Tarde de outubro



“E quem poderá prever um romance imprevisível? ”



 



Ainda era muito cedo, ela sabia disso porque mesmo pela claridade que invadia seu quarto pelas frestas da janela, ela ainda se encontrava encolhida debaixo do edredom, enquanto a neblina fria do amanhecer surrupiava para dentro do quarto.

Esticou-se preguiçosamente na cama antes de virar-se de lado e constatar que o outro lado já se encontrava vazio, sinal de que ele já acordara e se levantara há um tempinho. Espreguiçou-se mais uma vez e ergueu o corpo devagar, se sentando na cama, ainda se sentindo sonolenta e com uma vontade imensa de deitar e continuar dormindo.

Bocejando, ela finalmente se levantou e seguiu até o banheiro para sua higiene matinal, escovou os dentes, penteou os cabelos, e ainda com sua roupa de dormir seguiu até a cozinha onde o cheiro do café já se espalhava por todo o apartamento, aquele cheiro maravilhoso do café dele que fez seu estomago reclamar de fome. Era incrível como aquele cheiro impregnava todos os cantos da casa, era como se ele fosse feito com pó mágico, lhe dava uma sensação de “lar, doce lar”.

Sorriu quando se aproximou da cozinha e o viu, todo engravatado, terminando de organizar a cozinha depois de terminar de coar o café. Estava lindo, como sempre.

— Humm, esse cheiro me faz acordar com aquela sensação de estar dentro de um filme de romance. – Ele riu e se virou para observá-la, estava com os cabelos soltos, escorridos ao lado do rosto, apenas com uma camiseta de dormir que ia até os joelhos, linda e sexy, se aquilo fosse realmente um filme de romance.

— Bom, se isso fosse um filme de romance, a Scarlett Johanson estaria na minha frente agora.

— Há há há. – Ela fez uma careta enquanto ele, risonho, se aproximou e beijou carinhosamente o rosto dela enquanto falava baixinho.

— Bom dia, dorminhoca! – Marlene sorriu, e revirou os olhos, se sentando à mesa e cruzando uma das pernas na cadeira, de modo que a camisa ficava levemente erguida nas pernas.

— Você acordou cedo, o que aconteceu? Eu te empurrei da cama sem perceber? – Ele gargalhou enquanto ela se servia do café quente que ele acabara de fazer e tomava um pequeno gole, saboreando-o, preguiçosamente.

— O despertador me empurrou da cama, foi isso que aconteceu.

— Meu Deus, eu nem ouvi seu despertador. – Ele sorriu, carinhosamente, antes de responder.

— Eu deixei baixinho, mas como estava debaixo do meu travesseiro, apenas eu ouvi. – Ela sorriu, carinhosamente, de volta. Tomou mais um gole do café enquanto o observava, encostado no balcão, a xicara de café em uma das mãos, pensativo, enquanto tomava de gole em gole seu café. Hoje estava sem o terno, que ainda se encontrava na lavanderia, estava apenas com uma camisa social azul escura, de mangas cumpridas, a gravata preta, bem-feita no pescoço e a calça social preta; os cabelos estavam caídos displicentemente sobre os olhos, como sempre, de maneira sensual, a barba, por fazer, dava um charme todo especial, o que aliás, ela adorava quando ele deixava daquele jeito, lhe dando um ar de mais maturidade, de galã de novela. Ela sorriu, sem que ele percebesse, e voltou os olhos para seu café, que praticamente já acabara enquanto ela tomava e o observava.

— Então, hoje vai rolar happy hour de novo? O pessoal da sua empresa parece que gosta mais de beber do que de trabalhar. – Ele riu e assentiu, voltando a atenção para ela.

— Isso é um fato comprovado, eles adoram beber. – Ele riu, antes de continuar. – Bom, não sei, mas se for rolar, você podia ir pra lá com a gente. O que acha?

— Bom, não sei. – Ela riu baixo. – Vou pensar no seu caso.

Ele sorriu enquanto ia até a cozinha colocar a xicara, vazia, sobre a pia, e voltava para pegar a mochila, que sempre levava para o trabalho, sobre o sofá.

— Pensa com carinho então, eu pago as bebidas.

— Ah, mas sendo assim, pensarei com todo o carinho do meu coração.

