempre minha.
Cometi sem saber, ou sabendo, mesmo hoje ainda não sei, cometi, meu Deus, outro erro. Hermione poderia ter sido minha se o destino assim o quisesse, mas eu alterei o curso de minha vida. Escolhi fazer da minha vida e da de Hermione, um completo... inferno.



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