Eu Te Amo



Capítulo 13 - Eu te Amo

Tonks acordou cedo, ainda de madrugada, algo atípico para ela que sempre fora tão dorminhoca. Ainda entre o sonho e o despertar, ergueu o braço direito e tocou um corpo grande e peludo ao seu lado. O ato a fez acordar imediatamente, e ela abriu os olhos uma sensação de leveza se instalando nela quando capturou o olhar do animal sobre ela, a observando talvez já há algum tempo. Mais adiante, ela viu o relógio da mesa de cabeceira, que marcava seis horas. Estava escuro lá fora, mas uma linha cor de rosa se estendia no horizonte.

Aconchegou-se sobre as cobertas, feliz. Era surreal, inacreditável, que tivesse passado horas na presença de um lobisomem e inclusive dormido ao lado dele, de forma tão pacífica. No entanto, agora, lhe parecia tão certo, tão óbvio! Por mais algum tempo ela continuou deitada ali, saboreando essa idéia, deixando a mente vagar, quando um ganido baixo lhe chamou a atenção.

Olhou novamente para o lado e agora o lobo parecia respirar com dificuldade, gania, rosnou para ela ferozmente quando ela tentou toca-lo, fazendo-a descer da cama e encostar-se à parede para se manter longe, assustada. Como justificativa, ela viu, de relance, que o dia estava amanhecendo: ele estava se transformando.

Sem ação, observou a fera se contorcer cada vez mais, uivos de dor enchendo o quarto. Os pêlos começaram a desaparecer, como se voltassem para dentro da pele, os olhos mudaram de forma e cor, dedos cresceram de suas patas que agora mais se assemelhavam a mãos humanas, as pernas se alongaram.

Então tudo cessou. O silêncio tomou conta do aposento, exceto pelo arfar do homem que agora tomara o lugar da fera. Havia arranhões em todo o seu corpo, os cabelos castanhos grudavam no rosto coberto de suor. Tonks ofegou.

- Remus...

Foi até ele, pousando uma das mãos em suas costas – que subiam e desciam devido à sua respiração – enquanto, com a outra, tirava o cabelo de sua testa, para olhá-lo nos olhos, mas ele os manteve fechados. A vergonha o consumia por dentro, por ser visto assim por ela. Fraco, indefeso, amaldiçoado.

- Eu volto já – murmurou ela, com a voz tremula e ele pôde ouvir em seguida a batida seca da porta batendo.

Não conseguia lembrar de muita coisa da noite anterior. Como se fosse um sonho, cada vez mais os detalhes iam lhe escapando, até deixá-lo apenas com uma vaga idéia do que havia de fato ocorrido. O resto só podia supor, imaginar.

Mas, fosse o que fosse que ela tivesse presenciado, vira agora seu lado negro, feio, sujo. Teria para sempre na memória as visões daquela noite, assombrando seus sonhos e fantasias. Era culpa dele, por ter concordado com a visita dela. Sempre era culpa dele, ele, afinal, era o homem impuro, contaminado. Como poderia voltar a falar com ela, a olhar para ela, agora? – pensou em um desespero mudo.

O coração pareceu inchar no peito, a vergonha atingia níveis insuportáveis. Com um nó na garganta ele sentiu lágrimas escorrerem, misturando-se ao suor. Mas Ninfadora já devia estar voltando, ele precisava se recompor.

A porta voltou a se abrir e fechar, ela pulou ansiosamente na cama, ajoelhando-se ao seu lado. Beijou seu rosto, mas ele não reagiu. Sentiu a água morna em contato com a pele rasgada, a ardência e mais um jorro de humilhação por ter de ser cuidado por ela. Mas ela continuou seu trabalho, em silêncio, até terminar, depois foi até o armário dele e pegou roupas limpas.

- Vamos, vista-se. Pode deixar, eu te ajudo.

Ele se deixou erguer e vestiu o pijama que ela lhe oferecia, mas não a encarou nem por um segundo.