Ele riu, enquanto a observava se levantar e se encaminhar até ele, parando a sua frente e erguendo o corpo na ponta dos pés para ficar da sua altura, o que nem assim ela obtinha muito êxito.

— Você sempre deixa a gravata torta. – Ele sorriu, carinhosamente.

— É só pra você arrumar.

— O que seria de você sem mim, heim? – Ele deu uma risada, baixa, enquanto ela terminava de ajeitar a gravata em seu pescoço.

— Um cara com uma gravata torta. – Ela fez uma careta, em meio ao riso, e ele sorriu, pegando uma mecha de cabelo solto e colocando atrás da orelha dela, de maneira carinhosa.

— Cuidado com a chuva. – Ela disse.

— Cuidado com os relâmpagos. – Ela fez uma careta, enquanto ele ajeitava a mochila e seguia até a porta do apartamento. – Eu te mando um whats sobre o happy hour, Okay?

— Okay. Bom trabalho. – Ele piscou, charmosamente, e saiu, deixando-a ali, olhando para a porta, o sorriso nos lábios, pensativa.

Era engraçado pensar em como tinham ido morar juntos, quer dizer, ela tinha dezenove anos e ele vinte e quatro, ele era formado em engenharia e arquitetura, e ela estava no segundo semestre de publicidade e marketing, não tinham amigos em comum, nunca estudaram juntos, não tinham nenhum familiar em comum, muito menos conheciam os familiares uns dos outros, exceto suas mães, até porque sua mãe jamais teria deixado ela morar com um rapaz, sozinha, num apartamento, bom, não qualquer rapaz, mas o Sirius... Que mãe não iria gostar do Sirius, se ele era o genro que toda mãe sonhara ter?

Genro, Marlene ria ao pensar nessa palavra, sua mãe insistia que Marlene e Sirius namoravam e só tinham medo de assumir, sempre que ligava para a filha dizia “E como está o meu genro?”, no que Marlene sempre respondia que eles não eram namorados, e nunca iriam ser. Nessa última parte, todo mundo duvidava, assim como na primeira, para ser mais honesta.

Marlene, saiu de seus pensamentos e resolveu tomar um banho antes de colocar toda sua atenção naquele bendito seminário da faculdade, cujo ela precisava terminar urgentemente.

Fora numa sexta-feira como aquela que Marlene encontrara Sirius pela segunda vez, era difícil de esquecer porque fora uma coincidência bem grande, era quase como se o destino realmente quisesse que eles se esbarrassem novamente, mesmo que desta vez eles não tenham, literalmente, se esbarrado.

Ela estava no último ano do colegial, todo mundo naquela fase indecisa de, qual faculdade fazer, que caminho seguir na vida, faço administração ou recursos humanos, engenharia ou medicina, publicidade ou jornalismo, nunca uma opção, sempre duas, três, milhares, invadindo suas mentes e deixando todos os alunos confusos. Por isso, aquele dia era o chamado “um dia no campus”, onde uma universidade abria suas portas para alunos de escolas particulares ou estaduais conhecerem os cursos e a faculdade.

A universidade era enorme, e já era quase onze horas da manhã quando ela olhou pela milionésima vez para o celular, será que a faculdade era tão grande assim que não acabava nunca aquele passeio?

Marlene e a turma da sua escola passavam por um corredor de onde, pela janela, ela podia ver uma espécie de jardim do lado de fora, haviam várias arvores e banquinhos e no meio uma área arredondada, coberta por um telhado de vidro e diversos banquinhos de madeira, sem encosto, a volta dele; ao ver aquele espaço ela sorriu, encantada, finalmente uma parte na faculdade que realmente lhe agradara, não aqueles laboratórios, salas imensas e um refeitório tão enorme que dava até medo de se perder no meio de tantos alunos.

Encantada com aquele espaço, Marlene surrupiou pela porta adiante e caminhou, como se fosse uma aluna da faculdade, tranquilamente pelo caminho arborizado e tranquilo da faculdade. Era até possível ouvir os pássaros cantando, sentir o gostoso cheiro do verde das arvores, o vento batendo suavemente em seu rosto, aquele lugar era o paraíso escondido.

Alguns alunos iam e vinham e Marlene tentava não olhar muito para todo lado para que não percebessem que ela fazia parte dos alunos que visitavam a faculdade e a mandassem de volta com a turma, por isso ela passou pelos alunos decidida, como se estivesse pensando sobre a matéria da prova ou coisa assim.

