Um par para Serena

Um par para Serena



  O que aquele Malfoy idiota quis ao beijá-la? Essa era a pergunta que rodara pela cabeça de Serena durante quase toda a madrugada de domingo. Chegara tarde naquela noite, deveras, e Eliza já estava dormindo quando chegou, depois disso, não teve qualquer ânimo para contar o pequeno incidente à garota.


                Elizabeth, obviamente, lhe perguntara sobre o encontro com Snape, e por que chegara tão tarde. Serena contou-lhe uma versão nada detalhada,que não envolvia a visita aos aposentos do professor, e deu a entender para a colega que ela tinha feito uma redação.


                Saíram juntas da aula de Trato das Criaturas Mágicas, Elizabeth indo em direção à escadaria que levava a mais escadas rumo a Torre, para a aula de Adivinhação que fazia parte de seu horário, e Serena, que tinha essa aula extra vaga devido ao seu ingresso tardio na escola, seguiu o corredor para apanhar os materiais que esquecera na sala de Snape. Sabia que ele tinha esse horário vago, já que Dumbledore a informara no início do ano letivo, caso houvesse alguma dúvida, porém esperava realmente não se demorar.


                Viu Flich no final do corredor, seguindo para a sua sala e resmungando para Madame Nora seu desgosto pelos alunos, e contando à gata como um dos ‘pivetes’ conseguira quebrar a estátua branca de Pandemus, o Feio. Isso, pensou a garota, devia ser recente, já que da última vez que passara por aquele corredor a estátua que retratava um homem horroroso ainda estava por lá.


                Um grupo de Sonserinos sextanistas vinha em direção contrária, indo para Trato das Criaturas Mágicas, deduziu a garota pelo livro que carregavam. Seguiu, passando entre eles, distraída. Prestava atenção na figura do Barão Sangrento, pairando a muitos metros de distância, conversando com algumas bruxas velhas de um quadro.


                Sentiu, repentinamente, mãos fortes e seguras a empurrarem para uma abertura escura – longe dos sextanistas que se dirigiam para fora do castelo. As mãos tatearam em busca de sua cintura, aproximando o contato dos corpos. No escuro, os lábios se encontraram, fervorosos como outrora. Eles se aproximavam ao máximo, parecendo querer fundir-se um ao outro. As línguas eram rápidas e os movimentos bruscos, pareciam somente querer abrandar o desejo que corria solto em seus corpos.


                ‘-Vá para sua aula, Malfoy.’ – ela disse, empurrando-o de cima dela, viu-o desaparecer no corredor, ajeitou os cabelos e desamassou ligeiramente as vestes. Olhou para os dois lados. Não vinha ninguém. Colocou sua melhor expressão de tédio e saiu.


                Logo que saiu, notou que ali, naquele lugar onde estava se amassando com Malfoy segundos atrás, deveria ser o antigo lugar da estátua de Pandemus, o Feio. E notou que o archote que acompanhava a estátua também tinha sido apagado, o que tinha garantido certa privacidade aos dois.


                Serena pensou um pouco e estacou. Agora ela era a garota que andava se amassando pelos cantos com Malfoy? E se alguém visse os dois? Preferia morrer ao ser vista daquela forma com Malfoy. Será que Parkinson estava doente e o sonserino idiota resolvera tê-la como substituta?


 


                Chegou até a sala de Poções exausta com seus pensamentos. Não pensaria mais em Malfoy. Bateu na porta de leve, e teve como resposta um ‘entre’ arrastado e monótono, quase bravo, como se alguém tivesse incomodado profundamente.


                Serena empurrou a porta com cuidado para não ranger e encarou Snape. Ele ergueu os olhos do livro sobre a mesa e correspondeu seu olhar. Ao contrário da noite anterior, o olhar de Snape estava ainda mais gélido, e sua expressão só endureceu mais ao ver a garota adentrar sua sala.


                ‘-Senhorita Serena’ – disse com falsa animação – ‘Vejamos quem retornou após a fuga emblemática de ontem. O que quer aqui, garota? Deixe-me refrescar sua mente: não temos aula hoje.’ – Snape disse, a carranca aumentando.


