Inicio do Caos



Capitulo II - Início do Caos





- Não vou trabalhar com essa aí! - exclamou Rony levantando-se bruscamente como
se entrasse em modo de defesa.



Hermione gargalhou.



- E desde quando você trabalha?! Eu estou no MEU lugar de trabalho, já vocês,
bem, vocês eu não tenho a mínima idéia do que fazem aqui.



Harry parecia ser o mais calmo de todos os presentes, isso fez com que a atenção
de Hermione fosse atraída, era como se fosse um dos primeiros indícios de que
ele tinha mudado, e começara isso pelo auto-controle, que aparentemente, ele
tinha adquirido, a não ser por Melanny que olhava tudo com um olhar de
divertimento.



- Mick, você disse que nesse caso só os MELHORES haviam sido recrutados. - disse
Hermione, o olhar fixo nos companheiros de sala.



- Houve um engano, senhor, não iremos trabalhar juntos. Nenhum doido... - Mick
olhou com ele ameaçadoramente mas não houve nenhuma mudança na postura de Harry
- faria isso. - Continuou Harry com convicção.



- Não, está muito enganado, sr. Potter. Não há nenhum doido aqui, como o senhor
mesmo disse.



Harry estava certo de que a melhor maneira era tentar sair dali sem maiores
problemas, porém da maneira rude que estava usando não conseguira isso.



Mas porque se preocupar com o que estava ou não certo? Era um erro deixá-los ali,
juntos, novamente. E quem quer que fosse que tinha feito aquilo queria que eles
se ferissem, que eles se matassem. Muitas vezes, as pessoas ligam a palavra "matar"
com feitiços, armas, mas não era a isso que Harry se referia, mas a algo que vai
além da morte física, morrer em vida. Eles se feriam com palavras, sempre as
mais duras e cruéis, era disso que suas brigas eram compostas, palavras
indesejadas, sempre as piores possíveis, sempre...Era como se deixassem de serem
eles, que fossem possuídos e fossem somente movidos pelo sentimento de raiva,
ódio, fazendo deles pessoas sem almas. E ao final de cada briga ficava uma
ferida, e mesmo que cicatrizasse, estaria ali para toda a vida e que faziam
questão de relembrar, a cada segundo, para todos eles, toda a mágoa do que
acontecera, das palavras, do sentimento de angustia, humilhação, tristeza.



Era mais que uma ferida que não cicatrizara, era muito mais, era um dos rastros
de dor deixados pelo amor...



- Vou deixá-los a sós por um momento, - disse Mick trazendo Harry a realidade -
Melanny, você vai comigo.



- Eu? Mas eu quero... - Melanny não queria perder a chance de ver a grande
Hermione Granger, que todos bajulavam perder a compostura.



- Vamos. - disse o homem agora mais autoritário que antes, puxando-a da cadeira.



Ótimo! Realmente maravilhoso, pensou Hermione. Ela podia sentir seu coração
bater a mil, ela tremia, não sabia se conseguiria se sustentar em pé por mais
tempo. Sem dizer uma palavra sentou-se na cadeira de frente para Harry, quando o
olhou mais atentamente aquela manhã percebeu, mas claramente, o quanto ele havia
mudado, mas seu pensamento foi interrompido assim que ele passou a encará-la.



Era difícil encarar mais uma vez aqueles olhos verdes esmeralda que um dia
transmitiram carinho, amor e de repente passaram a julgá-la como se fosse o ser
mais desprezível da Terra.

Não! Ela não deixaria que a vissem sofrer, não naquele momento, prometeu a si
mesma.



Seus olhos transpareciam a incerteza, tristeza, orgulho, e até mesmo raiva, não
raiva deles, mas de si mesma. Passava parte de seus dias lamentando-se, pensando
como tudo poderia ser diferente se naquele momento não tivessem deixado o
coração falar mais alto, se não tivessem sido tão impulsivos, coisa que ela não
era.



Usara sempre tão bem as palavras e quando mais precisara delas, elas tinham
simplesmente escapado.

Estava novamente cometendo o mesmo erro, iria perdê-los de novo. Talvez fosse a
única oportunidade que pudessem esclarecer tudo.