Quando chegou ao centro do jardim, ela ficou completamente encantada, tentando não chamar a atenção, ela sentou num dos bancos, o mais distante de alguns alunos que se encontravam por ali, e ficou disfarçadamente olhando os detalhes. O vidro parecia ser muito bem reforçado, flores e folhas se enroscavam nas partes de ferro que seguravam o teto e nas pilastras que davam suporte ao mesmo. Pelo vidro ela podia ver o céu azul lá em cima, os pássaros voando felizes, as nuvens formando desenhos, quase dava para esquecer que ali era uma faculdade, imagine só, sentar ali todo dia para estudar as matérias? Que paz!

Sorriu consigo mesma e voltou os olhos para a frente quando ouviu passos, os alunos que estavam por ali voltavam para dentro da faculdade e apenas um continuava por ali, mas não parecia sequer notar a presença dela.

Estava deitado no banco, olhando para o céu através do vidro, tinha um fone de ouvido, daqueles grandes, nas orelhas por onde ele provavelmente ouvia música, pois balançava a cabeça levemente; vestia uma camisa do Elvis e embaixo do banco, uma mochila jazia jogada. Esse com certeza não estava ali para estudar.

Mas, sem saber porque, alguma coisa nele lhe chamara a atenção, era como se ela já o tivesse visto antes. Sem ser notada, ela sentou no banco, do outro lado do círculo, quase na mesma direção do garoto, e ficou observando-o, os cabelos eram caídos sobre os olhos, o rosto liso, não tinha barba até onde ela podia ver, parecia muito bonito, observou-o, observou-o, até que teve um insight.

“MEU DEUS, EU CONHEÇO ELE!” Pensou, num pulo, abrindo um sorriso e se encaminhando até o menino. Ele sequer notou a movimentação, parecia muito entretido na música e talvez perdido em pensamentos, que mal notou também quando um rosto surgiu bem acima de seu rosto, olhando-o, sorridente. Levou um susto tão grande que ergueu-se, de súbito, e quase bateu o próprio rosto no rosto da menina, que deu um grito assustado e um pulo pra trás, caindo na gargalhada em seguida.

— Meu Deus, você me assustou! – Ela disse, entre risos e ele a olhou, franzindo a testa, o coração batendo acelerado no peito.

— Caralho, menina, que susto você me deu. – Ela riu mais ainda, e ajeitou a mochila, caída por cima de um ombro. Ele ficou sentado no banco, uma perna de cada lado, o corpo meio torto para enxerga-la direito.

— Então é assim que se estudam nessa faculdade? – Ela sorriu e piscou para ele, e então ele arregalou os olhos, como quem reconhece a outra pessoa.

— Hey, eu conheço você! É a garota da chuva. – Ela riu e fez uma careta.

— Garota da chuva, parece tipo, a garota do tempo. – Ela riu, e completou. – Marlene!

— Isso. Marlene McKinnon.

— Muito bom, Sirius, sinal que pelo menos memória você tem, né? – Ele riu e se ajeitou no banco, virando o corpo e voltando a sentar como estava, uma perna de cada lado do banco, dessa vez deixando um espaço para ela, o qual ele indicou com a mão.

— Senta aí. – Ele sorriu, educado e ela sentou-se, totalmente à vontade. Ela não parecia ser o tipo de menina que ficava sem jeito ou sem graça perto de um garoto, percebeu ele. – Não sabia que você estudava aqui, quer dizer, você não tem cara de universitária...

— Tá querendo dizer o que? Que eu tenho cara de criança? – Ela pareceu ofendida, mas só por segundos, antes de fazer uma careta e rir, quando ele, apressadamente, começou a se defender.

— Não, não, não foi isso que eu quis dizer, é que você parece nova, quer dizer... – Ela gargalhou ainda mais diante do jeito embaraçado dele, e ele fechou a cara, erguendo a sobrancelha e a encarando. – Se não se importou com a pergunta, porque a cara feia?

— Porque é muito engraçado ver homens tentando se explicar. – Dessa vez, foi ele que fez uma careta.

— Ah, ela é engraçadinha! – Ela riu e fez pose de quem se acha, o que causou risos nele. – Então, você estuda aqui? – Ele ergueu a sobrancelha, já com as mãos erguidas, como quem já se rende antes mesmo dela brigar com ele, o que ela achou engraçado.