                ‘-Eu sei que não temos aula hoje, professor.’ – respondeu ela, no mesmo tom – ‘Para sua informação, não fugi ontem, é que já fui alertada para não ficar perto de Comensais’ – ela enfatizou a palavra – ‘Principalmente daqueles que dizem que já não o são mais. Esse é o pior tipo.’ – Serena abriu um sorrisinho de desafio para ele.


                Snape afrouxou a expressão ligeiramente. Estava um tanto quanto confuso.


                ‘-De onde você tirou essas conclusões, menina?’ – ele tentou um tom de deboche, mas havia uma pitada de medo na voz.


                ‘-Nenhum Comensal deixa de ser Comensal, só não o será mais quando estiver morto. Sei disso, Snape. E o senhor leva a Marca Negra não é? Eu a vi ontem à noite.’ – ela arqueou uma sobrancelha – ‘Voldemort tem e teve muitos seguidores não é? Mas ouvi falar que somente os do círculo mais íntimo possuem essa tatuagenzinha.’


                Então Severo entendeu o que se passava. Na noite anterior teve ódio dela. Ele se deixara mostrar para a menina, levara-a até seus aposentos, lhe dera a brecha necessária para o relacionamento dos dois, e ela simplesmente fugira. Quis nunca ter sido idiota a ponto de fazer isso, percebendo que todo o autocontrole que reunira durante anos se esvaía quando chegava perto de Serena.


                Ele descobrira o porquê da fuga repentina: ela tinha visto, tinha visto a Marca Negra em seu braço esquerdo. Snape, mergulhado em pensamentos, não percebeu que não dera uma resposta à menina. Serena achou suas coisas, guardadas em sua mochila,próxima a mesa do professor.


                ‘-Eu só vim buscar minhas coisas, Snape. Prometo não incomodar mais.’ – disse, e saiu, a passos lentos. Severo percebeu que ela não falara aquilo ao professor ela se dirigia à figura a qual era biologicamente ligada.


 


                Serena encaminhou-se diretamente para o Salão Principal, onde o almoço já devia ter começado a ser servido. Eliza avistou-a, e acenou para ela da mesa. A garota seguiu então em direção a um lugar vago vizinho a amiga. Elizabeth estava eufórica, seus olhos verdes e amendoados brilhavam, e quando a morena chegou até a mesa, deu um gritinho de felicidade.


                ‘-Ei, o que houve?’ – perguntou Serena, que não estava no clima de comemorações.


                ‘-Dumbledore anunciou antes de o jantar ser servido. Teremos um baile de inverno!’ – respondeu a loira, empolgada.


                ‘-Hum. E o que vocês costumam fazer?’ – perguntou novamente, se servindo de suco de abóbora e de uma coxa de frango.


                ‘-Dançar, comer, beber, e principalmente: nos divertir.’


                Serena olhou para as outras mesas.Todos estavam exatamente iguais a Eliza:  a euforia era geral. Viu Parkinson ajeitando o colarinho das vestes de Malfoy, enquanto perguntava qual cor ele preferia que ela usasse no baile, passando uma perna maliciosamente por cima das do garoto e o sorriso que ela deu a ele seria classificado como um ‘sorriso vadia’ por Serena.


                ‘-Oferecida.’ – comentou Eliza, olhando na mesma direção que a outra menina.


                ‘-Eu não vou.’ – disse Serena, apanhando um guardanapo limpo sobre a mesa.


                ‘-Como assim? Do que você está falando?’ – a loira distraiu-se do assunto principal.


                ‘-O baile. Eu não vou.’


                ‘-Você não pode não ir!’


                ‘-Claro que posso. Simplesmente não indo. Pronto.’ – Serena estava séria.


                ‘-Não, Serena! Todo mundo vai estar lá, todos os garotos de todos os anos.’


                ‘-E daí? Não estou em clima de festas.’


