A Garota



Algum lugar de volta no tempo.
Somewhere back in time.
1972

Sírius Black deu um muxoxo irritado e esfregou os olhos pela enésima vez naquele dia.
- Credo, ainda bem que esse trem sai as onze, não queria nem imaginar o seu estado se ele saísse mais cedo – falou Tiago Potter, já incomodado com o mau-humor do amigo.
- Não dormi tão bem como você – Sirius retrucou. Deu um grande bocejo.
- Aconteceu alguma coisa?
- Nada, só não peguei no sono.
Era o de sempre, não é? Havia brigado com sua mãe.
- Bom dia.
Um garoto de cabelos castanho-claros havia aberto a porta da cabine.
- Bom dia, Remo – Tiago respondeu. - Não liga pro Sírius que ele levantou com o pé esquerdo. - Recebeu um olhar fuzilante do moreno que tentava se acomodar em um canto do banco.
Minutos depois, quase atrasado, outro menino chegou à cabine.
- Agora está o dormitório inteiro aqui – comentou Remo Lupin, com um sorriso um pouco cansado, ao ver Pedro Pettigrew enfiar o malão na bagageiro. - Então, como foram de férias?
Eles logo puseram-se a discutir as preciosas 8 semanas de descanso, mas somente Tiago havia feito algo realmente interessante: visitara uns primos na Escócia com os pais. Ficaram em silêncio depois de alguns minutos de conversa, perdidos com a falta de assunto.
Sírius voltou a tentar se aninhar perto da janela, usando uma blusa como travesseiro, porém sabia que não ia adormecer até estar em Hogwarts, estirado confortavelmente na sua cama. Tiago tirou sua coruja da gaiola e Remo o ajudou a pegar as penas mortas das asas. Tudo bem que ela fazia isso muito melhor sozinha, mas eles precisavam de algo para se distraírem.
Foi Pedro quem a viu primeiro.
- Garota estranha – comentou, entediado, olhando pelo vidro da porta da cabine. O trem começava a rodar.
Os outros três vieram ver de quem se tratava. Havia uma menina miúda arrastando um malão maior que ela para a cabine da frente. Vestia uma camiseta larga, estampada com uns homens de cabelo que mais pareciam poodles mortos sobre as cabeças. Tinha uma bandana preta amarrada sobre os cabelos escuros e ondulados, suas calças jeans comportariam tranqüilamente umas 3 dela.
Ela tentava segurar a porta aberta enquanto puxava o malão para dentro. Conseguiu com muito esforço. Foi pior para colocá-lo no bagageiro, muito pior.
- Deviámos ajudar... não devíamos? - Perguntou Remo incerto.
- Vamos lá – Sírius sorriu. - Quero saber quem é esse bicho estranho.
Entraram na cabine sem cerimônia, só para receberem um olhar gelado da garota.
- Desculpa, já tem gente aqui. Deve ter mais alguma vazia no começo do trem.
Eles não disseram nada, somente se entreolharam.
- Você não devia ser grossa com os veteranos, primeiranista – falou Tiago, fingindo um tom sério enquanto segurava o riso.
- Veteranos, vocês? Tá bom – ela se virou e continuou tentando levantar o malão. Conseguiu colocá-lo em cima do banco. Já era um começo.
- Com certeza é seu primeiro ano – rosnou Sírius, entre dentes. - Então nos deve um pouco mais de respeito. Estamos aqui há mais tempo que você.
Ela se virou e o encarou, a irritação emanava de seus olhos castanhos.
- Vieram só me encher o saco?
- Na verdade, queríamos ajudar com o malão – riu Remo, divertido.
- Estou bem. Podem sair agora?
- Torce pra não cair na Grifinória – Pedro fechou a cara. Tirar Pedro do sério não era fácil, mas ela estava conseguindo com sua teimosia.
- Com todas as minhas forças – ela respondeu, mais alto.
Os garotos teriam retrucado aos gritos se um monitor chefe não tivesse passado pelo corredor naquele instante.
- Quem você pensa que é, ein? - Disse Sírius, saindo da cabine com os amigos, dando uma última olhada na baixinha.
- Viviane Lloyd. Agora, por favor... - Ela estendeu um braço para indicar a porta, um tom nada amistoso na voz.
A menina ainda lançou um último olhar de raiva silenciosa aos quatro antes que fechassem a porta. Olhou desanimada para o malão. Alguma ajuda viria mesmo a calhar...