— Ah, ele é bobinho! – Ela bateu as mãos nas dele, fazendo-o abaixá-las, enquanto ria. – Não, eu não estudo aqui. É o tal do ‘um dia no campus’.

— Ahhhh, tá. Que os alunos das escolas vêm visitar a universidade. Verdade, esqueci que tinha isso aí, hoje.

— Pois é. – Ela sorriu e olhou a frente, observando o lugar agora mais à vontade, já que não estava sozinha, então ninguém ia desconfiar dela ser uma aluna perdida.

— E você se perdeu dos alunos? – Ele a observava, no que ela notou, curiosamente. Estava agora encostado numa pilastra atrás dele, as pernas abertas, uma de cada lado do banco, o fone caído sobre os ombros, o celular sobre a perna esquerda, bem relaxado, a vontade, enquanto a observava com um sorrisinho no rosto. Deus, como ele era lindo!

— Não né, eu vi esse lugar e quis vir aqui conferir de perto, tava muito chato lá vendo laboratórios, biblioteca e salas de aula. – Ele riu e concordou com a cabeça.

— É, é um porre esses tours, eles fazem isso só pros alunos se apaixonarem pelo campus e vir estudar aqui.

— Com você foi assim? – Ela o encarou e ficou observando-o por alguns segundos. Ele era realmente lindo, tinha uma barba rala crescendo no queixo que dava a impressão dele estar na dúvida se tirava ou se deixava crescer, parecia ter uns vinte e poucos anos, talvez vinte ou vinte e um, era bem fortinho pelo que podia reparar pela camisa, apertada, mas não era o tipo musculozão, daqueles que ficava até feio, sabe? Não, ele era o tipo físico perfeito de homem forte, mas nas proporções exatas, forte o suficiente para ter força e te pegar no colo, além de te fazer babar caso tirasse a camisa, o que ele poderia fazer naquele momento que ela nem ligaria.

— Não, eu já sabia o curso que queria fazer e que aqui era uma boa faculdade, então vim direto pra cá; pulei o dia do campus. – Ele deu uma risadinha e ela observou o sorriso dele. Era um sorriso lindo. Caramba, ele todo era lindo!

— E você faz o que, afinal de contas? Achei que estudavam aqui, não que ficavam ouvindo música e olhando o céu pelo teto de vidro. – Ele gargalhou, a cada segundo gostava cada vez mais dessa menina, não era só bonita e fã do Beatles, mas tinha personalidade, era engraçada e falava o que pensava, isso era raridade no mundo, principalmente entre as meninas que ele conhecia que só pensavam em sapatos, maquiagem e como conquistar um homem, o que, aliás, elas nem sabiam fazer.

— Se estuda aqui, sim, e muito, para o seu governo, mas estou com uma aula vaga e ainda tenho tempo antes do meu estágio. – Ela o olhou com uma carinha de quem pensa se acredita e ele riu fracamente, antes de continuar. – Faço engenharia e arquitetura. E você vai fazer o que? Administração?

Ele perguntara isso apenas para ver aquela caretinha que ela fazia, na certa, e que era uma graça, até porque, mesmo sem saber a resposta, ele duvidava que ela fosse fazer administração, tinha cara de meninas decididas que pareciam querer muito mais do que ficar atrás de uma mesa o resto da vida.

— Ecaaaa... nãooo. – Ela fez uma careta e uma cara de nojo que o fez rir. – Bom, estou em dúvida entre publicidade e marketing ou jornalismo.

— Você é curiosa, deveria fazer jornalismo... e é bem desenvolta, acho que se daria bem na profissão.

— Obrigado. – Ela sorriu, não sem jeito, ou sem graça, mas como alguém que aceita os elogios, sinal de que ela era segura de si e não insegura como a maioria das meninas na idade dela, ou na idade que ele pensava que ela tinha.

— Quantos anos você tem? – Perguntou ele assim que pensou na idade dela. – Não me leve a mal. – Apressou-se, o que a fez rir.

— Eu heim, não sou essas velhas que tem medo de falar a idade. – Ela riu e ele respirou aliviado. Então conversar com ela não era como pisar em ovos, ele podia falar o que queria e como queria, que tudo ela levava na boa, na brincadeira, como era raro meninas assim! – Tenho dezessete, e... você? Uns trinta e cinco, aposto!