                ‘-Ah, mas eu não quero ir sozinha. Por favor. Por favor. Por favor!’ – ela choramingou, e fez beicinho.


                ‘-Garanto que alguém vai te convidar para o baile. Você não vai estar sozinha.’


                ‘-Sabe, ia ser bom ‘pra você se divertir um pouco...’ – disse ela, pensativa.


                ‘-Não ia não. E além do mais, eu odiaria ficar “segurando vela” para você.’


                ‘-Hum, que tal um combinado?’ – disse, tramando algo – ‘Se algum menino legal – na minha concepção de legal – te convidar para o baile você vai’ – Eliza sorriu, encantada com sua idéia – ‘Não importa a que Casa ele pertença.’


                Serena desatou a rir debochadamente.


                ‘-Você acha que algum menino iria me convidar?’ – a morena limpou a boca suja de suco de abóbora no guardanapo – ‘E ainda mais um menino legal?’


                ‘-Acho’ – respondeu simplesmente, desapontada com a outra que ainda ria – ‘Bom, se você acha que ninguém vai te convidar, não há nada de mais em topar o acordo.’


                ‘-OK’ – disse Serena, ainda um pouco relutante – ‘Mas nada de trapacear. Isso inclui suborno e indiretas sobre me convidar.’


                ‘-Tá, tá. Mas você vai ver! Tenho certeza que alguém legal vai te convidar.’ – os olhos de Elizabeth brilharam mais uma vez.


 


                O baile seria dali a duas semanas, e Serena não tinha esperança alguma de ser convidada por alguém, ainda mais por alguém que atenderia a classificação ‘legal’ de Eliza. Fora surpreendida mais uma vez por Malfoy, que a arrastara até uma sala inutilizada e a beijara como se o mundo fosse acabar no dia seguinte. Serena vira o garoto esnobar declaradamente Pansy Parkinson vezes demais naqueles dias, o que não deixava de ser mais uma atitude estranha.


                Na quinta-feira, Serena e Eliza estavam no Salão Comunal, terminando alguns deveres atrasados, quando uma coruja escura desceu, por uma entrada circular e pequena ligada ao corujal, e parou em cima do trabalho de História da Magia. A garota ergueu o olhar, e como não pegou o bilhete de imediato, a coruja começou a piar e sacudir a perna em que o pergaminho estava amarrado.


                Todos olhavam na direção da coruja que piava loucamente. Serena tratou de desamarrar logo o bilhete, antes que a ave atraísse ainda mais olhares. Assim que a garota abriu o pergaminho, a coruja já tinha ido, sem esperar resposta.



Te espero na Torre de Astronomia.


                D.M.


               
                Serena conferiu o verso. A frase era a única coisa escrita no bilhete. Eliza espichou os olhinhos verdes, tentando  - em vão – ler.


                ‘-O que é, Serena?’ – perguntou, afobada, na expectativa de que fosse um convite para o baile.


                ‘-Um pedaço de pergaminho.’ – disse, irônica, mas abalada.


                ‘-Ah, isso eu sei’ – ela revirou os olhos – ‘, mas quem mandou? O que ‘tá escrito?’


                ‘-Não é nada de importante. Bobagem.’ – Serena colocou o bilhete, disfarçadamente, dentro da mochila.


                ‘-Se não é nada importante, eu posso ver. Vamos lá, por favor.’ – ela suplicava, cheia de curiosidade.


                ‘-Não, Eliza. É sério, não é nada.’


                Elizabeth não se conformou de imediato, mas voltou sua atenção ao dever de casa. Serena estava cansada, e totalmente não iria até a Torre de Astronomia, provavelmente ele estava tentando pregar uma peça nela. A garota prendeu seus cabelos em um coque alto e frouxo e suspirou ao olhar para a pilha de deveres que a esperava.


                A loira terminou seus deveres muitíssimo mais rápido que a amiga, já que Serena acumulara mais tarefas do que ela. Era notável que Eliza ainda estava brava, já que saiu repentinamente, murmurando um ‘boa noite’ mal-humorado.