- Você pode tomar um banho depois – continuou ela, fingindo não notar a frieza com que ele a tratava – Acho que é melhor descansar um pouco antes, eu vou buscar algo para você comer.

- Não quero comer, obrigada.

- Não perguntei se queria – disse ela, de um modo um pouco mais próximo ao habitual, mais relaxado, descontraído, ao ver que ele ao menos falara – Você precisa comer, querendo ou não. Vou buscar alguma coisa na cozinha, ainda não tem ninguém acordado.

E desceu sem esperar por resposta.

Precisava de ajuda, precisava de um conselho, pensava enquanto descia as escadas o mais rápido que se atrevia para não despertar ninguém. Tinha que fazer alguma coisa, fazê-lo se sentir melhor, mas como, quando ele sequer queria olhar para ela? Sabia que esse lado dele, esse que procurava fugir, evitar os problemas, se esconder, existia, é claro; já o enfrentara antes. Mas nem daquela vez, nem quando fugira dela, ele a fizera sentir daquela maneira.

Estava ali ao lado dele, mostrando todo o seu apoio e tentado ajudá-lo, deixando explícito que não se importava com sua condição. Fizera tudo que estivera a seu alcance. Mas isso não estava sendo suficiente para sufocar o desconforto dele, a vergonha que ela tinha certeza de que ele sentia. Porém, enquanto subia novamente para o quarto dele, com um prato e talheres nas mãos, resolveu que ela que teria de ser a pessoa forte naquele momento, e não desistir. Ia fazer outra tentativa, e mais outra, e mais outra, e continuar até que desse certo.

- Aqui está – disse, estendendo o prato para ele. Achava que seria infinitamente melhor deixá-lo comer sozinho a tentar alimentá-lo, como se ele não fosse capaz. Ele comeu depressa, deixando óbvio que estava morto de fome, apesar da recusa anterior.

- Como está se sentindo? – perguntou quando ele terminou.

- O melhor possível para um lobisomem pós lua cheia, o que não significa muita coisa – murmurou, os olhos baixos.

- Remus, olhe para mim, por favor – disse de forma educada, escondendo sua indignação – Ao menos quando fala comigo.

- Me desculpe.

Ela sabia que ele não se referia exatamente àquilo. Falava por tudo o que tinham acabado de viver, naquelas poucas horas.

- Não é sua culpa. Eu vim aqui ontem à noite – por que eu quis Remus, e coloque isso na sua cabeça – e encontrei você de um jeito diferente do que eu estava acostumada. Não só fisicamente. Você se entregou para mim como eu nunca tinha visto antes – ela sorriu – talvez não se lembre disso. Mas pouco tempo depois de eu entrar aqui, você se tornou o lobo mais manso de que eu já ouvi falar. E eu gostei muito, muito mesmo disso. Por que eu me entreguei totalmente a você desde a primeira vez que ficamos juntos, e é bom ser retribuído, sabe? Talvez tenha sido só um efeito a mais que a lua tenha te causado – mais uma vez seus lábios se curvaram para cima por alguns momentos – mas eu gostaria mais de pensar que isso foi um avanço na nossa relação. Eu gostaria que você continuasse confiando tanto em mim quanto mostrou confiar ontem.

Ele manteve, durante todo o tempo em que ela falava, a cabeça baixa, prestando atenção, refletindo sobre suas palavras. Ouviu o colchão ranger quando ela engatinhou para perto dele, e sussurrou, agora bem próxima:

- Acha que consegue?

E, surpreendendo a si mesmo, ele cometeu um ato que nunca pensara em fazer logo após uma noite de maldição: sorriu. Não havia dúvida alguma de que ela era uma pessoa especial, Ninfadora Tonks. Sem aviso, ele a abraçou e rolou por cima dela sobre a cama. Ela riu, e o riso dela pareceu contagiar cada molécula do seu corpo. A beijou. E, sem pensar, disse o que passava por sua cabeça desde que a vira há seis anos atrás.

- Eu te amo.

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