Sirius fez uma cara de susto que a fez cair na gargalhada.

— Ah, é palhacinha! – Ele falou brincando e ela riu mais ainda.

— É que você tem uma cara de velho, sabe! – Ela disse, ainda gargalhando e ele fez cara de poucos amigos, antes de se “irritar” e mostrar o dedo do meio para ela, o que causou mais risos ainda nela, e nele, que não conseguiu se segurar diante do humor da garota.

— Idiota! – Ela disse e ele gargalhou.

— Você é engraçada! – Ela deu um sorriso enorme e ele negou com a cabeça, levemente, ainda risonho. – Eu tenho vinte e dois, e estou no último ano, antes que me pergunte.

— Uau, ele lê mentes ainda por cima. Fiquei com medo agora. – Ele riu e ela riu junto, olhando a volta, agora um pouco assustada.

— Ta tudo bem?

— Ai não, é a minha professora, me esconde. – Ela o segurou pelos ombros, puxando-o mais para a frente dela, de modo que a professora que passava no corredor onde ela estivera antes, não a visse, e assim ele a ficou olhando, com as sobrancelhas erguidas.

— É uma fugitiva então, né? – Ele disse baixinho e ela riu, abaixando a cabeça no ombro dele e erguendo em seguida, percebendo então que o rosto dos dois estavam muito próximos agora. Ela sorriu e tentou não pensar nisso.

— É, eu não queria te falar nada, mas... na verdade eu estudo num manicômio e eles estão me procurando agora. – Ela respondeu baixinho e ele riu, sem desviar os olhos dos dela.

Ela podia sentir a respiração de Sirius em sua própria pele, o cheiro do perfume dele que era sensacional, quase lhe embriagava e o sorriso dele, que se formava naqueles lábios, era a coisa mais estonteante agora que ela olhava-o de perto.

— Que droga, bem que eu percebi que você era meio doida. E agora? Será que vão me levar junto? – Ela reprimiu o riso diante da cara dele de sério, como se aquilo fosse realmente verdade.

— Vish, eu acho que sim. Desculpa... se ferrou! – Ela disse aquilo tão natural e tão séria que ele não se aguentou e gargalhou alto, fazendo ela dar um tapa no braço dele, em protesto enquanto ele chamava a atenção com sua risada escandalosa.

— Ai Droga, melhor eu ir, você e sua risada escandalosa, com certeza, me denunciou. – Ele continuou rindo enquanto ela batia novamente no braço dele.

— Descuuulpa, mas é que você é muito hilária. – Ela fez uma caretinha, mas dessa vez, sorrindo.

— Obrigado. – Ele concordou com a cabeça e ela se levantou.

— A gente se vê, engraçadinha. – Ele piscou e ela sorriu, docemente.

— A gente se vê, Elvis.



Era naquela mesma universidade que ela estava agora, fazia seu primeiro ano de publicidade e marketing, no fim, acabara escolhendo publicidade porque ela gostava de criar coisas, e se achava bastante criativa, mesmo que falasse pra caramba, como dizia Sirius.

Tinha combinado com suas amigas para terminarem o trabalho para o seminário, e depois de quase duas horas, finalmente, elas tinham terminado aquela coisa chata; já estava ficando com dor de cabeça de tanto pensar.

Se despediu das amigas e pegou o metrô, assim iria mais rápido para casa. O dia estava quente e ensolarado, por isso ela não via a hora de chegar em casa e tomar um banho bem demorado e refrescante, lavaria os cabelos, colocaria seu pijama e pediria uma pizza, assim quando Sirius chegasse, a pizza já estaria lá, eles comeriam e aproveitariam a noite, comendo e rindo um do outro, enquanto assistiam filme ou coisa do tipo. Isso se não rolasse o happy hour, é claro, ela não trocaria bebidas por pizza naquela sexta, nem morta.

O metrô estava vazio àquele horário, por isso ela colocou os fones de ouvido e sentou-se no fundo do vagão, sentada a janela, vendo mais paredes escuras do que paisagem, mas não se importou, estava entretida em pensamentos enquanto viajava em suas músicas favoritas.

Menos de dez minutos depois ela descia na estação do seu bairro, e caminhava quatro quarteirões até virar a esquina e chegar em seu prédio. Pegou as correspondências, e subiu os quatro andares pela escada, já que ali não havia elevador.