                Os deveres pareciam não acabar mais, até porque empacara em uma redação específica de Poções que exigia 1 metro e meio de pergaminho, e tudo o que ela conseguira escrever fora, no máximo, 10 centímetros.


                Depois de finalizar o texto de Poções, retornou ao trabalho sobre a Revolta dos Duendes, em que ela e Eliza estavam trabalhando, mas deixara de lado por preguiça de pesquisar mais coisas nos livros.


                Serena tinha despido a capa e os sapatos. Apesar de ser inverno, e as masmorras naturalmente frias, estava quente ali, talvez por todas as lareiras estarem acesas. Os grupos que continuavam no Salão Comunal eram cada vez menores, até que sobraram algumas poucas pessoas, que uma a uma foram deixando o aposento, umas sonolentas, outras – apesar de serem escassas – ainda animadas.


                Serena ainda tinha que listar os ingredientes, e a quantidade certa deles, que compunham um contraveneno perfeito e que atendesse à teoria asiática aplicada no livro. Ela abriu seu exemplar de ‘Contravenenos Asiáticos’ e suspirou longamente. Seus ombros doíam. Sua mente já não conseguia trabalhar. Precisava dormir.


                A porta de pedra que levava ao Salão se abriu, e mostrou uma figura alta adentrando-o. Ele também parecia cansado, os cabelos estavam despenteados, a gravata frouxa, e trazia a capa preta na mão. Serena se levantou repentinamente, a varinha em punho.


                ‘-Ei, Snape, não precisa me azarar por te chamar até a Torre de Astronomia. Onde você nem se deu o trabalho de ir.’


                Ela baixou a varinha e caminhou de volta a um sofá enquanto ele ia até ela. Era só o Malfoy.


                ‘-Você estava na Torre até agora?’


                ‘-O que você acha?’ – ele disse, com expressão entediada, atirando-se no sofá ao lado dela.


                ‘-Por que ficou lá até agora?’ – era uma pergunta debochada.


                ‘-Estava esperando uma certa sonserina, mas ela não apareceu. Esperei mais. Quem sabe ela estivesse atrasada?’ – ele disse, mas a voz era quase divertida.


                ‘-Nunca vi um atraso de 2 horas e meia, Malfoy.’ – ela sorriu, fingindo não saber que era dela que ele falava –‘E não olhe para mim como se isso tivesse sido marcado. Eu só recebi um bilhete tosco. Você não esperava realmente que eu fosse, não é?’


                ‘-Não, Snape. Sei como gente orgulhosa como você é’ – ele chegou mais perto dela e ficou de pé, puxando-a para si –‘Mas sei que você também não resiste a isso’ – ele beijou-a fervorosamente de novo – ‘Caramba, Snape!’ – ele bradou, soltando-a e distanciando-se um pouco dela – ‘Eu não sei o que é, mas alguma coisa me puxa ‘pra você. Nunca senti tanto desejo por alguém’ – ele se aproximou e roçou os lábios nos dela, que carregavam um meio-sorriso presunçoso – ‘Quero te beijar, te abraçar... Você está me deixando doido.’ – disse, agora baixo, em seu ouvido.


                Pela primeira vez, foi Serena quem começou um beijo. Ela passou seus braços ágeis pelo pescoço do garoto e o trouxe para mais perto, ele então colocou as mãos em sua cintura e ela beijou-o vorazmente, ele sorriu ao notar o quanto ela acelerava o beijo, e Malfoy se esforçava para acompanhar.


                Ele desprendeu os lábios por um instante e beijou o pescoço de Serena, calmamente, fazendo-a querer beijá-lo ainda mais. Quando o beijou e as carícias se tornaram mais rápidas e íntimas, a garota tirou as mãos de Malfoy de sua cintura.


                ‘-Chega por hoje, Malfoy. Já é hora de dormir.’ – ele nada mais disse, somente colou os lábios ao dela mais uma vez e rumou para seu dormitório.


                ‘-Por hoje...’ – ele disse, já de costas para ela.