O sentimento de culpa foi substituído por seu orgulho que voltara a predominar.
Hermione tentou explicar e o que eles tinham feito? A julgaram, fizeram de suas
palavras pouco caso, nem se esforçaram para tentar entender, simplesmente a
ignoraram, e a pouparam da única coisa que ainda a faziam viver, da sua pilastra
que a sustentava sempre, Rony e Harry, seus melhores amigos em todo o mundo.



- Não sei quanto a vocês dois, mas eu tô dando o fora. - Falou Rony como se
colocasse um fim em uma conversa que nem ao menos começara.



Hermione levantou os olhos, observando Rony mais atentamente aquela manhã. Ele
ainda preservava semelhanças com o garoto alto, desengonçado, cheio de sardas
que conhecera. O cabelo cor de fogo, estava mais rebelde, se bem que Hermione
tinha sérias dúvidas se era realmente o cabelo que estava começando a seguir um
outro rumo, ou se Rony ainda preservava a mania de depois de penteá-lo, passar a
mão várias vezes pelo mesmo, deixando-o com cara de quem acabara de acordar. Ela
se lembrava muito bem disso, pois fazia questão de perguntá-lo o porque de
pentear o cabelo e bagunçá-lo em seguida, - é claro que isso tinha sido antes
que o "mistério" no qual Hermione estava envolvida fosse descoberto - e ele a
dissera que, "para as mulheres isso quer dizer mais do que 'um homem desleixado',
cara Hermione, é muito mais, é algo como 'cabelos rebeldes, homens rebeldes'...
dá todo um charme a mais para a coisa...". Ao final da frase de Rony, Hermione
teve um ataque de risos mesmo que de alguma forma ele tinha razão e pensando por
outro lado, não era tão ruim.



Rony também tinha ganho muito mais corpo com o passar dos anos, era um homem
forte, também, pensou Hermione analisando-o, o trabalho de Auror exigia muitos
exercícios, poderia ser até mesmo comparado com o trabalho de um soldado trouxa
etc.s



Hermione o estudou com mais interesse, como um pintor que busca em sua obra um
erro, algo que falte, ela sabia que tinha algo diferente pois quando batera os
olhos pela primeira vez nele naquela dia, depois de tantos anos separados,
pudera sentir a diferença, mas só notou o que era quando ele a encarou novamente,
como se a desafiasse, mas ela optou por não aceitar e muito menos desviar o
olhar. Os olhos azuis. Estavam neles a resposta, a afeição que ele tinha por ela
e fazia questão de demonstrar tinha desaparecido, sempre quando o encara
procurava por uma verdade, por um consolo, mas não tinha mais, era como uma
chama que enquanto durara fora bela, mas que as poucos foi se apagando até que
nenhum rastro dela fosse encontrada...



- Ah, é? Bem se a sua carreira não é tão importante...



- O que quer dizer com isso, Potter? - Perguntou Rony usando o mesmo tom de voz
que usara no quarto ano quando desconfiara de Harry pela primeira vez.



- Cai na real! Em que mundo você vive? - Harry estava frio, tudo aquilo já o
estava fazendo o perder o juízo, e iria descontar no primeiro que cruzasse seu
caminho - O ministério irá te colocar pra fora em um piscar de olhos. É sempre
assim, você erra ou não faz algo contra a vontade deles e perde tudo. E eles não
se contentam em tirar somente o seu trabalho. - acrescentou Harry rancoroso,
pensando em um de seus colegas de trabalho que perdera tudo, somente por se
recusar a não ser uma das cobaias do Ministério.



- Não preciso que se preocupe comigo, vivi todos sem esses anos sem sua
preocupação, não será agora que irei precisar dela. Afinal, Potter, há quantos
anos você se esqueceu do mundo e de todos que te cercavam?! - rebateu Rony.



Eles estavam começando de novo, pensou Hermione, iam começar naquela luta sem
fim mais uma vez e ela iria assistir sem fazer nada.