“Lar, doce lar”, pensou assim que entrou no apartamento e jogou a mochila sobre o sofá, jogando as correspondências sobre a mesa e indo direto para a geladeira, tomar um delicioso copo de Coca-Cola bem gelada; tudo que ela mais precisava naquele momento.

Agora era a hora de relaxar, colocar o som na maior altura e tomar banho com a porta aberta, por quase meia hora, ahh como era bom morar sozinha, quer dizer, sozinha até as seis da tarde, ainda assim, mesmo quando Sirius estava em casa, era maravilhoso, porque ele não era seus pais e ela podia ainda fazer o que quisesse, quer dizer, quase tudo que quisesse, até porque ele era bem protetor também, não chato como seus pais, mas bastante protetor.

Sorriu ao pensar no amigo e ligou o som da sala, colocando um pen-drive com suas músicas favoritas e aumentando o volume, seguindo para seu quarto enquanto ia tirando a roupa colada de suor do corpo durante o trajeto. Jogou o celular sobre a cama, tirou a calça jeans e seguiu direto para o banheiro, onde tomou um banho longo e refrescante de aproximadamente trinta minutos.

O barulho da guitarra e o baixo, misturado aos vocais maravilhosos de uma de suas bandas favoritas ecoava por todo o apartamento quando ela saiu do banheiro, apenas de toalha, os cabelos pretos molhados e escorrendo pelo rosto e pelos ombros, fazendo gotas, agora geladas, escorrerem por sua pele, lhe causando uma refrescância gostosa. A primavera parecia ter chego logo com cara de verão, o sol brilhava lá fora ainda quando ela observou o dia pela janela, antes de fechá-la, e ligou o ventilador para afastar o calor que começava a emanar de seu corpo quente.

Tirou a toalha do corpo e a jogou sobre a cama, antes de seguir até o guarda roupa, onde apanhou uma calcinha preta e a colocou, ficando seminua pelo quarto, saboreando em todo o seu corpo aquele vento refrescante que vinha do ventilador que girava sob o teto, o barulho abafado pelo som dos Beatles que cantarolavam animadamente na sala. Se olhou no enorme espelho que tinha pendurado em uma das paredes do quarto e ficou se admirando, pensando que roupa colocava e o que faria depois, talvez pedir uma pizza? Será que o Sirius ia querer mesmo sair como ela tinha sugerido pela manhã? Ou será que ele iria sair com os amigos do trabalho e comemorar sozinho?

Achou melhor não pensar nisso naquele momento, por isso, deu as costas para o espelho e voltou para o guarda roupa, precisava encontrar seu secador de cabelos, sua chapinha e escolher uma roupa para colocar, melhor ficar arrumada, afinal, se o Sirius resolvesse sair com os amigos dele, ela ligaria para as meninas da faculdade e sairia também, sexta-feira era sexta-feira, certo?

Se embrenhou no guarda roupa e segundos depois encontrou o secador de cabelos e a chapinha, os quais jogou sobre a cama e voltou em direção ao guarda roupa para dar uma olhada em suas roupas enquanto pensava qual colocar. Estava quente, a noite com certeza iria ser bonita, talvez um vestido preto, rodadinho, leve e ao mesmo tempo sedutor, seria a escolha perfeita. Sorriu a si mesma quando puxou o vestido ideal do guarda-roupa e virou-se para joga-lo sobre a cama, totalmente distraída, tão distraída que, por segundos, ela mal percebeu que tinha alguém parado a porta de seu quarto, a observando.

— AHH! MEU DEUS! – Marlene levou um susto tão grande que deixou o vestido, ainda no cabide, cair de sua mão, e virou-se rapidamente, tentando cobrir os seios com as duas mãos. – SIRIUS! QUE SUSTO!

— Desculpa... eu não queria... eu não vi... nada. – Ele riu, sem graça, e Marlene virou-se, agora com as duas mãos sobre os seios, tapando-os e o encarando, com as sobrancelhas erguidas.

— Você tava me olhando há quanto tempo? – Ele riu, sem graça, observando como ela estava com os braços cruzados sobre os peitos, as duas mãos apertando os seios que pareciam maiores do que ele sequer imaginara alguma vez na vida, e com isso, deixando à mostra a parte de cima dos mesmos que ficavam mais volumosos conforme ela mais os apertava com as mãos.