                Serena revirou os olhos e recolheu suas coisas que estavam completamente espalhadas, deixando de lado o segundo dever de casa que Snape passara. Um sermão a mais, um a menos, pouco importava.


 


                Na sexta feira, Eliza e Serena almoçavam calmamente no Salão Principal sentadas à mesa da Sonserina. Elizabeth tinha superado o clima ruim do dia anterior,e sorria abertamente de novo. A escola inteira estava tomando coragem e arrumando pares para o baile, e aquele parecia ser realmente o dia. Só na hora do almoço elas viram os pedidos mais espalhafatosos que nunca sequer imaginariam. As quatro mesas explodiram na gargalhada quando uma garota grifinória do quinto ano recebera um berrador convidando-a para o baile. Era uma Weasley, a mais nova, e a garota deixara a mesa corada como seu cabelo e arrastando Dino Thomas – o remetente do berrador – pela gola das vestes, com todos os olhares sobre os dois.


                Serena dera graças a Merlim que não seria convidada para o baile, se alguém a mandasse alguma coisa associada a berradores ela o azararia até a morte. Eliza parecia pensar exatamente ao contrário: não via a hora de receber um convite de verdade, como dizia ela. Jullian McDonald fora o primeiro a convidar, mas a garota disse que era baixo demais para ela, Frederick Montéz fora o segundo, e ela dissera um não educado porque ele era mais novo, e para os seis seguintes Elizabeth não arranjara uma desculpa concreta.


                As duas levantaram da mesa junto com muitos alunos que já se retiravam do Salão. Na outra extremidade da mesa, Zabini puxou Malfoy e saiu correndo em direção às garotas.


                Serena e Eliza já estavam quase nos jardins quando os dois alcançaram-nas. Zabini ofegava teatralmente, e Draco revirou os olhos. O moreno chamou a atenção de Eliza, que deu um sorrisinho em resposta, Serena nem apercebeu-se da presença de Draco, somente viu-o saindo com Parkinson enquanto ela cochichava na ouvido dele e passava a mão de unhas compridas e vermelhas pelo pescoço do loiro. Malfoy olhava para trás, mas Serena estava absorta na reação da amiga.


                ‘-Então, já que não tive tempo de te preparar uma surpresa, ou um berrador’ – disse Zabini, conquistador, arrancando mais sorrisos da loira – ‘Queres ir comigo ao baile ó bela dama de cabelos dourados e olhos de esmeraldas? Sou somente teu mero servo...’ – o garoto interpretou o convite como uma peça de Shakespeare, e os olhos de Eliza brilharam tanto, ela riu mais, e corou ligeiramente.


                ‘-Aceito, meu caro senhor.’ – respondeu, entrando na brincadeira.


                Zabini segurou a mão da garota, e o vermelho de seu rosto intensificou-se, o garoto começou a puxá-la para os jardins, e Eliza olhou pedindo desculpas a Serena. Mas a morena não se importava, e seguiu só para os jardins, em um canto afastado da amiga e seu par.


                Carregava um livro trouxa, grosso, e acomodou-se encostada à uma árvore, podia ver bem o lago da Lula Gigante. Mal abriu o livro, fora interrompida.


                ‘-Tolstoi?’ – era alguém que tinha algum conhecimento do mundo dos trouxas – ‘Guerra e Paz?’ – ele chutou.


                Ela fez um som imitando uma campainha típica de jogos televisivos trouxas – ‘Anna Karenina.’


                ‘-Ah, sim. Já me disseram que Anna Karenina consegue ser melhor que o clássico Guerra e Paz... Mas, não sei, não li nenhum dos dois.’ – falou, um tanto envergonhado.


                ‘-Então, Potter, acredito que não tenha vindo até aqui discutir comigo sobre Tolstoi. O que você quer?’ – perguntou, não dando brecha para enrolações.


                ‘-Eu queria saber se você, hum... vaiaobaile.’ – ele disse a última parte rápido demais, e Serena não conseguiu entender.


                ‘-O que foi, Potter? Pode falar, eu não mordo.’ – Serena estava perdendo a paciência.