Hermione apertou suas próprias mãos e virou-se na direção da janela. Algo dentro
a forçava continuar naquela postura de mulher forte e trabalhadora, fazendo-a
mentir, não para os que estavam ao seu redor, mas para si mesma, porque sabia
que não era assim, não queria ser assim se isso significava sofrer calada,
sorrir para todos a sua volta enquanto deseja, desesperadamente, chorar, gritar,
que alguém ouvisse seu choro e que a ajudassem.



Pensou nas vezes que simplesmente sentava-se no parapeito da janela de seu
dormitório, encolhida em sua camisola comprida, com o cabelo preso a uma trança.
Abraçada com os próprios joelhos, desatava a chorar enquanto observava o luar,
pensando nos erros, nas desilusões, pensando no amanhã...



Encolhendo-se um pouco com a gritaria, cruzou os braços, não em um gesto de quem
está chateado ou de birra, mas sim alguém que está com frio, era como se fosse
mais uma daquelas noites silenciosas e torturantes em que o tempo parecia não
passar, em que ela pedia por alguém para abraçá-la, para ouvi-la e que mesmo
desabafando não ficasse se sentindo impotente como tinha acontecido várias vezes
quando procurava alguém para conversar e deixava-se levar pelo choro, e acabava
confessando seus segredos, seus medos. Era um frio que nem mesmo mil cobertores
poderiam acabar, chegava a ser algo psicológico, indecifrável, e toda fez que se
sentia atordoada, desprotegida, Hermione o sentia apoderar-se novamente dela...



As lágrimas começaram a brotar em seus olhos que ainda se concentravam em
observar os raios de um sol tímido atrás de grandes nuvens escuras, tentando
sobressair-se, esperando para poder inundar a cidade como costumava a fazer nas
manhãs de verão, mas até ele parecia não estar forte o suficiente para lutar.

A garganta seca implorava por um pouco de água, e o choro fazia com que sua voz
ficasse tremula e falhando algumas vezes, mesmo assim a intensidade com que
falava não era abalada.



- Sabe, às vezes me pergunto em como as coisas chegaram a tal ponto. Qual foi o
erro, se quem errou fui eu ou se já vinha acontecendo e nós é que não fomos
capazes de perceber. - Harry e Rony calaram-se com aquelas palavras e passaram a
encará-la. - Do que adianta gritar, ofender se isso não vai mudar nada? Você vai
chegar em casa pensando na burrada que fez ou então iludir-se dizendo que nada
te magoou, pois eu não acredito que vocês dois sejam tão frios como tentam
parecer.



- Sinto que vem uma lição de moral. - resmungou Rony sentando-se razoavelmente
longe do 'casal'.



- Está vendo só? Nem ao menos sentar próximos uns aos outros conseguimos, como
se o outro fosse portador de uma doença incurável...



- Acontece que há coisas que não se pode apagar, você pode tentar, mas elas
continuam lá. Sempre te deixando na dúvida se deve ou não, por simples palavras
bonitas ou um ou dois gestos carinhosos, perdoá-la. No entanto, as lembranças,
as marcas que ainda prevalecem fazem questão de dar o ar da graça - Harry falava
com dificuldade mas sempre que possível fazendo com que sua ironia fosse
lembrada - E então você pensa se realmente vale perdoá-la. A amizade não será
mais a mesma, por mais desculpas que peça, e não adianta negar. Porque quando
algo assim ocorre entre amigos parece ser algo imperdoável. Perdoar, a gente
perdoa, mas esquecer...



- Se a amizade é verdadeira você pode ... - começou Hermione, esperançosa.



- Você sabe que não é assim, srta Granger. - Falou Harry.



- Ninguém gosta de arriscar em algo que sabe que pode se machucar. Sendo mais
consolador viver sem ter aquela amizade, para não apagar as coisas boas
relacionadas a ela. Tortura seria ficar comparando de como ela era antes e no
que ela poderia ter se tornado. Toda a vez que o assunto surgissem, ambas as
partes sairiam machucadas. O sofrimento seria prolongado, talvez, até pior.



Hermione que até agora não tinha coragem de olhar para nenhum dos homens
presentes, parou de olhar para o chão e olhou para Rony atordoada.



