A casa do Morumbi



Quando tinha uns catorze anos mais ou menos, lembro que a gente morava numa casa no Morumbi com piscina e tudo o mais. Naquele tempo meu pai estava numa boa, tinha sido promovido no banco em que trabalhava. Ele costumava ficar pouco tempo em casa, porque vivia viajando pra Nova York.
MInha mãe naquela época  não trabalhava e nem precisava, meu pai dizia:
_ Trabalhar pra quê, Molly? É  melhor ficar cuidando das crianças. Sem contar que o salário de professor...
Mas foi com o salário de professor que ela acabou criando a gente, depois que ele fugiu se mandou com uma perua do escritorio e a deixou com uma mão na frente e outra atrás. Bem, é claro, minha mãe ficou com a casa do Morumbi, mas teve que vender rapidinho porque não sabia fazer nada e não conseguia nem pagar o colégio meu e da Gina.
Antes disso acontecer, a nossa vida era legal, ter uma  casa com piscina um monte de empregados, tinha chofer que levava a gente ao colégio e a mamãe ao shopping, e mais duas moças que cuidavam de tudo. Naquela época eu nunca tinha visto minha mãe passar uma roupa ou cozinhar, ela vivia ao telefone comendo chocolate e combinando programas com as amigas, cada uma mais vagau que a outra.
Nas férias, a gente ia pra Angra, numa casa que meu pai alugava. O engraçado é que ele nunca ficava com a gente, Minha mãe chegou a reclamar algumas vezes, mas ele dizia que com a promoção não podia tirar férias.
_ Daqui a uns dois anos, eu paro e fico mais com vocês...
O que era bom é que ninguém pegava no nosso pé.  Nem meu pai nem minha mãe nunca quiseram saber se a Gina e eu íamos bem na escola,coisa e tal. Mesmo assim nunca repeti de ano, é verdade que também não estudava nada. Mas se sou um idiota, nunca fui burro e sabia me virar. Gostava de ler e bastava prestar um pouco de atenção nas aulas pra tirar de letra qualquer matéria. Só fui tomar pau mesmo quando minha vida foi pro ralo. Com a Gina, a coisa era diferente, além de mais inteligente do que eu ela gostava de estudar, como faz até hoje. Não é a toa que com dezessete anos entrou na USP. Mas como dizia ninguém pegava no nosso pé, papai sempre viajando, e mamãe passeando com as amigas dela. Eu também não parava em casa. Chegava da escola, jogava os bagulhos em cima da cama, comia qualquer coisa correndo e me mandava pra rua. E essa vida de moleza durou até que o meu pai fosse embora de casa...

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.