                ‘-Hum, Serena, você quer ir ao baile co-comigo?’ – perguntou, nervoso.


                A garota achou o nervosismo dele engraçado. Ora, ele só estava falando com ela, não com uma garota linda, loira e popular. Isso o fez ganhar pontos, e francamente Harry Potter era uma pessoa legal, e Eliza simpatizava com ele. Serena teria que ir ao baile. Além de tudo, ela iria adorar a expressão de choque quando ela adentrasse o Salão com Potter. Seria uma noite inesquecível.


                ‘-Se você já estiver indo com alguém, tudo OK, eu não...’ – ele começaria a gaguejar a qualquer momento, então Serena interrompeu-o.


                ‘-OK, Potter. Vejo você no sábado. Me espere na porta do meu Salão Comunal, e não se atrase.’ – deu as ordens e um sorrisinho torto para ele – ‘Tchau, Potter.’


                A garota saiu apressada para o próximo tempo, que era, infelizmente, Poções. Encontrou Eliza no meio do caminho, a garota excedia os limites da felicidade, quando ela ia começar a lhe contar todos os detalhes – os quais Serena preferia que fossem omitidos – Snape chamou a turma já do corredor. Ele estava muito sério e aparentemente mais carrancudo do que nunca.


               
                Ao fim da aula, Eliza disparara pelos corredores assim que a sineta tocara, para poder ver Zabini mais alguns minutos entre a troca de aulas. Serena acompanhava a massa de alunos que deixava a sala, quando sentiu uma mão em seu ombro. Ela virou-se. O professor Snape a olhava de um jeito penetrante.


                ‘-Tem um minuto, senhorita?’ – perguntou Snape, ostentando uma expressão estranha no rosto.


                ‘-Ahn, sim, eu acho.’ – respondeu Serena, confusa.


                Severo caminhou até sua mesa, mas não se sentou, apenas apoiou-se nela. Serena acompanhou-o, parando próxima a outra extremidade da mesa.


                ‘-Você vai ao baile, Serena?’ – perguntou, não demonstrando nenhuma emoção.


                Sim, ela definitivamente iria. Mas não estressaria Snape tão cedo,ele provavelmente já ficaria furioso quando a visse no baile com Potter, então pouparia a si mesma de sermões antecipados. Ela ainda tinha ódio dele. Ele era um Comensal, e ela não queria contato nenhum com pessoas envolvidas com Voldemort.


                ‘-Ainda não me decidi.’ – disse, o olhar poderia congelar qualquer um tamanha a frieza – ‘Por que a pergunta, professor?’


                ‘-Você provavelmente não trouxe nenhuma roupa de gala’ – ele respondeu, encarando-a com firmeza.


                ‘-E que parte disto seria de sua alçada?’ – ela lhe provocava lançando um olhar dignamente desafiador.


                ‘-Em todas as partes, menina.Você vai ao baile ou não?’ – ele estava perdendo a paciência com ela.


                ‘-Se acha que é sua obrigação comprar vestes de gala para mim, lhe privo dela. Não quero nada vindo de você, Snape.’ – ela disse, o peito pesando um pouco após as afirmações grosseiras.


                Severo oscilou por um instante. Aquilo magoara-o.


                ‘-Está certo, Serena. Você não é obrigada a aceitar nada.’ – ele disse, quando se recompôs,frio como nunca mais fora nas últimas semanas – ‘Agora estou certo que a senhorita ainda tem aulas para assistir, então sugiro que vá.’


                Ele apontou para a porta, em um gesto brusco, então Serena jogou sua mochila por sobre os ombros e saiu, também carrancuda.


 


                Depois do jantar – quando finalmente pôde tomar um banho e instalar-se em sua cama – Serena se sentia culpada. Snape estivera sendo algo parecido com agradável com ela e oferecera-lhe, indiretamente, roupas para o baile, que ela recusou grosseiramente. A garota  notou que ele demorara pouco mais que o normal para responder, e isso a deixou pior.