- Nós realmente mudamos. - concluiu Hermione, depois de ouvir Rony. O Rony que
conhecia nunca haveria de ser tão maduro e sincero sem temer as conseqüências de
suas palavras, sem precisar se esconder atrás de uma mascara de um jovem incapaz
de admitir seus sentimentos. Era como se ele fosse outra pessoa, mas mesmo assim
ela conseguia ver através dos olhos azuis o amigo com o qual muitas vezes
brigara.



- Bem, se vocês querem perder seu emprego eu não sei, mas como eu não quero
perder o meu vamos começar a trabalhar. - Falou um Rony determinado, mudando sua
postura na cadeira de couro. - Juntos - acrescentou.



Hermione que se perdera em pensamentos como de costume olhou quase que
involuntariamente para Harry como se esperasse que ele começasse a dizer que
aquilo era uma grande besteira, algo impossível, mas assustou-se quando seus
olhos se encontraram, dessa vez não eram aqueles olhos verdes que a deixava com
medo, medo do que a esperava, mas sim os olhos de Harry, do garoto que aprendera
a amar.

Harry pode jurar que pode ver um sorriso se formar no canto da boca de Hermione,
mas preferiu não comentar e começou a encarar suas próprias mãos um pouco
tremulas e ensopadas de suor. Hermione pigarreou, voltando com a sua postura
autoritária:



- Eu realmente espero que sejam os melhores em suas áreas porque não podemos
errar.



- Você não vai encontrar aurores melhores. - Disse Rony, sorrindo. Harry olhou
para Rony com a sobrancelha erguida.



- Sempre soube que modéstia não era seu sobrenome. Cuidado para não se animar
demais.



Nem Hermione e Rony sabiam se ele estava brincando ou não, era difícil tentar
decifrá-lo como antes, ele não era a mesma pessoa com a que tinham crescido.



- Acordo feito, então, senhores? - Perguntou controlando o tom de voz, não iria
deixar sua ansiedade transparecer. Rony sorriu em resposta e Harry fez um gesto
com a mão indicando que sim.



- Hem-Hem - O trio se virou para ver quem pigarreara tentando chamar a atenção
deles.



- Está tudo bem? - Perguntou o homem, inseguro. - Pelo visto, a minha sala ainda
está inteira. Ele comentou mais para si do que para os outros.



- Er... Fizemos um acordo... - explicou Hermione. Ela se amaldiçoaria depois que
saísse dali.



- Iremos trabalhar duro... - acrescentou Harry ao ver a sobrancelha do sr.
Jordan levemente erguida, em sinal de que não entendera.



- O trabalho mais rápido e competente que você poderá ver em toda sua vida. -
orgulhou-se Hermione, esquecendo que ela era quem mandava.



- Para que não voltemos, nem tão cedo, a olhar um na cara do outro. - concluiu
Rony.



Hermione o olhou. Ela sabia que ele tentara ser engraçado ao dizer aquilo, mas
ele dera algo para ela pensar: será que depois de trabalhar naquele caso, que em
sua opinião poderia demorar até meses, eles ainda teriam como objetivo não
voltarem a se ver? Bem, isso ela não sabia. Era muito cedo para dizer qualquer
coisa a respeito disso.





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- A ordem descobriu que alguém está passando informação para Voldemort, eu vi
nos olhos de Dumbledore que ele sabe que sou eu. Temo que o diretor fale para os
demais! Se eu pudesse explicar... Como fui burra! Nunca deveria ter entrado
nessa merda. - arrependeu-se Hermione deitada no chão de seu quarto, ao redor
dela haviam fotos de Comensais, Aurores e membros da Ordem. - O que vou fazer
com isso? - perguntou-se pegando uma das fotos, conseguira com Harry, em seu
quinto ano ele ganhara de Moody a fotografia dos integrantes da Ordem da Fênix.




- Hermione, você não vai descer? Já estão todos aqui. - chamou Gina.



Talvez, pensou Hermione esperançosa, se contasse para Gina, ela talvez pudesse
mostrar uma luz no fim do túnel para Hermione.



-Estou indo, Gina. - gritou Hermione sem se mexer.



- Quer ajuda? - perguntou a garota preocupada.



- NÃO! Digo, não obrigada. Já estou terminando aqui. - ela juntou as coisas e
colocou fogo. Não poderia desistir agora, iria explicar para todos o que tinha
acontecido.