Parada na fila de aluninhos nervosos. Ela era uma das mais aflitas, tinha certeza. Seu pai não soubera dizer muita coisa sobre Hogwarts, mas pelo menos a preparara para os barquinhos. Agora, para um chapéu que cantava, nada nunca a teria preparado. Observou o início da seleção, tremendo.
Quando a bruxa bonita e séria de coque chamou seu nome, Viviane deu alguns passos à frente e se sentou no banquinho de três pernas. Viu os quatro do trem em uma mesa na ponta do salão antes que a aba do chapéu cobrisse sua visão.
- Ora, ora, que mente interessante temos aqui – sussurrou uma vozinha aguda em seu ouvido. - Quanta raiva guardada, menina! Você tem sangue-frio, com certeza. Mas tão vingativa! Sei de um lugar em que vai se dar bem. SONSERINA!
Ela ficou feliz ao ouvir os aplausos da mesa da outra ponta. Foi correndo para lá, animada pelo acolhimento, pois nunca ninguém a tratara com afeto assim do começo. Olhava tudo atentamente, captando os detalhes e pormenores. O teto a deixou impressionada, a descrição de Hogwarts, uma história não fazia jus, nem um pouco. Podia ver a noite clara salpicada de estrelas e uma bela lua minguante sorrindo para ela.
“Agora está tudo bem”, o sorriso da lua parecia dizer.
Embora não tivesse falado muito com ninguém, dormiu feliz naquela noite, ansiosa pelas aulas do dia seguinte.

A semana transcorreu em paz. Viviane Lloyd elegeu de cara Poções como sua matéria preferida e História da Magia como a pior de todas, a mais chata. Descobriu sem esforço e sem querer que os garotos do trem estavam no segundo ano e eram do tipo cheio de amigos. Especialmente os dois morenos.
Conforme os dias se arrastavam lentamente, havia esbarrado com eles nos corredores, mas nada grave. Sem a bandana e a camiseta de banda, ela era só uma novata como tantas outras, não é?
As coisas no geral iam bem, então. Não conversava muito, não era sociável. Timidamente trocava algumas palavras com uma garota do seu dormitório, Carolina Selwyn. Formaram dupla na aula de Herbologia e de Feitiços, mas pouco mais se falaram depois delas.
A história fica mais interessante na terça-feira da segunda semana de aulas. Nossa baixinha estava na biblioteca fazendo um trabalho de Defesa contras as Artes das Trevas sobre os gouls. Ela poderia jurar que não queria copiar parágrafos inteiros do livro texto, mas era o que estava fazendo. O que mais, se a informação estava ali, todinha pronta?
Sentiu peso na consciência o suficiente para procurar outro livro. Começou a vasculhar as estantes, entretanto a maioria dos exemplares parecia avançada demais. Feitiços contra seres mortais. Não. Encurralando diabretes – guia prático de receitas. Também não. A conspiração dos demônios etéreos: eles estão entre nós e querem nos dominar. Definitivamente não! Tratado sobre defesa para iniciantes. Ei, promissor.
Pegou o grande volume e folhou, acertara na mosca. Deu um passo para trás e não viu mais nada por alguns instantes. Caiu com a cara no chão, atropelada por um rapaz narigudo de cabelos negros e oleosos. Pôs uma mão na cabeça e olhou confusa para ele.
- De onde você saiu?
Ele não pareceu feliz. Levantou-se, ajeitou as vestes e virou as costas.
- Ei, seu grosso! - Viviane não se conteve. Ele trombou com ela sem querer, mas podia ao menos ter pedido desculpas ou ajudado a menina a se levantar.
O garoto se virou para ela, pegou o livro no chão e empurrou rudemente em direção ao peito dela.
- Toma.
Se ela soubesse que ele estava em um de seus piores dias, que os grifinórios do trem o haviam azarado a manhã toda e que um trabalho quilométrico dele havia misteriosamente sumido, ela provavelmente teria deixado passar. Conhecia essas coisas. Mas Viviane não sabia. Olhou feio enquanto ele se afastava com pressa e passou a mão ombro dolorido.
Havia acabado de decidir odiar Severo Snape.