                Ele era um Comensal, e mentira sobre não o ser mais. Porém, Serena começara a nutrir um sentimento estranho por ele, algo que alguns chamariam de carinho.


                Ela suspirou. Não adiantava mais pensar nisso, afinal nada mudaria. Eliza chegou pouco depois, abrindo a cortina escandalosamente e se jogando em sua cama.


                ‘-Blaise Zabini me convidou!’ – ela deitou na cama da amiga, eufórica – ‘Você está acreditando nisso?’


                ‘-Sim, Eliza, por acaso eu estava lá quando ele te convidou à La Shakespeare.’ – resmungou a outra.


                ‘-Eu simplesmente não consigo acreditar!’ – ela então rolou pela cama, mais do que feliz – ‘Sabe, Serena , eu só recusei aqueles convites por que queria que Blaise me convidasse.’ – admitiu, levemente acanhada.


                Serena revirou os olhos e cruzou as pernas, ajeitando as costas contra a cabeceira de pedra da cama.


                ‘-E você, Serena?’ – perguntou com curiosidade – ‘Não recebeu nenhum convite até agora? Hoje pareceu o Dia Mundial dos Convites para o Baile de Inverno...’ – ela suspirou, brincando com uma mecha de seu cabelo claro.


                ‘-Hum, Potter me chamou ‘pra ir com ele.’ – ela disse, sem emoção, apertando o travesseiro de plumas contra o peito.


                ‘-Harry Potter?’ – Serena concordou com a cabeça.


                ‘-Consta na sua definição de legal?’ – perguntou, sarcástica.


                ‘-Wow! Harry é mais do que legal. É tipo, perfeito. Hum, Potter é quase melhor do que o Blaise.’ – disse ela, pensativa, e animada – ‘Me conte os detalhes! Quando ele te convidou? Ele foi romântico?Espalhafatoso?’ – ela deitou de barriga para baixo ocupando quase toda a extensão da cama, e apoiou o rosto em ambas as mãos, curiosíssima – ‘Minha nossa, ele te beijou?’ – os olhos da loira esbugalharam ligeiramente à idéia.


                ‘-Calma, calma, Eliza. Foi tudo normal. Não acho que seja do feitio do Potter mandar um berrador. Ele puxou papo comigo sobre o livro que eu ‘tava lendo e me convidou para o baile. E só. Ele não me beijou, garota!’ – Serena riu torto, jogou o travesseiro que segurava em Elizabeth.


                A loira reclamou e jogou o travesseiro de volta, Serena agarrou-o no ar e de repente ficou séria.


                ‘-Hum, eu não tinha pensado em um detalhe.’ – o minúsculo diálogo com Snape lhe veio à tona – ‘Eu não tenho o que vestir.’


                ‘-Ufa’ – ela respondeu, um tanto aliviada – ‘, se é só isso, não há problema. Eu trouxe todos os vestidos que tenho. Não sabia para que serviria a tal ‘roupa de gala’, então trouxe um monte de vestidos, para todas as ocasiões.’ – Serena achou isso tão típico da Lufa-Lufa que ela era por dentro – ‘Vem cá, vamos escolher.’ – Eliza ficara realmente animada com a possibilidade de escolher sua vestimenta para o baile com a opinião de uma amiga.


                As duas seguiram para a cama da loira. O quarto – exceto por elas – estava vazio. As outras duas ocupantes do quarto cumpriam uma detenção longa com o velho zelador Flich. Elizabeth pegou o malão, de lá tirou uma miniatura de mala de viagem cor-de-rosa, e com um aceno de varinha ela voltou ao tamanho real. Era pelo menos duas vezes maior que o malão preto.


                Atentando à expressão de espanto de Serena, Eliza se explicou ‘-No malão não iria caber tudo. Tive que dar um jeitinho.’ – ela deu de ombros, e sorriu. Era, mais uma vez, o sorriso que lembrava o sorriso de Alexia Spring.


                Elizabeth tirou vários vestidos do malão – todos em tons que variavam de rosê à pink, passando antes por nude e acabando com um que era quase violeta. Embora fossem muitos, ainda não eram todos. A loira mostrou-os a amiga, a fim de esta avaliar, e Serena torceu – literalmente – o nariz para todos.