Com sorte, não serei estrangulada ou queimada em uma fogueira, pensou Hermione
amargurada, lembrando-se do livro de História da Magia.

Ela desceu as escadas. Seus joelhos tremiam, tinha quase certeza que iria
desmaiar antes mesmo de chegar ao primeiro andar. Parou ao lado da porta, a
reunião já tinha começado sem ela. Do outro lado da sala, sentado em uma cadeira
confortável de couro, estava Snape. Ele tinha em suas mãos algumas pastas, na
capa dela algo que Hermione não conseguia enxergar o que eram, mas deveria ser
importante, ele as segurava com força enquanto seus olhos negros estudavam
atentamente os outros membros. Havia um brilho a mais em seu olhar, um brilho
que Hermione vira poucas vezes, e uma delas foi quando ele tivera a chance de
colocar Sirius na prisão, mas por sorte esse sonho não tinha se concretizado,
desde de então,ela duvidara que Snape voltara a ficar tão feliz.



E Hermione sabia o porque de toda aquela felicidade.



- Nós já descobrimos quem é o traidor, Dumbledore. - disse Snape olhando para o
diretor. Por um momento, Hermione teve a sensação de que ele a olhara,
discretamente, e um sorriso se formara em seu rosto. Ela só teve certeza disso
quando ele voltou a abrir a pouca e isso confirmaria o fato de que era ela a
quem se referia. - Ou melhor, traidora.



Harry e Rony trocaram olhares preocupados.



- Quem? - perguntou Gui não se contendo.



- Para ser sincero, não foi uma grande surpresa quando descobri. Sempre soube
que teríamos grandes problemas com esse tipo de gente... mentes ambiciosas
querem mais do que lutar por uma boa causa.



Hermione ainda apoiando-se na porta para que não caísse e pode ouvir muito de
longe Snape falando.



- E bem, nós temos quem se encaixe perfeitamente nesse perfil. A senhorita...



- Sou eu quem... - disse Hermione em um sussurro porém alto o suficiente para
que os outros virassem para olha-lá. Suas mãos estavam molhadas por causa do
suor, pensou por um momento que iria cair, sentia-se incapaz de se manter em pé
sem algo para apoiar. Suas próprias palavras tiravam seu ar, e deixavam seus
batimentos cardíacos mais fracos, suas mãos frias tentavam procurar por algo
para mantê-la.



Hermione não conseguia respirar direito. As pessoas a sua frente pareciam
somente borrões, mas sabia que todos mantinham o olhar sobre ela, ninguém falava
nada, mas era como se conseguisse ouvir seus pensamentos ou pelo menos imaginar
o que eles pensavam. Todos os seus sentidos pareciam estar saindo fora de
controle, ela pensou que estava morrendo, tendo algo que fosse parecido com um
ataque cardíaco, ela não sabia o que era, mas com certeza não causava aquele
sentimento de perda, que iria descobrir somente mais tarde, quando tentasse
conversar com Rony e Harry.



Era uma tortura, ela sabia, estava pagando por todos os seus erros, estava
finalmente pagando o preço de seus atos. Voltou a abrir a boca, sentia o suor
escorrer por seu rosto e chegou até mesmo a sentir o gosto salgado do mesmo, era
a sua única chance, sua última chance.



- O que, Hermione? - perguntou Harry, fazendo-a estremecer. Pelo tom de voz
dele, ela pensou, ele não acredita ou se negava a acreditar.



- Eu fui encarregada de passar informações para Lucio Malfoy, caso o contrario
meus pais seriam punidos, eles iam matar meus pais... - Disse em uma rapidez
incrível, precisava terminar com aquilo enquanto ainda possuía fôlego e força. -
Resto, bem, o resto vocês já sabem e...



- Não, nós não sabemos. Por favor nos explique, senhorita Granger. - pediu
Snape, Hermione sabia que não havia mais nada de prazeroso do que aquilo para
Snape, vê-la falar, em frente de todos os seus amigos como se tornara uma
traidora. Ela que passara a vida ouvindo Rony e Harry falarem o quão desprezível
era Snape por se fazer de "o salvador da pátria" enquanto os traia por trás,
agora era a traidora, e provavelmente para Harry e Rony ela era exatamente
alguém como ou pior que Snape.