A oportunidade de uma vingança veio quase um mês depois. Ele estava distraído, anotando rapidamente uma última nota de inspiração em um pergaminho encostado contra a parede ao lado da porta da sala de aula. Segurava o trabalho com a mesma mão que enlaçava a tinta, a outra manejava habilmente a pena. Com um movimento rápido da menina e duas palavras baixas, o tinteiro escapou de suas mãos e flutuou por menos de um segundo antes de cair sobre sua cabeça. O vidro estourou e o garoto ficou coberto de tinta preta.
Snape se virou para o corredor, tentando se localizar. Seu material se espalhou pelo chão sem que ele conseguisse impedir. O pior foi quando, ao retirar a tinta que escorria sobre os olhos com um aceno de varinha, ele viu o trabalho irremediavelmente manchado. Olhou ao redor. Potter e Black haviam acabado de dobrar um corredor e entrar em vista. Qual seria a probabilidade de terem sido eles? Muito alta, Severo pensou.
Mas então viu a garota saindo com pressa, e, pensou, conhecia-na. Tiago e Sírius a viram guardando a varinha, olharam para o Ranhoso e, ao compreender o que havia se passado, deram um sorriso para ela. Quer um que sacaneasse com Severo Snape merecia respeito e, por que não, confiança.
Quando Viviane viu os dois sorrindo para ela, enrugou a testa. Não parecia natural aqueles dois antipáticos sendo gentis.
O alvo da vingança, ao reparar na varinha sumindo em seu bolso, lembrou-se vagamente da biblioteca um tempo atrás e reconheceu a alma sonserina da garota. Era o troco pela grosseria.
- Ei, menina, vem cá!
Ela não veio, apertou o passo. Ela tentou ir atrás, mas...
- O que é isso? Vai arrumar encrenca com alguém mais novo, e ainda uma garota?
- O que tem a ver com isso, Potter?
Tiago deu uma risadinha ao cruzar os braços.
- Nós só estávamos nos perguntando, Ranhoso, se você é tão covarde assim – debochou Sírius.
Severo fechou a cara. Viu o professor Binns chegando e não teve saída a não ser recolher seu material do meio do caminho e amaldiçoar mentalmente os três.
Viviane ouviu tudo, e se perguntou sinceramente por que eles haviam feito isso. Recuou alguns metros no corredor (quando teve certeza que o garoto da biblioteca tinha entrado na sala, claro) e viu os dois rindo enquanto contavam o acontecido para os outros que estavam no trem. Precisava decorar os nomes deles rápido, estava ficando confusa.
Eles se calaram quando a menina se aproximou e um silêncio constrangedor caiu sobre os cinco.
- Parabéns – sorriu o mais alto, com um brilho insano nos olhos.
- Porque me defenderam?
- Bem, você fez algo admirável – comentou o outro moreno, de óculos. - Sacaneou bonito com ele.
- Vingança – ela deu de ombros. - De qualquer forma, obrigada.
- Sempre que for se vingar dele de novo, nós te acobertamos – ele continuou.
Dessa forma, fez-se a paz dentro de Hogwarts. Fora dela, as primeiras vítimas da guerra começavam a aparecer.

N/As:
1 – Peço mil perdões a quem lia essa fic na versão anterior! Confesso que abandonei, fiquei 3 anos sem entrar no F&B. Isso porque a fic não ficou do jeito que eu queria, virou romance, coisa tonta. Bom, isso não vai acontecer de novo, estou tomando todas as precauções.
2 – A [K]ause uma vez me disse que primeiros capítulos são chatos. Isso é uma verdade aqui, infelizmente. A parte inicial da fic ainda tem os protagonistas pequenos demais para um conflito mental decente, mas eu juro que melhora no próximo capítulo. E que o terceiro vai ser bom.
3 – Respondendo aos comentários:
.Feer;: Aí está! E mais uma vez obrigada pela capa linda.
- Matthew Dresch;: Obrigada por ter paciência para me explicar como põe música! Pena que a do Prólogo e desse primeiro capítulo eu não achei nos sites...
Gabby Lupin: O que seria de mim sem seus incentivos? Espero que aproveite a fic!
Chris Black: Valeu! Sobre o capítulo com os personagens, eu explico aí em baixo.
Claudiomir José Canan: Muito obrigada por liberar propaganda de Sine Qua Non em Apollyon! Eternamente grata, ó grande autor.
4 – Bom, acho que vocês já sabem que existe um perfil no Orkut para a fic. Lá vocês encontrarão prévias do segundo capítulo em algum tempo, mas já estão disponíveis as fotos dos principais personagens originais. Confiram:
http://www.orkut.com.br/Main#Profile.aspx?uid=15081670062021947839
Também há algumas prévias no perfil.
5 – Sem comentários, sem capítulo. Desculpa, mas as coisas funcionam assim. Incrível como as pessoas parecem gostar das minhas fics, várias vezes eu vejo o mesmo nome de leitor em várias, mas ninguém comenta! Sim, eu tenho necessidade de atenção. Elogiem, xinguem, façam qualquer coisa, mas deixem um comentário, ok?
Acho que é só. Beijos a todos, L.W.

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