                Eliza experimentou todos, e acabou se decidindo por um rosa claro e leve, Serena aprovou, mas jamais usaria qualquer um daqueles.


                ‘-Está tudo muito cor-de-rosa, Eliza. Não vou ao baile parecendo uma Barbie falsa.’ – teimou Serena, cansada daquela cor.


                ‘-O que é Barbie?’ – perguntou inocentemente.


                ‘-Esqueci, você cresceu com bruxos. É uma boneca trouxa, magra e loura que é vestida de rosa o tempo todo.’ – enquanto ela explicava, Eliza acenava com a cabeça de forma engraçada, e a outra percebeu que ela não entendera nada – ‘Bom, você tem algo que não seja rosa aí?’


                A garota desatou a tirar mais vestidos da mala de viagem. Roxos, beges, cinzas, pratas, mais vestidos rosa... Até que tirou um modelo tomara que caia, de busto estruturado, que finalizava em uma saia balonê – vermelho sangue. Eliza deu um gritinho.


                ‘-É perfeito!’ – Serena arqueou a sobrancelha, descrente – ‘Vamos lá, Serena, experimente!’


                A morena, bufando, provou-o.Ele se encaixou perfeitamente em seu corpo curvilíneo. Deixava o colo branquíssimo exposto, assim como parte das coxas, já que ele estava a um bom palmo e meio acima do joelho. Eliza puxou o elástico que atava o cabelo da outra em um rabo baixo e os fios morenos deslizaram por sobre o ombro.


                ‘-Eu estava certa. É completamente perfeito, parece que foi feito ‘pra você. Sério, Serena, eu te dou esse vestido se você quiser, eu nunca usei. Sabe, não fica muito bem em mim.’ – Eliza estava pasma. Admirava a outra de todos os ângulos e exclamava de felicidade.


                ‘-Tá, Eliza, eu totalmente não vou usar isto.’


                ‘-O quê? Como assim não vai usar?’ – a garota ficara indignada – ‘Você ‘tá parecendo aquelas garotas sexy dos anos 50 misturada com uma diva dos anos 2 mil. Você tem que vestir isso.’ – o olhar que foi lançado a Serena era ameaçador.


                Ela se mirou mais uma vez no espelho de tamanho mediano que Eliza também trouxera dentro da mala. Ela se sentia apelativa. Como Parkinson. Apesar de ela ser bonita em demasia para ser comparada a outra sonserina. Mas totalmente não queria parecer Parkinson.


                Serena abriu o zíper do vestido e o jogou para a loira, que o agarrou furiosamente, partindo em sua direção. Enquanto isso, a morena, só de lingerie e sandálias prateadas de salto agulha, estava procurando loucamente na mala cor-de-rosa.


                Por fim, deu um sorrisinho quando encontrou um vestido preto e curto, feito de um tecido que refletia como se estivesse molhado, de um ombro só. Vestiu-o, e ficou feliz com o resultado.


                ‘-Olhe aqui’ – disse Eliza muito séria - ‘, eu não vou te deixar trocar esta beldade em vermelho por esse alternativo preto! Não, não e não.’ – ela cruzou os braço, ainda agarrada ao tomara que caia.


                ‘-Elizabeth’ – Serena também começou séria – ‘Eu não vou usar um vestido que cobre a minha calcinha e mal chega ao sutiã. E vermelho. O preto faz mais meu estilo.’


                ‘-Às vezes eu penso,’ – Eliza começou, meditativa – ‘você deve ter mais coincidências com o Snape do que o sobrenome!’ – a garota continuava a pensar, tentando montar um quebra-cabeça que Serena sabia que nunca conseguiria por falta de peças.


                A morena riu. Não era somente para disfarçar, mas era porque ela realmente possuía mais coisas em comum com Snape do que o sobrenome.E Eliza nem sequer imaginava o quanto essas míseras coisas faziam a diferença. 

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