Hermione ficou pálida ao pensar naquilo, parecia que não havia rastro de sangue
em seu corpo. Ela parou um momento para fitar o professor de Poções, o
amaldiçoando em pensamento, ele já não estava satisfeito?! Sua respiração estava
cada vez mais fraca, escondeu as mãos no bolso do sobretudo tentando esconder
que estava tremendo, esconder o medo que se apoderara dela.



- Pediram para que eu atraísse Harry para longe dos olhos de Dumbledore,- ela
falou, abaixando o tom de voz, as lágrimas misturando-se com o suor - quando me
neguei, eles... eles...eles - ela gaguejava, não conseguia terminar a frase,
muitas vezes iludia-se dizendo para si mesma que seus pais estariam a sua espera
nos fins de semanas, quando tinha uma "folga" da Ordem e iria encontrá-los da
mesma forma como da última vez que os vira vivos, o sr e a sra. Granger parados
a porta da grande casa, acenando freneticamente para ela, enquanto Hermione
encaminhava-se para o carro do noivo, que estava a sua espera dentro de uma
Mercedes preta, para mais uma viagem de trabalho. Todas as vezes que dizia que
eles tinham sido assassinados, mortos a sangue frio, era trazida de volta a
realidade, era como se tirassem, de novo, seus pais dela. Era acabar com suas
esperanças de que tudo não passara de um triste e horrível pesadelo. -
Eles...mataram...meus pais e eu então, eu...eu decidi traí-los novamente.



- Novamente? - perguntou Rony tentando ao máximo conter sua fúria.



Seu coração negava-se a acreditar naquilo, talvez estivesse entendo tudo errado
e logo, logo Hermione pararia com aquela terrível brincadeira, levantando-se e
gritando "primeiro de abril", mas por outro lado, ele sabia que ela jamais seria
capaz de uma brincadeira como aquelas, que era verdade o Hermione dizia. De
qualquer forma, a única certeza que tinha era que aquela não era a Hermione que
ele conhecia ou um dia pensara conhecer, era difícil dizer, naquele momento, o
que ela seria ou não capaz de fazer, pois depois de todos aqueles anos, Rony
sentia-se como se estivesse na frente de uma completa estranha. Aos poucos ele
foi começando a entender o verdadeiro significado de tudo, uma sombra negra
envolvendo seus olhos, o desejo de matar crescendo dentro de si, aquela que
julgara como uma irmã, era na verdade, uma traidora, simplesmente uma mentira...



- .... o livro, lembra-se que ele foi supostamente 'roubado'? Ele sempre esteve
na conta de Harry em Gringotes. Na noite em que todos estavam fora, ocupados com
suas responsabilidades, eu consegui a chave do cofre e o coloquei lá. Sei que o
livro contém os maiores feitiços de Arte das Trevas já usadas em toda a História
da Magia, ter algo daquela importância nas mãos de Voldemort era a sentença de
morte. - Cada palavra, cada frase dita por Hermione fazia com que Harry caísse
em um abismo. - Tentem entender, era a minha família em jogo! Eu não poderia
deixá-los! Eles não tinham nenhum tipo de proteção, eles dependiam de mim, eu
não podia falhar com eles! Não com eles que nunca falharam comigo. - Ela
terminou a última frase falando meio que para os presentes, meio que para ela.




- Nós teríamos protegido a você e sua família, Hermione - disse o sr. Weasley.




- O senhor sabe que não é verdade! Então me diz o porquê dos Vance estarem
mortos? Vocês haviam prometido segurança a eles e não demorou 2 meses e eles
morreram! - Explodiu Hermione, aquilo estava a muito tempo torturado-a.



Hermione tinha sido uma das pessoas escolhidas para limpar o lugar. Quando
chegou, os corpos continuavam lá. Hermione nunca poderia esquecer aquela cena. A
Sra. Emmeline Vance abraçada com o filho, os dois juntos abraçados e mortos.
Terror, sim essa era a única palavra possível para descrever a expressão nos
rostos de cada membro da família. E então, por um momento, ela não viu os Vance
mas sim sua mãe e seu pai.