— Eu não... Hey, eu não vi nada! Quando eu parei na porta você me viu, gritou e virou tapando os peitos. – Ele riu, adentrando o quarto, agora totalmente à vontade, como se ela já tivesse colocado uma roupa e não tivesse mais porque ele ficar se escondendo.

Claro que ele tinha visto um pouco mais do que estava contando, mas ela não precisava saber disso, afinal de contas, ele era homem, não era bobo e não era cego.

Ainda risonho, sentou-se na poltrona que ela tinha, ao lado do espelho e cruzou as pernas, observando-a.

— Você devia bater na porta, sei lá, avisar que tá em casa pra eu não ficar andando pelada por ai. – Ele ainda mantinha a mesma cara risonha e continuava olhando para ela, como se achasse engraçado a maneira como ela ficava apertando os peitos para ele não ver, se esquecendo que ele conseguia ver todo o resto do corpo dela que, por sinal, era muito bonito.

— Eu até tentei, mas os Beatles não deixaram. – Ele deu uma piscadinha e ela fez uma careta. – Então, algum motivo especial para você estar se produzindo toda aí?

— Não. E o que você tá fazendo aqui essa hora e não tá trabalhando? – Ela decidiu que, se ele poderia ficar ali, a vontade, como se nada tivesse acontecendo, ela também poderia agir normalmente como se ele não estivesse ali a olhando, por isso se virou de costas para ele, tirou as mãos dos seios, se abaixou e pegou o vestido, ciente de que ele provavelmente não desviara os olhos, sequer, e olhara para sua bunda, e enfiou-o pelo pescoço, deixando ele cair por seu corpo, cobrindo-o todo.

Ainda estava quente e não era exatamente aquilo que ela prevera, vestir roupa com o corpo suando não era algo muito gostoso de se fazer, mas ela não podia também se dar ao luxo de continuar andando pelada pelo quarto com ele ali, isso já era demais, por mais intimidade que eles tivessem, ver um ao outro nu era um nível de intimidade que eles nunca haviam chego até então, e naquele momento não era hora de mudar isso.

— Hoje é sexta-feira, eu saio mais cedo, esqueceu? – Ele continuava sentado, tranquilamente, agora com o celular nas mãos. Será que ele havia tirado uma foto dela sem roupa? Deus, não, que isso, o Sirius não faria isso. Que ideia, já estava pirando, já, pensou desesperada.

— Ah é verdade, eu tinha me esquecido. – Agora com o vestido meio colado ao corpo por causa do calor, ela virou-se normalmente e caminhou até a cama, pegando o secador e seguindo até a frente do espelho, onde ligou o secador na tomada, enquanto Sirius, agora mais próximo a ela, colocava o celular sobre o colo e ficava observando-a.

— A galera da minha empresa foi pra um happy hour, e como você disse ontem que queria fazer alguma coisa, resolvi passar aqui e ver se você queria ir comigo. – Ela sabia que ele poderia muito bem “esquecer” o que dissera naquela manhã e ir direto para o happy hour com os amigos e apenas ligar depois para ela, para avisar, mas ali estava ele, Sirius Black, seu melhor amigo, doce, gentil, atencioso, pensando nela e a convidando para ir no Happy Hour de seus amigos, os quais ela nem conhecia, com ele. Sorriu, carinhosamente, agora até se esquecendo que ele praticamente a vira nua.

— Jura? – Ele acenou com a cabeça e ela abriu um sorriso enorme, que ele achou lindo. – Eu tenho quanto tempo pra me arrumar?

Ele riu; típico, se ele não lhe desse um tempo exato para se arrumar, ela demoraria a noite inteira.

— Eu vou só tomar um banho e me trocar porque está muito calor e estou morrendo com essa camisa, então você tem aproximadamente, trinta minutos.

Ela assentiu, o rosto todo iluminado e ligou o secador, começando a secar o cabelo enquanto ele se levantava e ia até ela, parando atrás da garota e a olhando pelo espelho, enquanto ela sorria, erguendo as sobrancelhas, sem entender o que ele fazia ali.

Olhando para o corpo dela através reflexo do espelho, ele sorriu sapecamente, e antes de sair do quarto, mal ouvindo os xingos dela abafados pelas vozes de Paul, John, George e Ringo, ele aproximou os lábios do ouvido dela e disse, com a voz baixa e maliciosa.

— Belo corpo, Kinnon.



 


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