Aquilo fora fatal. Quando voltou da 'missão' ela descreveu para Rony e Harry a
quão preocupada estava, e eles sabiam que, aquilo no futuro seria um problema.
Ninguém estava seguro da Guerra, trouxas, mestiços, puro-sangues, todos estavam
marcados para morrer.



Hermione se virou desconfortavelmente na cama, um rápido flash de luz branca e
ela se viu, sentada no quartel da Ordem, sentada com a cabeça abaixada, era uma
cena familiar, ela se lembrava dela, era uma de suas memórias, agora, uma outra
parte do sonho...



Hermione abaixou a cabeça. Estava cansada. O mundo estava caindo sobre sua
cabeça e ela não podia fazer nada, havia procurado por aquilo. Perdera seus
pais, os únicos que sempre a amaram, que a amavam de forma incondicional. E ela
sabia, falassem o que quisessem mas a culpa fora dela.



Se tivesse recusado ir para a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts poderia ter
evitado tantas coisas, ela pensou enquanto esperava sentada no sofá do Grimmauld
Place número 12, esperando por seu julgamento, olhando sem vida para a janela.
Acompanhando com os olhos a mulher de 25 anos passar empurrando um carrinho de
bebê. Hermione a invejava, pois ela estava ali, com seu filho e não tinha a
mínima idéia do que acontecia, de que Voldemort estava a solta, e...



- Hermione? - Era a Sra. Weasley.



Hermione a olhou esperando encontrar nos olhos cor de mel de Molly o carinho, um
consolo de 'tudo vai ficar bem' como ela costumava fazer, ela se desesperou.
Molly estava séria, mas séria do que Hermione já vira em toda a sua vida.



Hermione acenou com a cabeça, em sinal de que entendera.



A Sra. Weasley no entanto continuou parada em frente a garota, esperando para
que essa fosse para a reunião.



Hermione deu mais uma olhada para a mulher e seu filho, e sorriu, um sorriso
triste mas sincero. Sabia que, talvez, nunca tivesse o prazer de segurar seu
filho no colo, ter um alguém que realmente dependesse dela, provavelmente,
aquilo seria um sonho distante e impossível. Hermione desejava, de todo o
coração, que aquela criança nunca tivesse que presenciar uma guerra entre o
mundo trouxa e bruxo, e quem sabe, tivesse mais sorte do que ela.



Ela levantou-se e encarou a senhora Weasley, fez um sinal, indicando para Molly
passar, mas essa não se mexeu. Foi só então que Hermione percebeu, Molly
desconfiava dela, como se caso ela passasse na frente poderia ser atingida por
algum feitiço, maldição, ou que Hermione fugisse.



Agora ela não era mais a Hermione Granger, melhor aluna de Hogwarts, ela era uma
traidora, motivo de desconfiança. O caos começara.




Hermione sentou-se em sua cama, suava frio. Mais uma vez, sonhara com o dia em
que perdera seus melhores amigos, e qualquer chance de ter uma vida considerada
normal para os bruxos.



Talvez, o melhor seria caso tivesse sido condenada a passar anos cercadas por
dementadores ou morrer. Dumbledore a havia absolvido de ser condenada a algo
assim. Ele tinha pena dela, fora isso que Hermione viu ao encarar o professor.
Muitos haviam incriminado-a, mas Dumbledore fez com que todos cessassem com as
agressões quando perguntou se não fariam o mesmo, caso a família que estava
ameaçada fosse a deles.



Hermione sabia a todo o momento, que não era certo de que mesmo se aliasse a
Voldemort, seus pais não morreriam nem sofreriam algum ataque pelos Comensais,
pois esses eram traiçoeiros, mas como um certo alguém a falara um dia, 'o amor é
cego'.



O amor por seus pais era tanto, incondicional, que ela sabia que valia arriscar,
até mesmo a vida dela, se preciso. Não poderia deixá-los morrer, não poderia
perder aqueles que sempre a haviam apoiado, mesmo que tivesse que seguir o
'caminho errado', ela o faria, tudo isso, só para protegê-los, pois eles não
tinham nenhum tipo de proteção a não ser a dela.



Ela tentou uma, duas, três vezes falar com Harry e Rony, mas estes a
desprezavam.



No fundo, ela entendia, por mais que tentasse negar, ela os entendia. E de
qualquer forma, "a traição de um amigo é pior do que a de um inimigo". Esfregou
os olhos com força, e abafou com a mão um demorado bocejo. Tateou a mesa ao
lado, procurando o interruptor do abajur, o encontrou. Demorou um pouco para que
seus olhos se acostumassem a claridade, e quando eles o fizeram, seu olhar focou
o relógio de digital.



Eram 2 da manhã. O livro que começara a ler antes dormir continuava marcado com
um lápis, o qual usara para fazer anotações no topo das páginas. Ficou ali,
encarando a capa do livro como uma sonâmbula alguns minutos. Flashes do sonho
ainda a atordoavam.



Impaciente, Hermione socou o travesseiro deixando o mais macio, desligou a luz
do abajur e se jogou na cama, cobrindo-se com o edredom vinho. Ela precisava
dormir, nem que fossem somente mais umas míseras 3 horas.





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Harry passou as mãos pelo lábio tentando lembrar-se da última vez que a beijara,
de como era como os lábios doces de Hermione tocavam o seus, capturar a explosão
de sentimentos que acontecia quando ele sentia seu corpo junto ao dela, como era
afagar sua mão naqueles cabelos lanzudos castanho-escuro.



Ela estava tão bonita, disse a si mesmo quando chegou em casa deitado em uma
cadeira de um conjunto de três que ficavam na varanda de seu apartamento.
Opinara por não morar em uma casa porque era só para ele e não...



É, pensou Harry amargo, ele estava novamente sozinho, sentado ali, naquela
varanda que era testemunha de todas as vezes que ele se sentia sozinho,
preocupado. Era ali que ficava, para ver o amanhecer e o anoitecer, sonhando
acordado, sonhando com o que poderia ter acontecido, em como tudo poderia ser
diferente.



Se tudo tivesse ocorrido como planejado agora ele estaria ali com ela, casados e
quem sabe fossem até pais agora? Mas tudo isso não passara de algo impossível.
Quando realmente pensou que seria feliz, ao lado daqueles que ele importava,
tudo foi tirado. Separados, não, tudo tinha sido arrancados dele. Arrancaram-no
uma parte de seu coração, uma parte de sua vida, do seu ar, do seu chão. E ele
sabia, que por mais que conhecesse milhares de mulheres, nunca seria tão
maravilhoso como fora entre ele e Hermione, que aquela fora a única chance que
teve de ser realmente feliz, mas como era de costume, provavelmente a vida não
lhe daria uma segunda chance.



Harry tinha que admitir, a saudade o consumia por dentro, cada vez mais e mais,
queria a todo o custo odiá-la, mas em todas as vezes seu coração falara mais
alto e ele continuava a deixar aquele amor crescer dentro de si, e estava
disposto a preservá-lo até a morte se preciso.



Sabia também que não hesitaria caso ela precisasse dele, seu único medo era que
como ouvir um certo alguém falar um pouco mais cedo, se seria uma boa escolha
tentar uma reaproximação. Não queria se machucar de novo, sofrer um golpe
daqueles uma vez fora o suficiente, não precisava de mais nada assim. Por mais
que sentisse falta daquela droga, sim, foi assim que a apelidara, esse era o
nome que combinava bem com o que ela era para ele. Uma droga. O intoxicava,
precisava de mais, não se sentia seguro sem ela, poderia deixá-lo da pior
maneira possível, mas mesmo assim continuava a ser dependente dela, necessitava
daquilo para sobreviver, para ser feliz, ou pelo menos, imaginar que era feliz.




Quem sabe, algum dia, aquela insegurança de arriscar e se machucar de novo
acabasse? Era algo mais otimista, mas o tempo era a resposta. Mas o tempo é
capaz de apagar feridas? Amores? Paixões?, indagou-se Harry observando o sol se
pondo, eram poucas as nuvens no céu azul, prometia uma noite linda, assim como
aquela que fora testemunha de quando ele se entregou de corpo e alma ao seu
verdadeiro amor.


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